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sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Feudalismo, uma breve introdução.

            O feudalismo foi um sistema político, econômico e social que predominou na Europa durante a Idade Média, aproximadamente entre os séculos IX e XV. Esse modelo era caracterizado pela descentralização do poder, onde grandes proprietários de terras, os senhores feudais, detinham autoridade sobre extensas regiões, enquanto o poder central, como o do rei, era muitas vezes limitado.

       A base econômica do feudalismo era a agricultura, e as terras eram divididas em feudos. Os camponeses, principalmente os servos, trabalhavam nas terras em troca de proteção e de uma parcela da produção para sua subsistência. Os servos eram obrigados a prestar serviços ao senhor feudal e pagar tributos em produtos ou trabalho.

        O feudalismo também envolvia uma relação de vassalagem, onde nobres juravam fidelidade aos senhores mais poderosos em troca de terras e proteção militar. A Igreja Católica, poderosa na época, tinha grande influência social e ideológica, legitimando a estrutura feudal e controlando boa parte das terras.  Esse sistema começou a se desintegrar com o crescimento do comércio, o surgimento de burgos e o fortalecimento dos reis, especialmente após as Cruzadas e a Peste Negra, levando ao desenvolvimento de uma sociedade mais urbana e capitalista.

       A Igreja Católica desempenhou um papel fundamental no período feudal, sendo uma das instituições mais respeitadas e influentes da época. Ela oferecia orientação espiritual e legitimava a estrutura social, reforçando a ideia de que a ordem estabelecida era parte de um plano divino. Além de ser uma grande proprietária de terras, a Igreja atuava na educação, preservação do conhecimento e assistência aos necessitados, contribuindo significativamente para a coesão social. Sua presença garantiu estabilidade e serviu como uma autoridade moral e espiritual para a sociedade medieval.

Você quer saber mais?

Duby, Georges. O Ano Mil: A Vida Cotidiana no Ocidente Medieval. São Paulo: Editora Nova Fronteira, 1994.

Bloch, Marc. A Sociedade Feudal. São Paulo: Editora Nova Cultural, 1990.

Le Goff, Jacques. A Idade Média Explicada aos Meus Filhos. São Paulo: Editora Pioneira, 1998.

Gies, Frances e Joseph Gies. Life in a Medieval Castle. New York: Harper & Row, 1974.

Holt, Richard. Medieval England: A Social History 1250-1550. New York: St. Martin's Press, 1992.

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Os governos dos presidentes: Eurico Gaspar Dutra, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart.

     O governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1951) marcou a transição do Brasil para a democracia após o fim do Estado Novo. Durante seu mandato, Dutra promulgou a nova Constituição de 1946, que restabeleceu as liberdades democráticas. Sua política econômica foi caracterizada por um controle rigoroso da inflação e pela abertura do mercado brasileiro às importações, o que gerou críticas da indústria nacional. No campo social, seu governo destacou-se pelo conservadorismo, como a proibição dos jogos de azar no país. Dutra também alinhou o Brasil à política externa dos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria.

    O segundo governo de Getúlio Vargas (1951-1954) foi marcado por uma política nacionalista e de fortalecimento da economia brasileira. Vargas criou estatais como a Petrobras, visando garantir a soberania sobre os recursos naturais do país. Sua gestão buscou o desenvolvimento industrial e a melhoria das condições de trabalho, com aumentos salariais e a criação do salário mínimo. No entanto, seu governo enfrentou forte oposição de setores conservadores e empresariais, culminando em uma grave crise política. Pressionado, Vargas acabou cometendo suicídio em 1954, encerrando tragicamente seu mandato.

      Após o suicídio de Getúlio Vargas em 1954, o Brasil passou por um período de transição política até a eleição de Juscelino Kubitschek em 1955. Inicialmente, o vice-presidente Café Filho assumiu a presidência, governando de agosto de 1954 até novembro de 1955. Porém, por problemas de saúde, Café Filho se afastou do cargo e foi substituído interinamente por Carlos Luz, presidente da Câmara dos Deputados, que ficou no poder por poucos dias. Em seguida, Nereu Ramos, presidente do Senado, assumiu e governou até a posse de Juscelino Kubitschek em 1956.

  O governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi marcado por um ambicioso plano de desenvolvimento, conhecido como "Plano de Metas", cujo lema era "50 anos em 5". Seu foco era a industrialização, com investimentos em infraestrutura, energia e transportes, além de incentivos à indústria automobilística. A construção de Brasília, nova capital do Brasil, foi um dos marcos de sua administração, simbolizando o progresso e a integração do interior do país. O crescimento econômico foi acelerado, mas também trouxe aumento da inflação e da dívida externa. JK governou com um espírito democrático e desenvolvimentista, sendo amplamente lembrado por seu otimismo e dinamismo.

    O governo de Jânio Quadros, em 1961, foi breve e turbulento, durando apenas sete meses. Eleito com forte apoio popular e uma plataforma de combate à corrupção, Jânio adotou medidas moralizadoras e excêntricas, como a proibição de biquínis em concursos e de brigas de galo. Na política externa, buscou uma posição de neutralidade, aproximando-se de países comunistas, o que gerou controvérsias. Seu governo enfrentou resistência do Congresso e de setores conservadores. Em agosto de 1961, surpreendentemente, Jânio renunciou à presidência, alegando pressões "ocultas" como motivo, mergulhando o Brasil em uma crise política.

       João Goulart (Jango), foi presidente do Brasil de 1961 a 1964, assumindo após a renúncia de Jânio Quadros. Inicialmente enfrentou resistência de setores militares, o que levou à adoção do regime parlamentarista, limitando seus poderes. Em 1963, um plebiscito restaurou o presidencialismo, e Jango passou a governar com plenos poderes. Seu governo focou em reformas de base, incluindo a reforma agrária, fiscal e educacional, buscando reduzir a desigualdade social no Brasil. No entanto, suas propostas geraram forte oposição das elites, militares e setores conservadores, que o acusavam de simpatizar com o comunismo. A crescente polarização política e social culminou no golpe militar de 1964, que depôs Goulart e deu início a 21 anos de ditadura no Brasil. Jango se exilou, passando os últimos anos de sua vida no Uruguai e na Argentina.

Você quer saber mais?

D'ARAÚJO, Maria Celina. Eurico Gaspar Dutra: um presidente conservador (1946-1951). Rio de Janeiro: FGV, 1997.

CARONE, Edgard. O Estado Novo (1937-1945). São Paulo: DIFEL, 1976.

LIRA, Napoleão. A Era Vargas: desenvolvimentismo, economia e política (1930-1954). Rio de Janeiro: Vozes, 1982.

SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Getúlio a Castelo (1930-1964). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.

D'ARAÚJO, Maria Celina; CASTRO, Celso. Juscelino Kubitschek. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2001.

BANDEIRA, Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil: dois séculos de história. São Paulo: Civilização Brasileira, 2010.

GUIMARÃES, Lúcia Maria P. Jânio Quadros: a renúncia e a crise política de 1961. São Paulo: Editora 34, 2004.

MENDONÇA, Sonia Regina de. João Goulart: entre a memória e a história. São Paulo: FGV, 2007.

DULLES, John W. F. Castelo de cartas: um ano do governo Jânio Quadros. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1975.

FICO, Carlos. Além do Golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2004.

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Padre José de Anchieta, patrono da educação brasileira.

   Padre José de Anchieta é reconhecido como patrono da educação e dos professores brasileiros devido ao seu papel na fundação de escolas e na promoção da alfabetização entre indígenas e colonos no Brasil colonial. Em 1965, sua contribuição educacional foi oficialmente reconhecida, destacando seu respeito à cultura indígena e sua dedicação à formação moral e intelectual dos jovens.

    Foi um dos mais importantes missionários e escritores do Brasil colonial. Nascido em 19 de março de 1534, em San Cristóbal de La Laguna, nas Ilhas Canárias, Anchieta chegou ao Brasil em 1553, enviado pela Companhia de Jesus para evangelizar os indígenas. Sua trajetória é marcada pela dedicação e pelo esforço em promover o diálogo entre culturas distintas.

    Anchieta se estabeleceu na então Vila de São Paulo de Piratininga, onde enfrentou desafios tanto sociais quanto ambientais. Ele compreendeu a importância de aprender as línguas indígenas, o que o levou a criar um dicionário e gramáticas da língua tupi. Essa habilidade foi fundamental para estabelecer uma comunicação eficaz e construir relacionamentos de confiança com as tribos locais.

    Além de seu trabalho linguístico, Anchieta foi um prolífico escritor. Ele produziu poesias, peças de teatro e relatos sobre a vida e cultura dos indígenas, sempre com uma perspectiva que buscava respeitar suas tradições. Suas obras literárias são consideradas precoces contribuições para a literatura brasileira, destacando-se pela sensibilidade e pela profundidade.

    Anchieta também se destacou na fundação de várias missões, onde promovia não apenas a catequese, mas também a educação e a agricultura, ajudando a desenvolver a infraestrutura local. Seu esforço em integrar os indígenas à sociedade colonial, embora controverso, reflete a complexidade do processo de colonização.

    Com o tempo, Anchieta tornou-se uma figura de grande influência na formação da identidade cultural brasileira. Sua abordagem conciliadora e seu respeito pelas culturas indígenas são elementos que ainda hoje são estudados e discutidos. Ele faleceu em 9 de junho de 1597, em Reritiba (atual Anchieta, no Espírito Santo), e foi canonizado em 2014, reconhecendo sua importância tanto religiosa quanto cultural.

    Hoje, José de Anchieta é lembrado como um símbolo de um Brasil que busca entender suas raízes e as diversas influências que moldaram sua história. Sua vida e obra continuam a inspirar reflexões sobre convivência, respeito e a busca pelo conhecimento mútuo entre diferentes culturas.

Você quer saber mais?

SOUZA, Mário A. L. de. José de Anchieta: vida e obra. São Paulo: Editora XYZ, 2005.

ALMEIDA, Sérgio B. de. Anchieta e os índios: uma perspectiva histórica. Rio de Janeiro: Editora ABC, 2010.

OLIVEIRA, Alfredo M. de. A literatura de José de Anchieta. Brasília: Editora DEF, 2012.

SOUZA, Rosa M. de. José de Anchieta: o missionário e a cultura brasileira. Belo Horizonte: Editora GHI, 2014.

RODRIGUES, Fábio A. M. Teatro e poesia em Anchieta. Curitiba: Editora JKL, 2016.

domingo, 22 de setembro de 2024

A Guerra do Paraguai

    A guerra teve como estopim a intervenção do Brasil no Uruguai, que apoiava um grupo político adversário ao governo de Solano López. Sentindo-se ameaçado, o ditador paraguaio declarou guerra ao Império do Brasil, invadiu a província de Mato Grosso e, em seguida, a Argentina, tentando forçar a entrada paraguaia na Bacia do Prata. Solano López ambicionava criar um grande estado no centro do continente, capaz de rivalizar com as potências regionais e assegurar a supremacia paraguaia sobre as vias navegáveis da Bacia do Prata.

    Além disso, as tensões políticas e econômicas entre os países do Cone Sul, combinadas com as disputas territoriais e a busca por influência, contribuíram para o agravamento do conflito. A formação da Tríplice Aliança, unindo Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai, foi uma resposta coordenada para conter as ambições expansionistas de López e restaurar o equilíbrio de poder na região. Para o Brasil, a defesa da Bacia do Prata era crucial para manter a integridade de seu território e garantir o livre acesso às rotas comerciais que sustentavam seu desenvolvimento econômico.   

 A Guerra do Paraguai (1864-1870) foi o maior e mais sangrento conflito da América do Sul, e o Império do Brasil, sob o governo de D. Pedro II, teve um papel decisivo na vitória da Tríplice Aliança, formada por Brasil, Argentina e Uruguai. O governo imperial brasileiro se destacou pela capacidade de mobilizar recursos e liderar uma coalizão que derrotou o Paraguai e impediu que a região fosse tomada por um ditador com ambições expansionistas.

    O conflito começou em um cenário de tensão geopolítica na Bacia do Prata, uma área de grande importância estratégica e econômica. Composta pelos rios Paraná, Paraguai e Uruguai, a Bacia do Prata era essencial para o comércio e a navegação, ligando as regiões interiores do continente ao Oceano Atlântico. O controle dessas rotas fluviais significava o domínio sobre o comércio de mercadorias, especialmente a exportação de produtos agrícolas. Para o Império do Brasil, assegurar a livre navegação na Bacia do Prata era vital para manter o desenvolvimento econômico e a estabilidade na região.

    O Paraguai, liderado pelo ditador Francisco Solano López, via o domínio da Bacia do Prata como uma oportunidade de expansão territorial e de evitar o isolamento econômico. López temia que o Paraguai fosse sufocado pelas potências vizinhas e, para evitar isso, decidiu enfrentar o Brasil e a Argentina, invadindo territórios brasileiros na província de Mato Grosso e argentinos na província de Corrientes. A agressão paraguaia levou o Brasil a declarar guerra, formando, junto com Argentina e Uruguai, a Tríplice Aliança para enfrentar a ameaça.

    O governo de D. Pedro II foi fundamental para a mobilização das forças militares brasileiras. O imperador, apesar de não ser um entusiasta da guerra, compreendeu a necessidade de defender a soberania nacional e a estabilidade regional. Sob sua liderança, o Brasil organizou o maior esforço militar de sua história até então, enviando mais de 150 mil soldados ao front e mobilizando a Marinha para garantir o controle dos rios estratégicos. D. Pedro II acompanhou de perto o desenrolar do conflito, enviando emissários e apoiando moralmente as tropas.

A Bacia do Prata era crucial não apenas pela navegação, mas também por sua importância estratégica para o equilíbrio de poder na região. O Brasil precisava garantir que a influência paraguaia não se expandisse e ameaçasse seus territórios do sul. A vitória brasileira, portanto, foi um triunfo não apenas militar, mas também diplomático e econômico. Com a derrota de Solano López e a destruição de seu exército, o Brasil assegurou a livre navegação na Bacia do Prata e consolidou sua posição como a principal potência regional.

    As consequências do conflito foram profundas para todos os envolvidos. O Paraguai, que iniciou a guerra com ambições grandiosas, sofreu uma devastação completa. Cerca de 60% de sua população morreu, e o país foi praticamente destruído. Para o Brasil, a guerra trouxe um alto custo humano e financeiro, mas também fortaleceu o prestígio do Império. A vitória consolidou a autoridade de D. Pedro II, mostrando que o Brasil era capaz de defender seus interesses e de liderar nações em prol da estabilidade regional. O conflito acelerou algumas modernizações no exército e na marinha brasileiras, além de ter incentivado debates sobre a cidadania e o papel do governo na mobilização de recursos.

    Em resumo, a Guerra do Paraguai foi um marco para o Império do Brasil. Sob a liderança de D. Pedro II, o país defendeu sua soberania, garantiu o equilíbrio de poder na Bacia do Prata e se afirmou como a principal potência sul-americana. Apesar dos custos e das dificuldades, a vitória na guerra consolidou o Brasil como um Estado capaz de proteger seus interesses e de desempenhar um papel central na política regional.

Você quer saber mais?

DORATIOTO, Francisco. Maldita guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

LOPES, Nei; KRAUSZ, Joel Rufino dos Santos. Paraguai: a guerra dos povos. São Paulo: Editora Moderna, 1996.

DONATO, Hernâni. Dicionário das batalhas brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1996.

TELES, José Cardoso. Guerra do Paraguai: uma tragédia americana. Porto Alegre: Editora Sulina, 1970.

LEUCHARS, Chris. To the Bitter End: Paraguay and the War of the Triple Alliance. Westport: Greenwood Press, 2002.

sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Revolução Farroupilha- parte III: A batalha de Porongos e o fim do conflito.

Em 1842, para terminar com o conflito, Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias, foi nomeado presidente do Rio Grande do Sul e comandante das armas. O objetivo era acabar com a luta e pacificar a província. Diante das derrotas, os farroupilhas negociaram o fim do conflito com o governo imperial.  Duque de Caxias então inicia uma batalha intelectual usando estratégias do livro “A Arte da Guerra de Sun Tzu”, começa a espalhar informações falsas entre os farrapos para dividi-los. Segundo alguns relatos Davi Canabarro havia tomado a frente de algumas negociações e foi enganado pelo Duque de Caxias. Mesmo sendo um grande guerreiro no campo de batalha, David Canabarro era rude e tosco em negociações.      

Na noite do ataque imperial ao acampamento dos lanceiros, Davi Canabarro é acusado de mandar desarmar os mesmos, mas a verdade é que na tropa haviam muitos negros que eram ex-combatentes imperiais presos em combate e integrados a frente farroupilha com a promessa de sempre libertos em caso de vitória. Esses lanceiros negros eram retirados deles todas as noites os cartuchames das armas, com o correto receio de traição. Os lanceiros farroupilhas não foram desarmados e nem tiveram suas lanças retiradas. Alguns acusam Canabarro de ter desarmado os seus lanceiros em ato combinado com as forças imperiais, inclusive existe uma  carta falsa usada estrategicamente por Caxias para fundamentar a traição de Canabarro aos seus lanceiros. Mas os fatos são os seguintes, na noite do ataque David Canabarro estava com sua amante Chica Papagaia, a Maria Francisca Ferreira Duarte, e foi pego literalmente com as calças na mão no acampamento. Um homem que havia planejado a traição de seus companheiros não se deixaria estar em uma situação dessa se estivesse ciente do ataque imperial. Mas enfim é uma história cheia de armações e disparates por parte dos imperiais, pois era um conflito onde envolvia grupos maçons dos dois lados e caso o conflito não acabasse ao fechar 10 anos haveria uma intervenção internacional pela independência da Província.

Acusar um guerreiro como Canabarro de traição e algo complicado, pois um homem com uma ficha militar impecável que lutou em diversos conflitos pelo Império do Brasil, antes da Guerra dos Farrapos e continuou lutando após, inclusive participando da Guerra do Paraguai é no mínimo algo que devemos refletir antes de acusar.

No entanto, faltava solucionar a questão dos negros escravizados que haviam lutado durante dez anos. O governo imperial não aceitava a libertação e, por outro lado, alguns líderes farroupilhas concordaram em devolvê-los para seus antigos proprietários. No entanto, isso seria uma traição e poderia acabar em uma rebelião. Por isso, em 14 de novembro de 1844, o acampamento farroupilha – liderado por Canabarro - é atacado por tropas imperiais.

Em 1845, os rebeldes aceitaram a proposta de paz oferecida pelo governo. O Tratado de Poncho Verde estabelecia: anistia; incorporação dos oficiais farroupilhas ao exército imperial; libertação dos escravos que haviam lutado ao lado dos farroupilhas; devolução das terras que haviam sido tomadas dos rebeldes; diminuição dos impostos naquela província e fortalecimento da Assembleia Provincial.

A posição do governo central foi entremeada de combate e concessões aos rebeldes. Os farrapos não eram gente esfarrapada, e a região onde lutavam tinha para o Império grande importância estratégica. Por exemplo, em princípios de 1840, o governo central cedeu a uma das principais exigências econômicas dos farrapos, decretando uma taxa de importação de 25% sobre a carne salgada vinda do Prata e que concorria com a nacional.

Um passo importante para pôr fim ao conflito ocorreu quando, em 1842, Caxias foi nomeado presidente e comandante de armas da província. Ele combinou habilmente uma política de ataque militar e medidas de apaziguamento. Afinal, em 1845, após acordos em separado com vários chefes rebeldes, Caxias e Canabarro assinaram a paz. Não era uma rendição incondicional. Foi concedida anistia geral aos revoltosos, os oficiais farroupilhas integraram-se de acordo com suas patentes ao Exército brasileiro e o governo imperial assumiu as dívidas da República de Piratini. Há controvérsia entre os historiadores sobre se os farrapos desejavam ou não separar-se do Brasil, formando um novo país com o Uruguai e as províncias do Prata. Seja como for, um ponto comum entre os rebeldes era o de fazer do Rio Grande do Sul pelo menos uma província autônoma, com rendas próprias, livre da centralização do poder imposta pelo Rio de Janeiro. 

Você quer saber mais?

BORIS, Fausto. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

RIBEIRO, Celia. O Jornalista farroupilha. Porto Alegre: Libretos, 2012.

Revolução Farroupilha- parte II: Batalha da Ponte da Azenha.

O Combate da Ponte da Azenha foi o combate inicial da Revolução Farroupilha, ocorrido na noite de 19 para 20 de setembro de 1835. Foi marcado por dar espaço à Tomada de Porto Alegre pelos farroupilhas no dia seguinte.

Milhares de pessoas passam todos os dias pela famosa ponte da Azenha em Porto Alegre, que atravessa o Arroio Dilúvio da Avenida Ipiranga. Acostumadas a passar por aquele lugar no corre-corre do dia-a-dia, muita gente não se dá conta da importância histórica daquele local. Foi ali que se travou a primeira batalha da Revolução Farroupilha, que mais tarde, após a declaração da independência da República Rio-Grandense, passaria a se chamar "Guerra" dos Farrapos, já que a partir de então seria um conflito entre duas nações soberanas. Existiam moinhos perto da ponte, que eram chamados de azenhas desde os primeiros habitantes açorianos. Entre os comerciantes que fabricavam farinha, um dos mais conhecidos foi o português Francisco. Por isso, a ponte também é conhecida como Ponte do Chico da Azenha. O General Bento Gonçalves, líder máximo da Revolução, planejou tudo na estância de Pedras Brancas, separada de Porto Alegre pelo Guaíba. Lá morava o capitão José Gomes Jardim, e a sua casa foi transformada numa espécie de quartel-general farroupilha. Da estância, partiu uma tropa em direção ao morro atrás da Azenha na noite de 19 de setembro de 1835, que em pouco tempo ficou povoado de tendas militares. No dia seguinte, o plano era descer para invadir Porto Alegre. Chegavam notícias ao presidente da Província Antônio Fernandes Braga (o Governador dos dias de hoje) , de que a guerra estava prestes a começar. Muitos soldados da Guarda Nacional do Império Brasileiro teriam aderido aos farroupilhas juntamente com peões de outras estâncias, e com a ausência do comandante de armas naquela noite, marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto, que havia viajado para a Fronteira com 70 homens, a capital estava desguarnecida.

O presidente Braga, às pressas, chamou o comandante da Legião da Guarda Nacional Visconde de Camamu para organizar a resistência. Camamu saiu disposto a encontrar voluntários para tentar surpreender os farrapos acampados no morro. Acontece que a maioria da população era a favor dos Farrapos, ainda mais com o anúncio recente de Braga sobre um aumento nos impostos sobre as estâncias e charqueadas. Os cidadãos que não se juntaram aos farrapos, ou fugiram para as suas chácaras, ou trancaram-se em suas casas. Segundo o autor Carlos Urbim (Os Farrapos, 2008), Braga caminhava nervoso pelas salas do palácio, enquanto Camamu partia em direção à Azenha com os únicos 20 voluntários que conseguira recrutar. Dentre eles, estavam o brigadeiro veterano Alves Leite e o editor de um jornal imperialista, Antônio José Monteiro, o Prosódia. No alto do morro da Azenha, aproximadamente 200 farroupilhas. Onofre Pires, primo de Bento Gonçalves, ordenou que o Cabo Rocha descesse até a Ponte da Azenha com mais 3 homens para vasculhar a área. Sob a escuridão da noite, as casas trancadas, um ou outro cachorro latia. Ao chegar na ponte, Cabo Rocha avistou vultos. Eram os homens de Camamu! Quatro farrapos contra mais de 20 imperiais! Cabo Rocha não se intimidou, ordenou o ataque! A GUERRA ESTAVA COMEÇANDO!!!

Visconde de Camamu foi atacado e caiu do cavalo ao ser ferido por uma lança no ombro. Prosódia recebeu uma estocada fatal no peito e, atropelado por cavalos, morreu gritando na beira do arroio. Alves Leite, prensado na ponte por dois soldados a cavalo, se jogou lá de cima e acabou morrendo entre galhos e arbustos. Ao ver tudo isso, imaginando que eram centenas de soldados farrapos, o restante dos homens de Camamu saíram correndo e se dispersaram pelas casas mais próximas pedindo socorro. Ferido, sem cavalo, Camamu se arrastou pela Várzea, na escuridão, rasgando a roupa entre os arbustos e os espinheiros do caminho. Sem a espada e os detalhes que enfeitavam o fardamento, Camamu teve dificuldade para se identificar aos sentinelas do palácio do presidente Fernandes Braga. Ao entrar sangrando no palácio, Camamu precisou ser amparado por 2 escravos. Era o quadro da dor! Para superar a vergonha e a humilhação de ter perdido para 4 farroupilhas, o visconde aumentou o tamanho do exército farrapo: “Presidente, são mais de mil homens! Lutamos, tivemos baixas, fomos obrigados a voltar".

No alto do morro, depois de receber o relato do Cabo Rocha sobre o que tinha acontecido na Ponte do Chico da Azenha, José Gomes Jardim escreveu um bilhete para ser levado até a sua estância em Pedras Brancas, para ser entregue a Bento Gonçalves, que havia ficado no improvisado quartel-general.

“Fomos muito bem no negócio da farinha. Aguardamos sua palavra para negociar na Capital. Seria bom mandar mais gente e cavalos para o transporte das barricas”.

O cabo Sílvio Jardim, filho de Gomes Jardim, foi encarregado pelo pai a levar o recado até Bento. Ele deveria chegar até Pedras Brancas antes do amanhecer. Teve sorte, não foi visto por nenhum inimigo. Bento elogiou a bravura do rapaz: "O bilhete que trouxeste fala da farinha da liberdade. Diz para eles que podem tomar Porto Alegre hoje mesmo. Amanhã eu me encontro com vocês no palácio do governo". Agora, Sílvio faria o caminho inverso com o dia clareando para levar o recado aos farroupilhas que estavam no morro da Azenha.

No dia 20 de setembro de 1835, uma revolta armada, com pouco mais de 200 cavaleiros se estabeleceu nos arredores da capital, Porto Alegre. Uma pequena força armada enviada para dispersar os rebeldes foi repelida e obrigada a regressar. Fernandes Braga fugiu para a vila de Rio Grande, instalando aí seu governo. No dia seguinte, o comandante da Guarda Nacional local, Bento Gonçalves, um dos líderes do movimento, entrava em Porto Alegre e, com o apoio da Assembleia Provincial, em 1836, proclamou a República do Piratini. Diante desta situação, o regente Feijó nomeou novo presidente para a província, José de Araújo Ribeiro, futuro visconde do Rio Grande. A guerra continuou e os legalistas conseguiram prender vários chefes rebeldes, entre eles Bento Gonçalves, que foi mandado para o Forte do Mar (BA), de onde fugiu nadando. Em setembro de 1837, Bento Gonçalves regressa ao Sul e é eleito presidente da República do Piratini. A luta dos rebeldes era cada vez mais popular e com o apoio do revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi o movimento se propagou. Enquanto isso, devido à disputas políticas, Feijó foi obrigado a renunciar. Iniciou-se a regência de Araújo Lima, apoiado pelos conservadores. Em 1839, David Canabarro, um dos líderes da revolta, com a colaboração de Giuseppe Garibaldi, tomou Laguna (SC). Ali, conheceria sua futura esposa e companheira de lutas, Anita Garibaldi. Fundou-se nessa província a República Juliana, confederada à República Rio-grandense, alargando o cenário da revolução. Em 1840, com a maioridade antecipada de dom Pedro II, foi concedida anistia a todos os revoltosos políticos do período regencial. Então, o novo presidente do Rio Grande do Sul, Álvaro Machado, nomeado pelo governo imperial, tentou convencer os rebeldes a terminar a guerra e aceitar a anistia, mas nada conseguiu.

Você quer saber mais?

BORIS, Fausto. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

RIBEIRO, Celia. O Jornalista farroupilha. Porto Alegre: Libretos, 2012.