Lanceiro Negro. Imagem: Jornal Negritude.
Lanceiros
Negros é o nome dado a dois corpos de lanceiros constituídos, basicamente, de
negros livres ou de libertos pela República Rio-Grandense que lutaram na
Revolução Farroupilha. Possuíam 8 companhias de 51 homens cada, totalizando 426
lanceiros .
Tornou-se
célebre o 1.º Corpo de Lanceiros Negros organizado e instruído, inicialmente,
pelo Coronel Joaquim Pedro, antigo capitão do Exército Imperial, que
participara da Guerra Peninsular e se destacara nas guerras platinas. Ajudou,
nesta tarefa, o Major Joaquim Teixeira Nunes, veterano e com ação destacada na
Guerra Cisplatina. Este bravo, à frente deste Corpo de Lanceiros Negros,
libertos, prestaria relevantes serviços militares à República Rio-Grandense.
O 1.º
Corpo de Lanceiros Negros, ao comando do tenente-coronel Joaquim Pedro Soares e
subcomandado pelo então major Teixeira Nunes, teve atuação importante na
Batalha do Seival, em 11 de setembro de 1836, em reforço à Brigada Liberal de
Antônio de Sousa Netto que surgiu por transformação do Corpo da Guarda Nacional
de Piratini integrado por 2 esquadrões com 4 companhias, recrutados em Piratini
e em seus distritos Canguçu, Cerrito e Bagé até o Pirai .
"
As tropas para o combate de Seival foram dispostas por Joaquim Pedro, na
qualidade de imediato e assessor militar de Antônio Netto. Deixou um esquadrão
em reserva que foi empregado em momento oportuno, decidindo a sorte da
luta."
Segundo
Docca, coube a este bravo e a Manuel Lucas de Oliveira convencerem Antônio Neto
da proclamação da República Rio-Grandense, bem como "a grande satisfação
de ler, a 11, no campo do Menezes, à frente da garbosa tropa por ele instruída,
a Proclamação da República Rio-Grandense."
O
Corpo de Lanceiros Negros era integrado por negros livres ou libertados pela
Revolução e, após, pela República, com a condição de lutarem como soldados pela
causa..
O 1.º
Corpo foi recrutado, principalmente, entre os negros campeiros, domadores e
tropeiros das charqueadas de Pelotas e do então município de Piratini (atuais
Canguçu, Piratini, Pedro Osório, Pinheiro Machado, Herval, Bagé, até o Pirai e
parte de Arroio Grande).
Excelentes
combatentes de Cavalaria, entregavam-se ao combate com grande denodo, por
saberem, como verdadeiros filhos da liberdade, que esta, para si, seus irmãos
de cor e libertadores, estaria em jogo em cada combate. Manejam como grande
habilidade suas armas prediletas - as lanças. Estas, por eles usadas mais
longas do que o comum. Combinada esta característica, com instrução para o
combate e disposição para a luta, foram usados como tropas de choque, uso hoje
reservado às formações de blindados. Por tudo isto infundiram grande terror aos
adversários. Eram armados também com adaga ou facão e, em certos casos, algumas
armas de fogo em determinadas ocasiões.
Como
lanceiros não utilizavam escudos de proteção, mas sim seus grosseiros ponchos
de lã - bicharás, que serviram-lhes de cama, cobertor e proteção do frio e da
chuva. Quando em combate a cavalo, enrolado no braço esquerdo, o poncho
(bichará) servia-lhes para amortecer ou desviar um golpe de lança ou espada. No
corpo a corpo desmontado, servia para aparar ou desviar um golpe de adaga ou
espada em cuja esgrima eram habilíssimos, em decorrência da prática continuada
do jogo do talho, nome dado pelo gaúcho à esgrima simulada com faca, adaga ou
facão.
Alguns
poucos eram hábeis no uso das boleadeiras como arma de guerra, principalmente
para abater o inimigo longe do alcance de sua lança, quer em fuga, quer
manobrando para obter melhor posição tática.
Eram
rústicos e disciplinados. Faziam a guerra à base de recursos locais, Comiam se
houvesse alimento e dormiam em qualquer local, tendo como teto o firmamento do
Rio Grande do Sul e de Santa Catarina. A maioria montava a cavalo quase que em
pêlo, a moda charrua. Vale também lembrar que os LANCEIROS NEGROS exerciam uma
função de tropa de choque no exército farroupilha, pelo simples fato de manejar
com eximia destreza a lança que é uma arma essencial para este tipo de combate.
A
Surpresa dos Porongos, ocorreu na localidade de Porongos, hoje parte do
município de Pinheiro Machado. Em 14 de novembro de 1844, os Lanceiros Negros
de Teixeira Nunes salvaram o desfecho da Revolução Farroupilha de um desastre
total. Pelo modo como combateram, salvaram Canabarro e grande parte das tropas
e tornaram possível a negociação de uma paz honrosa como e foi a de paz de
Ponche Verde, e a liberdade para todos os negros e mulatos que lutaram pela
República Rio Grandense. Ao final do combate o campo de batalha dos Porongos
ficou juncado com 100 mortos farroupilhas.
Segundo
descrição do historiador Canabarro Reichardt: Dentre eles 80 eram bravos
Lanceiros negros de Teixeira Nunes. Com a surpresa em Porongos, os farrapos,
passados os primeiros momentos de estupor, recobram ânimo e se dispõem a morrer
lutando. Teixeira, o Bravo dos bravos, cujo denodo assombrou um dia o próprio
Garibaldi, reuniu os seus lanceiros negros. O 4º Regimento de Linha farrapo e
alguns esquadrões
desanimam quando os imperiais se multiplicam ,e surgem de
todos os pontos. Uma segunda carga imperial e mais impetuosa é também repelida.
E este foi o sinal da debandada farrapa geral. Em vão os chefes chamam os
soldados ao dever, dando-lhes o exemplo. Nada os contêm e o Exército Farrapo
como por encanto, se dissolve, arrastando consigo ainda os que querem lutar.
Apenas alguns grupos mantêm-se resistindo e neles o combate se trava à arma
branca. Tombam os lanceiros negros de Teixeira, brigando um contra vinte, num
esforço incomparável de heroísmo.
Em 28
de novembro de 1844, Teixeira Nunes e remanescentes de seu legendário Corpo de
Lanceiros Negros travaram o último combate da Revolução em terras do Rio Grande
do Sul, consta que em terras do atual município de Arroio Grande, berço do
Visconde de Mauá.
A
morte de Teixeira Nunes foi assim comunicada pelo então barão de Caxias, em
ofício: Posso assegurar a V. Exa. que o Coronel Teixeira Nunes foi batido no
campo de combate, deixando o campo, por espaço de duas léguas, juncando de
cadáveres. Eram seguramente cadáveres de Lanceiros negros.
Teixeira
Nunes foi um dos maiores lanceiros de seu tempo, e como uma ironia do destino
teria caido mortalmente ferido por uma lança manejada pelo braço vigoroso do
Alferes Manduca Rodrigues.
"O
único ponto controverso da paz firmada entre Caxias e farroupilhas, a liberdade
dos escravos que lutaram com os rebeldes, foi resolvido de forma pragmática e
cruel: o batalhão dos chamaos Lanceiros Negros, desarmado por seu comandante,
Davi Canabarro, foi massacrado em novembro de 1844, em Porongos." (Eduardo
Bueno, História do Brasil, 1997.)
Dos
Lanceiros Negros restaram mais de 120, que após a paz de Ponche Verde foram
mandados incorporar pelo Barão de Caxias aos três Regimentos de Cavalaria de
Linha do Exército na Província.
O
Império manteve suas liberdades na cláusula IV da Paz de Ponche Verde. São
livres e como tais reconhecidos todos os cativos que serviram à República.
Cláusula
respeitada por conta e risco pelo Barão de Caxias contrariando determinação
superior de os recolher como escravos estatais para a Fazenda de Santa Cruz no
Rio de Janeiro .
Caxias
usou o seguinte expediente para não os enviar para o Rio. Considerou que eles
haviam se apresentado livremente. E a seguir os libertou e os incorporou as
três unidades de Cavalaria Ligeira do Exército Imperial no Rio Grande .E em
Ponche Verde em D. Pedrito foram acolhidos pelos coronéis Manuel Marques de
Sousa e Manuel Luís Osório comandantes de duas unidades de Cavalaria.
Dentre
em breve iriam lutar na Guerra contra Oribe e Rosas, pela Integridade e Soberania
brasileiras no Sul, ameaçadas por caudilhos platinos.
Foi
também lembrando Teixeira Nunes e seus bravos lanceiros negros, que o
acompanharam na expedição a Laguna, que Giuseppe Garibaldi escreveu: Eu vi
batalhas disputadas mas nunca e em nenhuma parte homens mais valentes nem
lanceiros mais brilhantes do que os da cavalaria rio-grandense, em cujas
fileiras comecei a desprezar o perigo e a combater pela causa sagrada dos
povos.
No
Museu de Bolonha, Itália, existe um quadro do Lanceiro Negro Farroupilha,
representa um dos célebres lanceiros negros farroupilhas que acompanharam
Giuseppe Garibaldi e Luigi Rossetti no retorno de Santa Catarina, após o
malogro da República Juliana.
Você
quer saber mais?
SOUSA DOCCA, Emílio Fernandes de, História do Rio Grande do
Sul. Rio de Janeiro: Org.Simões, 1954.
BENTO, Cláudio Moreira.O Exercito Farrapo e os seus chefes.
Rio de Janeiro: Bibliex,1992.
BENTO, Cláudio Moreira.O Negro na Sociedade do Rio Grande do
Sul. Porto Alegre: IEL,1975.
SPALDING, Walter Farrapos. Porto Alegre: Sulina, 1960.
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