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segunda-feira, 30 de junho de 2014

A Vitimização de Professores e a “Alunocracia” na Educação Básica




Tania Maria Scuro Mendes

Juliana Mousquer Torres


            A violência, especialmente na escola pública, faz parte do cotidiano. Hoje, a mesma está presente nas relações pedagógicas alunos-professores. Tendo em vista a realidade descrita, esta pesquisa tem por objetivos: analisar contextos de violência contra professores que atuam na educação básica; investigar quais as reações de professores frente a violências, verbais e/ou físicas, cometidas por alunos; discriminar alternativas apontadas por professores para prevenção e minimização da violência contra docentes; subsidiar a construção de uma legislação que ampare o professor, visando à sua integridade física, psicológica e social. Os sujeitos da pesquisa, aleatoriamente selecionados, são 108 professores que atuam em diferentes escolas e disciplinas nas redes pública e privada de educação básica. O instrumento para coleta de dados é um questionário contendo perguntas abertas e fechadas. A pesquisa é de caráter qualitativo e quantitativo, sendo seus dados submetidos à análise de conteúdos. Como resultados parciais, é possível verificar que os professores são vítimas principalmente de agressões verbais e físicas, bem como de ameaças. Ao se depararem com tais situações, a maioria dos docentes opta por não revidar as agressões, tentando estabelecer diálogos. As escolas, através de suas equipes diretivas, geralmente limitam-se a solicitar a presença de pais ou responsáveis e a efetivar registros de advertência aos alunos que praticam agressões contra professores. Constata-se que 58% desses docentes não se sentem seguros em relação a condições ambientais e psicológicas nos seus contextos de trabalho e 87% não se consideram amparados pela legislação educacional quando se vêem vítimas de agressões encetadas por alunos. Nestas circunstâncias e como conclusão, 89% dos professores gostariam de poder contar com leis que os amparassem no que tange esta problemática.

1 Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética segundo o protocolo 2006-373 H. Os sujeitos que participaram da investigação assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

2 Mestre e Doutora em Educação (UFRGS). Professora na graduação e pós-graduação da Ulbra.

3 Aluna de graduação da Ulbra. Bolsista Voluntária de Iniciação Científica.

            Introduzindo a problemática: a realidade da educação escolar em novos cenários. A educação escolar brasileira tem apresentado gradativas mudanças a partir da Lei 9.394/96, de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que se constitui em uma legislação educacional orientada pela democratização. Na trajetória das transformações operadas na realidade do ensino, podemos evidenciar, entre outras, duas condições de diferenciação dos contextos escolares precedentes: uma de natureza social; outra, legal.

            Assistimos, nas últimas duas décadas, a ampla procura de escolarização pelas classes sociais menos favorecidas, o que tem levado a uma democratização de acesso ao ensino e, concomitantemente, à necessidade de a escola enfrentar o desafio de conciliar problemas sociais. No âmbito legal, temos o Estatuto da Criança e do Adolescente (E.C.A), de 1990, conferindo garantias democráticas de proteção à criança e ao adolescente, bem como os Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), baseados na Constituição Federal de 1988 e na L.D.B. de 1996, que elegem os seguintes princípios para a educação escolar voltada para a plena cidadania:

a) dignidade da pessoa humana.

 b) igualdade de direitos;

c) participação;

d) co-responsabilidade para a vida social.

            Privilegiando essa concepção de educação, os P.C.N.s destacam a ética como um dos temas transversais, a qual é dividida em quatro blocos: respeito mútuo, justiça, diálogo e solidariedade. Assim, novos paradigmas educacionais e comportamentais estão sendo estabelecidos, o que tem reflexo no ambiente das instituições de ensino, especialmente no âmbito das relações entre seus integrantes. Ao par das mudanças sociais e na legislação educacional, amparadas em paradigmas progressistas, verificamos, não obstante, um fluxo de violência que tem invadido as escolas de educação básica, compreendendo diferentes esferas de influência: violência urbana refletida no cotidiano escolar e violência intra-escolar (embora gestada em processos sociais mais amplos), com distintas relações, particularmente aluno(s)-aluno(s) e aluno(s)-professor(es). Embora em nenhum outro momento histórico tenha se amparado tanto a democratização, em nenhum outro período nos deparamos com tantas atitudes e comportamentos de violência nas escolas. A violência, em especial enfoque na escola pública, faz parte do cotidiano. Antes relacionada ao entorno da instituição escolar, enquanto fatores externos a ela; em seguida, trazida para os meandros das relações sociais estabelecidas na escola; agora, a violência está presente nas relações pedagógicas alunos-professores. Esse fenômeno social vem sendo destacado em depoimentos de docentes, artigos de revistas e periódicos, manchetes de jornais, pesquisas nacionais e de órgãos internacionais – como a UNESCO.


             Como salientam Valadarez e Pedral (2006), nunca se falou tanto na necessidade de pôr limites e nunca se praticou tão pouco. Perguntam sobre que feitiço é esse que deixa pais e mães [e, por que não, professores e professoras] inertes diante de crianças e adolescentes tiranos que se identificam, subjetivamente, com ditadores mirins e juvenis, o que pode ser levado para diferentes etapas da vida e para distintos contextos de interações sociais. Nesses primeiros anos do século XXI, na visão de Abramovay e Ruas (2002), tudo indica que não pára de crescer a necessidade da eleição desse objeto de estudo que apresenta a escola como seu campo de pesquisa, visando a desenvolver um debate em que a relação aluno-professor é a protagonista. Já não basta o diagnóstico das situações de violência encetadas na direção alunos-professores; precisamos enfrentar esse problema que afeta a realidade escolar da educação básica brasileira. Por ser a violência um objeto complexo de pesquisa, uma vez que é múltipla e multifacetada, sendo também várias as formas como ela se manifesta no nível interpessoal aluno-professor, carece de olhares investigativos analíticos e acurados que pormenorizem seus movimentos de constituição, solicitando, como sustentam Oliveira et all (2005), uma abordagem transdisciplinar no sentido de que, além de estabelecer interfaces entre áreas de conhecimento, atravesse campos de estudo espiralando ações teórico-práticas voltadas à transformação da realidade emquestão.

            As manifestações violentas, como explica Rondelli (2000), passam a ser consumidas como produto mediático, o que contribui para a formulação de suas diversas representações sociais, ao mesmo tempo em que delas são constituintes. Importa problematizarmos tais representações, buscando, junto aos professores vitimizados simbólica, verbal e fisicamente, dados significativos que possibilitem construir alternativas para ultrapassar o âmbito do diagnóstico. A relevância social dessa investigação está articulada com a possibilidade de apontar condições que possam ser trabalhadas pelas políticas públicas, bem como pelas personagens envolvidas no cenário escolar atual.

            A vitimização de professores As inferências até então destacadas são respaldadas nos recursos prévios dessa investigação, quais sejam: a) depoimentos de alunos de graduação e que atuam como professores na educação básica das redes pública e privada de ensino, os quais têm, reiteradamente, feito alusão e voltado seus interesses a essa área; b) em notícias da mídia impressa veiculadas nos últimos três anos. Importa destacarmos dois dos projetos de pesquisa realizados por esses alunos e, em seguida, algumas das reportagens que circularam na imprensa escrita. Nogueira et all (2006), em pesquisa empírica realizada com professores sobre o que eles pensam sobre as mudanças na legislação ocorridas na década de 90, verificaram que 67% dizem que, apesar de positivas, comportam algo negativo, pois, na década de 60, liberdade significava luta política para transformar a sociedade. Atualmente, liberdade significa fazer o que se quer na hora que quiser, o que está gerando, do ponto de vista dos entrevistados, um individualismo exacerbado. Podemos complementar, dizendo que tal individualismo pode estar fundamentado na ideologia neoliberal que sustenta o paradigma do darwinismo social. Outro projeto desenvolvido na graduação, conforme SANTOS et all (2006), problematiza que as agressões verbais e físicas contra o professor está no cotidiano escolar e que, ainda que registradas em manchetes de jornais que vêm apresentando mais de um caso de violência escolar por semana, tais notícias não têm sido veiculadas, concomitantemente. na imprensa falada (rádio e televisão). Vêem a necessidade dessa realidade ser mostrada e de o assunto ser debatido pela sociedade, o que requer a análise, entre outros, de fenômenos sócio-psicológicos como: mudança do conceito de núcleo familiar, alimentação social do sentimento de potência do adolescente que tem necessidade de mostrar que não tem medo e que tudo pode, pois não dá nada, e a influência da mídia.
Outros subsídios que contribuíram para o olhar reflexivo que engendrou essa investigação foram reportagens, recentemente publicadas, que tem situado o professor como alvo de agressões de alunos. Vamos a algumas delas:  Zieger (2006) afirma textualmente: na escola, educadores ouvem palavrões, levam tapas, escutam “sou de menor, e tu não pode fazer nada comigo” e se sentem impotentes diante desse quadro de dor, desrespeito e indisciplina. A professora não pode responder, não pode punir, não pode... Segundo a mesma autora, o Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe muitas conquistas, mas sua errônea interpretação tem nos jogado numa avalanche de impunidade.

            As reportagens ressaltam que, em função de episódios de ofensa, ameaça e agressão, cometidas por crianças e adolescentes, estarem sendo levados às delegacias, a percepção de sindicatos e de professores, como noticiado, é de que a multiplicação dos ataques – antes verbais e, agora, físicos – nos últimos três anos, tem sido mais precoces, ocasionados ainda na educação infantil, o que tem instaurado um clima de terror nos ambientes escolares. São registrados alguns números:

- 51% dos professores e dos funcionários de escolas da Capital [gaúcha]
relataram desrespeito com profissionais, segundo pesquisa da UNESCO entre
2000 e 2002;

.- o desrespeito por parte dos alunos foi a segunda principal razão para não se
seguir a carreira de professor, conforme pesquisa da Associação dos
Supervisores de Educação do Estado;

- Segundo o CPERGS, 40% dos casos de licença-saúde dos professores
estaduais são por problemas psicológicos.

Encontramos no Jornal Zero Hora, de 25 de junho de 2006:

            Autoridades do Judiciário estão alarmadas com o número crescente de episódios de violência escolar levados às delegacias de polícia (...) a resposta do sistema judicial para o drama da violência em sala de aula é a Justiça Restaurativa, um novo procedimento por meio do qual os conflitos são resolvidos mediante diálogo e acordo. Infrator e vítima [no caso, o professor são chamados para expressar seus sentimentos em relação ao que ocorreu e estabelecem compromissos, como mudança de comportamento e prestação de serviços à comunidade. Esse acordo é proposto pelo juiz em substituição à sentença (...) Apenas em 10% dos episódios violentos os envolvidos aceitam participar dos círculos restaurativos. A partir dessas abordagens, sobrevém pontos de interrogação ancorados em uma visão pedagógica:

- A democratização da educação, amparada na concepção progressista, tem relação com o comportamento dos alunos para com os professores?

- Qual o conceito de professor que está sendo construído no cotidiano escolar?

- Quais os deveres e direitos dos professores no atual contexto cultural?

- O Estatuto da Criança e do Adolescente, que não estipula penalidade por agressão ao professor, influenciou a relação professor-aluno, contribuindo para a formação de uma cultura de violência no ambiente escolar?

- O que significa ser professor antes e depois do E.C.A?

- Estaria se instaurando, paulatina e progressivamente, a ditadura do alunado contra o estatuto da autoridade docente?

Muitas outras indagações podem acirrar o debate educacional em torno desse objeto de investigação. Por ora, são essas interrogações que irão guinchar o roteiro da relação teórico-prática que subsidiará a nossa análise.


A trama teórica tecida para este estudo

            O cotidiano violento das escolas está fazendo do magistério, em certas instâncias e circunstâncias, uma profissão de risco. Porém, convém frisarmos que esse risco é fabricado para além dos fios delicados que atam as relações interpessoais no contexto escolar. Para entendê-lo, precisamos resgatar a tessitura que o engendra. Rastreando, ainda que brevemente, o significado de violência na esfera jurídica, nos campos da filosofia, da sociologia, da psicologia, e sua diferenciação de agressão, FANTE (2006) pondera que se constituem em termos bastante polissêmicos. Diante dessa constatação, evidencia que:

(...) podemos sintetizar o fenômeno da violência, reportando-nos os livro Mapa
da Violência: os jovens do Brasil, escrito pelo Coordenador do Desenvolvimento Social da UNESCO Brasil, Jacobo Waiselfisz, quando diz que os atos de violência apresentam-se hoje na consciência social não apenas como crimes, homicídios, roubos ou delinqüência, mas nas relações familiares,
nas relações de gênero, na escola e nos diversos aspectos da vida social. Portanto, o autor não se refere à violência apenas na sua manifestação física,
mas também quanto às situações de humilhação, exclusão, ameaças, desrespeito, indiferença, omissão para com o outro. A violência, hoje, está estritamente ligada ao conceito de alteridade, expressando-se nas formas e mecanismos pelos quais a sociedade convive com as diferenças. (p. 156) No que tange a agressão, a autora (op. cit.) declara que esse termo também é empregado em situações e sentidos diferentes. Sem desconsiderar distintas definições dadas por renomados autores, sublinha que, para a Associação Norte-Americana O E.C.A, no seu artigo 53, coloca o direito da criança e do adolescente de ser respeitado por seus educadores.

            Psiquiatria, a agressão diz respeito a comportamento repetitivo e persistente que, tendo em vista a confrontação da vítima, viola seus direitos. A violência e a agressão, imbricadas nos contornos contextuais, definem-se como fenômenos culturais e históricos motivadores de representações sociais. Na acepção de Castel (1998), estamos assistindo a uma ruptura dos laços sociais que provocam desfiliação nas relações de alteridade e dilaceram o vínculo entre o eu e o outro. A escola, como instituição socializadora, é um lócus de ruptura desses laços, pois vive um processo de ineficiência do controle social, sendo que a violência constitui-se, conforme sublinha Tavares dos Santos (1995), como um ato de excesso, qualitativamente distinto, presente no exercício de cada relação de poder articulado nas produções do social. Essa perspectiva remete-nos a uma pluralidade de sentidos. Dentre eles, a violência como dispositivo que, na percepção de Deleuze (1989), é composta por distintas linhas e realizações que rompem com a filosofia do sujeito, da consciência, para, conforme ilumina o mesmo autor (1992), a constituição da filosofia do acontecimento e da multiplicidade que se evidencia no “entre dois”, no intermezzo. Precisamos, desse modo, fazer rizomas, conexões, para compreendermos o acontecimento da violência que vai além do sujeito violento, pois que, nas palavras de Deleuze (1995 e 1998), implica modos de subjetivação coletiva. Alinhavando essa explicação, podemos trazer a contribuição de Bourdieu (1998), que explicita que uma violência é sempre antecedida ou justificada por uma violência simbólica que ocorre através de uma subjetivação pelos agentes sociais envolvidos na relação, onde, podemos aludir, a agressão é subliminar. Por exemplo, a prescrição de estigmas é uma das formas de violência simbólica, o que implica a imagem veiculada nas relações sociais e o que, por sua vez, implica a significativa solidariedade entre o fenômeno da violência e suas representações sociais, ainda que no âmbito da violência inter-pessoal. A discussão acerca da construção social da violência demanda, ainda, como expressa Foucault (1979), uma rede de poderes que permeia as relações sociais, envolvendo grupos, classes, categorias sociais, gêneros, etnias, produzindo uma microfísica do poder e um dano social mediante o uso da coerção ou da força. Esse contexto desembocaria, na visão de Santos (2006), na microfísica da violência, e a escola, como um dos cenários da violência social, constituir-se-ia como uma microestrutura de poder. Para tentarmos entender como tais microestruturas, através das quais perpassam representações sociais, estariam funcionando, e em razão de quê, podemos buscar algumas explicações veiculadas em reportagens de revistas, também publicadas recentemente. Vamos a algumas delas, retomando as idéias expressas por seus autores. Benicini (2005) explica que, na década de 80, a formação e organização de sindicatos dos professores e a pulverização de idéias de educação popular, segundo as teorias pedagógicas progressistas, fizeram com que a disciplina não fosse vista de forma mais tão rígida, o que provocou uma relação professor-aluno mais próxima. Já nos anos 2000, a educação estendida a todas as classes sociais e a ampla procura de escolarização exigem do professor uma nova postura, pois que este precisa enfrentar problemas de aprendizagem, violência, diferenças culturais, nem sempre resolvidos a contento, considerando que, comumente, não foi preparado, na formação profissional, para o enfrentamento das novas demandas de tais realidades. Ao mesmo tempo, a tecnologia presente na escola e os ambientes virtuais de aprendizagem passam a colocar em xeque
o papel do professor. Tais aspectos, correlacionados, produzem a desvalorização do professor num processo de subjetivação coletiva alimentada por representações sociais.

            Zagury (2006), por sua vez, aponta que, em concepções educativas anteriores, se o aluno não aprendia, a culpa era dele; atualmente, se o aluno não aprende, a culpa é do professor. Diferentemente das décadas anteriores, quando era prerrogativa do professor privilegiar o conhecimento (ou, não raro, tão somente a informação), na atualidade, que tem sido referendada por pesquisas na área, os professores têm destacado cinco principais problemas concernentes a suas ações em sala de aula: manter a disciplina 22%; motivar os alunos – 21%; avaliar de forma adequada – 19%; manter-se atualizado – 16%; metodologia adequada – 10%. A autora conclui, afirmando que o magistério é uma das profissões que mais acumulou funções nos últimos anos. Nas entrelinhas desses dados, podemos ler: a sociedade tem representado o professor como o substituto do lar, da babá, da creche (escola de educação infantil). Assim, cai em descrédito o provérbio insistentemente declarado por professores: “educação vem de casa”, até porque, na vertente interpretativa da mudança Segundo o autor, a disseminação da violência tem o contributo dos meios de comunicação de massa, especialmente a televisão que, pretendendo ser um instrumento de registro, constitui-se como instrumento de criação da realidade. Paradigmática da educação dos filhos, muitos pais têm revelado tolerância excessiva [quando se posicionam, por exemplo, como advogados daqueles]. Del Claro e Briza (2005) destacam, além deste, outros motivos de agressividade de crianças e adolescentes: o excesso de energia mal canalizada e dificuldade de reconhecer os próprios controles, o que tem sido fortalecido pelo entorno da escola, especialmente pela mídia, nada desprezível catalisadora e construtora de representações sociais. A mídia, na visão de Madeira (1999), exerce forte influência sobre os educandos, pois cria ou fortalece um clima de naturalização, mostrando processos de banalização da violência. Nos espaços escolares, como pondera o mesmo autor, a ação da violência, expressando-se pelos conflitos, é direta e perversa, repercutindo sobre as atividades pedagógicas.


             Acrescentamos a essa tessitura a visão de que o ato educativo está sendo banalizado pelas políticas neoliberais que tem delegado a responsabilidade da educação para setores civis da sociedade. Para Severino (1997), a política para a educação no contexto neoliberal, expressa na Lei 9.394/96 (L.D.B. em vigor), visa à substituição do aparelho do Estado pela sociedade civil mediante a permuta da regulação da administração política pelas leis do mercado, o que implica a concorrência entre grupos e seus interesses particulares que abrem mão de um projeto, inclusive de educação nacional, que retrate as necessidades da sociedade. Isso tem gerado, na nossa perspectiva, uma mudança social do que significa educação formal e tem colocado as escolas em descrédito com as expectativas de parcela da sociedade que ainda a vê com o enfoque assistencialista. Todos esses aspectos, engendrados pelas representações sociais e articulados de modos diferenciados em cada contexto, provocam mudanças de paradigmas sócioeducacionais. Se é difícil avaliar as transformações da imagem de professor (como operário do ensino?), podemos, no entanto, dizer que o respeito e o reconhecimento do professor pelo aluno tem mudado radicalmente, quadro esse que, como dissemos, começa a chamar a atenção de órgãos internacionais.

            A UNESCO – Órgão das Nações Unidas para educação e cultura – tem
analisado o fenômeno da violência nas escolas do Brasil e, em uma pesquisa sobre vitimização realizada em 2003, com 2.400 professores, de seis capitais brasileiras (São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Porto Alegre, Belém e Distrito Federal) mostra que 86% desses professores admitem haver violência em seus ambientes de trabalho. A então coordenadora da pesquisa da UNESCO, Miriam Abramovay, explica que a violência conseguiu impor a sua lei do silêncio. Segundo ela, a violência está nos dados: 61,2% dos professores, sujeitos da investigação, afirmam não saber se há tráfego de drogas na escola; 53,2% dizem não saber se gangues atuam na escola. A mesma coordenadora diz:
(...) todo o problema do fracasso escolar vem não só da qualidade do ensino, mas também daquilo que ocorre no cotidiano escolar. (...) a escola não está organizada nem preparada para receber a população que passou a freqüentá-la com a democratização do ensino (...) a violência também aumenta na medida em que o ensino se democratizou e a escola de hoje não tem mecanismos de resolução de conflitos. (Jornal da Ciência, de 6/7/2006, p. 2)
Uma das professoras entrevistadas na pesquisa da UNESCO alega que um dos motivos da vitimização dos professores foi a implantação da progressão continuada, pois os alunos perderam o receio de ser reprovados e, com isso, não há o menor respeito pelo professor. Em outra pesquisa engendrada pela problemática da violência na escola, Campos et al (2005) encontraram nos dados coletados um destaque para a violência cometida pelos alunos, ressaltando-se a agressão física, o desrespeito, a agressão verbal, os danos em geral causados à escola e/ou aos que nela convivem. É nesse clima que professores são ameaçados e agredidos no exercício de sua profissão! Vêem a docência em situação de desgaste e desvalorização que perpassam as relações pedagógicas influenciadas por representações sociais, vendo-se, ao mesmo tempo, como reféns de um processo legal que confere, do nosso ponto de vista, direitos desproporcionais na relação aluno-professor. A alunocracia na educação básica: a teoria da curvatura da vara revisitada De um lado, verificamos um avanço da democracia e do respeito aos direitos humanos. Mas, de outro, temos a impressão de que as relações interpessoais estão mais violentas, instrumentais, pautadas num individualismo primário, num hedonismo, também primário, numa busca desesperada por emoções fortes, mesmo que provenham da desgraça alheia. (Taille, 2000).

            Relendo Escola e Democracia, de Saviani (2000), que atenta sobre a teoria da Curvatura da Vara, inspirada em Lênin, revejo a tese de como, quando mais se falou em democracia no interior da escola, menos democrática foi a escola (p. 36). No contexto interativo escolar, podemos nos defrontar com realidades que oscilam entre os extremos: repressão e falta de limites De um lado, tínhamos, há até poucas décadas, a autoridade nas mãos do professor, o que curvava os alunos à resignação. De outro lado, temos, atualmente, representações sociais que desvirtuam princípios legais e que tem gerado o absolutismo e a ditadura dos alunos: a alunocracia. Essa oscilação, elucidada por Hobsbawn (1994) que disserta sobre a Era dos Extremos, é marcada, entre outros aspectos, pela mundialização de questões sociais manifestada, de formas simultâneas, em diferentes sociedades. Talvez isso contribua para compreendermos porque a tendência do que estamos nomeando como Alunocracia esteja se evidenciando em diferentes contextos culturais.

Onde estaria o meio termo?...

            Precisamos aprender a contrabalançar esses extremos, pois, nas palavras de Zieger (2006): a violência na família e na escola gera violência social. Mas não podemos cair no lado oposto da moeda: falta de limites e impunidade também geram violência e caos. O caminho do meio, caracterizado pela moderação, é o mais plausível e o mais difícil de ser percorrido. È muito complexo ser realmente democrático, tanto para professores, quanto para alunos. Esta aprendizagem implica diferentes patamares cognitivos e de julgamento moral, transitando da anomia à heteronomia e desta à autonomia, processo que envolve uma construção que, conforme salientam Coll et all (2000), para além de conhecimentos conceituais e procedimentais, requer conhecimentos atitudinais. Poder-se-ia pensar que o problema é gerado pelo professor, enquanto réu que desenvolveria metodologias e avaliações inadequadas e descontextualizadas das realidades dos alunos. No entanto, aqueles considerados professores competentes também têm sido alvos em práticas de violência verbal e física assistidas no convívio escolar. Assim, segundo Fante:
(...) a intolerância, a ausência de parâmetros que orientem a convivência pacífica e a falta de habilidade para resolver os conflitos, são algumas das principais dificuldades detectadas no ambiente escolar. Atualmente, a matéria mais difícil da escola não é a matemática ou a biologia; a convivência, para muitos alunos e de todas as séries, talvez seja a matéria mais difícil de ser aprendida. (2005, p. 91).

            Resta-nos indagar: temos, como professores, sido referenciais de tolerância, não a excessiva, mas aquela que educa, holisticamente, o ser humano? Temos aproveitado os exemplos de violência para trabalhos pedagógicos convergentes a abordagens sociais? Já não podemos aceitar, passivamente, a banalização da violência; precisamos problematizá-la e trazer à reflexão seus meandros, porque, buscando eco nas palavras de Brecht apud Dreher (2002 p. 1), é fácil saber o que é certo longe do tiro. Os conflitos de paradigmas, experimentados em nossos dias, podem abrir novas possibilidades de interações. Para tanto, precisam ser problematizados, discutidos, analisados, reconstruídos sobre um novo patamar conceitual e pedagógico. Saviani (2000), amparado em Foucault (1979), alenta-nos quando diz que as pequenas revoluções que acontecem em sala de aula, compatíveis à ruptura ou quebra de paradigmas, podem dar a chance de uma transformação histórica. Elas acontecerão, de forma benéfica ou não, queiramos ou não. Se penetrarmos no movimento dialético da vida social, podemos aprender com equívocos e impasses. Mas precisamos fazê-lo. É o que nos propomos nesta pesquisa projetada para além de seu relato! E, como iniciamos esse tópico com um pensamento, também o encerramos com outro, alumiando nossas projeções. Um dia você aprende que (...) ou você controla seus atos ou eles o controlarão, e que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, sempre existem dois lados Aprende que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências. Aprende que paciência requer muita prática. (...) William Shakespeare.

Tendo em vista a realidade descrita e as interfaces empírico-teórico-reflexiva,
cabe-nos transitar pelo caminho investigativo que aponta para o seguinte horizonte, traduzido como objetivos desta pesquisa:

- Analisar contextos de violência contra professores que atuam na educação
básica, discriminando os tipos de ações violentas evidenciadas no cotidiano do
ambiente escolar;

- Investigar quais as reações de professores de educação básica frente a violências, verbais e/ou físicas, cometidas por alunos;

- Discriminar alternativas apontadas por professores para prevenção e
minimização da violência contra docentes no contexto escolar;

- Subsidiar a construção de uma legislação que ampare o professor no exercício de sua profissão, visando à sua integridade física, psicológica e social. Revisitando o caminho metodológico da investigação A pesquisa tem como campo empírico dez escolas de educação básica das redes pública e privada de ensino da grande Porto Alegre – RS.

Os sujeitos da pesquisa são professores que atuam nas distintas disciplinas do currículo escolar da educação básica. A amostra é constituída por 200 professores, selecionados aleatoriamente a partir de contatos com as direções das escolas. Em termos especialmente qualitativos, pensamos à época que este é um valor que se apresenta considerável, possibilitando análises diversificadas. Todavia, participaram efetivamente da investigação 108 professores, os quais responderam ao instrumento da pesquisa. Os dados foram obtidos através de questionários com perguntas abertas e fechadas e, quando necessário, mediante depoimentos de professores nos locais de atuação profissional dos mesmos, visando a compreender o lugar, objetivamente existente e subjetivamente representado, da violência nas relações sociais estabelecidas na direção alunos-professores. A análise de dados, de caráter qualitativo e quantitativo, tem como suporte a metodologia de Análise de Conteúdos, proposta por Bardin (1986). Objetivando obter, por descrição e classificação dos conteúdos das mensagens, indicadores que possibilitem inferências relativas às condições e relações entre os dados coletados, procedeu-se à Análise Temática, que se apresenta como uma subdivisão da Análise de Conteúdos. Cabe-nos sublinhar, por fim, que, para darmos conta dessa problemática, importa estabelecermos uma interface entre estudos culturais, psicologia e educação, 6 Os sujeitos da pesquisa assinaram Termo de Consentimento Livre e Esclarecido nas escolas onde desenvolvem suas atuações docentes.

            Cujos aportes alinhavarão a teia de relações teórico-práticas a serem pautadas, tendo presente a função social que uma pesquisa precisa assumir.
Ajustando o foco para a análise de dados Convém sublinharmos, conforme o registro anterior: dos duzentos questionários enviados a dez escolas, tivemos o retorno de 108 devidamente respondidos. Para compreendermos as declarações dos professores que se constituem em sujeitos desta investigação, vamos, inicialmente, a alguns dados numéricos. A maior freqüência de idades desses sujeitos está entre trinta e cinqüenta anos (75 sujeitos). A maioria (60 sujeitos) tem ensino superior completo e apenas 10 sujeitos tem apenas o curso Normal de ensino médio. A maior quantidade de sujeitos (38) tem entre cinco e dez anos de profissão. O nível de ensino em que mais atuam é de quinto a oitavos anos de ensino fundamental (54 sujeitos). Questionados sobre, se durante o desenvolvimento de suas ações profissionais como docentes, em alguma ocasião, viram-se vitimados, 58 professores respondem que sofreram agressão verbal; 36 foram vítimas de ameaças e 14 foram acometidos por agressão física. Diante de agressões verbais, ameaças e agressões físicas praticadas por alunos, 53 professores afirmam que se retiraram da sala de aula para buscar auxílio com a equipe diretiva; 38 procuraram não revidar; 17 sentiram-se acuados, pois, segundo eles, “a lei protege o aluno”. A partir desses dados preliminares, analisemos em que condições o processo de vitimização de professores geralmente tem acontecido. As principais situações (31) em que se desenvolveram episódios de agressão, dos tipos acima especificados, ocorreram, segundo os sujeitos da investigação, devido à chamada de atenção pelo professor. São vários os protocolos que ilustram o que se caracteriza como o chamar a atenção do aluno. Vamos a alguns exemplos: O aluno não queria fazer a atividade proposta e ele partiu para cima como quem vai para uma briga. A minha reação na hora foi de me defender e mostrei para ele que não iria adiantar talatitude.

            Chamei a atenção do aluno e ele levantou-se, pegou uma vassoura e correu atrás de mim. Eu saí da sala.  As respostas dos professores foram transcritas na íntegra, conforme fornecidas pelos mesmos, constituindo-se em protocolos. Apesar da agressão física iminente, essa não chegou a se concretizar, convergindo ao plano de ameaça de ações interrompidas, no primeiro caso pela reação da professora e, no segundo caso, pela fuga da situação de risco ou de perigo. Contudo, a agressão verbal, por vezes, é acompanhada de ameaças explícitas, como as que seguem descritas nesses protocolos: Ao ser advertido por mau comportamento, o aluno ameaçou-me com palavras de baixo calão e que sua gangue poderia me pegar na rua. O aluno estava atrapalhando a aula com piadas, fui chamar sua atenção e ele me disse palavrões e que me apagaria na saída. Embora admitamos a seriedade dos contextos de vitimização de professores até então descritos, nada mais grave do que as situações sintetizadas nas seguintes declarações: Chamei a atenção do aluno que não deixava os colegas participarem da aula. Respondeu-me que eu era uma...[palavrão[ e que não mandava nele. A seguir, atirou uma pedra pequena que tinha no bolso, acertando-me nos óculos, protegendo dessa forma o olho que seria atingido em cheio. Chamei a atenção do aluno. Ele me agrediu fisicamente com uma cadeira. Consegui acalmá-lo e contornar a situação sem envolver a direção. O aluno parou atrás de mim. Golpeou-me com um chute e um empurrão. Ao ser repreendido, o aluno empurrou a mesa sobre mim. Ainda que esta pesquisa não tenha como foco analisar quem são os sujeitos que praticaram tais atos, os ambientes físicos e sociais nos quais interagem, bem como seus processos de constituição psicossociais, não podemos desconsiderar que são efetivamente agressores. Diante dessas circunstâncias, a docência pode ser facilmentelocalizada como profissão de risco.

            Subjacentes a esses dados, podemos questionar as funções e a própria figura do professor enquanto autoridade (e não necessariamente com um papel autoritário). O que, há algum tempo, era prerrogativa do professor, em termos de estabelecimento de um clima de organização e respeito em sala de aula, parece, do ponto de vista de alguns alunos, ser excesso de autoridade e motivo de enfrentamento. A falta de limites, em relação ao que pode ou deve ser realizado no ambiente de sala de aula também foi apontada por professores  como propulsora de agressões a eles dirigidas, os quais salientam, entre outros aspectos: Não gostam de cumprir normas estabelecidas. Acabam tendo atitudes inesperadas e agressivas. No momento em que o professor estava expondo o conteúdo, alguns alunos circulavam pela sala de aula, sem dar a mínima atenção ao contexto escolar. Há situações em que a falta de limites è aliada a insultos que invadem a esfera pessoal do professor: O aluno fez piada com os meus cabelos. Disse que na casa dele havia panelas para limpar. Defrontando-se com essas condições, uma professora argumenta: Muitos alunos falam palavrões em sala de aula. Escrevem em classes e paredes, ofendendo professores. Riscam os carros no estacionamento. Debocham de nós, nos desprezam.

            É como se nós tivéssemos direito de conquistar nada: um carro, uma casa, férias, uma viagem, um objeto bonito. Professoras que vêm bem arrumadas para a escola são motivo de chacota e fofocas dos alunos. Os jovens não respeitam seus pais, por que respeitariam a nós? Ousando adentrarmos no âmago dessas relações pedagógicas, podemos vislumbrar que os alunos podem estar reagindo a duas condições que são observadas nas escolas atuais: ausência dos pais ou excesso de permissividade no processo educativo dos filhos, o que se reflete nos comportamentos nos ambientes escolares, e a abordagem legal e pedagógica da avaliação, o que acaba repercutindo no valor atribuído à mesma por alguns alunos, conforme podemos inferir mediante a afirmação que segue: Durante a atividade, o aluno referiu-se a minha pessoa dessa forma: “não faço. Meu pai paga o seu salário. Sei que não vou rodar. Estou aqui porque fui obrigado. Nem em casa eu faço e ninguém vai me obrigar.” As situações de avaliação, especificamente, também são destacadas (em 18 casos) como desencadeantes de situações de agressões encetadas a professores. Ao receber uma avaliação a ser realizada, o aluno dirigiu-se a mim com insultos graves por achar que o teste estava muito difícil. O aluno não teve paciência para esperar e esclarecer o erro da nota e disse que ia esfregar o caderno na minha cara. A exemplo do que ocorre com a categoria relativa à chamada de atenção e á falta de limites, as situações de avaliação apresentam-se mescladas com ameaça de alunos: Após surpreendê-lo em uma prova, o adverti e falei que tiraria a sua prova. Nesse momento, ele me ameaçou, dizendo que algo poderia me acontecer. Anunciei uma nota vermelha e fui ameaçada de morte. O aluno tinha uma gangue. O aluno me enfrentou por discordar da cobrança de uma atividade a ser avaliada e desrespeitou-me, dizendo que pertenciam a determinado grupo “gangue”. Quase me bateu em frente da turma. O tom das ameaças, longe de ser ameno, vem carregado de sentimentos de vingança. O professor é trazido, do ponto de vista desses alunos, aos seus mesmos patamares. Conhecimentos, experiências, maturidade de adulto, profissão ... nada, dos seus lugares de alunos, os diferencia no sentido de bloquear ou frear tais agressões. Os limites dessas diferenças parecem cair, sem auto-censura, diante do poder das ameaças.

            Mas essas tentativas de desconstrução de intervenções pedagógicas não se restringe à relação professor-aluno, manifestando-se também nas interrelações aluno(s)-aluno(s). Nessa ótica, mais uma vez o professor não se desvencilia de possíveis conseqüências. Exemplificando, houve casos (4) em que as agressões físicas sofridas por professores ocorreram em função de separação de brigas entre alunos: A agressão física foi separando briga entre alunos. Não gostaram e resolveram bater também em mim. O aluno agredindo outro colega e fui tentar separar a briga e levei nesse momento um chute na perna. A criança agrediu um colega e não quis sentar-se com a professora, pois ficaria sem brincar até que conversasse sobre o assunto. Então o aluno começou a me chutar. Os comportamentos descritos acima parecem se referir somente a alunos de educação infantil e primeiros anos do ensino fundamental. Contudo, como explicado no início desta análise, a maior incidência de agressões dá-se entre o quinto e oitavo anos desse nível de ensino e, portanto, quando os alunos estão no início da adolescência. Como deixarmos de perguntar: esses adolescentes são afetiva, cognitiva e socialmente imaturos? Se assim forem, por que tais condutas assim se apresentam? Quais as intervenções educativas para superá-las? Essas perguntas são importantes, especialmente se considerarmos as duas colocações alçadas a seguir. A primeira diz respeito a que outras categorias, com menor incidência de casos, foram encontradas, tais como: agressão verbal por parte de mãe de aluno; ameaça verbal de mãe de aluno; dano patrimonial; agressão declarada em Orkut8; não aceite de resultado de avaliação pelo pai; ameaça de morte por amigos do aluno. A segunda colocação refere-se às providências tomadas pelas escolas em relação à vitimização de professores, as quais têm se encaminhado, geralmente (35 casos), para a solicitação de presença dos pais nas mesmas. Resta-nos indagar: solicitar a presença dos pais para se correr o risco de novas agressões? A escola chamou o responsável do aluno que começou a briga. O pai dele veio buscá-lo. Ao sair da sala, o pai do garoto começou a dar tapas no menino, batendo e gritando com ele. Pedi [a professora] que parasse, e o pai me xingou e disse que se protegesse o filho, eu é que precisava apanhar pra aprender a ter autoridade. No mais, nada foi feito. Na contrabalança da cena anterior, há episódios em que os pais, como anunciado na revisão de literatura pertinente, advogam pelos filhos, ou ainda, utilizam serviços de um advogado.
(...) o pai compareceu com um advogado. Este, ao ver tudo documentado, recusou-se a levar adiante. Quando o profissional contratado para defesa do aluno tem lucidez e compreende a posição do professor, a situação está salva (do ponto de vista deste, é claro!). Mas, quando o profissional tem interesse em polemizar ou está motivado pela questão econômica, o processo judicial torna-se inevitável. Vale ressaltar que várias, escolas, geralmente privadas, bem como professores, apesar desse dado não ter sido constatado nesta investigação, têm respondido a processos judiciais, conforme vem se noticiando de modos formais e informais. A repercussão imediata disso é que, em se tratando de escolas particulares, os professores de vítimas podem passar a ser réus: Na escola pública chamamos os pais e os colegas auxiliam. Já na particular, a supervisão diz que a professora não é criativa. A culpa é da aula que não envolve. É provável que seja por isso que os professores reclamam que, não raro, resta:

            Alguns alunos, utilizando o Orkut, diziam que queriam explodir a escola e falavam obscenidades sobre os professores. Neste caso, a escola os processou e não aconteceu nada. Convocar os pais, encaminhar para avaliação, aguardar as providências que, às vezes, não ocorrem por vários motivos. Interagindo nesse cenário, outros professores preferem não levar o caso adiante, estabelecer diálogos com os agressores. Assim justificam tal postura:
Encaminhamento para o SOE. Conversa com a família e psicóloga. Estabelecer vínculos com o aluno, com a família e fazer contratos verbais em momentos de calma. O diálogo, na visão de professores, permite ainda o restabelecimento do vínculo social e das regras que o permeiam. Através de diálogo foram reiteradas questões como respeito e regras de convivência. Além dessa intervenção pedagógica, a advertência ao aluno também se constitui em ação realizada pela escola, o que é verificado em sete delas. No entanto, de modo geral, os professores a consideram insuficiente. “ Somente” uma advertência verbal. A escola apenas advertiu o aluno e registrou ocorrência;. Disse que iria encaminhar o aluno para o Conselho Tutelar. Nada mais aconteceu em relação ao problema. O aluno continuou aprontando. Todavia, o que chama a nossa atenção é que oito escolas não tomaram nenhuma providência em relação às situações ocorridas. Não é por causas escusas que alguns professores afirmam sentirem-se solitários e acuados frente a agressões e, por vezes, insultos e humilhações. Levei o aluno para a sala do SOE que não fez nada, pois a mãe do menino era muito agressiva e poderia agredir o filho fisicamente. A escola, na verdade, não tomou providência alguma. Eu o suspendi das aulas práticas, ficando ele durante as minhas aulas a cargo da direção. Além dessas circunstâncias, foram encontradas outras tais como: registro de ocorrência policial (4 casos); situação de reciprocidade onde as professoras revidaram as ameaças (2 casos); institucionalização (1 caso). Apesar disso, uma pessoa desabafa:

 “A escola não pode fazer nada além de registrar os fatos, conversar com os alunos e, em alguns casos, exigir que o aluno freqüente a escola.”

            No que se refere ao que o professor faz diante de uma ameaça, agressão física ou agressão verbal praticada por um aluno, os comportamentos dos professores coincidem com os adotados pelas escolas através de suas equipes diretivas, pois 16 professores alegam que dialogam com esses, possibilitando a construção de limites. No caso de uma ameaça ou intimidação, lembro-lhe que existem regras sociais e de que ele pode ser punido como qualquer outro cidadão. Retomo com o aluno em outro momento e combino regras com ele. O diálogo amistoso, por parte do professor, não abdica da necessidade de reconstituição da autoridade que este precisa assumir. Alguns sujeitos, em razão disso, explicam: Primeiro sou ouvinte para entender a agressão e após tento contornar com uma boa conversa enérgica. A minha maneira seria estabelecer autoridade, mas não na forma de agressão verbal, mas talvez com explanação sobre valores éticos e convivência em grupo, citando talvez alguma frase do tipo: liberdade e responsabilidade andam juntas. Ainda no que tange as providências tomadas pelo professor, nove afirmam ter solicitado as presenças dos pais ou responsáveis. Se o aluno for menor de idade, procuro conversar com o responsável. Efetuo registro por escrito. Envio bilhete ao responsável, assinado por mim e pela direção da escola, além de solicitar a presença do responsável. Em relação ao mesmo questionamento, quatro professores dizem ter pedido auxílio à equipe diretiva: É claro que se o aluno não se intimidar ou perder o respeito, a solução é encaminhá-lo à direção ou SOE.

            Solicito que outro aluno busque auxílio na direção, pois não deixaria a turma sozinha. Ligo para a equipe diretiva, pois sinto medo que os outros alunos sejam agredidos. Apesar do olhar vigilante e atento e de ações interventivas apoiadas em outras autoridades escolares, uma porcentagem bem menor comenta que efetivou, na ocasião, registro na escola e ocorrência policial. Dessas condições, sucintamente expressas e exemplificadas nos protocolos, decorre que 58% dos professores não se sentem seguros em termos de condições ambientais e psicológicas exercendo suas atividades profissionais. Traficantes nos portões das escolas. Gangues nas esquinas. Marginais infiltrados nas salas de aula. Segurança?????????????????????? Cada vez sinto mais dificuldades, principalmente pelas condições psicológicas a que somos submetidos: alunos indisciplinados, sem limites, famílias que não acompanham os filhos e ficam indiferentes aos apelos do professor e da escola, pressão pela porcentagem nas aprendizagens, que é nossa responsabilidade, mas que, muitas vezes, não depende só de nós, devido às condições do aluno (deficiência, problemas orgânicos ou psicológicos). Me sinto como se tivesse que enfrentar um leão a cada instante, ficando sempre no limite do stress. Alguns professores apontam que essa insegurança deve-se, também, ao conceito de autoridade e à ruptura das relações hierárquicas constituídas através dessa, a qual, segundo eles, poderia ampará-los nas suas decisões. Nas suas falas aparecem: Na escola pública e privada o professor é desrespeitado com freqüência e quando cobra atitudes da direção, ela apóia os alunos e seus familiares. Existe muita indisciplina como conversas altas, celulares ligados. Não existe mais o respeito às hierarquias numa escola Essa conjuntura que pode colocar os professores nessa berlinda de micropoderes, configura-se como realidade cotidiana experimentada na concretude das relações pedagógicas, mas que, geralmente, não é problematizada, teorizada e contextualizada nos cursos de formação de professores. Essa explicação encontra eco nas vozes de nossos sujeitos de pesquisa:
Estamos expostos ao convívio com diferentes realidades. Não estamos preparados para trabalhar com alunos violentos e mal educados. Contudo, hoje, esses alunos violentos e mal educados são parte significativa de turmas que habitam nossas salas de aula!

            Talvez seja justamente por esse motivo que 87% dos professores desta investigação não se consideram amparados pela legislação educacional quando se vêem ou se viram vítimas de agressão por parte de alunos. Nada ampara o professor, e o aluno sabe disso. O professor procura conversar com os familiares. Em oposição ao desamparo legal sentido pelos professores, a lei está, dos seus pontos de vista, do lado do aluno:

            Mesmo que o aluno me agrida, eu não tenho direito de me defender, pois se o fizesse e sendo este menor de idade, ele tem total amparo na lei.
O conjunto de leis, de proteção aos menores, dá idéia de impunidade entre os alunos e professores. Geralmente é um processo lento, resultados lentos e, nesses casos, o aluno tem muita proteção, mecanismos que os ampare, dependendo da situação, o professor de vítima passa a ser o vilão. Essa proteção acaba se refletindo nas condutas dos gestores:

            Na escola particular há muita vista grossa em relação ao que os alunos fazem. Mesmo tentando buscar soluções, nada se consegue fazer: são “menores” Porque sempre o aluno acaba protegido, por ser menor, por ter um estatuto que o ampara. Além de tudo, parece que sempre o professor é culpado. Quando uma situação extrema acontece, é porque não utilizou uma metodologia adequada, não motivou os alunos ou não procurou compreender a história desse indivíduo, não teve um “olhar” diferenciado. Diferentemente do contexto da escola particular, uma professora esclarece que para a escola pública há um aparte legal que precisa ser considerado. Explica a professora:
No caso de professora nomeada, há uma lei que não pode faltar, como respeito ao funcionário público, mas não refere nada a “contratados”. A professora está se referindo ao Art. 331 do Decreto Lei n. 2.848 de 07/12/1940 do Código Penal que sublinha a pena relativa ao desacato de funcionário público no exercício da função pública ou em razão dela. Nesse caso, a pena prevista é a detenção de seis meses a dois anos ou multa. Como a professora explicita, esse artigo restringe-se a funcionário público e, por isso, não se estende a professores contratados em regime de C.L.T.

            A partir desse prisma é que podemos compreender porque 89% dos professores gostariam de poder contar com uma legislação específica que conferisse possibilidades de preservação de seus direitos humanos. A classe docente está totalmente desamparada, desassistida e está em segundo plano. É preciso leis que protejam e defendam o professor. Os professores justificam a necessidade da criação de um estatuto de direitos do docente mediante declarações como as que seguem:

            Se existisse um Estatuto do Docente seria mais divulgado e repercutiria mais, trazendo resultados mais rápidos. Para que possa prever medidas a serem tomadas em casos de violências contra professores, assegurando, assim, uma relativa segurança quanto ao trabalho docente. Para termos nossos direitos assegurados como cidadãos e mantermos nossa ética e moral não afetadas por ofensas e situações que nos depreciam pessoal e profissionalmente. Outros professores elucidam, inclusive, implicações que essa legislação desencadearia: Porque facilitaria o trabalho docente. Tornaria mais clara a função e os objetivos dos professores. (...) muitas vezes, a força da lei faz com que as pessoas se intimidem e repensem suas ações. Sugiro a criação de um Fundo para professores que são feridos com agressões no exercício da profissão.

            No que tange os aspectos que esse estatuto devesse contemplar, os professores apontam, entre outros:

- definição da função específica do docente;

- estabelecimento de condições para que o professor tenha protegida sua integridade física, intelectual, emocional, econômica no exercício de sua profissão;

- especificação dos direitos do professor em termos de dignidade e respeito profissional;

- explicitação de como o professor deve agir frente a uma agressão;
Nesse depoimento a professora faz alusão a uma colega de escola que, por ter sido agredida fisicamente por um aluno há dois anos, precisa, quinzenalmente, deslocar-se 120 Km de sua cidade de origem até a capital do estado, onde realiza tratamento mediante infiltração óssea no braço direito. Essa professora
teve tão somente quinze dias de afastamento mediante licença de trabalho e, desde então, vem arcando com os custos do seu tratamento.

- direito do professor a processo civil especial, no caso de agressão física ou verbal cometida por aluno;

- penalidade às escolas que se eximirem de acompanhar o professor frente à sua vitimização;

- os pais devem ser penalizados pelas atitudes desrespeitosas dos filhos ou deles próprios;

- regulação mais detalhada da relação entre professor, alunos, pais ou responsáveis e Conselho Tutelar;

- regulamentação de novas ações do Conselho Tutelar para que seja atuante e presente nas escolas visando a resolver os problemas a ele destinados;

- medidas sócio-educativas em benefício especialmente da escola para alunos infratores do regimento escolar onde deve constar nitidamente os direitos e deveres de docentes e discentes;

- acompanhamento psicológico para alunos e professores dependendo das situações de agressão;

- restrição ao desenvolvimento de aulas em condições completamente insalubres;

- normas traduzidas como freio ao descaso em relação ao sistema de aprovação sem aprendizado;

- em casos mais graves, proteção especial ao professor.

            Os professores sugeriram vários tópicos que, orientados pela análise de conteúdos, metodologicamente tratados, revelam a mobilização por uma causa justa: o direito de ser professor em um ambiente escolar socialmente saudável. Para além de um olhar conclusivo Alinhavando relações teórico-práticas, podemos tecer uma síntese argumentativa. As representações sociais de escola e de professor vêm sendo, especialmente a partir das últimas duas décadas, engendradas por condições multifacetadas: democratização da escolarização, que trouxe o acesso e permanência também de problemas sociais, econômicos, cognitivos...na escola; as novas tecnologias, que estão fomentando a alusão à substituição do professor tradicional e informativo; as novas legislações educacionais com a implantação da progressão continuada que foi sendo transformada, na prática, em progressão automática quando o professor é situado como responsável pela aprendizagem do aluno, o qual perde o receio de não aprender e de ser reprovado; o acúmulo de funções do magistério, cuja profissão tem agregado muitas áreas de atuação (serviço social, psicologia, enfermagem...); influências da mídia, particularmente em relação à naturalização da violência. É nessa trama enredada por tais condições, historicamente construídas, que se operam as transformações da imagem de professor e a desvalorização de sua profissão.

            É de dentro desse cenário que esses sujeitos flagram-se com direitos desproporcionais na relação aluno-professor e, não raro, como reféns desse estado de coisas que pode, inclusive, paralisá-los diante da perplexidade. Não é sem motivos que 108, e não 200 professores conforme o previsto pelo envio de questionários, participaram dessa investigação. Nas entrelinhas, podemos dizer que expressam (e assim o fizeram à bolsista de iniciação científica) sua descrença quanto à possibilidade de transformação, à perspectiva da pesquisa e à sua própria situação de educadores. É no processo de subjetivação coletiva, alimentado pelas representações sociais intimamente ligadas às redes de poderes e, por conseguinte, de coerção e força, que os professores vêm sendo, em primeira instância, vitimizados simbolicamente para, posteriormente, sofrerem as conseqüências práticas em forma de agressões.

            Apesar de precisarmos atentar ao conceito de vitimização para que os professores não se sintam e não se façam de vítimas desamparadas pelas próprias sortes, é fundamental um cuidado para consigo, preservando sua dignidade profissional que, segundo eles, está, por um lado, coibindo-se a preceitos legais que amparam o aluno (alunocracia) e, por outro, atrelando-se, cada vez mais, à possibilidade de encontrar na construção do estatuto dos direitos humanos do professor uma saída justa. Adentrarmos a seara dos direitos humanos, quando do tratamento endereçado por alguns alunos a professores, significa admitirmos a gravidade das situações a que estão cotidianamente expostos, afinal os dados submetidos à lente analítica falam por si e, por isso, não podemos disfarçar preocupações, indignações e o desconforto que esse lugar social demanda no contexto atual. Todavia, temos que ponderar que nenhuma lei resolve dramas e pode operar grandes transformações sem a construção de uma postura social que a legitime, de modo a operar transformações nos comportamentos dos sujeitos.  Experimentando essa sinergia, como ficariam imunes à construção de sintomas da Síndrome de Bournoult?

            Poderíamos pensar: esse é um expediente heterônomo que não aposta na capacidade de, pedagogicamente, construirmos atitudes e relações eminentemente humanas em um espaço institucional que deveria primar por essa prerrogativa. Não obstante, esse idealismo cai golpeado pela violência que invade e assola tantas escolas de educação básica de nosso país. Se esperarmos, ainda que comprometidos e verdadeiramente empenhados com a transformação atitudinal, quantos professores terão sido vitimizados? Isso só faz aumentar a veiculação de idéias de que o adulto, o professor, a autoridade não precisam ser respeitadas e de que as agressões não precisam ser sancionadas e isso, pedagogicamente, não contribui para as transformações atitudinal e comportamental desejadas. Piaget (1977) pode nos auxiliar nessa análise: a autonomia é construída em um processo que implica anomia, heteronomia desde os estágios menos elaborados para que, a partir disso, se possa vislumbrar, cooperativamente, o processo de conquista da autonomia. Legislar a favor dos direitos humanos dos professores pode significar a abertura a esse processo. Não o saberemos se não o trilharmos...

           

domingo, 29 de junho de 2014

As Intervenções Militares brasileiras no Prata durante o II Império.


Imagem: Manuel Ceferino Oribe y Viana.

A Guerra contra Oribe (Uruguai) e Rosas (Argentina) em 1851-1852.

            O governador de Montevidéu, o blanco Manuel Oribe, alia-se a Juan Manuel de Rosas, governador de Buenos Aires e cria entraves para os negócios brasileiros em Montevidéu e impedimentos para os estancieiros brasileiros que tinham propriedades no Uruguai, para passagem de seu gado pela fronteira rumo às suas estâncias no Rio Grande do Sul.

            Decidido a derrubar os dois caudilhos, do Uruguai e da Argentina, o Brasil firmou alianças com o Paraguai presidido por Carlos López e com os inimigos políticos do blanco Oribe (frutuoso Rivera -Colorado) e de Rosas (Justo Urquiza –governador da província de Entre-Rios e da província de Corrientes).

            Irineu Evangelista de Sousa financiou a resistência à Oribe em Montevidéo. Caxias (comandou o Exército) e Grenfell (comandou a Marinha) que derrotam Oribe em 1851. Rosas é derrotada na batalha de Montecaseros em 1852. O império estabelece um domínio ostensivo no Prata.  

            Os brasileiros em número de mais de vinte mil, constituíam mais de 10% da população uruguaia possuindo cerca de 30% de terras do país.

            O blanco Berro procurou limitar o assentamento de brasileiros no Uruguai, assim como o direito de possuírem escravos e, além disso, se recusou a renovar os Tratados de Comércio e Navegação com o Brasil que expiraram em 1861 e tentava controlar e taxar o comércio bovino através da fronteira com o RS.

A Guerra contra Aguirre no Uruguai (1864-65).


Foto: Atanásio da Cruz Aguirre.

            No Uruguai, em abril de 1863, iniciou-se uma guerra Civil do general colorado Venâncio Flores contra os Blancos de Berro. O Brasil e a Argentina (unificada com Bartolomeu Mitre) apoiaram Venâncio Flores. Em 1864, o Brasil enviou uma missão diplomática chefiada por José Antônio Saraiva, já sob a presidência do sucessor de Berro, o também blanco Atanásio Aguirre e a pretexto de proteger os direitos adquiridos pelos brasileiros no Uruguai buscava de fato criar condições para justificar uma intervenção militar no Uruguai. Acompanhado por uma esquadra comandada pelo então vice-almirante Tamandaré. Saraiva tentou impor uma substituição dos blancos por colorados. Aguirre, que já entrara em entendimentos com o Paraguai, esperando o apoio do presidente Solano López, recusa-se ceder às pressões brasileiras o que motivou o ultimato imperial ameaçando invadir o país, caso as exigências brasileiras não fossem atendidas em um prazo de seis dias. Como Aguirre manteve sua posição, em 12 de setembro tropas brasileiras invadiram o Uruguai.