quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte V. Considerações finais.


O Pecado Original: desobediência a Lei de Deus...."do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal dessa não comereis por que no dia em de-la comeres certamente morrereis". Os Pelagianos não acreditavam que o pecado de Adão e Eva foram passados para seus descendentes pelo contrario cria que os homens eram livres para escolher entre o bem e o mal não sofrendo influência nenhuma da natureza desobediente de nossos primeiros pais. Essa crença se opunha contra todas as premissas da Salvação por meio de Cristo segundo a Graça Divina.
Imagem: Arquivo Pessoal CHH.

Chegamos ao final de nosso estudo sobre o Pelagianismo em suas implicações na vida da Igreja Cristã e dos cristãos do século IV e inicio do século V d.C. Agora analisaremos de forma ampla as questões que firmavam o pelagianismo como uma força religiosa que teve respeitável número de adeptos, mas como tal teve um grande adversário pela sempre por meio da Igreja Católica que firmava as premissas de sua fé na tradição Apostólica.

A convicção básica de Pelágio e seus seguidores consistiam em que a natureza do homem era correta e fundamentalmente imutável. Originalmente criados por Deus, reconhecia-se que os poderes da natureza humana tinham sido cerceados pelo peso dos hábitos passados e pela corrupção da sociedade. Mas essa constrição era puramente superficial. A “remissão dos pecados” no batismo podia significar para o cristão a recuperação imediata da plena liberdade de ação, que fora meramente suspensa pela ignorância e pelas convenções.

O homem pelagiano era, essencialmente, um indivíduo separado: o homem católico estava sempre prestes a ser tragado por vastas e misteriosas solidariedades. Para Pelágio, os homens haviam simplesmente resolvido imitar Adão, o primeiro pecador; para os católicos, eles recebiam sua fraqueza essencial da maneira mais íntima e irreversível que havia: nasciam pela mera realidade da descendência física desse pai comum da raça humana.

Para Pelágio o pecado humano era essencialmente superficial: era uma questão de escolha. As escolhas erradas podiam acrescentar uma certa “ferrugem” ao metal puro da natureza humana, mas uma escolha, por definição, era reversível. Para estes o autocontrole era suficiente: bastava defender a cidadela da decisão livre, escolhendo o bem e rejeitando o mal.

Por mais conscientemente cristão que fosse o movimento pelagiano, ele se apoiava solidamente no leito dos antigos ideais éticos do paganismo, sobretudo do estoicismo. Eles achavam que os bebês eram criados por Deus e, portanto, eram bons; que não poderiam ser amaldiçoados por não serem batizados; e “que o homem pode chegar à felicidade por seu livre-arbítrio respaldado pela bondade da natureza humana.” Pretendiam persuadir os homens como tinham feito os filósofos pagãos, de que eles poderiam atingir neste mundo uma “vida completa”, uma beata vita.

Os tratados de Pelágio soam vez por outra, como obras de teoria política racional. Seu Deus é um déspota esclarecido e os cristãos são bem providos de Sua legislação abundante. Pelágio indignava-se com o fato de os homens continuarem a descumprir as ordens de um soberano tão sensato e bem-intencionado:

“Depois de tantos avisos a vos chamar a atenção para a virtude, depois da entrega da Lei, depois dos profetas, do Evangelho e dos apóstolos, simplesmente não sei como Deus poderá vos demonstrar indulgência, se quiserdes cometer um crime.”

Pelágio presumia constantemente que a existência de um bom meio podia influenciar diretamente os homens para melhor. Segundo ele, a vontade dos homens podia ser “impactada” a agir pelo bom exemplo de Cristo e pela terrível sanção do fogo do inferno.

Havia um traço de frieza na mentalidade de todo o movimento pelagiano. Adão fora punido com a pena de morte por desrespeitar uma única proibição; e até ele era menos culpado do que nós, pois, não tivera o grande benefício da execução anterior de um ser humano para detê-lo.  A liberdade podia ser admitida como um fato: simplesmente fazia parte de uma descrição do ser humano feita pelo senso comum. Presumia-se que o homem fosse responsável (caso contrário, como poderiam seus pecados ser chamados pecaminosos?) e ele tinha consciência de exercer escolhas; portanto, insistia Pelágio, era livre para determinar seus atos.

“No começo, Deus instalou o homem e o deixou entregue a seu próprio arbítrio. (...) Colocou diante de ti a água e o fogo, para que estendas a mão para o que quiseres.”

Pelágio e seu discípulo Celéstio, julgavam poder argumentar diretamente a partir das realidades aceitas da escolha e da responsabilidade para completar a autodeterminação humana: “É coisa mais fácil do mundo” escreveu Celéstio, “mudar nossa vontade por um ato de vontade.” Para eles, a diferença entre os homens bons e maus era muito simples: uns escolhiam o bem, e outros o mal.

Para os católicos a liberdade não pode ser reduzida a um sentimento de escolha: trata-se de uma liberdade de agir plenamente. Tal liberdade deve envolver a transcendência do sentimento de opção. É que o sentimento de opção é sintoma da desintegração da vontade: a união final do conhecimento e do sentimento envolveria de tal maneira o homem no objeto de sua escolha, que qualquer outra alternativa seria inconcebível.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte IV: Papa Zózimo e o Imperador Honório dão a sentença final sobre o pelagianismo.


O personagem bíblico Jó era considerado pelos pelagianos um herói. Imagem: Arquivo pessoal CHH.

Chegamos à quarta parte de nosso estudo sobre o pelagianismo e sua influência na formação dos principais dogmas Católicos contra heréticos, pois sendo os mesmo uma ameaça que muito trabalho deu aos bispos católicos no século IV e V. No trabalho que se segue veremos a veemência pelagiana de alcançar a perfeição plena e harmônica entre alma e corpo de tal forma que segundo suas crenças poderiam manter-se livres de qualquer desobediência às leis sagradas por seu próprio esforço e dessa maneira deixando o clero católico consternado, pois desse modo os pelagianos excluíam Cristo de sua sociedade. Uma blasfêmia que não seria tolerada pela Igreja Cristã.

Pelágio escolhera bem os seus destinatários e, todos eles, tinham uma notável força de vontade ao romperem por completo com “o mundo”, frente ao opressivo sentimento de família que imperava na sociedade aristocrática do baixo Império Romano. A extraordinária obstinação desses jovens nobres afigurava-se um presságio seguro do futuro progresso na perfeição. Havendo usado sua força de vontade com um efeito tão poderoso, eles poderiam facilmente tornar-se seguidores fervorosos de Pelágio. E teriam dado a esse movimento de reforma a bênção da classe mais influente de leigos cristãos do mundo romano. Isso porque o pelagianismo podia afigurar-se um movimento com um projeto definido.

A Igreja Católica viu-se diante de pessoas que se acreditavam capazes de exortações urgentes, de exercer uma influência imediata no comportamento da sociedade.

Para os pelagianos, o homem não tinha desculpas para seus pecados nem para os males que o cercavam. Se a natureza humana era essencialmente livre e bem criada, e não perseguida por uma misteriosa fraqueza íntima, a razão da miséria geral dos homens devia ser externa, de algum modo, a seu verdadeiro eu; devia estar, em parte, na força restritiva dos hábitos sociais de um passado pagão, Tais hábitos podiam ser reformados. Assim, poucos autores do baixo-império foram tão francos em suas críticas à sociedade romana. Os trechos mais suaves das frias exortações dos pelagianos são os que descrevem o horror das execuções públicas, instando o cristão a:

“sentir a dor alheia como se fosse sua e a se comover até as lágrimas com as tristezas de outros homens.”

Jó era o herói dos pelagianos: ali estava um homem subitamente despojado dos artifícios da sociedade, e capaz de mostrar ao mundo o esqueleto nu de uma individualidade heroica. Não foi por consciência que essas ideias circularam entre homens que desejavam despojar-se de sua vasta riqueza.

Como muitos reformadores os pelagianos depositaram no indivíduo o peso assustador da liberdade completa: ele era responsável por todos os seus atos; portanto, todo pecado só podia ser um ato deliberado de desprezo a Deus.

Depois de 410, entretanto, a África tornou-se uma das únicas províncias em que se podia contar com o status quo. Talvez tenha sido mais do que coincidência o fato de as ideias pelagianas parecerem ter tido o máximo de repercussão justamente nas províncias em que os antigos estilos de vida foram afetados pelas invasões dos bárbaros: na Grã-Bretanha, no Sul da Itália.

As diferenças fundamentais entre Pelagianos e Católicos pode ramificar-se das questões mais abstratas da liberdade e da responsabilidade para o papel efetivo do indivíduo na sociedade do baixo império.  Mas, podemos distinguir fundamentalmente em duas concepções radicalmente diferentes da relação entre o homem e Deus. A Igreja Católica via nos bebês a extensão do desamparo encontrado neles e esta os impressionava. Já os pelagianos, desdenhavam os bebês. “Não há admoestação mais premente do que está: devemos ser chamados filhos de Deus”.

Ser “filho” era tornar-se uma pessoa inteiramente distinta, não mais dependente do pai, porém capaz de seguir por conta própria as boas ações ordenadas por ele. O pelagiano era emancipatus a deo – uma imagem brilhante, extraída da linguagem do direito romano de família: libertos dos direitos abrangentes e claustrofóbicos do pai de uma grande família sobre seus filhos, esse filhos teriam “atingido”. Como no direito romano, da dependência em relação ao pater familias, e podiam enfim lançar-se ao mundo como indivíduos maduros e livres, capazes de defender com feitos heroicos o bom nome de seus ilustres ancestrais: “Sede perfeitos, como perfeito é vosso Pai celestial.”

Pelágio angustiava-se com a hipótese de que sua mensagem austera fosse proscrita, se declarada herege. Os pelagianos achavam que a Igreja precisava de seus serviços: cabia mais a eles tolerar a negligência moral da Igreja católica, cujo populacho sempre rotularia de “heresia” qualquer opinião desagradável.

Para o homem médio, era difícil decidir se a linguagem usada por Pelágio era “herege”. “Heresia” significava erros quanto à natureza da Trindade, como os que haviam provocado à controvérsia ariana e, nesse aspecto, os pelagianos eram irrepreensíveis .

Os pelagianos sempre ameaçaram apelar para as igrejas orientais, com tradições mais liberais e muito diferentes. Vista de fora, a fundatissima fides parecia expressar meramente o rigor tacanho de uma igreja isolada.

Pelágio chegou a Terra Santa em meados de 415 e um sínodo de quatorze bispos se reuniu em Diópolis ficou claro para eles que as acusações deveriam ser descartadas.
Se a aceitação de Pelágio pareceu perfeitamente normal no Oriente, causou grande rebuliço no Ocidente. A misteriosa rede de adeptos de Pelágio certificou-se então de que seu relato do sínodo de Dióspolis chegasse ao mundo latino com espantosa velocidade. A conspiração destinada a prejudicá-lo fora reduzida a confusão; ele ficara com sua “ficha limpa”, e sua opinião de que os homens podiam existir sem pecado fora aprovada por bispos dos Lugares Santos.

Chegou então a vez da Igreja da África mostrar sua contra-demonstração. E está foi impressionante. Dois concílios foram realizados; um em Cartago e outro em Milevs e havia trezentos bispos católicos prontos para concordarem unanimemente com decretos redigidos por especialistas incontestáveis contra os ensinamentos pelagianos.

Assim no final de 416, Inocêncio bispo de Roma recebeu da África uma pilha realmente inusitada de documentos:

domingo, 27 de janeiro de 2013

Rio Grande do Sul em Luto. Incêndio na boate Kiss é o de maior número de mortos nos últimos 50 anos no Brasil.



A tragédia

O incêndio na boate Kiss, no centro de Santa Maria, começou entre 2h e 3h da madrugada de domingo, quando a banda Gurizada Fandangueira, uma das atrações da noite, teria usado efeitos pirotécnicos durante a apresentação. O fogo teria iniciado na espuma do isolamento acústico, no teto da casa noturna. 

Sem conseguir sair do estabelcimento, mais de 200 jovens morreram e outros 100 ficaram feridos. Sobreviventes dizem que seguranças pediram comanda para liberar a saída, e portas teriam sido bloqueadas por alguns minutos por funcionários.

A boate


Maior tragédia gaúcha teve pelo menos 233 vítimas confirmadas pela Brigada Militar e outras dezenas internadas em hospitais do Estado.

Localizada na Rua Andradas, no centro da cidade da Região Central, a boate Kiss costumava sediar festas e shows para o público universitário da região. A casa noturna é distribuída em três ambientes - além da área principal, onde ficava o palco, tinha uma pista de dança e uma área vip. De acordo com o comando da Brigada Militar, a danceteria estava com o plano de prevenção de incêndios vencido desde agosto de 2012. 

Plano de prevenção contra incêndios de boate estava vencido.

A danceteria Kiss, palco da tragédia em Santa  Maria, está com o Plano de Prevenção e Controle de Incêndios vencido desde agosto de 2012. A informação é do subcomandante-geral da Brigada Militar, coronel Altair Cunha, que é bombeiro de formação e está em Santa Maria para coordenar trabalhos de rescaldo do incêndio que matou mais de 200 pessoas na madrugada de domingo.

Os proprietários tinham pedido renovação do PPCI, mas ela ainda não foi concedida. É normal que se permita o funcionamento, enquanto espera a fiscalização verificar o novo plano, já que eles tinham um plano anterior aprovado — explica Altair.

O coronel confirma que a entrada e a saída da danceteria eram uma só. Ele diz que, apesar disso, o funcionamento pode ser autorizado quando os proprietários do estabelecimento comprovam que a largura dessas vias de acesso é suficiente para deixar passar um grande número de pessoas, o que seria o caso da Kiss.

Tem de checar agora outras coisas: se as portas foram abertas na hora da confusão, como deveriam. Se os extintores funcionaram e assim por diante — ressalta o subcomandante da BM.

Testemunhos colhidos pela Polícia Civil indicam que as portas de saída não estavam totalmente abertas, na hora em que o incêndio começou a se propagar. Por isso, muita gente teria buscado refúgio nos banheiros, onde acabou morrendo por asfixia ou pisoteada.

Segundo o capitão da Brigada Militar (BM) Edi Paulo Garcia, a boate Kiss teria apenas uma saída. De acordo com Garcia, 90% dos corpos estariam nos dois banheiros da boate — um feminino e outro masculino. Ainda conforme Garcia, aqueles que não morreram pelo fogo, foram vítimas de asfixia (em função da forte fumaça) ou foram pisoteados.

O proprietário


Kiko Spohr, proprietário da boate Kiss.

O dono da boate Kiss, o empresário Kiko Spohr, é Ator, cantor e empresário, e sócio do empresário Mauro Hoffmann. No Facebook, amigos de Kiko sugerem que ele venha a público explicar o que aconteceu. Vemos nessa tragédia como uma grande irresponsabilidade dos órgãos municipais do município de Santa Maria-RS, principalmente da defesa civil do município e do próprio proprietário, pois ele esta lidando com seres humano, são vidas humanas que estão se divertindo, que precisam de total segurança.

A tragédia, que teve repercussão internacional, é considera a maior da história do Rio Grande do Sul e o maior número de mortos nos útimos 50 anos no Brasil. 

Entre os incêndios, o incidente na boate Kiss é o que teve mais vítimas nos últimos 50 anos. Até o momento já foram confirmados 233 mortos e outras dezenas de feridos.

De acordo com levantamento feito por Zero Hora, o incêndio só é superado na história brasileira pela tragédia ocorrida em Niterói, no Rio de Janeiro, em 1961. Na ocasião, 503 pessoas morreram após um circo com cerca de 3 mil espectadores pegar fogo, conforme o livro-reportagem O Espetáculo Mais Triste da Terra, do jornalista Mauro Ventura.

O coronel Humberto de Azevedo Viana Filho, secretário nacional da Defesa Civil, chegou a Santa Maria na tarde deste domingo. Ele compara a tragédia da boate Kiss com os deslizamentos no Rio de Janeiro, em 2011, que vitimaram mais de 900 pessoas e deixaram mais de 200 desaparecidos até hoje. Para o secretário, o que mais surpreende no caso é o número de mortos em espaço reduzido:

— Este evento só ressalta que devemos estar preparados em todos os municípios. É um momento de solidariedade e muita dor, e temos de ter prudência na avaliação dos dados.

Desde então, nenhuma tragédia se aproxima do número de vítimas do incêndio santa-mariense. A tragédia ocorrida na madrugada deste domingo teve 63 vítimas a mais do que a do edifício Joelma, em São Paulo, em 1974, e cinco vezes mais mortos que o incêndio nas lojas Renner, em Porto Alegre, em 1976.
Entre os incêndios ocorridos em locais fechados, como boates ou cinemas, o caso pode ser incluído no ranking das piores tragédias do mundo. Dois incidentes na China, em 1994, registram um número maior de mortos em situações semelhantes. O incêndio na boate Kiss supera, em número de vítimas fatais, até mesmo o caso da casa de shows Republica Cromañón, em Buenos Aires, em 2008. Naquela ocasião, a causa também foi o uso de fogos de artifício.

O incidente é comparável a catástrofes naturais, que atingem uma área muito mais ampla e um maior número de pessoas. Nas enchentes que atingiram Santa Catarina em 2008, por exemplo, morreram 98 pessoas menos. Dados coletados desde 1900 pelo Centro para a Pesquisa da Epidemiologia de Desastres, da ONU, com sede na Bélgica, apontam que este incêndio ocorrido no Estado também supera o número de mortos por deslizamento no Rio de Janeiro, em 2010.

Em informações preliminares, foi dito que o número de vítimas chegaria a 245 pessoas. O major do Batalhão de Operações Especiais (BOE), Cleberson Braida Bastianello, corrigiu o número de mortes confirmados para 233.

FONTE:



sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte III: o Estado Romano, a Igreja Católica e os Pelagianos!



Pelagianismo. Imagem: Ministério Bereia.

Dando continuidade ao nosso estudo sobre as “Questões acerca do Pelagianismo”, avaliaremos nesta postagem sua compreensão da desobediência no pecado original e a hereditariedade da culpa trazida a todos os humanos, que como tais são descendentes de nossos primeiros pais Adão e Eva. E como consequência a compreensão dos pelagianos dos escritos canônicos ante os Católicos.

Quando analisamos a vida dos cristãos abastados do baixo Império Romano vemos que como tais continuavam a fazer parte de uma classe dominante comprometida com a manutenção das leis do império, mediante a imposição de castigos brutais. Estavam dispostos a lutar com unhas e dentes para proteger suas vastas propriedades e, à mesa de jantar, eram capazes de discutir tanto a mais recente opinião teológica, pela qual se orgulhavam como especialistas, quanto o tipo de punição judicial que houvesse acabado de infligir a algum assassino/estuprador.

Nessa confusão, a mensagem dura e firme de Pelágio surgia como uma libertação. Ele oferecia ao indivíduo a certeza absoluta, pela obediência absoluta. Podemos perceber isso na carta de um homem que se viu subitamente sob a influência de uma dama da nobreza, figura dominante de um grupo de entusiastas pelagianos na Sicília.

“Quando morava em minha terra, eu pensava ser um adorador de Deus. (...) Agora, pela primeira vez, comecei a saber como posso ser um verdadeiro cristão.(...) É fácil dizer que conheço Deus, creio em Deus, temo a Deus e sirvo a Deus. Mas não se conhece Deus quando não se acredita n’Ele; e não se acredita n’Ele a menos que se o ame; e não se ode dizer que se O ama, quando não se O teme quando não se O serve; e não se pode dizer que se serve a Deus quando se desobedece a Ele em qualquer aspecto. (...) Quem crê em Deus obedece a Suas ordens. Isto é amar a Deus: fazer o que Ele ordena.”

Era uma época séria. Os imperadores, ao insistirem no cumprimento de suas leis, usavam a mesma linguagem desesperada que Pelágio empregava ao falar das leis de Deus. Os homens que liam os textos pelagianos haviam acabado de assistir a uma série de acontecimentos que tinham abalado a confiança de toda uma classe: expurgos brutais, a ruína de famílias inteiras, assombrosos assassinatos políticos e, mais tarde, os horrores de uma invasão bárbara. Mas, enquanto alguns eram impelidos para o retraimento por essas catástrofes, os pelagianos pareciam determinados a se voltar para fora, a reformar toda a Igreja Cristã. Este foi o aspecto mais notável de seu movimento: o estreito fluxo de perfeccionismo que empurrara os nobres seguidores de Jerônimo para Belém, levara Paulino de Nola e Agostinho, de Milão, para uma vida de pobreza na África de repente voltou-se para fora nos escritos pelagianos, de modo a abarcar toda a Igreja Cristã:

“Decerto não é verdade que a Lei da conduta cristã não foi formulada para todos aqueles que se chamam cristãos. (...) Porventura credes que as fogueiras do Inferno arderão com menos calor para os homens que têm permissão (como governadores) de dar vazão a seu sadismo, e que só ficarão mais quentes para aqueles cujo dever profissional é serem devotos? (...) Não pode haver dois padrões num único e mesmo povo.“

Em toda a literatura do baixo Império Romano, esse é o protesto mais pungente contra a pressão sutil, experimentada pelos bispos católicos, para que se deixassem a vida cristã para os santos reconhecidos e se continuasse a levar a vida de homens comuns, como pagãos. Pelágio  queria que todos os cristãos fossem monges..

É que os pelagianos ainda pensavam na Igreja cristã como um pequeno grupo num mundo pagão. Estavam preocupados em dar um bom exemplo: o “sacrifício do louvo”, matéria tão íntima para os bispos católicos, significava, para os pelagianos, o louvor da opinião pública pagã, que seria conquistada pela Igreja como instituição composta por homens perfeitos. Foi nisso, é claro, que o movimento pelagiano afetou a Igreja Católica intimamente. Para a Igreja cristã, era como se as novas afirmações dos pelagianos de que poderiam chegar a uma Igreja “sem mácula nem imperfeição” meramente dessem continuidade à asserção dos donatistas de que só eles pertenciam justamente a essa Igreja.

quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte II: A teologia da alma perfeita!



A alma humana! Para os Católicos tende ao pecado desde o nascimento, e para os pelagianos pura desde o nascimento e pode assim permanecer durante toda a vida do fiel pelagiano! Imagem. Getty Imagens.

Pelágio era um homem que se aborrecia com os escritos dos bispos católicos que ensinavam o nascimento em pecado e a necessidade do batismo para arrependimento e salvação. Entrou em choque com bispos por várias vezes, como Paulino de Nola, numa discussão subsequente a uma leitura das ternas passagens do Livro X, das Confissões de Agostinho de Hipona;

“Ordenai o que quiserdes, doai o que ordenardes.”

 Essa frase parecia toldar, por intermédio de atos pessoais de favoritismo, a majestade incorruptível de Deus como Legislador. O sentimento de que a onda da opinião pública estava-se voltando rapidamente contra ele, em favor de uma tolerância do pecado como “extremamente humano”, arrancou-lhe um panfleto enraivecido e sem meias palavras, Sobre a natureza. Tempos, depois esse mesmo texto foi usado como uma valiosíssima prova em sua argumentação contra Pelágio, pelos bispos católicos.

Em 412 d.C, o britânico Pelágio tornou a partir, desta vez para a Terra Santa; ficaria conhecido apenas por seus livros: Sobre a Natureza, e, Carta, que evidentemente os impressionou. Trata-se de uma intrigante imagem dupla: em uma ele era o teólogo otimista de Sobre a natureza; para outros, era o asceta ardoroso que escrevera uma admoestação para as famílias.

Mas foi Celéstio quem provocou a crise na África, não Pelágio. Tão logo chegou a Cartago, ele interveio confiantemente nos debates em curso, que pareciam tocar no mistério perene da origem da alma, e passou aos problemas afins da solidariedade da raça humana no pecado de Adão, pois, por exemplo, como poderia a alma “nova em folha” de um indivíduo ser considerada culpada do ato distante de uma outra pessoa? Essas discussões tocaram na necessidade do batismo infantil. E foi aí que os argumentos pelagianos depararam com seu primeiro obstáculo sério.

Os bispos que haviam passado anos defendendo a necessidade absoluta e a singularidade do batismo conferido por eles na Igreja Católica, e que, na biblioteca dos bispos de Cartago, podiam consultar uma carta de São Cipriano que insistia no batismo dos bebês recém-nascidos, não estavam dispostos a tolerar tais especulações.

Celéstio foi denunciado quando se candidatou ao sacerdócio. As seis proposições condenadas que ele se recusou a retirar viriam a constituir, ao lado de Sobre a Natureza, de Pelágio, a base da argumentação católica contra Pelágio. Para a Igreja, esses eram os capitula capitalia, pois tais proposições bastariam para “enforcar” Pelágio, caso se admitisse que o radicalismo de Celéstio, o discípulo, era apenas a extensão lógica das opiniões secretas de seu mestre.

Para os bispos católicos da África o Pelagianismo sempre foi um conjunto de ideias, de disputationes, “argumentos”. Mas, em Roma no entanto, tais ideias haviam desencadeado um “movimento”. Pelágio tinha um corpo de adeptos tenazes e bem situados. Estes se certificavam de que suas cartas circulassem com surpreendente rapidez e de que ele se mostrasse decidido a buscar um lugar para suas ideias dentro da Igreja Católica. Suprimiam-no de entusiastas que compunham “células” pelagianas em locais tão distantes quanto a Sicília, a Grã-Bretanha e Rodes. Hoje podemos apreciar as motivações desses homens e, portanto, podemos avaliar o papel desempenhado pelo pelagianismo numa das crises mais dramáticas da Igreja Cristã no Ocidente.