Livro conta a história de expedição nazista à região. Na imagem uma cruz de 3 m, decorada com uma suástica, é colocada na cachoeira de Santo Antônio em homenagem a Joseph Greiner, membro da equipe que faleceu de malária durante a expedição. Imagem: Einestages Spiegel.
Os oficiais de
Hitler estiveram aqui, gostaram do que viram e fizeram um plano audacioso e
assustador: enviar uma missão secreta à Amazônia para atacar os países vizinhos
e começar a ocupação da à América do Sul.
Os gringos
querem tomar a Amazônia. Você já deve ter ouvido essa teoria conspiratória, que
volta e meia aparece em conversas de bar. O que você provavelmente não sabe é
que esse risco já existiu de verdade. Uma superpotência já esteve aqui mapeando
o terreno. E não foram os EUA - foi a Alemanha nazista. "A tomada das
Guianas é uma questão de primeira importância por razões político-estratégicas
e coloniais." Essa frase faz parte de um relatório de 1940 preparado pelo
biólogo e geógrafo Otto Schulz-Kamphenkel para a SS - a força de elite do
Terceiro Reich. O objetivo da chamada Operação Guiana era colonizar as guianas
Francesa, Inglesa e Holandesa. A invasão seria feita pelo norte do Brasil, pois
os nazistas já haviam passado por aqui - e gostado do que viram. De 1935 a
1937, Schulz-Kamphenkel liderara uma expedição que começou em Belém do
Pará e percorreu as margens do rio Jari, no atual estado do Amapá, até chegar à
fronteira da Guiana Francesa.
Os metais preciosos da região e a forte influência dos ingleses na América do
Sul foram os principais incentivadores da Operação Guiana. Em carta endereçada
a Hitler, no dia 3 de abril de 1940, o oficial da SS Heinrich Peskoller diz que
as reservas de ouro e diamantes locais seriam suficientes para sanar a situação
financeira da Alemanha em poucos anos. "Na Guiana Britânica, a extração de
ouro e diamante é mantida em baixa para não atrapalhar o mercado sul-africano
(dominado também por ingleses). Nas mãos do Führer, cada metro quadrado de solo
poderia ser em pouco tempo explorado pela grande Alemanha", escreveu o
oficial.
Peskoller não queria apenas criar uma colônia para alimentar a economia do
Terceiro Reich. A região teria importância na construção do Espaço Vital da
raça ariana - pois os nazistas acreditavam que seria possível transformar a
região em um lugar bom de viver. "O empenho e a técnica alemã poderiam
domar as inúmeras cachoeiras na forma de usinas hidrelétricas colossais.
Podendo fazer uma rede elétrica em todo o país com bondes, navegação fluvial,
produção de madeiras nobres, pontes, aeroportos, escolas e hospitais. A
comparação entre o antes e o depois da tomada dos alemães contaria pontos para
o Führer", argumentava Peskoller.
A conquista das Guianas também traria outro grande benefício para os alemães:
atrapalhar a Inglaterra. Os ingleses compravam muitas matérias-primas das
Américas, e boa parte dos cereais consumidos no território inglês vinha da
Argentina. Depois de montar a base na América do Sul e tomar as Guianas, o
próximo passo dos nazistas seria mandar submarinos para a região - para que os
navios que se dirigiam à Inglaterra fossem abatidos.
Em 1940, o projeto foi encaminhado a Heinrich Himmler, líder da SS e um dos
principais nomes do governo nazista. "O plano parece romântico, mas é
factível", defendeu Schulz-Kamphenkel. A operação, de acordo com o
pesquisador, deveria ser feita em sigilo. Os alemães atacariam em duas frentes.
Uma tropa de 150 soldados navegaria o rio Jari, no Amapá, para chegar a Caiena,
capital da Guiana Francesa. Ao mesmo tempo, pequenas embarcações e 2 submarinos
atacariam pela costa da Guiana.
A América do Sul e a Sibéria deslumbravam Schulz-Kamphenkel pelas riquezas
naturais. Esses territórios eram considerados áreas ideais para a expansão do
Terceiro Reich. Mas a invasão militar na Sibéria estava temporariamente
descartada. Os Russos dominavam a região. E, até 22 de junho de 1941, estava em
vigor um pacto de não-agressão germano-soviético. Sobrava a América do Sul.
Na avaliação dos nazistas, os países vizinhos não impediriam a invasão. O
Brasil dera apoio irrestrito à primeira viagem de Schulz-Kamphenkel pela Amazônia,
em 1935 (quando o pretexto dele era estudar a flora e a fauna locais), e não
sabia dos planos de ataque. Uma possível represália dos EUA também era
considerada improvável. Em 1940, eles ainda não estavam em guerra contra a
Alemanha. Pela lógica da SS, a troca de poder nas colônias seria uma mera
substituição de nações europeias na região - e não afetaria a influência dos
americanos por aqui.
O plano também incluía previsões assustadoras para o período do pós-guerra.
Após a conquista da Europa, o novo alvo seria o Japão. "Se conseguirmos
assegurar (o território das Guianas), teremos uma posição estratégica para
enfrentar o Japão", diz o relatório. Era uma questão de defesa. "Há o
risco terrível de domínio amarelo no mundo. A raça branca está ameaçada pela
raça amarela."
Antes de a guerra estourar, o jovem Otto Schulz-Kamphenkel já desfrutava de
prestígio entre os homens fortes de Hitler. Sua primeira grande expedição foi
na África, na atual região da Libéria, onde ele caçou animais - que vendeu para
o zoológico de Berlim. Seu grande desejo era conhecer a floresta amazônica. A
expedição ao Jari, em 1935, colocou o pesquisador no patamar dos mais
prestigiados cientistas alemães da época. O Museu de História Natural de Berlim
ainda expõe animais empalhados trazidos por Schulz-Kamphenkel, que também gravou
um filme de 90 minutos, tirou 250 fotos e escreveu o livro O Enigma do Inferno
Verde, que vendeu 100 mil exemplares na época. "A descrição da paisagem é
muito precisa. Ainda hoje é possível se guiar na região com as referências
dadas no livro", diz Cristoph Jaster, chefe do Parque Nacional
Tumucumaque, no estado do Amapá.