O título “Médico do Brasil” não veio assim tão fácil antes Oswaldo Cruz passou por aviltamentos gerados principalmente pelo fatídico 10 de novembro de 1904, A Revolta da Vacina. Médico e filho de médico, Oswaldo Cruz entrou na escola aos cinco anos, já alfabetizado pela mãe. Aos catorze, ingressou na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Formou-se médico aos vinte, dedicou sua tese de doutorado ao seu pai cujo tema - “A veiculação microbiana pelas águas” - já mostrava interesse pela microbiologia, ramo da biologia que ganhava importância graças aos estudos feitos pelo francês Louis Pasteur.
Com o apoio financeiro do sogro, Oswaldo Cruz muda-se para Paris. Seu objetivo era aperfeiçoar-se em microbiologia no Instituto Pasteur.
Em 1899 houve uma grande mortandade de ratos no porto de Santos Vital Brasil e Adolfo Lutz, pesquisadores do Instituto Bacteriológico do Estado de São Paulo, diagnosticaram: peste bubônica. A cidade foi colocada em alerta e a pedido do governo federal Oswaldo Cruz viajou a Santos, nascia assim o trio científico Oswaldo Cruz, Vital Brasil e Adolfo Lutz que contribuiria e deixaria raízes importantíssimas para a ciência brasileira.
No fim do século XIX e início do XX, o Brasil passava por grandes mudanças, sobretudo gerada pelo fim da monarquia e o fim da escravatura. A maioria da população vivia no campo, com o fim da escravatura e o movimento de industrialização, cidades como São Paulo e Rio de Janeiro passam por uma urbanização desordenada. A capital federal recebia trabalhadores de diversas regiões do país na maioria pessoas marginalizadas pelo preconceito racial e social.
Neste caos social, sem saneamento básico e condições precárias de infra-estrutura que algumas doenças vitimaram diversas pessoas. O Rio de Janeiro era conhecido como o “túmulo dos estrangeiros”. Havia até uma propaganda de uma companhia de viagem européias que fazia o seguinte anuncio: “Viaje direto para a Argentina sem passar pelos perigosos focos de epidemias do Brasil”. Diante de tal situação o presidente Rodrigues Alves elaborou um plano de modernização cujo plano contemplava também a eliminação das doenças que assolavam o Rio de Janeiro o responsável por esta missão seria Oswaldo Cruz.
Em 1903, Oswaldo Cruz foi empossado na Diretoria Geral de Saúde Pública e sua meta seria erradicar três das principais doenças: febre amarela, peste bubônica e a varíola. Escreveu também um código sanitário, que incluía a vacinação obrigatória.
Além disso, esclareceu a população através de folhetos educativos, outros dirigidos aos profissionais de saúde, além dos famosos “Conselhos ao povo” publicações na imprensa que explicavam como eram os mosquitos transmissores da febre amarela, os cuidados que cada cidadão devia tomar para acabar com os criadouros, como se proteger das picadas e evitar o contágio, e como os doentes deviam ser tratados. Também com sucesso foi a campanha para erradicar a peste bubônica. Oswaldo Cruz já enfrentara um surto em Santos e o Instituto Soroterápico Federal, onde era diretor, produziu o soro antipestoso.
Mesmo assim, a imprensa e os opositores do presidente Rodrigues Alves criticavam duramente as ações de Oswaldo Cruz, o motivo era a polêmica vacinação obrigatória. Era comum encontrar piadas, caricaturas, crônicas e músicas satíricas que hostilizavam o médico brasileiro.
A Revolta da Vacina foi apenas o estopim para um movimento popular protestar contra as arbitrariedades impostas aos cidadãos como desocupação de imóveis e imposição brutal à vacinação. É neste contexto político e social conturbado, que o médico brasileiro é incompreendido, pois o conhecimento científico (vacinação) estava diluído a outras ações e interesses do governo da época. O que causou certa confusão exacerbando o senso comum sobre a vacinação obrigatória, pois acreditavam que a vacina poderia prejudicar, ou seja, a população marginalizada não foi devidamente orientada e respeitada e a vacinação obrigatória foi vista como mais uma ação prejudicial imposta pelo governo.
O panorama da Revolta da Vacina foi de 23 mortos, 67 feridos e 945 presos e a vacina passou a ser facultativa. Em 1908, um novo surto atinge mais de nove mil pessoas mesmo assim a não-obrigatoriedade foi mantida.
O Instituto Soroterápico Federal conquistou reconhecimento nacional e internacional, pois Oswaldo Cruz no seu comando estimulou a pesquisa e o ensino, além da produção de imunobiológicos contra a tuberculose, cólera, malária e produtos que eram destinados à eliminação de pragas na agricultura, essas renderam a Oswaldo Cruz e a equipe de cientistas brasileiros uma importante premiação em Berlim, depois viajou a Paris, em seguida Nova York onde levou a notícia da erradicação da febre amarela e também ao México, onde propôs organizar juntamente com os governos da América Central uma legislação sanitária para erradicar a febre amarela. O resultado do seu reconhecimento internacional rendeu o título de “O médico do Brasil” e o país agora tinha o seu “Pasteur” e ironicamente o mesmo que outrora fora ridicularizado agora era recebido com herói nacional.
O presidente Afonso Pena sucede Rodrigues Alves e o Médico do Brasil é mantido a frente da Diretoria Geral de Saúde Pública, a capital federal está completamente mudada com largas avenidas, sem cortiços e a febre amarela controlada, porém um fato curioso é importante ressaltar, no governo anterior existia a preocupação com a febre amarela, pois esta acometia todas as pessoas sendo, assim as orientações do doutor Oswaldo Cruz eram tidas como importantes, já no governo sucessor o Rio de Janeiro conquistara o status de “Paris das Américas”, porém a população marginalizada foi expulsa para os morros e favelas. É nesta mesma época que acontece uma epidemia de tuberculose, porém diferentemente da febre amarela a tuberculose atingia principalmente as pessoas pobres, moradores de locais insalubres. Oswaldo Cruz preocupado com tal situação apresenta um plano de saúde pública o qual continha as seguintes medidas: isolamento dos doentes em locais adequados, os chamados sanatórios de cura que naquela época eram particulares e caros, além da educação da população e uma aposentadoria para os trabalhadores pelo tempo que durasse a doença.
Diferentemente da ocasião anterior, a tuberculose não foi incluída como interesse público, desestimulado com a impossibilidade de por em ação seu projeto contra a tuberculose, juntamente com a entrada em vigor de uma lei que proibia a acumulação de cargos no serviço público federal Oswaldo Cruz deixa a Diretoria Geral de Saúde Pública e resolve dedicar-se ao Instituto Soroterápico, então transformado em Instituto Oswaldo Cruz. Juntamente com outros cientistas inicia-se um movimento expedicionário pelo Brasil com o objetivo de pesquisar e promover a melhoria das condições sanitárias das regiões brasileiras surge então o chamado Movimento Sanitarista, que defendia a idéia de que não haveria desenvolvimento nacional se as doenças endêmicas não fossem combatidas. Criou-se assim dados e relatos da real situação brasileira e esta importante ação científica contribuiu para desmentir idéias preconceituosas da época como composição racial do povo e clima quente do trópico. A repercussão foi tanta que Monteiro Lobato convenceu-se e mudou de idéia, refazendo o personagem Jeca Tatu, assim o próprio escritor que fora adepto das idéias anteriores acabou sendo um dos líderes do Movimento Sanitarista.
Oswaldo Cruz não viveria para ver os frutos da sua política expedicionária de saúde, morreu em 11 de fevereiro de 1917 e deixou para o país uma das instituições mais importantes que é responsável por 60% da produção nacional de vacinas, fabrica setenta medicamentos básicos para o Sistema Único de Saúde, fornecidos à população carente, e sete dos doze remédios do coquetel contra AIDS, além de atividades de ensino e pesquisas.
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