sexta-feira, 29 de janeiro de 2021

A Contribuição da disciplina de História para a formação do cidadão - Parte IV.

Autor: Jairo Trindade Batista, formado em licenciatura plena em História e pós-graduando em Metodologia do Ensino em História.

E-mail: jairo.coramdeo@gmail.com

O CIDADÃO NA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL IMPÉRIO

Em 1822, o Brasil tornou-se independente, e continua em regime monárquico, que transformou a nação em império, permaneceu como imperador, aquele que herdou o trono como príncipe da antiga metrópole; devido a esta nova característica do Estado, que tinha um regime monárquico que legitimava a escravidão. No entanto, uma das grandes mudanças, refere-se à descrição do cidadão brasileiro mencionado no 2º título da constituição nacional que diz:
 

Art. 6. São cidadãos brazileiros os que no Brazil tiverem nascido, quer sejam ingenuos, ou libertos, ainda que o pai seja estrangeiro, uma vez que este não resida por serviço de sua nação. Os filhos de pai Brazileiro, e os illegitimos de mãi Brazileira, nascidos em paiz estrangeiro, que vierem estabelecer domicilio no Imperio. Art. 7. diz: Perde os direitos de cidadão Brazileiro. O que se naturalisar em país estrangeiro, o que sem licença do  imperador aceitar emprego, pensão, ou condecoração de qualquer governo estrangeiro, o que for banido por sentença. Art. 8. Suspende-se o exercício dos direitos políticos por incapacidade physica, ou moral, por sentença condenatória a prisão, ou degredo, emquanto durarem seus effeitos. (Pedro I, Carta de lei, 1824).


A constituição de 1824 definia como cidadão aqueles judicialmente que gozariam de direitos civis e políticos, assegurando a inviolabilidade de seus direitos, a carta legislativa assegurava a liberdade de expressão, a liberdade religiosa, o direito à propriedade, a instrução básica gratuita. O poder judicial tornou-se independente, o foro privilegiado teve fim, o acesso ao emprego público era conquistado por mérito e não por herança. Em relação aqueles considerados cidadãos, a carta constitucional incluía ingênuos e libertos nascidos no Brasil, filhos de pai de brasileiro, os ilegítimos de mãe brasileira nascido no exterior que fixassem domicílio no império e os filhos de pai brasileiro em serviço em país estrangeiro, os que nasciam em Portugal e suas possessões que residissem no país por ocasião da independência (BRASIL. Constituição (1824), art. 6º).

Observa-se que de acordo com a constituição (BRASIL, 1824, art:6º) a ênfase da constituição tinha como centro do ser cidadão, o pertencimento à terra, o sentimento de pátria, e não a educação como percebido no conceito romano, e, nas compreensões de Marshall, em que que a educação era o centro do foco para construir um cidadão nos moldes do passado. Verifica-se que no texto constitucional, há possibilidade da perda da cidadania dependendo do que se considerava infração.

CIDADANIA NA CONSTITUIÇÃO ATUAL, ALGUNS DIREITOS

Nota-se uma diferença entre a constituição de 1824 para a de 1988, a primeira entendia o cidadão como aquele que pertencia a sua pátria, o valor do espaço geográfico tinha mais importância, enquanto que a de 1988, no Art 1º, já coloca a cidadania como um dos pilares, porém, não define o que é ser cidadão, e já parte para alguns direitos, segue abaixo a constituição atual: 

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: a soberania; a cidadania; a dignidade da pessoa humana; os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; o pluralismo político. (BRASIL, Constituição Federal, 1988).


A constituição atual, determina que o cidadão tem seus direitos individuais e coletivos, segue o declara:

 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta constituição; ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei; ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante; é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato. (BRASIL. Constituição Federal, 1988).


A carta constitucional BRASIL, Constituição Federal (1988), “determinou a igualdade perante a lei, deixa explícito que o direito à vida é inviolável, garante direito à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”, percebe-se as garantias aos direitos. No entanto, a maioria das pessoas não conhece os seus direitos individuais e coletivos, desconhece os seus deveres de cidadão garantidos por lei, além disso, há uma ignorância que permeia a sociedade no que se refere a seus deveres e o pleno exercício da cidadania, não sabem que tem garantia individual pela lei brasileira de pensar e ter convicções do que quiser.

Em relação às convicções, sejam políticas, filosóficas ou religiosas, a Constituição Federal (1988) no seu Art.5º.VIII, diz “ ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei, prestação alternativa.

De acordo com a Constituição Federal (1988) em seu artigo 205 declara “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”. Observa-se a prática do ser cidadão que depende da educação ministrada pela família e pelo Estado.

O DESCONHECIMENTO DOS DIREITOS E DEVERES DOS CIDADÃOS

De acordo com o gráfico conceitual de origem, a cidadania tem seus primeiros sinais na Grécia, e abrange nacionalidade, consciência dos direitos públicos, civis, políticos e sociais e dos deveres; o cidadão é aquele que goza desses direitos, uma vez que este tem o conhecimento. A questão que surge é: será que todos os habitantes de uma nação, estado e cidade têm consciência do que é ser cidadão? Será que o povo que dá características culturais a um país sabe qual é seu direito e dever de cidadão? Sabe o conceito?

O Data Senado realizou uma pesquisa nos dias 18 e 30 de setembro de 2013, ouviu oitocentas e onze pessoas, todas maiores de dezesseis anos, e constatou que 7,8% alegaram não ter nenhum conhecimento da constituição, uma outra parcela dos entrevistados que são 35,1% declararam ter um raso conhecimento dela. Como cidadãos irão reivindicar seus direitos, sem o conhecimento dos seus direitos? Como poderão criticar decisões políticas, civis, sociais e educacionais, sem ao menos uma noção dos seus direitos constitucionais? (TRINDADE, 2013).

Como observado no gráfico acima, cidadania objetiva à coletividade, envolve as dimensões do direito, da educação, do saber, da economia, do saber e da existência; o ser cidadão se relaciona também com o “eu”, a sociedade e a vivência na vida social. Observando estas esferas que envolvem a cidadania, faz-se necessário uma abordagem clara sobre o tema proposto, no entanto, o presente trabalho se limitará a pontos específicos relacionados à educação, à legislação sobre o assunto, à disciplina de história para formar o indivíduo como cidadão.

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A Contribuição da disciplina de História para a formação do cidadão - Parte III.

Autor: Jairo Trindade Batista, formado em licenciatura plena em História e pós-graduando em Metodologia do Ensino em História.

E-mail: jairo.coramdeo@gmail.com

DIFERENÇAS ENTRE O CONCEITO DE CIDADANIA GREGA E ROMANA

A compreensão do conceito de cidadania romana diverge do entendimento grego. São por essas diferentes concepções de cidadão que na contemporaneidade, encontram-se dificuldades para definir de modo pleno, o conceito. A expressão latina “Civis romanus sum” significa “sou um cidadão romano”, era comum em Roma e estava relacionada ao pertencimento a um grupo que tinha privilégios políticos, econômicos, militares e jurídico. Na questão jurídica, era assegurado a este um “julgamento justo” em caso de acusações. (BANDEIRA, 2010).

Observa-se a diferença no raciocínio grego e romano que está na crença do primeiro de que a cidade e seu desenvolvimento possibilitavam crescimento e autonomia dos indivíduos, e assim, formavam o conjunto de cidadãos. Os romanos por sua vez, tinham uma percepção diferente, para estes, fazia-se necessário primeiro o crescimento individual com ênfase na moral dos cidadãos em busca da plena liberdade, e estes cidadãos, juntos, seriam responsáveis pela organização das cidades, e de maneira direta, do Estado. (BANDEIRAS, 2010).

Na Grécia, cidadania se conquistava. Em Roma, podia ser adquirida por concessão. Na Grécia, ou era ou não era cidadão pleno. Em Roma, havia diversos níveis de cidadania, dependia muito dos interesses políticos e militares, havia cidadania plena e limitada. Tinha-se a educação como pilar de relevância na sociedade, Cícero foi o pai da pedagogia romana, refletida sobre o saber. Vale ressaltar que historicamente os romanos herdaram a cultura grega, por isso valorizaram o autodesenvolvimento do indivíduo que resulta na conquista de seu lugar na sociedade. (BANDEIRAS, 2010).

CONCEITO DE CIDADANIA EM MARSHALL

Para Marshall (1967), o direito civil é o primeiro direito conquistado pela sociedade moderna, e isto, no século XVIII. Este direito está ligado ao homem se reconhecer como sujeito, que está relacionado com a liberdade individual, ou seja, não ser submisso ao pensamento da elite, ou preso filosoficamente a um grupo dominante. Dentre as conquistas, pode-se mencionar a “liberdade de ir e vir, liberdade de imprensa, pensamento e fé, direito à propriedade, concluir contratos válidos e direito à justiça.

De acordo com o sociólogo inglês, cidadania seria uma posição de igualdade de todos os seus membros, em contrapartida, a sociedade de classes consistia na aceitação das desigualdades como organização social. No entanto, a desigualdade sistematizada em classes sociais pode ser admissível, desde que haja reconhecida igualdade de cidadania. O direito civil mais básico é o direito ao trabalho, ou seja, seguir uma profissão de livre escolha, desde que tenha preparação técnica prévia. (MARSHALL, 1967).

Segundo Marshall (1967), “a educação está diretamente relacionada com a cidadania, e quando o Estado garante que todas as crianças serão educadas, este tem em mente, sem sombra de dúvida, as exigências e a natureza da cidadania”. Assim como os romanos, Marshall também acreditava que a educação estava no centro da construção do cidadão e do pleno exercício da cidadania. (MARSHALL, 1967). Também foca a educação ainda na infância, para que sendo adulto, possa desfrutar dos seus direitos individuais, por isso argumenta que:

A educação das crianças está diretamente relacionada com cidadania, e quando o Estado garante que todas as crianças serão educadas, este tem em mente, sem sombra de dúvida, as exigências e a natureza da cidadania. Está tentando estimular o desenvolvimento do cidadão em formação. O direito do cidadão, é um direito social de cidadania genuíno porque o objetivo da educação durante a infância é moldar o adulto em perspectiva. Basicamente, deveria ser considerado não um direito de a criança frequentar a escola, mas como o direito do cidadão adulto ter sido educado. E, nesse ponto, não há nenhum conflito com direitos civis do modo pelo qual são interpretados numa época de individualismos. Pois os direitos civis se destinam a ser utilizados por pessoas inteligentes e de bom senso que aprenderam a ler e escrever. A educação é um pré-requisito necessário da liberdade civil. (MARSHALL, 1967, pg.73).


Uma vez que a criança tenha sido educada e obtido os direitos civis devido ao processo educacional, todos passam a ter acesso a direitos sociais, que incluem bens e serviços, como por exemplo, o acesso à saúde, moradia, educação e renda mínima para gastos com bens e serviços essenciais, porém, essas mínimas conquistas, não podem ser entendidas como assistencialismo do Estado, mas sim, conquistas individuais. (MARSHALL, 1967).

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