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sexta-feira, 7 de agosto de 2015

A peste negra e a grande fome


Estima-se que, em 1348, um terço da população europeia tenha sido dizimada pela peste negra.

►A origem e a propagação da peste negra: Durante a Idade Média, várias enfermidades, como a tuberculose e a disenteria, provocavam muitas mortes. Mas nenhuma teve tanto impacto quanto a peste negra. A doença é causada pela bactéria Yersinia pestis, que é transmitida ao ser humano por meio de pulga que se contaminam ao parasitar roedores que alojam a bactéria. Inicialmente se acreditava que a peste negra teria se originado na China, no início do século XIV. Acompanhando as rotas terrestres utilizadas para o comércio, como a famosa Rota da Seda, a peste teria se disseminado da Ásia Central até o Império Bizantino, atingindo sua capital, Constantinopla. Hoje defende-se que a epidemia teria surgido na Ásia Central e entrado na Europa através das rotas de caravanas. Do porto de Constantinopla, os navios que transportavam mercadorias para a Europa levavam também muitos ratos, cujas pulgas estavam contaminadas pela bactéria. Foi essa uma das vias pelas quais a peste negra alcançou os portos europeus, entre 1348 e 1352. Na época, não se conheciam os mecanismos de contágio da peste negra. Por isso, embora a doença não tenha escolhido um grupo social específico, as camadas sociais mais poupadas foram aquelas que dispunham de melhores condições de saneamento e higiene ou seja, os mais ricos.

►A grande fome: Entre 1315 e 1317, a produção agrícola europeia, que já era insuficiente, ficou ainda mais distante das necessidades alimentares da população. O esgotamento do solo, as fortes chuvas que castigaram a Europa em 1314 e 1315 e o clima mais frio foram as principais razões das más colheitas. A epidemia encontrou a população desnutrida e com o sistema imunológico fragilizado. A crise agrícola atingiu todas as camadas sociais. Como consequência das más colheitas, o preço dos cereais, principalmente do trigo, aumentou  e a população urbana sofreu com o desabastecimento e o aumento do banditismo. Nos campos, os senhores feudais passaram a explorar mais intensamente os camponeses.

►As consequências da peste negra: Diante do avanço da peste, as pessoas procuravam se isolar. Para isso, as cidades evitavam a entrada de estranhos, especialmente os oriundos das zonas mais afetadas. Testemunhos da época, no entanto, relatam atitudes de solidariedade. Várias pessoas se ofereciam para cuidar dos doentes ou para enterrar os mortos, mesmo sabendo do risco que corriam. A peste negra provocou a destruição de comunidades inteiras e um grave desequilíbrio social e econômico. Calcula-se que, até o ano de 1390, a peste tenha vitimado entre 20 e 25 milhões de pessoas na Europa, o que equivale a um terço da população do continente na época. As principais consequências dessa tragédia foram a redução ainda maior da atividade econômica e o desabastecimento, tanto no campo quanto na cidade, promovendo mais miséria. Mesmo depois de a epidemia abrandar, milhares de europeus continuaram morrendo, atingidos principalmente pela fome.

A formação dos Estados europeus modernos:


O fortalecimento do poder dos reis: A nascente burguesia comercial precisava promover algumas reformas para impulsionar o comércio. O transporte de mercadorias de uma cidade para outra, por exemplo, obrigava os comerciantes a cruzar vários feudos. Cada um deles, porém, estava sob autoridade de um senhor feudal, que estipulava suas próprias leis. A burguesia passou, então, apoiar a transferência de poder para as mãos de um rei. Dessa maneira, o rei poderia unificar a moeda, as leis, os impostos e estabelecer um sistema de pesos e medidas único, facilitando, assim, os negócios. Muitos senhores feudais também apoiaram a centralização política, mas por razões diferentes. Enfraquecidos após as Cruzadas  e as fugas de servos para as cidades, muitos nobres recorreram aos reis em busca de favores da Coroa. Com o fortalecimento de seu poder, os reis conseguiram impor sua autoridade sobre os habitantes de um território e estabelecer os chamados Estados modernos. Mas esse processo não foi igual em toda a Europa. A seguir estudaremos os casos de Espanha, Portugal, França e Inglaterra.

A Reconquista da Península Ibérica: Desde o início do século VIII, a Península Ibérica estava quase totalmente dominada pelos muçulmanos. Os cristãos que lá viviam ocupavam os territórios ao norte da península. A partir do século XI, as Cruzadas e as disputas políticas entre os muçulmanos estimularam os cristãos a retomar os territórios ocupados pelos árabes na Europa, em batalhas que ficaram conhecidas pelo nome de Reconquista. Aos poucos, os territórios reconquistados na península deram origem a reinos como Leão, Castela, Navarra e Aragão. Esses reinos, entretanto, também lutavam entre si pelo controle político e territorial sobre a região. Alianças entre famílias reais, firmadas por meio do matrimônio, também foram usadas para ampliar o poder de cada reino. As guerras e os casamentos arranjados explicam por que esses reinos variaram tanto em tamanho e poder político e militar. Essa instabilidade durou até o casamento de Fernando, herdeiro do trono de Aragão, com Isabel, irmã do rei de Leão e Castela. Da união desse três reinos formou-se a Espanha no final do século XV.

A formação de Portugal: No século XI, Afonso VI governava os reinos de Leão e Castela. Naquele momento, o rei concedeu ao nobre Henrique de Borgonha como recompensa por sua atuação nas guerras de Reconquista, uma porção de terras situada entre os rios Douro e Minho, denominada Condado Portucalense. Mais tarde, em 1139, Afonso Henriques, filho de Henrique de Borgonha, rompeu com o reino de Castela e com apoio da Igreja Católica proclamou-se rei das terras recebidas por seu pai. O passo seguinte foi à conquista das terras ao sul: era o inicio do reino de Portugal.

A França rumo à centralização: A formação da monarquia nacional francesa teve início no final do século XII, quando o poder real tomou medidas para enfraquecer a nobreza resistente à centralização do poder nas mãos do rei. A coroa criou um exército assalariado e passou a cobrar taxas sobre os bens da Igreja. Além de submeter à Igreja francesa, o rei Felipe, o Belo, que governou a França entre 1285 e 1314, convocou uma assembleia composta pelo clero, pela nobreza e por representantes das cidades para comunicar suas decisões, mais tarde conhecida como Estados Gerais.

A Inglaterra e os limites do rei: A centralização do poder na Inglaterra teve início com Henrique II, no século XII. Entretanto, seu sucessor, o rei Ricardo Coração de Leão, esteve ausente durante grande parte de seu reinado, lutando nas Cruzadas. Com isso, a autoridade real diminuiu. João Sem-Terra, sucessor do rei Ricardo Coração de Leão, logo teve de enfrentar a oposição dos nobres, descontentes com as pesadas taxas que pagavam. Pressionado pela nobreza, pelo clero e pela burguesia, João Sem-Terra assinou, em 1215, a Magna Carta, cujo principal objetivo era limitar os poderes do rei.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

As Cruzadas


As Cruzadas foram expedições militares europeias enviadas ao Oriente a partir do final do século XI.

A convocação do papa: Em 1076, Jerusalém, cidade sagrada para os cristãos, foi tomada por turcos muçulmanos. No final do século XI, o papa Urbano II convocou os cristãos para reconquistar Jerusalém. Reis, nobres e pessoas provenientes de diferentes regiões da Europa atenderam o chamado do papa e rumaram em direção à cidade. A palavra ‘cruzada’ não é contemporânea ao seu acontecimento, ou seja, não era utilizada por aqueles que viveram no período. Apenas em meados do século XIII, quando o movimento cruzadista declinou é que esse termo apareceu. O nome surgiu por causa da vestimenta dos guerreiros cristãos, que costuravam cruzes em suas roupas. Quando as cruzadas tiveram início forma chamadas apenas de peregrinação ou de guerra-santa.

Além da religiosidade: Não era apenas a Igreja que tinha interesse em promover as Cruzadas. Comerciantes das cidades de Gênova e de Veneza monopolizavam as atividades comerciais no Mar Mediterrâneo. Esses homens procuravam formas de também controlar os portos do Oriente. Para eles, as Cruzadas representavam a oportunidade ideal para ampliar e defender as áreas de comércio. Ainda havia interesses políticos e sociais na organização das Cruzadas. O aumento populacional deixou muitos nobres sem terras, uma vez que apenas o primogênito podia herdar as terras da família. Por isso, muitos nobres aderiram às Cruzadas em busca de riquezas e terras no Oriente. Já para os marginalizados da sociedade europeia, as Cruzadas representavam a oportunidade de conseguir melhores condições de vida nas regiões orientais.

Os resultados das Cruzadas: Os cruzados conquistaram Jerusalém e fundaram pequenos Estados no Oriente. Na metade do século XIII, porém, Jerusalém foi reconquistada pelos muçulmanos e os Estados cristãos desapareceram. Apesar do insucesso religioso, as Cruzadas contribuíram para acelerar as mudanças sociais que já estavam ocorrendo na Europa desse período.

Enfraquecimento do sistema feudal, já que, de um lado, os senhores endividaram-se para montar seus exércitos e, de outro, muitos servos que partiram para as Cruzadas com seus senhores não retornaram.

►Muitas terras do norte da Europa ficaram praticamente despovoadas em razão da partida de seus habitantes para a luta.

►O Mar Mediterrâneo recuperou a importância de antes, pois, com as Cruzadas, aumentou o movimento de embarcações que transitavam por ele.

►O aumento do comércio entre o Oriente e o Ocidente, principalmente pelos portos de Gênova e Veneza, usados pelos cruzados para embarcar para o Oriente.
O contato com os muçulmanos possibilitou ampliar o acesso dos europeus ao conhecimento produzido na Antiguidade greco-romana, preservado pelos árabes, em áreas como filosofia e matemática. Além disso, com as Cruzadas, os europeus tiveram mais contato com o próprio conhecimento produzido pela cultura muçulmana, sobretudo nas áreas da matemática e da arquitetura. Não se pode, no entanto, supervalorizar o papel das Cruzadas no enfraquecimento do sistema feudal. A sua importância foi a de contribuir para a expansão comercial e para a crise do trabalho servil, mudanças que já estavam ocorrendo na Europa.

O cotidiano das Cruzadas: Não foram apenas clérigos, peregrinos, comerciantes e cavaleiros que participaram das Cruzadas. Muitas crianças, doentes, mulheres e aventureiros seguiram nas expedições. Essas pessoas enfrentavam inúmeras dificuldades: falta de alimentos, enchentes, estradas esburacadas, ataques de bandidos e doenças. Acredita-se que, de cada quatro cruzados que partia da Europa, apenas um conseguia chegar à Terra Santa.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Hy Brazil: a ilha fantasma e os “Antigos”.


Detalhe do mapa europeu de 1572 do cartógrafo Abraham Ortelius.

“On the ocean that hollows the rocks where ye dwell,
A shadowy land has appear’d, as they tell;
Men thought it a region of sunshine and rest,
And they call’d it ‘O Brazil – the Isle of the Blest’.
From year unto year, on the ocean’s blue rim,
The beautiful spectre show’d lovely and dlim;
The golden clouds curtain’d the deep where it lay,
And look’d like an Eden, away, far away.”

Trecho de um antigo poema irlandês sobre Hy Brazil.

“Hy Brazil” — “Ilha Afortunada”, no irlandês — aparece na mitologia gaélica irlandesa, cuja lenda está relacionada a diversos avistamentos por marinheiros de uma porção de terra encontrada no Atlântico Norte que desaparecia em meio à neblina. Ao longo dos séculos, a ilha foi deslocada por diversas vezes nos mapas, inclusive chegando onde seria a costa da América do Sul, em algumas ocasiões.

Considerada como existente na cartografia européia medieval, Hy Brazil, portanto, nunca teve uma localização específica.

Aparentemente os cartógrafos da época, baseados nas lendas e relatos de avistamentos, ficaram confiantes o suficiente de sua existência para incluírem o local mítico em mapas a partir do século XIV; como no mapa da Catalunha (1325-1330). A inclusão de Hy Brazil na cartografia marítima pode ter inspirado diversas viagens e aventuras malfadadas que ocorreram até o final do século XV.


Mapa mostrando a localização de Hy Brazil. Detalhe do mapa catalão de 1350 mostrando a localização de Hy-Brazil. (imagem de Donald Johnson, “Ilhas Fantasma do Atlântico” )

A ilha aparece na mitologia irlandesa muito antes da data oficial do descobrimento de Vera Cruz (Brasil). Assim, como é possível verificar nos trechos abaixo, algumas vertentes históricas atribuem que o nome “Brasil” tenha sido dado em decorrência da lendária ilha e não da árvore Pau Brasil, visto que durante os séculos seguintes, a fantasiosa porção de terra já era conhecida na Europa.

Para Roger Casement, não existe a menor dúvida que tanto os livros escolares, enciclopédias e dicionários como os brasileiros indagados individualmente estavam cometendo um engano. ‘Por mais estranho que possa parecer, o Brasil deve o seu nome não à abundância de um certo pau-de-tinta, mas à Irlanda. “A distinção em nomear o grande país da América do Sul, eu acredito, pertence seguramente à Irlanda e a uma antiga crença irlandesa tão remota como a própria mente celta'”. — Geraldo Cantarino.

“Assim, tal qual Duarte Pacheco que, com sua etimologia selvagem havia dado à madeira ibirapitanga dos indígenas o nome de brisilicum, frei Vicente também contribuía, à sua maneira, para obscurecer a origem mítica do nome Brasil. De erros em enganos foi-se sedimentando a assimilação do vocábulo brasa ao nome Brasil, perdendo seu significado primitivo como metonímia do Outro Mundo dos celtas atlânticos.” — Ana Donnard.


Hy Brazil em mapa de 1572
Mapa europeu de 1572 do cartógrafo Abraham Ortelius.

Histórias sobre o lugar vinham circulando por toda a Europa durante séculos, alegando que era a Terra Prometida dos Santos, um paraíso terrestre onde seres puros viviam. Mas supostamente Hy Brazil era cercada por uma névoa espessa, escondida dos olhos dos mortais. Na mitologia celta, ela aparecia a cada 7 anos, mas não era possível alcançá-la, pois a mesma desaparecia sempre que uma embarcação se aproximava. Entretanto, o monge irlandês São Brandão alegou descer na ilha, considerando-a o Éden.

As buscas pela Hy Brazil tiveram ápice entre os anos de 1300 e 1500, sendo patrocinadas por inúmeros monarcas. Ainda que outras ilhas míticas da época tenham sido descobertas, a ilha fantástica nunca foi encontrada.

Tradução do poema:

“No oceano que esculpe as rochas onde moras,
Uma terra enigmática apareceu, é o que contam;
Os homens a consideraram uma região de luz e descanso,
E a chamaram de O’Brazil, a ilha dos Bem-Aventurados.
Ano após ano, na margem azul do oceano,
A linda aparição se revelava encontadora e suave;
Nuvens douradas encortinavam o mar onde ela se encontrava,
Parecia um Éden, distante, muito distante.”

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domingo, 22 de fevereiro de 2015

Porfiria, doença confundida com os mitos de Licantropia e Hematofagia.




Sintomas de doenças como a Porfiria eram confundidas na Idade Média e Antiguidade com Licantropia (Lobisomens) e Hematofagia (Vampiros).

Porfirias

As porfirias são um grupo de doenças genéticas cujas causa pelo mal funcionamento da sequência enzimática do grupo Heme da hemoglobina (a hemoglobina é o pigmento do sangue que faz que este seja  vermelho e é composta pelo grupo Heme e várias classes  de globinas, segundo circunstancias normais que agora não veem ao caso). O grupo Heme é quem transporta o oxigênio dos pulmões ao resto das células do organismo e é um complexo férrico (em estado ferroso). Qualquer erro na hereditariedade que interfere na síntese do grupo Heme é capaz produzir doenças chamadas Porfirias.

Sintomas

Fotossensibilidade, Hirsustino (crescimento de pelos). A pele pode apresentar zonas de pigmentação ou despigmentação. As Porfirinas acumuladas na pele podem absorver luz do sol em qualquer longitude, tanto no espectro ultravioleta, como no espectro visível e logo transferir sua energia ao oxigênio que proveem da respiração. O oxigênio normalmente não é toxico, mas como excesso de energia transferido pelas porfirinas o oxigênio se libera sob a forma de oxigênio altamente reativo. Este oxigênio altamente reativo, produz destruição dos tecidos, pontas dos dedos, o nariz, a boca etc. Oxidando essas áreas de forma violenta, com severa inflamação em forma de queimação.

Os Mitos

Agora procure pensar na Idade Média uma pessoa com essa doença. Com a pele completamente branca cheia de pelos, sem poder andar de dia devido a irritação na pelo causada pela doença, vagando pelas noites a procura de comida e abrigo, com o rosto desfigurado pela doença. Agora o que alguém que o encontra-se pensaria naquele tempo em uma noite escura ou de lua cheia. Foi ai que nasceu o mito do lobisomem (Licantropia) e dos vampiros (Hematofagia). Procuro por meio desse estudo mostrar que por detrás de todo mito existe pontos verdadeiros e por isso mesmo devem ser estudados.


segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O rei Dom Afonso Henriques, fundador de Portugal.



D. Afonso Henriques, nascido por volta de 1109, era filho do Conde D. Henrique de Borgonha e de sua esposa, D. Teresa. Pelo pai, era neto do Duque Henrique de Borgonha e trineto de Roberto II, Rei de França.

Sua mãe era filha ilegítima de Afonso VI, Rei de Leão e de Castela. Este confiara ao genro o Condado Portucalense, que se estendia do sul do Minho às proximidades do Tejo.

Sucedendo a seus pais no governo do Condado Portucalense (em 1130), o jovem D. Afonso Henriques empenhou-se em fazê-lo independente, por meio de repetidas lutas contra Afonso VII, que sucedera a Afonso VI no trono de Leão.

Desde então começou a intitular-se Rei de Portugal. Afonso VII reconheceu-lhe esse título em 1143, na conferência de Zamora, à qual assistiu o Cardeal Guido de Vico, Legado do Papa Inocêncio II.

Para esse resultado concorreu o juramento de vassalagem que D. Afonso Henriques havia prestado ao Papa na pessoa do Legado, talvez ainda antes da conferência.

Na carta de enfeudamento que escreveu a Inocêncio II nesse mesmo ano, prometeu o tributo anual de quatro onças de ouro, com a condição de gozar da proteção pontifícia para si e seus sucessores, e não reconhecer nenhum outro senhorio espiritual ou temporal além do Papa e seus legados.

Devido a reclamações de Afonso VII contra esse enfeudamento, só em 1179 Alexandre III reconheceu D. Afonso Henriques como Rei, tomando a ele e a seus sucessores sob a proteção da Cúria Romana.

A paz com os leoneses permitiu ao novo Rei prosseguir a cruzada contra os mouros. Em 1147 liberta Santarém e Lisboa, esta com o auxílio de um grande exército de cruzados que seguia para a Terra Santa.

Depois toma os castelos de Sintra, Almada e Palmeda, a praça de Alcácer do Sal (1158), Évora e Beja (1159). Perde estas duas últimas cidades, e as retoma em 1162.

Em 1165 e 1166, Giraldo "Sem Pavor" conquista Trujillo, Cáceres, Serpa e Juromeña para o Rei de Portugal. Em 1184, tendo o Rei 90 anos de idade, sua chegada a Santarém bastou para pôr em fuga os infiéis que ameaçavam a cidade.

D. Afonso faleceu em 1185, tendo reinado 57 anos. Foi casado com D. Mafalda de Sabóia.

Além de guerreiro consumado, foi "político enérgico e tenaz, que bem conhecia os meios de se afirmar e vencer", como escreve um historiador.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Fausto: a busca pelo absoluto

Drama filosófico que, ao mostrar a procura como fonte pulsante da vida, transfigura-se em odisséia do homem moderno.


 Eloá Heise

            A tragédia Fausto é, sem dúvida alguma, um dos textos que empresta a Goethe repercussão universal. Nela, pode-se dizer, o poeta expressa a experiência de toda sua existência. O próprio autor afirma em Poesia e verdade, que essa obra representa o “suma sumaruim” de sua vida. Não se pode esquecer que Goethe trabalhou durante 60 anos com esse tema : de 1772 (com seus trabalhos sobre o Urfaust – Fausto zero como ficou conhecido pela tradução encenada no Brasil) até 1832, ou seja, pouco antes de sua morte, ano em que postumamente é publicado o Fausto II. Em seu longo processo de elaboração, esse texto congrega as várias transformações pelas quais passou o poeta em sua longa vida: os vários períodos literários da época – Ilustração, Sturm und Drang, Classicismo, Romantismo -; as diversas atividades do poeta junto ao estado, no meio teatral, seus interesses científicos – botânica, mineralogia, estudo das cores -; seus estudos filosóficos – teologia, teosofia, escritos mágico-místicos -, além dos conhecimentos da mitologia antiga.

            Fausto, além de ser a obra simbólica da vida de Goethe, adquire também significado universal por materializar o mito do homem moderno, o homem que busca dar significado a sua vida, que precisa tocar o eterno e compreender o misterioso. Sob este aspecto, o mito faústico transforma-se em um “mito vivo”, um relato que confere modelo para a conduta humana.

O mito faústico e as marcas intertextuais

            A relação de Fausto como o conceito de mito, entretanto, também deve ser entendida em uma outra acepção, no sentido de fábula, de ficção, uma vez que a obra de Goethe baseia-se na lenda medieval sobre a figura histórica do doutor Fausto.

            Para entender o verdadeiro significado da figura do doutor Fausto, torna-se importante ressaltar que não se trata apenas de um charlatão que se tornou rico e famoso por ter feito um pacto com o diabo, como se propaga comumente. Cabe lembrar que o mito criado em relação a essa figura histórica – Georg (Johann)  Faust, (1480-1540) tem sua origem em uma época de crise, a transição entre a Idade Média e a Idade Moderna, época caracterizada por profundas mudanças, na qual conceitos até então inquestionáveis começam a ser colocados em xeque. Nesses novos tempos de inquietação, ligados a pesquisas no campo das ciências naturais e outras ciências, pode-se entender que aquele que manifesta sua descrença em relação a verdades, tidas como absolutas, é considerado um homem não temente a Deus, um pactuário do demo. Isso explica a recorrência do motivo do pacto com o diabo à época. Nesse contexto, basta lembrar de figuras contemporâneas ao doutor Fausto: Paracelsius, Nostradamus, Bacon ou Galileu que, perante os olhos da Inquisição, também teriam feito uma aliança com o demônio. Esse é o pano de fundo que serve de cenário para o aparecimento do personagem histórico, doutor Fausto, em tempos que espelham esse processo de busca por maioridade.

            Consta que esse douto levou uma vida errante, passando por várias localidades da Alemanha, o que fez que se tornasse conhecido por toda parte. Estudou magia, medicina, astrologia, alquimia, atividades que lhe permitiram trabalhar com horóscopo e fazer profecias. Unindo a capacidade de curar com a de prever o futuro, ficou famoso e conseguiu amealhar uma boa fortuna. Todas essas aptidões, por sua vez, renderam-lhe a fama de ter vendido sua alma ao diabo. Esse destino pessoal, que personifica os anseios da época ao materializar a busca daquele que quer ultrapassar os próprios limites através da especulação, dará origem à primeira versão escrita sobre as histórias de Fausto, publicada logo após a morte do Fausto histórico, em 1587, sob o título de Historia von D. Johann Fausten.

            Essa história, de autor anônimo e de cunho popular, narra, ao lado de relatos sobre o Fausto, que eram voz corrente, outras discussões de cunho teológico, astrológico, histórico, científico, provindas das mais diferentes fontes contemporâneas. Essa estrutura, sem unidade estética, acaba por refletir esse tempo de transformação, com a justaposição de crenças diabólicas medievais ao lado do novo espírito das ciências. No livro popular, com suas partes especulativas e enciclopédicas, o pacto entre Fausto e o diabo compreende um período de 24 anos. Nesse contexto, a sede insaciável do protagonista por saber é vista, antes de tudo, como um grande pecado, pois uma tal postura afastaria o homem de Deus e o aproximaria da dúvida. Esse homem incorreria no pecado da hybris, a presunção, por pretender equiparar-se a Deus. Essa história, tão ao gosto da época, conquistou enorme repercussão, atingindo 5 edições. Sabe-se que Goethe, ainda quando criança, entrou em contato com a edição de 1725, sob a forma de teatro de marionetes, apresentada em praças de mercado.

As versões de Marlowe e Lessing

Por volta de 1592, o livro popular alemão é traduzido para o inglês, originando-se daí o livro popular inglês sobre o tema Fausto. Esse livro, por sua vez, serve de material para Christopher Marlowe, o mais importante dramaturgo ao lado de Shakespeare, escrever sua peça Tragical history of doctor Faustus, editada em 1604. As encenações do texto de Marlowe, por seu turno, irão repercutir novamente na Alemanha ao serem apresentadas por teatros mambembes, em língua estrangeira, mas de forma pantomímica. Consta que Goethe conheceu as encenações da peça de Marlowe de 1768 e 1770.

            Já a partir do drama de Marlowe, começa a delinear-se uma ambivalência moral em relação a este homem impulsionado por sua sede de saber. Tem origem no dramaturgo inglês a idéia do monólogo inicial, no qual Fausto mostra toda sua infelicidade por não alcançar a plenitude do conhecimento. Enquanto no livro popular alemão há uma clara condenação da presunção do protagonista, a versão inglesa da lenda deixa transparecer uma postura dúbia. Existe a condenação, sim, mas, paralelamente, percebe-se uma admiração pela figura desse douto que, qual um Prometeu, desafia a divindade. Contudo, também na versão inglesa, o ímpeto desmesurado de Fausto conduzirá ao estabelecimento de um pacto com o diabo, selado sob a condição de viver 24 anos de prazer sem limites, decorrendo, como conseqüência, a sua condenação.

            A lenda sobre o Fausto ganha novo fôlego a partir de idéias próprias do período da Ilustração. Entre 1755 e 1775, Lessing, o grande escritor do Iluminismo alemão, desenvolve projetos de escrever uma peça sobre o Fausto. O texto não chega a se efetivar, restando apenas a montagem de fragmentos e idéias gerais  reconstituídas pela memória de amigos, dados creditados à coincidência de informações.

            Se Kant, em sua definição de Iluminismo, mostra que o lema dessa corrente filosófica é: Sapere aude - tenha a coragem de servir-te da tua própria inteligência -, então Fausto, por ousar, por ter a coragem de buscar pelo sentido da vida, não poderia ser alguém condenado à danação dos infernos. Nesse contexto iluminista, Fausto, na sua procura pela verdade através da razão, empreende uma tarefa que dignifica o homem; em outras palavras: aquele que decide fazer uso de sua qualidade intrínseca, a razão, não será condenado, mas transforma-se no preferido de Deus, o destinado à salvação.

            Goethe conhecia os planos de Lessing e as reconstituições de seu drama que podem ser detectadas, em sua essência, nas obras teatrais póstumas (Theatralischer nachlass, de 1786). Vem de Lessing a idéia de salvação que encontramos no Fausto de Goethe.

            Goethe contou, pois, com diferentes pré-textos na elaboração de suas variadas versões da tragédia: de 1772-1775, elabora o Fausto zero; em 1790, produz Fausto, um fragmento; em 1808, é publicado o Fausto I e, em 1832, o Fausto II. No rastreamento do percurso do mito faústico e das fontes que serviram de inspiração para a realização de sua obra-prima, pode-se mencionar suas impressões da infância, ao assistir nas praças dos mercados as encenações do livro popular propriamente dito, a versão inglesa, com as apresentações do Fausto de Marlowe. A esses legados de cunho literário deve-se acrescentar um fato de origem real, o processo e a execução da infanticida Margaretha Brand, ocorrido em 1771-72, tragédia que impressionou profundamente Goethe e que será ficcionalizada em sua obra através do destino de Gretchen, a mulher que se apaixona por Fausto e, ao ser abandonada por ele, em um ato de loucura, assassina o próprio filho. Dentro desse rol de marcas intertextuais cabe dar ênfase especial à idéia de salvação, esboçada inicialmente por Lessing e assumida por Goethe, que servirá de inspiração para a virada redentora no destino de seu protagonista.

A estrutura da peça

            Dentre as diversas versões mencionadas, vamos nos ater à composição do Fausto I e do Fausto II, que podem sem interpretadas como uma unidade, com uma construção própria.
            A peça inicia-se com três cenas introdutórias, três prólogos que desenvolvem, respectivamente, uma perspectiva autobiográfica, uma perspectiva poetológica e uma perspectiva metafísica.

            O primeiro prólogo, Dedicatória, não dedica a peça a ninguém, como o título faz supor, mas é uma metarreflexão, em forma de monólogo, no qual o poeta faz uma retrospectiva da história da obra. No Prólogo no teatro, que vem a seguir, há uma discussão sobre a essência e a função da obra teatral; no confronto de opiniões antagônicas, debatem-se temas pouco ortodoxos para uma peça de teatro como: produção, rentabilidade, encenação e recepção do drama. Percebe-se, pois, que esses dois prólogos iniciais não se integram no enredo dramático.

            O Prólogo no céu, no entanto, é parte do desenvolvimento da trama e representa a moldura celestial externa que contém no seu escopo a ação terrena interna. Essa moldura metafísica envolve todo o drama. Inicia-se no começo do Fausto I e encerra seu contorno no fim do Fausto II, sob forma de epílogo. A moldura celeste, formulada segundo conceitos próprios da tradição cristã e assumindo a fórmula de um mistério medieval, apresenta uma imagem do mundo e do homem. Nesse jogo universal a terra é colocada entre o céu e o inferno e o ser humano entre Deus e a diabo.

            Nesse espaço, Fausto, personificando o homem,  transforma-se em objeto de disputa entre o Senhor e Mefistófeles. O Senhor acredita que o homem é intrinsecamente bom; pode errar porque procura, mas, por fim, será conduzido à luz. Já Mefisto o vê como uma criatura mal construída, dividida entre o instinto animal e sua parte racional. A partir dessas posições contrárias, Mefisto pede permissão e aposta que conduzirá Fausto por seus caminhos. Já o Senhor, por acreditar que “o homem erra, enquanto aspira” mas “da trilha certa se acha sempre a par”, aceita a aposta. Paralelamente, o Senhor também sabe que o “humano afã tende a frouxar ligeiro” e, por isso, é necessário que o homem tenha por companheiro o diabo, que atiça e instiga, impedindo que o ser humano caia na suprema condenação, a inércia. Assim, Mefisto desempenha uma dupla função: conduz o homem por caminhos que o levarão à culpa mas, ao mesmo tempo, impede que ele esmoreça e cesse sua atividade, o motor essencial da vida.

            Fausto, portanto, é colocado em jogo como objeto demonstrativo pelo Senhor, e deve provar através de si os valores ou os desvalores da criação. O drama, como um todo, pode ser entendido como a tentativa espiritual de compreensão da totalidade do universo. Discute, de forma poética, o sentido da criação, a função do mal, o destino do homem.

            A ação interna da peça, no âmbito terreno, vai espelhar, na aposta feita entre Fausto e Mefisto, o dilema proposto no âmbito celestial, entre o Senhor e Mefistófeles. Diante do desafio que lhe propõe Fausto, Mefisto assume a tarefa de satisfazer o homem e de conduzi-lo pelas experiências do pequeno mundo (Fausto I) e do grande mundo (Fausto II). Já Fausto, na sua busca sem limites, aposta que o diabo nunca conseguirá seu intento, que ele nunca irá deitar-se em “uma cama de preguiça” e, satisfeito consigo, irá proferir as palavras que  condenariam sua alma: “permaneça (momento), tão belo que és”. Desta maneira, com a ajuda de Mefisto, Fausto percorrerá o mundo na ânsia de vivenciar toda experiência destinada à humanidade.

            A ação terrena, abarca toda a trajetória do protagonista: desde a cena Noite, (Fausto I), com a constatação da crise existencial, até a cena final Grande átrio de palácio (Fausto II), quando Fausto morre. Dentro desse grande contorno, a partir das propostas do pacto e da aposta entre Fausto e Mefisto, o protagonista irá percorrer as diversas estações na sua busca por sentido.

            Cabe mencionar que o pacto, cerne do mito faústico tradicional, tem pouca ênfase na obra de Goethe. O pacto, sugerido por Mefisto, é prontamente aceito por Fausto, pois o protagonista “não teme nem o inferno nem o diabo”. Essencial em Goethe é a aposta, desafio proposto pelo titã Fausto que, por não apresentar um vencedor de antemão, tem um caráter ativo e inconclusivo (diferente do pacto que é um acordo fechado). Coaduna-se, assim, mais com a proposta vital da obra: a ação contínua como mola propulsora da vida.

            No Fausto I podemos detectar três estações: a procura por sentido através da bebida (O porão de Auerbach), do desejo e do amor por Gretchen (cenas Rua até Cárcere) e da sensualidade desenfreada (Noite de Walpúrgis). O Fausto II também comporta mais três estações: o mundo da corte (I ato), a estação da beleza e da arte (II e III atos) e a estação do conquistador e empreendedor (IV e V atos).

Quem ganha a aposta?

quarta-feira, 23 de abril de 2014

O Misticismo e Ocultismo do Judaísmo Hassídico


Israel ben Elizer (Baal Shem Tov), fundador do judaísmo hassídico.

Desde o princípio houve duas correntes no seio do judaísmo: de um lado o formalismo ritual da Bíblia e o Talmud e do outro, a tendência ao misticismo, ao ocultismo que criou a Cabalá e o Zohar. Daí a oposição entre fariseus e essênios na época do Talmud e entre talmudistas e cabalistas na Idade Média. O formalismo ritual, tão rigorosamente praticado pelas massas do povo na Europa Oriental entre os séculos XVII e XVIII, tendia fatalmente a produzir uma reação e daí nasceu o hassidismo, isto é, o sistema de "hassid", que em hebraico significa "pio".

Foi fundado no ano de 1740 na Polônia pelo místico Israel ben Eliezer, conhecido pelo nome de Baal Shem Tov: "o senhor de boa fama".

O "hassidismo", que começou por abandonar o formalismo ritual, despertou maior importância ao sentimento religioso que à prática. Proclamou a onipresença de Deus e por isso ordenou que a oração fosse feita com devoção psicológica e alegria especial, até chegar a um êxtase que permitia ao homem entrar em comunicação direta com a divindade. Tornou sua a opinião da Cabala, segundo a qual toda ação humana tem suas repercussões nas esferas do mundo divino e assim o homem pio e justo, o "Tsadik", o ser que chega a despojar-se de todo pensamento material e que vive nada mais que pelo espírito e para o espírito, pode ser suscetível de modificar o curso dos acontecimentos.

Assim como o "hassidismo" teve eminentes defensores como um Dov Beer, Levi Isaac, Josef Ha-Cohen, etc., teve também grande oposição na pessoa do Gaón de Vilna e os "masquilim", isto é, os simpatizantes da cultura moderna.

Seja qual for a crítica que se haja podido fazer ao "hassidismo", este, segundo a opinião de Edmond Fleg, devolveu à alma popular o sentido profundo do divino que a casuística poderia ter lhe feito perder e deu à vida religiosa e social do judaísmo, nos dois últimos séculos, a forma de uma grande originalidade que inspirou a muitos escritores de valor.

Filosofia hassídica é o conjunto de ensinamentos, interpretações do Judaísmo e misticismo articulado pelo moderno movimento hassídico. Ela inclui os elementos religiosos do povo carismático do hassidismo, mas principalmente descreve seu pensamento estruturado, expressado no seu conjunto de teologia à filosofia.

A palavra deriva do hebraico "hesed" ("bondade") e a apelação "hasid" ("temente a Deus") possui uma história no Judaísmo para a pessoa que possui motivos sinceros em servir a Deus e ajudar os outros. Alguns movimentos judaicos atuais também são chamados por este nome, renovação populista do Judaísmo, iniciada pelo Rabbi Israel ben Eliezer (Baal Shem Tov) no século VIII, na Podólia e Volínia (hoje Ucrânia). Seus discípulos mais próximos desenvolveram a filosofia nos primeiros anos do movimento. Da terceira geração, a liderança superior tomou suas diferentes interpretações e dispersou-se através da Europa Oriental, da Polónia, Hungria e România para Lituânia e Rússia.

Atribuem-se ao Baal Shem Tov o poder da cura e vários milagres, sobretudo no confronto com espíritos malignos, os quais ele teria vencido usando como arma a fé e a alegria de viver. O rabino ia de aldeia em aldeia levando o alívio aos doentes e divulgando seus ensinamentos. Afinal reuniu seus seguidores em torno de um corpo doutrinário sistematizado, constituindo o hassidismo como uma disciplina de natureza religiosa.

O elemento central do hassidismo é a devekut, isto é, a união mística com Deus - uma metodologia espiritual que tem como meta libertar o ser humano dos reveses da vida terrena. Seus discípulos pregam que o Homem tem o poder de se desligar dos bens materiais e de tudo o que está relacionado ao mundo, por meio da prece meditativa, o Daven, o qual pode conectar o indivíduo a Deus. O Baal Shem Tov admite a Shekhiná, ou seja, a presença divina em cada vida, como uma prova da compaixão divina pelo ser humano e por todas as suas criaturas.


Sepultura de Menahem Mendel de Kolzk.

Por outro lado, uma das lideranças mais significativas do hassidismo no século XIX, Menahem Mendel de Kotzk, representa a polaridade oposta, pois destaca a revolta diante das imperfeições do Homem e de seus sofrimentos. Sua ira o conduz ao conceito do Tikun Olam, a redenção do Cosmos.

As ideias opostas destes dois ícones do movimento hassídico imprimem nesta corrente a piedade alegre e compadecida, de um lado, e a busca implacável da justiça austera, do outro. O hassid, seguidor dessa esfera mística, está constantemente imbuído da presença do Criador, pois se encontra quase sempre em estado de meditação, a qual não traz em si apenas os típicos lamentos judeus, mas igualmente as melodias que se repetem por um longo tempo e a coreografia hassídica.

A comunidade judaica se beneficiou amplamente do hassidismo, uma vez que ele provocou uma reestruturação extrema da sociedade judaica, reforçando o senso comunitário com base no conceito de uma vivência mística na vida cotidiana. A doutrina hassídica é um tanto complexa, pois se fundamenta no panenteísmo, segundo o qual Deus é a existência de fato, a essência de tudo que há. Em sua versão mais radical, afirma que nada existe a não ser o Criador, e tudo o mais é ilusão.

Não se deve confundir o panenteísmo com o panteísmo, movimento que prega a imanência divina ao Universo e à natureza. Na concepção panenteísta, Deus se revela em cada evento universal, constituindo a realidade última, a única existência consistente. O mundo estaria encoberto por um manto que, uma vez removido, manifestaria tão somente a presença do Criador. Assim sendo, Ele está no interior de cada ser, mas também transcende a criatura, a qual nada mais seria que uma dissimulação do Ser Divino. Portanto, a Divindade atua como uma conexão entre todos os seres, os quais estão interligados em uma alteridade consagrada.

Desta forma, todos podem ser recuperados e alteados, aprimorados de tal forma que podem, assim, voltar ao seio divino. Cada indivíduo tem como papel principal na existência promover esse resgate do outro. Eis porque o hassid não acredita no mal e o vê apenas como uma máscara deturpada do que ainda não foi salvo.


Espíritos Dybbuk, segundo o judaísmo hassídico

No judaísmo hassídico , um dybbuk é um espírito maligno possuidor, acredita-se que seja a alma "deslocada" de uma pessoa morta.


Representação de Dibbuk. 

Dybbuks são almas que escaparam de Geena (um termo hebraico vagamente análogo ao conceito de inferno) ou almas em que a entrada em Geena foi negada por terem cometido uma grave transgressão como o suicídio. A palavra dybbuk é derivada do Hebraico דיבוק e significa "anexo", o dybbuk se "anexa" (possui) ao corpo de uma pessoa viva e habita a sua carne. Segundo a crença, uma alma que foi incapaz de cumprir sua função durante a sua vida é dada outra oportunidade para fazê-la em forma de dybbuk. Ele supostamente deixa o corpo do hospedeiro, uma vez que tenha conseguido seu objetivo, ou em algumas vezes depois de ser "ajudado".

Um ser humano que é possuído por um espírito ou uma criatura de outro mundo é um fenômeno encontrado em uma miríade de culturas e religiões. Judaísmo hassídico chama o espírito que faz com que esta ocorrência rara, mas notável um "dybbuk". Uma dybbuk (pronuncia-se "dih-buk") é o termo para uma alma errante que se anexa a uma pessoa viva e controla o comportamento dessa pessoa para realizar uma tarefa . No entanto, por vezes, ter um dybbuk é uma coisa muito ruim. Rabbi Gershon Winkler vem estudando folclore judaico, espiritualidade e suas raízes xamânicas há mais de 25 anos. Ele tem escrito livros que cobrem a perspectiva judaica sobre fantasmas, aparições, magia e reencarnação, incluindo um livro intitulado Dybbuk . Rabino Winkler disse, "[os judeus] não acredita em possessão demoníaca. Acreditamos que, em ocasiões muito raras, pode haver uma posse de uma pessoa viva pela alma de quem deixou o corpo, mas não o mundo, e eles estão buscando um corpo para possuir para terminar o que eles precisam para terminar." Winkler explicou como histórias de dybbuk nas escrituras antigas. No Antigo Testamento da Bíblia, no Livro de Samuel (18:10), um espírito mau é brevemente descrito como anexando-se ao rei Saul, o primeiro rei eleito chefe das antigas tribos de Israel: "E aconteceu que, no dia seguinte, que o espírito maligno da parte de Deus se apoderou de Saul ...Mais tarde, na Bíblia, no Livro dos Reis, o profeta Elias é possuído pelo espírito de um morto que está tentando fazer com que o profeta engane o Rei em ir para a guerra, quando não era necessário. Winkler disse: "Você tem histórias como essa, que só indiferença mencionar espíritos de pessoas que nos deixaram descer para efetuar alguma mudança, algum fenômeno neste mundo." Rabino Winkler tem uma perspectiva única sobre dybbuk e outros folclores judaico. Embora os tipos de coisas que ele está escrevendo e ensinando sobre não podem ser discutidos na sua sinagoga local, Winkler explica como fantasmas e espíritos são definitivamente parte do Judaísmo.


Os Sheydim, podem ser espíritos bons ou maus.

Winkler disse: "Nossas escrituras e nossa tradição mística está cheia de fantasmas - fantasmas que significa a alma desencarnada ainda vagando. Temos também ensinamentos sobre o que eles chamam em português “Demônios", mas eles não são todos mal - eles são chamados 'sheydim' em hebraico. Há sheydim, bons e maus de acordo com a nossa tradição antiga, sheydim (demônios) são seres como nós somos, assim como os animais são. Eles foram criados no crepúsculo da criação após o ser humano foi criado, logo antes do clímax da criação, de modo que eles são nem deste mundo, nem do outro mundo, mas pouco dos dois. Há ensinamentos sobre como nossos ancestrais, como o rei Salomão se envolveu em demonologia, e ele aprendeu um monte de feitiçaria mistérios do famoso chefe de todos os demônios, Ashmedai.  


Rabbi Gershon Winkler

Como um dybbuk toma posse de uma pessoa? Winkler disse: "O dybbuk é atraído para alguém que está no estado em que sua alma e seu corpo não estão totalmente conectados uns com os outros por causa de grave melancolia, psicose, coisas assim. Onde você não está integrado ela procura uma determinada pessoa que, em sua vida atual está passando pelos mesmos interesses do espírito passou, e assim o espírito que possui é atraída para compatibilidade, a alguém que está lutando com a mesma coisa que fez. Digamos que no meu coração eu tenho um desejo de roubar todas as lojas de conveniência, mas eu não sigo adiante, porque eu não tenho coragem. O espírito de alguém que realmente fez isso será atraído para o meu desejo de fazê-lo e vai me possuir porque somos compatíveis.  Ceder às suas inclinações más não significa necessariamente que você é vítima de um dybbuk. A posse verdadeira tem sinais específicos. Winkler explicou: "Você pode dizer que é real se a pessoa é capaz de falar coisas que eles não seriam capazes de saber. Porque a alma que está neles não está integrado com eles o suficiente para ser sujeito ao tempo, espaço e matéria , eles seriam capazes de dizer coisas que eles normalmente não sabem -., como o que você sonhou na noite passada, o que está acontecendo do outro lado da rua, talvez eles podem até falar uma língua diferente que nunca viu antes " Se este tipo de mau posse toma conta, a solução é exorcismo.

Ritual de exorcismo judaico hassídico

O ritual de exorcismo judeu é realizado por um rabino que tem dominado a Cabala prática. A cerimônia envolve um quorum de 10 pessoas que se reúnem em um círculo em torno da pessoa possuída. O grupo recita o Salmo 91 três vezes, e o rabino sopra o shofar (chifre de carneiro). Rabino Winkler já realizou quatro exorcismos em sua vida até agora. Ele disse: "Nós sopramos o chifre de carneiro de certa maneira, com algumas notas, com efeito de destruir o corpo, por assim dizer. Assim que a alma que está possuindo será abalada soltando-o. Depois de ter sido abalada e solta, podemos começar a se comunicar com ele e pedir-lhe o que deseja. Podemos orar por ele e fazer uma cerimônia para ele para habilitá-lo a se sentir seguro e terminou de forma que ele pode deixar o corpo da pessoa. “O ponto do exorcismo é curar a pessoa que está sendo possuído e o espírito fazendo a possuir”. Este é um contraste gritante com o exorcismo católico que se destina a afastar o espírito de ofensa ou demônio. Winkler disse: Nós não tiramos nada de ninguém o que queremos fazer é curar a alma que é possuída e curar a pessoa. É tudo sobre a cura. Fazemos a cerimônia em nome de ambas às pessoas." Em alguns casos, uma pessoa pode apresentar sinais de dybbuk, mas o problema é puramente psicológico. Rabino Winkler contou uma história do folclore judaico, que teve lugar no século XVIII - na época o primeiro despertador de corda foi inventado. Uma mulher levou sua filha ao seu rabino, porque ela suspeitava de uma dybbuk. O rabino diagnosticou a menina e não encontrou quaisquer sinais reais de posse, ele a mandou para casa com um despertador e disse-lhe para levá-lo ao longo do dia. O rabino disse para a mulher e sua filha que às 4:30 da tarde, o dybbuk deixaria a menina. Às 4:30, a família acreditava que o dybbuk se foi pelo simples choque de ouvir o sino sair exatamente 4:30. Há também um aspecto positivo a um dybbuk. Às vezes, um espírito virá a uma pessoa em um momento de necessidade para ajudar.