Prisioneiros em Guantánamo. Imagem: Arquivo Pessoal CHH.
Numa base militar no caribe,
fica a prisão mais dura do mundo. suspeitos de terrorismo são levados para lá e
podem ficar presos para sempre, sem direito a julgamento. Dos 166 detentos, 130
estão fazendo greve de fome. E um deles conta, pela primeira vez, como as
coisas são por lá. Conheça a vida no pior lugar da Terra.
Reportagem de Larry Siems,
da Slate. Edição e tradução: Bruno Garattoni
Mohamedou Ould Slahi se
apresentou voluntariamente à polícia de seu país natal, a Mauritânia, em 20 de
novembro de 2001. Foi preso, e uma semana depois, a pedido do governo dos EUA,
transferido para a Jordânia. Slahi era acusado de ligações com um atentado
frustrado no aeroporto de Los Angeles, em 1999. Por sete meses, foi interrogado
pelas autoridades jordanianas, que não acharam nada que o incriminasse.
Insatisfeita, a CIA buscou Slahi e o levou até uma base militar americana no
Afeganistão.
Em 4 de agosto de 2002, ele
foi encapuzado, algemado, drogado e colocado num voo com 30 outros detentos,
para uma viagem de 36 horas até a base de Guantánamo, em Cuba, onde está até
hoje. Slahi escreveu um livro de 466 páginas contando sua história. Partes dele
acabam de ser divulgadas, e você irá ler a seguir. Os trechos cobertos por uma
tarja preta foram censurados, antes da liberação do texto, pelo governo dos
EUA. As passagens em laranja foram adicionadas pela SUPER para facilitar a
compreensão do caso.
O interrogatório
Os gritos dos outros presos
me acordaram.
Enquanto os guardas serviam
comida, nós nos apresentávamos. Não podíamos ver uns aos outros, mas era
possível ouvir as vozes. "Eu sou da Mauritânia." "Eu sou da
Palestina." "Síria." "Arábia Saudita."
"Como foi o voo?"
"Eu quase congelei até
morrer", gritou um cara. "Eu dormi a viagem toda", respondeu
[Techo censurado].
Nós nos chamávamos pelos
números de identificação que tínhamos recebido. O meu era 760. Na cela à
esquerda estava [Techo censurado], de [Techo censurado]. Na cela à direita,
havia um cara de [Techo censurado]. Ele falava mal árabe e dizia que tinha sido
capturado em Karachi (Paquistão), onde frequentava a universidade. Nas celas em
frente à minha, colocaram dois sudaneses.
O café da manhã foi modesto,
um ovo cozido, um pedaço de pão duro e uma outra coisa que não sei o nome. Foi
minha primeira refeição quente desde a Jordânia. O chá foi reconfortante.
Eu considerei a chegada a
Cuba uma bênção, e disse aos meus irmãos. "Como vocês não estão envolvidos
em crimes, não têm o que temer. Eu vou cooperar, porque ninguém vai me
torturar." Eu erroneamente acreditava que o pior tinha passado. Eu
confiava demais no sistema judicial americano.
Prisioneiros são humilhados e torturados pela "acusação de Terrorismo". Imagem: Arquivo Pessoal CHH.
"[Techo
censurado]", disse um dos soldados enquanto segurava longas correntes nas
mãos. A palavra [Techo censurado] é um código, significa que você será levado
para um interrogatório. Eu prudentemente obedeci às ordens, e eles me levaram
até o interrogador. O nome dele era [Techo censurado], e ele vestia um uniforme
do Exército dos EUA. Falava árabe decentemente, com um sotaque de [Techo
censurado]. Ele me disse que é de [Techo censurado] e costumava trabalhar como
intérprete para os [Techo censurado].
[Techo censurado] era um
cara amigável. Ele queria que eu contasse mais uma vez toda a minha história.
Quando cheguei à parte sobre (o que tinha passado) na Jordânia, ele disse que
sentia muito!
"Esses países não
respeitam os direitos humanos. Eles até torturam gente." Me senti
confortável por essa crítica a métodos cruéis de interrogatório; significa que
os americanos não fariam algo do tipo.
Depois que [Techo censurado]
terminou suas perguntas, me mandou de volta (à cela).
Eles obviamente viam o quão
doente eu estava. Eu parecia um fantasma (registros oficiais indicam que Slahi,
de 1,70 m, pesava apenas 49 quilos ao chegar à base). No meu segundo ou
terceiro dia em Guantánamo, eu desmaiei. Os médicos me tiraram da cela. Vomitei
tanto que fiquei completamente desidratado. Recebi primeiros socorros e uma
sonda intravenosa. Foi terrível, eles devem ter colocado algum remédio ao qual
sou alérgico. Minha boca secou, e minha língua ficou tão pesada que eu não
conseguia falar para pedir ajuda. Com gestos, pedi aos guardas que tirassem a
sonda, e eles tiraram.
Mais tarde, os guardas me
levaram de volta à cela. Eu estava tão doente que não conseguia subir na cama.
Dormi no chão o resto do mês. O médico me prescreveu Ensure (suplemento
nutricional) e um remédio para hipertensão. Quando eu tinha crises de nervo
ciático, os guardas me davam Motrin (anti-inflamatório). Embora eu estivesse
fisicamente muito fraco, os interrogatórios não pararam.
Nos primeiros meses em
Guantánamo, Slahi foi interrogado por agentes do FBI e da Marinha, que
utilizavam métodos tradicionais. Mas, em maio de 2003, começou seu
"interrogatório especial" - termo que os militares americanos
utilizam para se referir ao uso de técnicas mais fortes, que incluem certos
tipos de tortura. Slahi foi transferido para a solitária.
A escolta apareceu na minha
cela. "Mexa-se."
"Para onde vou?"
Prisioneiros sendo torturados em Guantánamo. Imagem: Arquivo Pessoal CHH.
"Não é problema
seu", disse com raiva o guarda [Techo censurado]. Mas ele não era muito
esperto, pois tinha anotado meu destino em sua luva. [Techo censurado] era (um
lugar) reservado para os piores presos da base. Se você fosse transferido para
[Techo censurado], muitas pessoas deveriam ter autorizado, talvez (até) o
presidente dos EUA. As únicas pessoas que eu conhecia que tinham passado algum
tempo em [Techo censurado] eram [Techo censurado] al Kuwaiti e outro detento de
[Techo censurado].
Ao chegar ao bloco, a coisa
começou. Tiraram todos os meus objetos, exceto por um colchonete e um cobertor
muito fino, pequeno e velho. Fui privado dos meus livros. Fui privado do meu
Corão. Fui privado do meu sabonete. Fui privado da minha pasta de dentes. Fui
privado do rolo de papel higiênico que eu tinha.
"Nós sabemos que você é
criminoso."
"O que eu fiz?"
"Me diga você, e
reduzimos a sua sentença para 30 anos. Se você não cooperar, vamos colocar você
num buraco e apagar seu nome da nossa lista de detentos."
Quando eu não dei a resposta
que ele queria ouvir, ele me fez levantar. Fiquei com as costas arqueadas (para
trás), porque minhas mãos estavam acorrentadas a meus pés e ao chão. [Techo
censurado] sempre me deixava sofrendo durante seu almoço, que demorava duas a
três horas. Ele gostava de comida; nunca pulava o almoço. Fiquei pensando, como
[Techo censurado] pode ter passado no teste físico do Exército (tendo uma forma
física tão ruim)? Mas faz sentido, ele está no Exército por um motivo.
Como nunca me deixavam ver a
luz (do dia), eu "gostava" do curto trajeto entre minha cela gelada e
a sala de interrogatório. Era uma bênção quando eu sentia o sol morno de
Guantánamo. Sentia a vida voltando a cada centímetro do meu corpo.
"Como você está?",
disse um dos guardas porto-riquenhos.
"Ok, obrigado, e
você?"
"Não esquenta, você vai
voltar para sua família," ele disse. Quando ele falou isso, eu não
consegui evitar o [Techo censurado]. Eu tinha me tornado tão vulnerável. Uma
mera palavra de conforto neste oceano de agonia era o suficiente para me fazer
chorar.
Em [Techo censurado] nós
tínhamos uma divisão de porto-riquenhos. Eles eram diferentes dos outros
americanos. Não eram tão vigilantes e hostis. Às vezes, levavam presos para
tomar banho [Techo censurado]. Todo mundo gostava deles. Por causa de sua
atitude amigável e humana com os presos, arranjavam problemas com os chefes da
base.
"Hoje nós vamos falar
sobre [Techo censurado]", disse [Techo censurado] depois de me empurrar
uma cadeira de metal.
"Eu já disse o que sei
sobre [Techo censurado]."
"É mentira. Você vai
nos dizer mais?"
"Não, não tenho mais o
que dizer." [Techo censurado] puxou a cadeira e me derrubou.
"Vamos lhe ensinar sexo
americano. Levante", disse [Techo censurado].
Assim que eu levantei, os
dois [Techo censurado] tiraram as blusas e começaram a falar todos os tipos de
baixaria que você possa imaginar. [Techo censurado] se encaixou em mim pela
frente, e o [Techo censurado] se encaixou por trás, esfregando o corpo todo no
meu. Enquanto faziam isso, eles falavam coisas sujas comigo e brincavam com
minhas partes sexuais. Vou poupar você das coisas nojentas e degradantes que eu
tive de ouvir do meio-dia até 10 horas da noite.
Para ser honesto e justo, os
[Techo censurado] não tiraram minhas roupas em nenhum momento; tudo aconteceu
comigo vestido. O [Techo censurado] sênior estava assistindo. Fiquei rezando o
tempo todo.
"Para de rezar, porra.
Você está fazendo sexo com [Techo censurado] americanos e está rezando? Como
você é hipócrita!", disse raivosamente [Techo censurado] ao entrar na
sala. Eu continuei rezando. Durante essa sessão, eu me recusei a comer ou
beber, embora eles tenham me oferecido água algumas vezes. Eu queria desmaiar
para não ter de sofrer; essa era a principal razão da minha greve de fome. Eu
sei que pessoas como eles não se impressionam com uma greve de fome. Claro que
eles não queriam que eu morresse, mas eles sabem que há muitas etapas até que
alguém morra.
"Você não vai morrer,
nós vamos alimentar você pelo rabo," disse [Techo censurado].
Registros oficiais mostram
que, em julho de 2003, mais de um mês após o início do "interrogatório
especial", Slahi foi questionado durante uma semana por um novo
interrogador, mascarado.
"Tragam de volta o
filho da p...", gritou [Techo censurado], uma celebridade na equipe de
tortura. Ele tinha 1,80 de altura, era atlético e [Techo censurado].
Conforme fui conhecendo
[Techo censurado] melhor, pensei em como um homem tão inteligente quanto ele
poderia aceitar um trabalho tão degradante, que com certeza irá perturbá-lo
para o resto da vida. Tempos depois, perguntei a alguns dos guardas porque eles
tinham executado a ordem de me impedir de rezar, que é ilegal. "Eu poderia
ter (ignorado a ordem), mas meu chefe teria me dado um cargo de merda, ou me
transferido para um lugar ruim."
"Você não está ajudando
o [Techo censurado]", continuou [Techo censurado] enquanto me arrastava
até uma sala escura. Com ajuda dos guardas, ele me jogou no chão sujo. A sala
estava escura como o ébano. [Techo censurado] começou a tocar uma música muito
alto. Muito alto mesmo. A música era Let the Bodies Hit the Floor (da banda de
heavy metal Drowning Pool). Talvez eu jamais me esqueça daquela música. [Techo
censurado] ligou umas luzes coloridas que machucavam os olhos. "Se você
dormir, eu vou machucar você". Eu tive de escutar aquela música sem parar
até a manhã do dia seguinte.
"Bem-vindo ao
inferno", disse o guarda [Techo censurado]. Eu não respondi, não valia a
pena. Mas pensei, "você merece o inferno mais do que eu, porque você está
trabalhando arduamente para ir ao inferno!"
"Vou trazer umas
pessoas para me ajudar a interrogar você", falou [Techo censurado],
sentado a poucos centímetros de mim.
[Techo censurado] me
ofereceu uma cadeira de metal. O convidado se sentou, quase tocando meu joelho.
[Techo censurado] começou a me perguntar uma coisa de que não lembro.
"Levanta, filho da
p...", gritaram ambos. Então uma sessão de tortura e humilhação começou.
[Techo censurado] colocou o
ar-condicionado no máximo para me congelar. Esse método era praticado na base
pelo menos desde agosto de 2002. Eu vi pessoas que foram expostas à sala de
congelamento dia após dia, como [Techo censurado].
Os interrogadores queriam
que o ar-condicionado chegasse a zero grau, mas obviamente o aparelho não é
projetado para matar. Na sala, bem isolada, o ar chegou a 9,4 graus Celsius -
muito, muito frio, especialmente para alguém que teve de ficar ali por mais de
12 horas, não tinha roupa de baixo, tinha um uniforme muito fino, e vem de um
país quente. Os interrogadores se vestiam adequadamente. Por exemplo, [Techo
censurado] estava vestido como alguém que vai entrar num frigorífico. Além
disso, eles não ficavam muito tempo com os detentos. Os interrogadores ficavam
se movimentando na sala, o que significa circulação sanguínea, o que significa
se manterem quentes enquanto o detento estava [Techo censurado] o tempo todo,
de pé a maior parte do tempo. Tudo o que eu podia fazer era mexer meus pés e
esfregar as mãos. Mas o marine impediu que eu esfregasse as mãos. Ele trouxe
uma corrente especial que prendia minhas mãos nas laterais do quadril.
O homem (líder) do show
começou a jogar cadeiras, me deu uma cabeçada e me descreveu com todos os tipos
de adjetivo, sem motivo. O cara era maluco; ele me perguntou coisas das quais
não tenho ideia e nomes que nunca ouvi. "Eu estive em [Techo
censurado]", ele disse, "e sabe quem foi nosso anfitrião? O
presidente! Foi agradável lá no palácio." O marine fazia perguntas e
respondia ele mesmo. Ele trouxe água gelada e encharcou todo o meu corpo.
Minhas roupas grudaram em mim. Era horrível, eu tremia como um paciente de
Parkinson. Eu não conseguia mais falar. O cara era burro, ele estava literalmente
me executando devagar. [Techo censurado] mandou ele parar de jogar água em mim.
[Techo censurado] mandou ele
parar porque estava com medo da sindicância que (resultaria) em caso da minha
morte. Ele encontrou outra técnica; trouxe um CD player com amplificador e
começou a tocar um rap. Eu não liguei para a música porque ela me fez esquecer
minha dor; na verdade, a música era uma bênção disfarçada, eu fiquei tentando
entender as palavras. Só entendi que a música era sobre amor, você acredita?
Amor! "Escuta isso, filho da p...!", disse o convidado ao sair,
fechando violentamente a porta. "Você vai ter a mesma m.... dia após dia,
e sabe o quê? Vai piorar. É só o começo", disse [Techo censurado]. Eu
continuei rezando e ignorando o que eles estavam fazendo.
"Ó, ALÁ, me ajude... Ó,
Alá, tenha piedade", [Techo censurado] ridicularizava minhas rezas.
"ALÁ... ALÁ ... Não existe Alá. Ele te abandonou!"
Entre 10 e 11 da noite,
[Techo censurado] ordenou aos guardas que me colocassem numa sala especialmente
preparada. Era muito fria e cheia de fotos mostrando as glórias dos EUA:
arsenal, aviões, fotos de G. Bush. "Não reze, você insulta o meu país se
você reza durante o meu hino nacional. Nós somos o maior país do mundo livre, e
temos o presidente mais inteligente do mundo", disse [Techo censurado]. A
noite inteira eu tive de ouvir o hino dos EUA. De qualquer forma, eu odeio
hinos. Tudo o que consigo lembrar é o começo, "Oh say can you see
...", repetido e repetido.
Entre 4 e 5 da manhã, [Techo
censurado] me soltou, para algumas horas depois recomeçar a mesma coisa.
A viagem de barco
Em 24 de agosto de 2003,
Slahi foi tirado da cela e levado numa viagem de barco de três horas pelo
Caribe.
Eu mal tinha acabado de
comer, quando de repente [Techo censurado] e eu ouvimos uma confusão, guardas
gritando alto, "Eu avisei, filho da p...". Ouvi gente pisando forte
no chão, um cão latindo, portas fechando com força. Eu fiquei paralisado.
Subitamente um grupo de três
soldados e um pastor alemão entraram. [Techo censurado] me socou violentamente,
o que me fez cair de cara no chão, e o segundo cara continuou a me socar em
todo o corpo, principalmente no rosto e nas costelas. Ambos estavam mascarados.
"Eu avisei, você já
era!", disse [Techo censurado]. O parceiro dele continuou a me socar sem
dizer nada; ele não queria ser reconhecido. O terceiro homem não estava
mascarado, ele ficou na porta segurando a guia do cachorro, pronto para
soltá-lo em mim.
"Quem mandou vocês
fazerem isso? Vocês estão ferindo o detento", gritou [Techo censurado],
que estava tão assustado quanto eu.
"Vendem o filho da
p...! Ele está tentando olhar." Um deles me acertou com força no rosto e
rapidamente colocou óculos nos meus olhos, abafadores nos ouvidos, e um pequeno
saco na minha cabeça. Eles apertaram as correntes nos meus tornozelos e pulsos;
eu comecei a sangrar. Achei que eles iriam me executar.
O outro guarda me arrastou e
me jogou num caminhão, que começou a andar. A sessão de espancamento duraria as
próximas três a quatro horas, depois do que eles me entregariam para outro
time, com técnicas diferentes de tortura.
"Para de rezar, filho
da p... você está matando pessoas", [Techo censurado] disse, e me socou
com força na boca. [Techo censurado] e [Techo censurado] ficaram cada um de um
lado e começaram a me socar e me bater contra o metal do caminhão. Um dos caras
me bateu (com tanta força) que minha respiração parou e comecei a engasgar. Era
como se eu estivesse respirando pelas costelas.
Várias vezes percebi [Techo
censurado] esguichando amônia no meu nariz. O engraçado é que [Techo censurado]
era ao mesmo tempo um (torturador e) "salva-vidas", como os guardas
com os quais eu lidaria no ano seguinte; todos tinham permissão para me medicar
e dar primeiros socorros.
Depois de 10 a 15 minutos, o
caminhão parou na praia. Meu time de escolta me arrastou e me colocou numa
lancha. Continuaram a me bater. Dentro do barco, [Techo censurado] me fez tomar
água salgada, acho que direto do mar. Eu vomitei. Eles colocaram um objeto na
minha boca e gritaram, "engole, filho da p...!" .
[Techo censurado] e [Techo
censurado] estavam me escoltando na viagem de lancha. O objetivo dessa viagem,
primeiro, era torturar o detento e dizer que ele "se feriu durante o
transporte", e, segundo, fazer o detento pensar que está sendo transferido
para alguma prisão secreta muito, muito longe.
Era noite. Minha venda não
me impediu de ver umas lâmpadas fortes.
"Nós felizes por isso
(sic). Talvez nós levamos ele pro Egito, ele diz tudo", disse um sujeito
cuja voz eu nunca tinha ouvido, com um forte sotaque egípcio. O inglês dele era
ruim e pronunciado errado.
"Talvez depois",
disse [Techo censurado].
Eu me afundei em
pensamentos. Senti vergonha que o meu povo (árabe) estava sendo usado para esse
trabalho horrível por um governo que se diz o líder do mundo democrático. O que
o americano médio pensaria se ele ou ela soubesse o que seu governo está
fazendo com alguém que não cometeu nenhum crime?
Depois de uns 40 minutos,
[Techo censurado] instruiu o time árabe a começar. Os dois caras me pegaram e,
como eu não conseguia andar sozinho, me arrastaram até o barco.
"Senta!", disse o
egípcio, o que mais falava. O egípcio se sentou do meu lado direito. Um jordaniano
sentou à esquerda.
Eles me puseram uma espécie
de jaqueta grossa, que me prendia à cadeira. Era uma sensação boa - mas que
também tinha um lado horrível. Meu peito ficou tão apertado que eu não
conseguia respirar. Eu não sabia exatamente o que estava acontecendo, mas
alguma coisa estava errada. "Puxe o ar", disse secamente o egípcio.
Eu estava literalmente sufocando.
Eles encheram o espaço entre
minhas roupas e eu com cubos de gelo, do pescoço até os tornozelos, e conforme
o gelo derretia eles colocavam mais cubos. De vez em quando, um dos guardas me
batia, geralmente no rosto. O gelo servia tanto para me castigar quanto para
eliminar marcas (hematomas no corpo).
E se me mandassem para o
Egito? Como o interrogatório seria? Eu esperava choques elétricos. Quanta
eletricidade meu corpo poderia aguentar?
(Mas) A festa terminou, e os
árabes me devolveram para a equipe americana. Eles me arrastaram para um
caminhão. Quando o caminhão parou, [Techo censurado] e seu colega forte me
pegaram e arrastaram por alguns degraus. E eles me jogaram de cara no chão de
metal da minha nova casa.
"Não se mexa, não
apronte comigo, filho da p...!", disse [Techo censurado], com a voz enfraquecida.
Ele estava obviamente cansado, e foi embora.
Pouco tempo depois, senti
alguém tirando (o capuz) da minha cabeça. Quando a venda foi tirada, eu vi um
[Trecho censurado]. Concluí que era um médico, mas por que diabos ele está se
escondendo atrás de uma máscara, e por que é do Exército, sendo que a Marinha é
a responsável pelos cuidados médicos dos presos?
"Se você se mexer, eu
vou machucar você!"
Fiquei pensando como eu
poderia me mexer, que mal eu poderia fazer. Eu estava acorrentado, e cada centímetro
do meu corpo doía. Ele saiu e logo voltou com algumas coisas médicas. Eu
reparei no relógio dele; era 1h30 da manhã.
O médico começou a limpar o
sangue do meu rosto com uma gaze. Depois disso, ele me colocou num colchão - o
único item da cela - com ajuda dos guardas. "Não se mexa", disse um
guarda. O médico colocou muitas cintas elásticas em volta do meu peito e
costelas. Depois disso, eles me fizeram sentar. Eles me mexiam como um objeto.
Mais tarde eles tiraram as correntes, e um dos guardas me jogou um cobertor
pequeno e fino, e isso era tudo o que eu teria na cela.
Demorou um tempo até que a
medicação fizesse efeito, e aí eu apaguei, e só acordei quando um dos guardas
chutou violentamente a porta. "Levanta, seu merda!". O médico mais
uma vez me deu remédios e examinou minhas costelas.
"Já terminei com o
filho da p...", disse, e saiu em direção à porta. Eu fiquei chocado de ver
um médico agindo assim.
Slahi continuou em total
isolamento durante setembro e outubro. Em 17 de outubro de 2003, um interrogador
enviou um e-mail para um psicólogo militar. "Slahi me disse que está
ouvindo vozes". O psicólogo respondeu que a "privação sensorial (como
a experimentada na solitária) pode causar alucinações".
Pelas primeiras semanas eu
não tive banho, troca de roupa, nem pude escovar os dentes. Não era permitido
dormir. Para garantir isso, me davam garrafas com 740 ml de água a cada uma ou
duas horas, dependendo do humor dos guardas, por 24 horas. As consequências
eram devastadoras. Não conseguia fechar os olhos por dez minutos, porque
passava a maior parte do tempo no banheiro (privada da cela). Mais tarde,
perguntei a um dos guardas. "Por que essa dieta de água? Por que vocês não
me mantêm acordado me obrigando a ficar de pé, como em [Techo censurado]?"
"Acredite, você não viu
nada. Nós já mantivemos detentos presos embaixo do chuveiro por dias, comendo,
urinando e defecando no chuveiro!"
Eu comecei a alucinar e
ouvir vozes claras como cristal. Ouvi minha família numa conversa casual. Ouvi
leituras do Corão com uma voz celestial. Ouvi música do meu país. Mais tarde os
guardas tentaram se
aproveitar dessas alucinações, e ficavam falando com vozes engraçadas pelo
encanamento, me encorajando a tentar fugir.
Eu percebi que estava à
beira de enlouquecer. Comecei a falar sozinho. Ouvia vozes constantemente, dia
e noite. Eu não sabia quando era noite, mas assumia que era quando o ralo
ficava escuro.
Reuni minhas forças, estimei
a direção de Meca, me ajoelhei, e comecei a pedir a Deus. "Por favor me
guie. Eu não sei o que fazer. Estou cercado de lobos." Quando estava
rezando, eu caí em lágrimas, mas abafei para que os guardas não ouvissem.
"Senhor," eu
disse, quando terminei minha reza. Um dos guardas apareceu usando uma máscara
de Halloween.
"Quê?", disse
friamente o guarda.
"Eu quero falar com o
[Techo censurado]."
Confissões são como contas
de um colar, se a primeira cai, as demais seguem.
"Nós gostaríamos que
você escrevesse suas respostas no papel, nos dá muito trabalho registrar o que
você fala, e você pode se esquecer de coisas quando fala conosco", disse
[Techo censurado].
"Claro!", eu
respondi. Eu gostei da ideia, porque preferia falar com um papel do que com
ele. Pelo menos o papel não iria gritar ou me ameaçar. Depois disso, [Techo
censurado] me afundou numa pilha de papéis, que eu obedientemente preenchi com
minha escrita. Era bom deixar sair minha frustração e depressão.
"Nós vamos dar a você
uma tarefa relacionada a [Techo censurado]. Ele está preso na Flórida e eles
não conseguem fazê-lo falar. Ele fica negando tudo. É bom que você nos dê uma
prova contra ele", disse [Techo censurado].
Eu fiquei tão triste. Como
eu poderia fornecer uma prova sobre uma pessoa que eu mal conhecia?
Ele me deu alguns papéis e
voltei para minha cela. Peguei a caneta e escrevi todo tipo de mentiras
incriminatórias sobre um pobre sujeito, que estava tentando obter asilo no
Canadá e ganhar algum dinheiro para começar uma família. E ele é aleijado. Eu
me senti tão mal, ficava rezando em silêncio, "nada vai lhe acontecer,
irmão". Dizer a verdade sobre ele estava fora de questão, pois [Techo
censurado] já tinha me dado as instruções.
"[Techo censurado] está
esperando o seu testemunho contra [Techo censurado] com extremo
interesse!"
Eu dei o papel para [Techo
censurado], e depois da avaliação vi [Techo censurado] sorrir pela primeira
vez. "O que você escreveu sobre Ahmed foi muito interessante, mas nós
queremos que você forneça informações mais detalhadas", disse ele.
"Como eu estou
cooperando, o que vocês vão fazer comigo?", perguntei a [Techo censurado].
"Depende, se você nos fornecer muita informação que nós não tenhamos, isso
será considerado na sua sentença. Por exemplo, a pena de morte seria reduzida
para perpétua, e a perpétua para 30 anos", ele respondeu.
"Isso é ótimo",
respondi.
Me senti mal por todos que
feri com meus falsos testemunhos. Eu tinha de vestir o terno que os EUA
cortaram para mim, e foi exatamente isso o que fiz.
A família
Os interrogatórios violentos
prosseguiram pelos últimos meses de 2003. Slahi continuava em completo
isolamento.
"Sabe o que você
é?", disse [Techo censurado].
"Hã."
"Você é um
terrorista", continuou.
"Sim, senhor."
"Se nós matarmos você
uma vez, não será suficiente. Nós temos que matar você 3 mil vezes. Mas em vez
disso, nós o alimentamos!"
"Sim, senhor."
Ao longo de algumas semanas,
eu fiquei com os cabelos brancos. Na minha cultura, isso é considerado um sinal
extremo de depressão.
Aí, aos poucos, os guardas
receberam ordens para 1) permitir que eu escovasse os dentes, 2) me dar mais
refeições quentes, 3) me dar mais banhos. [Techo censurado] foi quem tomou os
primeiros passos, mas tenho certeza que eles decidiram isso numa reunião. Todos
na equipe perceberam que eu estava a ponto de enlouquecer, depois de tanto
tempo em isolamento.
"Eu trouxe este
presente para você", ele disse, e meu deu um travesseiro. Sim, um
travesseiro. Eu recebi o presente com uma felicidade enorme - não porque
estivesse morrendo de vontade de ter um travesseiro, mas porque o interpretei
como um sinal de que as torturas físicas parariam.
Eu não tinha nada na cela.
Na maior parte do tempo, eu recitava o Corão. O resto do tempo, eu falava
sozinho e pensava sobre minha vida, e as piores coisas que poderiam acontecer
comigo. Contava os furos da gaiola em que estava. São cerca de 4.100. Quando me
deram o travesseiro, eu ficava lendo a etiqueta sem parar.
"Levante! Coloque as
mãos pela porta!", disse com voz hostil um guarda. Depois que me
acorrentaram, eles me levaram para fora do prédio, onde [Techo censurado]
estava me esperando. Foi a primeira vez que vi a luz do dia. As pessoas não dão
valor a ela, mas, se você for proibido de vê-la, lhe dará valor. O sol me
atingiu misericordiosamente com seu calor. Eu estava apavorado e tremendo.
"Nós trouxemos você
para que possa ver o sol. Nós teremos mais recompensas como esta."
Não importa quão duros sejam
os seus interrogadores, forma uma relação com eles. É uma relação familiar, com
todas as vantagens e desvantagens. Você não escolheu sua família, nem cresceu
com ela. Mas é uma família.
"Eu vou embora
logo", disse [Techo censurado].
"É mesmo, por
quê?"
"Está na hora. Mas o
outro [Techo censurado] vai ficar com você." Isso não era exatamente
confortador. Eu fiquei inquieto, e não conseguia pensar num argumento para
convencer [Techo censurado] a ficar.
"Nós vamos ver um filme
juntos antes de eu ir embora", disse [Techo censurado].
[Techo censurado] saiu. Ele
voltou alguns dias depois, com um laptop e dois filmes.
"Você pode escolher
qual deles quer ver." Eu escolhi Falcão Negro em Perigo (filme de 2001
sobre uma ação militar dos EUA na Somália), não lembro do outro. O filme era
violento e triste. Eu prestei mais atenção nas emoções de [Techo censurado] e
dos guardas do que no filme em si. [Techo censurado] estava calmo. Ele pausava
o filme de vez em quando para me explicar determinadas cenas. Os guardas quase
ficaram loucos de emoção, porque viam muitos americanos sendo mortos.
Depois que terminamos de ver
o filme,
[Techo censurado] fechou seu
computador.
"Ei, a propósito, você
não me disse quando vai embora!"
"Você não vai mais me
ver!" Eu congelei. Ele não tinha me dito que iria embora tão cedo. Eu
achava que talvez demorasse um mês, três semanas, algo assim, mas hoje? Era
como se a morte estivesse devorando um amigo seu, e você não pudesse fazer
nada.
"Puxa, tão cedo. Estou
surpreso! Você não me disse. Adeus. Desejo tudo de bom para você."
"Eu tenho de seguir
ordens, e deixo você em boas mãos." E [Techo censurado] foi embora. Voltei
à minha cela e comecei a chorar em silêncio, como se eu tivesse perdido um
[Techo censurado] e não alguém cuja função é me ferir e extrair informação.
"Posso ver meu
interrogador, por favor?", pedi aos guardas, esperando que conseguissem
alcançá-lo antes que ele chegasse ao portão principal.
"Vamos tentar."
Logo depois, [Techo
censurado] apareceu na porta da minha cela. "Não é justo, você sabe que eu
fui torturado, e não estou pronto para outra rodada."
"Você não foi
torturado. Você tem de confiar no meu governo. Enquanto você estiver dizendo a
verdade, nada de mau vai acontecer a você!"
"Eu só não quero
começar tudo de novo com novos interrogadores", eu disse.
"Isso não vai
acontecer," disse [Techo censurado]. "Além disso, você pode me
escrever. Prometo que vou responder todos os seus e-mails", ele continuou.
"Não, eu não vou
escrever."
"Ok. Você está
bem?"
"Não, mas você pode ir
embora."
"Eu não vou embora até
você me garantir que está tudo bem", [Techo censurado] disse.
"Eu falei o que tinha
para falar. Tenha uma boa viagem. Que Alá guie você. Eu vou ficar bem."
"Tenho certeza que vai.
Em no máximo uma semana você terá me esquecido."
Eu não falei (mais nada)
depois disso, apenas deitei. [Techo censurado] ficou ali durante mais alguns
minutos, repetindo, "Eu não vou embora enquanto você não me garantir que
está tudo bem."
Eu sempre agi como se não
soubesse onde estava. Os guardas diziam que eu estava "no meio do
nada". Eles ficavam tentando descobrir se eu sabia de algo, e eu sempre
respondia, "só sei que estou sendo detido pelo DoD (Ministério de Defesa
dos EUA), o lugar não importa."
(Até que) [Techo censurado]
veio falar comigo. "Tenho de informar a você, contra a vontade de muitos
membros da nossa equipe, que você está em Guantánamo. Você tem sido honesto, e
nós devemos o mesmo a você." Agi como se (a informação) fosse novidade.
Fiquei feliz, porque terem me contado significava muito para mim.
Em 2005, a situação de Slahi
tinha mudado completamente. Desde então, ele tem recebido privilégios, e vive
com outro preso num anexo, onde eles têm permissão para plantar, escrever e
pintar.
Os guardas queriam ser
batizados com os nomes de Star Wars.
"A partir de agora nós
somos os [Techo censurado], e você vai nos chamar assim. O seu nome é
Travesseiro", disse [Techo censurado]. Mais tarde, eu aprendi que [Techo
censurado] são os caras do bem, que lutam contra as forças do mal. Eu representava
as forças do mal, e os guardas, a força do bem.
[Techo censurado] tinha 40 e
poucos anos, era casado e com filhos, baixo, mas forte. Ele passou um tempo
trabalhando em [Techo censurado], e então acabou fazendo uma missão especial
para [Techo censurado].
"O seu trabalho
terminou. Eu estou quebrado", eu disse.
Embora [Techo censurado]
seja um cara duro, ele é humano. [Techo censurado] entende o que muitos guardas
não entendem. Se você fala e diz aos interrogadores o que eles querem ouvir,
você tem de receber alívio.
"Meu trabalho é fazer
você ver a luz", disse [Techo censurado] enquanto eu comia minha refeição.
[Techo censurado] sempre gritava e me assustava, mas nunca me bateu. Acho que o
sonho da vida dele é se tornar um interrogador. Que sonho dos infernos.
"Você é meu
inimigo", ele disse."Sim, senhor."
"Então vamos falar de
inimigo para inimigo."
Durante nossas conversas,
ele sorrateiramente tentava me fazer assumir coisas que eu não pratiquei.
"Qual foi seu papel no 11 de Setembro?"
"Eu não participei do
11 de Setembro."
"Mentira!", ele
gritou. Eu percebi que não seria uma boa parecer inocente, pelo menos não por
enquanto.
Então eu disse, "Eu
estava trabalhando para AQ (o grupo terrorista Al Qaeda), em
telecomunicações."
Ele pareceu mais feliz com a
mentira. "Qual era o seu cargo?".
"Eu era tenente."
Eu odiava e gostava quando
era o turno dele. Eu odiava o interrogatório, mas gostava porque ele me dava
mais comida e uniformes novos. Ele começou a me ensinar lições, e me fez
treiná-las. As lições eram provérbios e frases que eu deveria memorizar e praticar
na minha vida. Eu ainda me lembro de algumas lições. "1) Pense antes de
agir. 2) Não confunda generosidade com fraqueza" etc.
Meu relacionamento com
[Techo censurado] melhorava a cada dia, e consequentemente com o resto dos
guardas, porque eles o respeitavam muito.
"F...-se! Quando eu
olho para o Travesseiro, eu não vejo um terrorista, eu vejo um velho amigo meu,
gosto de jogar com ele", disse aos outros guardas.
Relaxei um pouco e ganhei
autoconfiança. Os guardas descobriram em mim um cara bem-humorado. Começaram a
me dar seus PCs e DVDs para que eu consertasse; em troca, eu podia ver um
filme.
Nós começamos a nos tornar
um grupo, fofocar sobre os interrogadores e criar apelidos para eles. Nessa
época, [Techo censurado] me ensinou a jogar xadrez. Antes da prisão, eu não
sabia nem a diferença entre um peão e um cavalo.
[Techo censurado] me trouxe
um tabuleiro de xadrez, para que eu pudesse jogar sozinho. Quando os guardas
viram o tabuleiro, quiseram jogar comigo. No começo, eles sempre ganhavam. O mais
forte era [Techo censurado].
"Não foi assim que
ensinei você a jogar", [Techo censurado] comentou irritadamente quando eu
venci um jogo.
"O que eu deveria
fazer?"
"Você tem de criar uma
estratégia, e organizar seu ataque! É por isso que os p..... dos árabes nunca
têm sucesso."
"Por que você não joga
e pronto?", perguntei.
"Xadrez não é só um
jogo", ele disse.
"Imagine que você está
jogando contra um computador!"
"Eu pareço um
computador para você?"
"Não."
No jogo seguinte, eu tentei
fazer uma estratégia para deixar [Techo censurado] ganhar.
"Agora você entendeu
como se joga xadrez", ele comentou. Eu sabia que [Techo censurado] não
gostava de perder, então não gostava de jogar com ele, não me sentia confortável.
[Techo censurado] acredita que existem dois tipos de pessoa, os americanos
brancos e o resto do mundo. Americanos brancos são inteligentes e melhores do
que todo mundo. [Techo censurado] odeia o resto do mundo, especialmente árabes,
judeus, franceses e cubanos. O único outro país que ele mencionou positivamente
foi a Inglaterra.
Depois de um jogo de xadrez,
ele virou o tabuleiro."Minha esposa me chama de c....", disse,
orgulhoso.
É engraçado como as pessoas
ocidentais têm uma visão falsa dos árabes: selvagens, violentos, insensíveis e
frios. Eu posso dizer com confiança que os árabes são pacíficos, sensíveis,
civilizados e muito amorosos, entre outras qualidades. Eu disse a [Techo
censurado], "vocês dizem que nós somos violentos, mas se vocês ouvirem
música árabe, ou poesia árabe, é tudo sobre amor." Durante meu tempo com
[Techo censurado], escrevi muitos poemas. [Techo censurado] tem todos.
Um dos meus poemas diz:
A página seguinte do livro
foi censurada pelas autoridades militares dos EUA.
Mohamedou Ould Slahi
continua preso na base militar de Guantánamo. Em 2010, recebeu um habeas corpus
na Justiça americana, que ordenou a soltura dele. O governo recorreu, e Slahi
continuou preso. A Justiça deverá analisar novamente o caso até o final do ano.
Até a conclusão desta edição, quase 80% dos presos de Guantánamo permaneciam em
greve de fome - alguns deles pelo quarto mês consecutivo. Os detentos em estado
de saúde mais grave são amarrados e alimentados à força, por meio de uma sonda
nasogástrica.
por Mohamedou Ould Slahi
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