RESUMO  (Para meditação)
 
 No cenário do tempo de paz, o homem público detém o papel principal.  (...). De repente, a guerra retira um outro dos bastidores, impele-o ao  primeiro plano, projeta sobre ele o facho das luzes: surge o chefe  militar. Tem início uma peça na qual o político e o militar irão  representar juntos. (...).
 
 O político se esforça para dominar a opinião do monarca, do Conselho do  povo, pois é de lá que ele extrai a ação. (...). Inconstante  companheira, a opinião o segue com um passo caprichoso, (...).Toda sua  vida, toda sua obra têm um caráter instável, agitado, tumultuoso que o  opõe à do soldado.
 
 Este tem por profissão o emprego das armas, (...). A partir do dia em  que as empunha, o soldado é submetido a uma disciplina que não mais o  deixa. (...).
 
 A esse preço, porém, ela lhe abre o império da força. Por isso, se  muitas vezes sofreu sob a disciplina, ele a mantém, melhor ainda: a ama e  se glorifica daquilo que ela lhe custa, dizendo: “É minha honra!”(...).
 
 O político e o soldado trazem ao empreendimento comum características, procedimentos e cuidados muito diferentes. (...).
 
 Dessa desigualdade resulta alguma incompreensão. (...).
 (...), o gosto pelo sistema, a segurança, a rigidez, pelos quais o  espírito da profissão e as suas longas coações imprimiram no soldado  como que uma segunda natureza, ao político parecem incômodos e sem  atrativos. (...).
 
 Essa falta de simpatia recíproca entre o político e o militar não é, em essência, deplorável (...).
 
 Contudo é necessário que se possam entender. Políticos e soldados têm de colaborar, mesmo que não queiram. (...).
 
 Durante os longos períodos em que a pátria não está diretamente  ameaçada, a opinião pública opõe-se aos encargos militares. (...).  Tem-se muitas vezes por desperdício tanto dinheiro consagrado às forças  que não combatem. (...).
 
 Cedo ou tarde, porém, prevista ou não, desencadeada de propósito ou  suportada com horror, eis a guerra. No primeiro brilhar das espadas a  ordem dos valores se subverte. Saindo da penumbra o chefe militar é  investido imediatamente de uma autoridade estarrecedora. Em um piscar de  olhos, seus direitos como deveres atingem limites extremos. (...). O  futuro da pátria depende imediatamente daquilo que ele decide. (...).
 
 (...), transformados pela abnegação e preocupados com o exemplo a dar, o governante e o soldado se entendem, (...).
 
 Mas eis que a guerra desencadeia o seu cortejo de lutos e decepções. As  paixões das massas se elevam ao paroxismo. Essa onda terrível, (...),  não é entendida pelos homens de Estado sem vacilação. O sangue e as  riquezas do povo que eles levam aos campos de batalha e pelos quais,  afinal de contas, respondem, outros chefes tem de utilizá-los, e o  governante deve responsabilizar-se pelo destino dos cidadãos, assim como  pelo país e pelo seu próprio, e até mesmo pelo dos homens distantes,  cuja arte ciumenta não admite intrusos. Essa angústia, (...), constitui  em tais momentos a pior prova do poder.(...).
 
 Se a vitória não se faz esperar o mal-estar é rapidamente apagado.  (...). Porém, se o perigo cresce, o azedume se espalha, exaspera-se, na  proporção do tumulto público.(...).
 
 Transtornados pela crise, o político e o soldado, de repente, acham  insuportável essa dependência recíproca na qual se vêem acorrentados.  (...). Eis rompido o equilíbrio, desdenhada a ordem, esmagados os  ímpetos. A ação, daí em diante, torna-se incoerente. O desastre acorre.
 
 (...). Certamente, a condução da guerra pertence ao homem de Estado; as  operações, ao militar. Mas onde cada um deve parar? Em que medida a  estratégia e a política reagirão uma sobre a outra? (...). Basta  considerar como o jogo foi conduzido em muitas ocasiões sancionadas pela  vitória, para se constatar como o talento dobra à necessidade e às  circunstâncias a doutrina e os procedimentos, e que não se acorrentam  por fórmulas as contingências da ação.
 
 (...), o caráter de crise brutal que reveste a guerra confere ao  comandante militar a maior parte dos atributos próprios do governo.
 
 Este porém [o político], fixadas as frentes, retoma o primeiro plano. É  o povo que ele deve utilizar. Aumentar efetivos, mobilizar a indústria,  administrar o moral dos cidadãos, ajustar-se com os aliados, tal é,  desde então, o maior assunto. (...). Do mesmo jeito, estreita-se a  dependência mútua da direção da guerra e das operações. A necessidade de  limitar as perdas de homens tutela a estratégia. (...). O estado moral  do Exército depende do estado moral do povo.
 
 (...), a conduta da guerra consiste acima de tudo em manter a vontade  nacional à altura do perigo. A mais justa glória consagra o homem de  Estado que a isso soube dedicar-se sem cuidar de mais nada.
 
 (...): nada se faz de grande sem grandes homens, e esses o são por o terem querido. (...).
 
 Que os políticos e os soldados queiram, pois, a despeito das obrigações  e preconceitos contraditórios, começar a se habituar do seu interior à  filosofia que convém, e se verão, quando preciso, belas harmonias.  (...): não há nas armas carreira ilustre que não tenha servido a uma  política importante, nem uma glória de homem de Estado que não tenha  dourado o brilho da defesa nacional.(O Fio da Espada – Charles de  Gaulle)
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