sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Livro de Baruc

Discípulo de Jeremias, Baruc é tradicionalmente reconhecido como o autor do livro Deuterocanônico que leva o seu nome.Foi filho de Nerias (Jeremias 32:12; 32:16; 16 : 4, 8, 32; Baruc 1:1), e provavelmente irmão de Saraias, chefe camareiro do Rei Sedecias (Jeremias 32:12, 51:59; Baruc 1:1). Depois que o Templo de Jerusalém foi saqueado por Nabucodonosor (599 A.C.), Baruc escreveu o oráculo do grande profeta Jeremias, sendo ditado por este, e leu o escrito para que o povo judeu, arriscando sua vida por causa disso. No escrito era previsto o retorno dos babilônicos. Ele também escreveu a segunda e mais longa edição das profecias de Jeremias após a primeira ter sido queimada pelo enfurecido rei Joaquim (Jeremias: 36).
Durante sua vida, Baruc permaneceu fiel aos ensinamentos e ideais do grande profeta, apesar de em alguns momentos ter se deixado levar por decepções e ambições pessoais (Jeremais, 45). Ele estava com Jeremias durante o cerco a Jerusalém e testemunhou a compra do terreno ancestral de Anatot (Jeremias, 32). Depois da queda da Cidade Santa e dá destruição do Templo (588 A.C.), Baruc provavelmente viveu algum tempo com Jeremias em Masphath. Foi acusado por seus inimigos  de  sugerir ao profeta a aconselhar os Judeus a permanecerem em Juda, ao invés de iram para o Egito (Jeremias, 43), onde, de acordo com a tradição Hebraica preservada por São Jeronimo (Isaiah 30: 6, 7), os dois morreram antes de Nabucodonosor invadir aquele país. Entretanto, essa tradição entra em conflito com a informação encontrada no capítulo de abertura da Profecia de Baruc, onde é dito que ele escreveu este livro na Babilónia, e o leu publicamente 5 anos depois da queima da Cidade Santa. Aparentemente o livro foi enviado para Jerusalém por Judeus cativos dentro de um vaso sagrado como um presente destinado ao sacrifício no templo de Yahweh. Essa informação entra em conflito com várias tradições, tanto judias quanto cristãs, mas provavelmente contém algumas partes de verdade que não permitem determinar a data, local ou maneira em que Baruc morreu.
Na Bíblia Católica, “A Profecia de Baruc” é formada por 6 capítulos, último entitulado “Epístola de Jeremias” não pertence propriamente ao livro. A Profecia abre com uma introdução histórica (1: 1-14), estabelece primeiro (versos 1-2) que o livro foi escrito por Baruc na Babilónia, 5 anos após Jerusalém ter sido queimada pelos Caldeus. Em seguida (versos 3-14) deixa claro que foi lido na presença do Rei Jeconias e de outros em exílio na Babilônia, o  que resultou em efeitos benéficos. A primeira parte do corpo do livro (1:15; 3:8) contém a confissão dos pecados que os levaram ao exílio (1:15-2:5; 2:6-13), juntamente com uma prece a Deus para o perdão do Seu povo (2:14; 3:8). Enquanto a primeira parte é muito parecida com o Livro de Daniel (Daniel 9:4-19), a segunda parte de Baruc (3:9; 4:4) se assemelha à passagens em Jó 28, 38. É um belo louvor à Sabedoria Divina, que não se encontra em nenhum outro lugar a não ser na Lei dada a Israel; somente com o disfarce da Lei é que a Sabedoria apareceu no mundo e se tornou acessível ao homem, o que leva, portanto, Israel a provar novamente sua fidelidade a Lei. A última sessão do Livro de Baruc se estende de 4:5 até 5:9. É formada de 4 odes, cada um começando com a expressão “Tenha coragem” (ou “Tenha melhor animo” dependendo da tradução) (4:5, 21, 27, 30), e com um salmo muito semelhante ao décimo primeiro Salmo apócrifo de Salomão (4:36; 5:9). O capítulo 6 apresenta, como apêndice, todo o livro “A Epistola de Jeremias”, enviada pelo profeta “para aqueles que foram levados cativos à Babilónia” por Nabucodonosor. Devido aos seus pecados, os judeus foram levados para a Babilónia onde deveriam permanecer “ali muitos anos, e largos tempos, até sete gerações”. Naquela cidade herege deveriam testemunhar a bela adoração dada aos “deuses de ouro, e de prata, e de pedra, e de madeira”, mas nunca deveriam se conformar com aquilo. Todos esses deuses, demonstrado com vários argumentos, são impotentes e perecíveis, obras da mão de homens, eles não podem fazer nem mal nem bem, assim eles não são deuses de jeito algum.
É certo que o sexto capítulo de Baruc é distinto do resto da obra. Além do título especial, “A Epistola de Jeremias”, o estilo e conteúdo provam se tratar de um escrito independente da Profecia de Baruc. Em alguns manuscritos gregos Baruc não tem a “Epístola”, em outros, entre os melhores, ela está separada do Livro de Baruc e é apresentada imediatamente depois de Lamentações de Jeremias. O fato de o sexto capítulo de Baruc levar o título de “Epistola de Jeremias” tem sido entendido, e ainda é por muitos, o motivo definitivo de que o grande profeta é o autor. É também instigante a vívida e precisa descrição do esplendido, mas infame, culto aos deuses babilónicos em Baruc, feita pelo escrito tradicional, em Jeremias 13:5-6, provavelmente se referindo a dupla jornada de Jeremias ao Eufrates. Finalmente, afirma-se que um certo número de características hebraicas podem ser reconhecidas, levando a um original hebraico. Contrário a esta visão tradicional, a maioria dos críticos contemporâneos argumenta que o estilo grego de Baruc prova que ele foi originalmente escrito em grego e não em hebraico, consequentemente, Jeremias não seria o autor da Epístola com seu nome. Por causa disso e por outras razões observadas no estudo do conteúdo de Baruc, eles acreditam que São Jeronimo estava decididamente correto quando descreveu como uma pseudoepígrafe, ou seja, escrita com um nome falso. No entanto, um importante estudo do Canon das Sagradas Escrituras prova que, a despeito das contestações dos protestantes, Baruc 6 sempre foi reconhecido pela Igreja como um livro inspirado.
Em relação à linguagem original do Livro de Baruc (capítulos 1-5), uma variedade de opiniões permanecem entre os estudiosos. Naturalmente aqueles que se apegam simplesmente ao título admitem que toda a obra foi originalmente escrita em hebraico. Do contrário, a maioria dos que questionam ou rejeitam o título do livro acreditam que a obra foi escrita totalmente, ou pelo menos parcialmente, em grego. É verdade que características literárias gregas aparecem em várias sessões e não apontam para um texto original em hebraico, mas não é difícil se supor que o texto completo de Baruc seja uma tradução, aqui algumas evidências linguísticas que confirmam está última suspeita:
- É muito provável que Teodotio (final do segundo século da nossa era) traduziu O Livro de Baruc de um original hebraico.
- A alguma notas do texto Siro-Hexaplar declaram que algumas palavras no texto grego não são encontradas no texto hebraico.
- Baruc 1, 14 diz que o livro foi feito para ser lido em público no Templo, sendo assim ele deve ter sido composto com esse propósito.
Além disso, em relação a sua linguagem original, Baruc apresenta uma certa unidade em relação a seu tema, de modo que aqueles que acreditam que todo o texto seja um escrito primitivo hebraico admitem que ele é uma unidade de composição. Entretanto, há no Livro de Baruc muitos traços de um processo de compilação, onde várias partes foram aparentemente unidas. A diferença da forma literária entre 1-3:8 e 3:9-5 é grande e, observando-se a maneira abrupta como o panegírico sobre Sabedoria é introduzido em 3:9, sugere que tenham origens diferentes. A duas confissões dos pecados que levaram ao exílio em 1:15, 3:8, são colocadas lado a lado sem nenhuma transição natural. As diferenças literárias entre 3:9-4:4 e 4:5-5:9 são consideráveis e o início da terceira sessão em 4:5 não é menos abrupta do que o da segunda em 3:9. Novamente, a introdução histórica parece ter sido composta somente para o prefácio de 1:15-2:5. Em vista desses e de outros fatos, os críticos contemporâneos geralmente entendem que a obra é fruto de um processo compilatório e que sua unidade é fruto do editor final, que juntou os vários documentos sobre o enfado do exílio. Este método de composição literário não necessariamente conflita com a devoção tradicional ao Livro de Baruc, muitos dos escritores sagrados da Bíblia são compiladores, e Baruc pode ser mais um entre eles, de acordo com os estudiosos católicos que admitem o caráter compilatório das obras escritas por ele. Os católicos se sustentam aqui por três pontos:
- O livro é assinado por Baruc em seu título;
-  Sempre foi reconhecido como uma obra de Baruc pela tradição;
- O seu conteúdo não apresenta nada que pudesse ser de um período posterior ao de Baruc, o que seria considerado estranho ao estilo e forma do fiel discípulo e secretário de Jeremias.
Contra está visão, não-católicos argumentam:
- O seu fundamento é somente o título do livro;
- O título em si não está em harmonia com o conteúdo histórico e literário da obra;
- E parte desse conteúdo, quando examinado imparcialmente, aponta para uma compilação mais tardia do que Baruc; alguns vão mais longe e alegam que a composição foi obra de um escritor do século 70 D.C.
Católicos facilmente desmentem a última data do livro, mas não tão fácilmente refutam as graves dificuldades que foram levantadas contra o seu próprio relato de todo o trabalho a Baruque. Suas respostas são consideradas suficientes por estudioso católicos em geral. Mesmo se, entretanto, julgarem inadequado, por tanto considerarem o Livro de Baruc como um trabalho de um editor tardio, o caráter inspirado do livro permanece, entendendo-se que o último editor foi inspirado em seu trabalho de compilação.
O Livro de Baruc foi definido como escrito “sagrado e canônico” no Concílio de Trento, é tão inspirado por Deus como qualquer outro livro da Sagrada Escritura e pode ser demonstrado com um estudo minucioso do Canon Bíblico. Sua edição em Vulgata Latina remonta a desde antes da versão em Latim antigo de São Jeronimo, e é razoavelmente integral a versão em grego do texto.
PARA CITAR

GIGOT, Francis. Baruc. The Catholic Encyclopedia. Vol. 2. New York: Robert Appleton Company, 1907. Disponível em: <>. Desde: 15/12/2014. Traduzido por: Rodrigo Bastos.

Livro de Tobias

INTRODUÇÃO

Este é o primeiro de 7 estudos sobre os livros deuterocanônicos. Estes estudos visam aproximar o leitor ao conhecimento da história, hagiografia, texto, manuscritos e versões dos livros deuterocanônicos, para uma melhor visão e preparação apologética e exegética dos livros.

O NOME

No Códice Alexandrino chama-se Biblos logon Tobit; no Vaticanus, Tobeit; no Sinaiticus, Tobeith; nos manuscritos em latim Liber TobiaeLiberTobit et Tobiae, Liber utriusque Tobiae. Na Vulgata e no hebraico Fagii ambos, pai e filho têm o mesmo nome, Tobias, tobyyah. Em outros textos e versões, o nome do pai varia: Tobi “meu bem” é Iahweh no hebraico Munster; Tobit ou Tobeit na Septuaginta; Tobis, ou Tobit, e tobith “bondade” de Javé, na Vetus Latina.

TEXTO E VERSÕES

O texto original, que foi escrito supostamente em hebraico, foi perdido; as razões atribuídas para uma versão aramaica original parece apenas ser provável por parecer que uma tradução do aramaico influenciou nossas versões presentes em grego.

(1) VERSÕES DA VULGATA
São Jerônimo ainda não tinha aprendido aramaico, quando, com a ajuda de um rabino que sabia tanto aramaico quanto hebraico, fez a versão Vulgata. O rabino expressa em hebraico o pensamento dos manuscritos aramaicos e São Jerônimo imediatamente colocou esse em latim. Foi um trabalho de apenas um dia (cf. Praef. Nos Tobiam). A Vetus Latina certamente influenciou esta versão apressada. A recensão da Vulgata da versão em aramaico conta a história na terceira pessoa, assim como o aramaico de Neubauer e os dois textos do hebraico de Gaster (HL e HG), enquanto todos os outros textos fazem Tobias falar na primeira pessoa de até o capítulo 3, 15. As seguintes passagens ocorrem somente na Vulgata: o abanar da cauda do cão (11, 9); a comparação do revestimento sobre o olho de Tobit com a membrana de um ovo (11, 14); a espera de meia hora, enquanto o fel do peixe efetuava a sua cura (11, 14); o fechamento dos olhos de Raguel e Edna após morte por Tobias; também 2, 12; 2, 18; 3, 19; 3,24, 6, 16-18; 6, 20-21; 8, 4-5; 9, 12b. Algumas partes da Vulgata, como a continência de Tobias (6, 18; 7, 4), foram por vezes, encaradas como interpolações cristãs de Jerônimo, até que foram encontradas em um dos textos hebraicos de Gaster (HL). Por último, a Vulgata e o HL omitem qualquer menção ao Ahikhar e Achior da Vulgata (Tobias 11,20), é provavelmente uma adição ao texto.

(2) VERSÕES ARAMAICAS
Além da versão em aramaico usada por Jerônimo, e agora perdida, há o texto aramaico sobrevivente recentemente encontrado em um comentário aramaico sobre o Gênesis, “Bereshit Midrash Rabba”. A escrita é midrash deste trabalho do século XV; que contém o Livro de Tobias como um haggada a promessa que Jacob faz de dar dízimos a Deus (Gênesis 28, 22). Neubauer editou o texto, “O Livro de Tobit, um caldeu de texto a partir de um único manuscrito na Bodleian Library” (Oxford, 1878). Ele acha que é uma forma mais breve do texto aramaico de Jerônimo. Isto não é provável. A linguagem é, por vezes, uma transliteração do grego e dá provas de ser uma transliteração de um ou outro dos textos gregos. Ele concorda com a Vulgata naquela que desde o início do conto de Tobias é contada na terceira pessoa; caso contrário, é mais perto do Codex Vaticanus e ainda mais próximo do Codex Sinaiticus.

(3) VERSÕES GREGAS
Há três recensões gregas de Tobias. Devemos nos referir a eles pelos números apresentados ao Vaticano e o códices Sinaítico em Vigouroux, “La sainte bíblia polyglote”, III (Paris, 1902)
(a) AB, são respectivamente o texto dos códices Alexandrino (século V) e Vaticano (século IV). Esta recensão é encontrado em muitos outros códices do texto grego, tem sido usado há séculos pela Igreja grega, é incorporado na edição Sixtine da Septuaginta, e foi traduzido para o armênio como texto autêntico daquele rito. AB é o preferido para a recensão do Sinai por Nöldeke, Grumm, e outros, e ainda avaliado por Nestlé, Ewald, e Haris como um compêndio mais do que uma versão de todo o texto original. Ele condensa Oração de Edna (X, 13), omite a bênção de Gabael (IX, 6), e tem três ou quatro leituras únicas (3,16; 14, 8-10; 11, 8).
(b) Aleph, é o texto do Codex Sinaítico (século IV). Seu estilo é muito mais difuso do que o de AB, que parece ter omitido propositalmente muitos stichoi do Aleph - cf. 2,12, “no sétimo dia de Dustros ela cortou a rede”; 5, 3, a incidência da ligação dividida em duas partes, uma para Tobias  e outra para Ragüel; 5, 5, a longa conversa entre Rafael e o jovem Tobias; 6, 8; 10,10; 12, 8, etc. O Aleph omite 4, 7-19 e 13, 6b-9, doAB.
(c) O texto dos códices 44, 106, 107 para Tobias 6, 9 a 13, 8. A primeira porção (1, 1-6: 8) e a última (13, até o fim) são idênticos ao AB; o restante parece ser uma tentativa de uma melhor versão do texto original. Um trabalho independente é mostrado por 6, 9 a 7,17 e 8, 1 a 12, 6, é muito parecido com Siríaco e mais próxima do Aleph do que de AB; 12, 7 a 13, 8 assemelha cada texto em vários pequenos detalhes. Leituras distintivas e estranhas encontradas destes cursivos são orações gnósticas de Edna, “Que todos os Æons[1] te louvem” (8, 15); e o fato de que Ana viu o cachorro correndo antes de Tobias (11, 5).
(d) O que parece ser uma terceira recensão do segundo capítulo é apresentado em Grenfell e Hunt, “Oxyrhyneus papiros” (Oxford, 1911), parte VIII. O texto difere tanto AB quanto Aleph e, consequentemente, nos cursivos gregos.
(4) VERSÕES LATINAS   ANTIGAS
Antes da tradução latina da Vulgata da recensão aramaica (ver acima) existiam pelo menos três das versões latinas antigas de um texto grego que foi substancialmente Aleph; (a) a recensão do Codex Regius Parisiensis 3654 e Codex 4 da Biblioteca de São Germano; (b) a recensão do Códice Vaticanus 7, contendo 1-6:12; (c) a recensão do “Speculum” de Santo Agostinho.
(5) VERSÕES SIRÍACAS
Até o capítulo 7, 9, é uma tradução de AB; depois disso, ele concorda com o texto grego cursiva, com a ressalva de que 13, 9-18, é omitido. Esta segunda parte é claramente uma segunda recensão; seus nomes próprios não são soletrados como na primeira parte. Ahikhar (14, 10) é Achior (2:10); 'Edna (7, 14) é' Edna (7, 2), Arag (9,  2) é Raga (4, 1, 4, 20).
(6) VERSÕES HEBRAICAS
Existem quatro versões do hebraico deste livro:
(a) HL, Hebraico Londinii, um manuscrito do século XIII, encontrada por Gaster no Museu Britânico, e traduzido por ele no “Proceedings of the Soc. of Bibl. Arqueology” (XVII E XX). Além de um cento de exortações escriturais, este manuscrito contém uma porção da narrativa de Tobias, traduzida, pensa Gaster, a partir de um texto que se situava mais próximo em relação ao aramaico usado por São Jerônimo. É apenas possível, embora não menos provável, que o autor judeu do século XIII do HL fez uso da Vulgata.
(b) HG, Hebraico Gasteri, um texto copiado por Gaster a partir de um Midrash sobre o Pentateuco e publicado no "Proc. da Soc. de Bib. Arch.” (XIX). Este manuscrito, agora perdido, concorda com o aramaico de Neubauer e estava em um compacto como aquele estilo da recensão da Vulgata.
(c) HF, Hebraico Fagii, uma tradução muito livre de AB, feito no século XII por um estudioso judeu: é encontrado na bíblia Poligloda de Walton.  
(d) HM, Hebraico Munsteri, publicado por Munster em Basileia em1542 d.C, encontrado na bíblia Poliglota de Walton. Este texto concorda em regra com o aramaico de Neubauer, mesmo quando este está em desacordo com AB. Trata-se, de acordo com Ginsburg, de origem do quinto século. As versões em hebraico juntamente com o aramaico omitem a referência ao cão, que desempenha um papel proeminente nas outras versões.
A revisão anterior das diversas recensões do Livro de Tobias mostra o quão difícil seria para reconstruir o texto original e como facilmente erros textuais pode ter havido em nossa Vulgata ou no aramaico do qual depende.

CONTEÚDO

A história divide-se naturalmente em duas partes:
(1)   A fidelidade de Tobit o ancião e de Sara ao Senhor (1, 1 a 3, 25)
  • A fidelidade de Tobit (1, 1 a 3, 6) mostrada por seus atos de misericórdia aos colegas cativos (1, 11-17) e, especialmente, para os mortos (1, 18-25), atos que resultaram em sua cegueira (2, 1-18), as provocações de sua mulher (2, 19-23), e o recurso de Tobit a Deus em oração (3, 1-6).
  •  
  •  A fidelidade do Sara, filha de Raguel e Edna (3, 7-23). No mesmo dia em que Tobit em Ninive foi insultado por sua esposa e voltou-se para Deus, Sara em Ecbátana foi hostilizada por sua empregada como homicida de sete maridos (3, 7-10), e voltou-se para Deus em oração (3, 11-23). As orações de ambos foram ouvidas (3, 24-25).
(2)   A fidelidade do Senhor para Sara e Tobias através das ministrações do anjo Rafael (4, 1 a 12, 22).
  • Rafael cuida do jovem Tobias em sua jornada para Gabael em Rages em Midiã para obter os dez talentos de prata deixados no exílio por seu pai (4, 1-9, 12). O jovem decide ir, após uma longa instrução de seu pai (4, 1-23); Rafael se junta a ele como guia (5, 1-28); Tobias enquanto toma banho no Tigre é atacado por um grande peixe, pega-o, e, seguindo o conselho de Rafael, conserva o seu coração, fígado e vesícula (6, 1-22); eles passam por Ecbatana, e páram na casa de Raguel. Tobias pede Sara em casamento e recebe-a (7, 1-20); por continência, exorcismo, do odor da queima de fígado de peixe e da ajuda de Rafael, ele vence o demônio que tinha assassinado os sete anteriores maridos de Sara (8, 1-24); Rafael pega o dinheiro de Gabael em Rages, e traz a Ecbatana para a festa de casamento do jovem Tobias (9, 1-23).
  • Rafael cura a cegueira do ancião Tobit, no retorno de seu filho, e manifesta a verdade de que ele é um anjo (10, 2 a 12, 31). Conclusão: o hino de ação de graças do ancião Tobit, e a subsequente história de pai e filho (13, 1 a 14, 7).
PROPOSTA

Mostrar que Deus é fiel aos que são fiéis a Ele é evidentemente a principal finalidade do livro, Neubauer (op cit, p... XVI) diz que o enterro dos mortos é a principal lição; mas a lição de caridade é mais proeminente. Ewald, “Gesch des Volkes Israel”, IV, 233, estabelece a fidelidade ao código Mosaico como a principal tendência do autor, que escreve para os judeus da dispersão; mas o livro é destinado a todos os judeus, e claramente inculca neles muitas lições secundárias e uma que é crucial para o resto - Deus é verdadeiro para aqueles que são fiéis a ele.

CANONICIDADE

(1) No Judaísmo
O Livro de Tobias é deuterocanônico, isto é, não contido no Canon da Palestina, mas no de Alexandria. Que os judeus da Dispersão aceitaram o livro como canônico Escritura é claro a partir do seu lugar na Septuaginta. Que os judeus da Palestina reverenciaram Tobias como um livro sagrado pode ser alegado a partir da existência da tradução o aramaica utilizada por São Jerônimo e os publicados por Neubauer, como também dos quatro traduções hebraicas existentes. Então, a maioria destas versões semitas foram encontrados como Midrashim, ou hagganda, do Pentateuco.
(2) Entre os Cristãos
Apesar da rejeição de Tobias no cânon protestante, o seu lugar no cânon cristão das Escrituras Sagradas é inquestionável. A Igreja Católica sempre estimou como inspirado.
• São Policarpo (AD 117), Aos Felipenses, Capítulo 10, fala sobre a esmola, e cita Tobias 4, 10 e 12, 9, como sua autoridade para exortar.
• Pseudo-Clemente (AD 150), Aos coríntios Capítulo XVI, tem louvores as esmolas que são um eco de Tobias 1, 8-9.
• São Clemente de Alexandria (190-210 AD), em Stromata VI.12, cita como as palavras das Escrituras Sagradas: “O jejum é bom com a oração” (Tobias 12, 9); e em Stromata I.21 e II.23, “O que odeias, não faça aos outros” (Tobias 4,16).
• Orígenes (cerca 230 d.C) cita como Escritura Tobias 3, 24 e 12, 12-15, em “De oratione”, II; Tobit 2,  1, na seção 14; Tobit 12, 12, na seção 31 (cf. P.G., XI, 448, 461, 553); e escreve a Africanus (PG, XI, 80), explicando que, embora os hebreus não usem Tobias, a Igreja usa.
• Santo Atanásio (AD 350) usa Tobit 12, 7 e 4:19, com a frase distintiva “como está escrito”, cf. “Apol. Contra Arianos II, e Apol. Anúncio Imper. Constantium (PG, XXV, 268, 616).
• Na Igreja ocidental, São Cipriano (248 d.C), muitas vezes refere-se a Tobias como de autoridade divina, tal como ele se refere a outros livros das Sagradas Escrituras; (cf. De mortalitate, x; De opere et eleemosynis, v, xx; De patientia, xviii (P.G., IV, 588, 606, 634); Ad Quirinum, i, 20 para Tobit 12; iii, 1 para Tobias 2: 2; e iv, 5-11; ii, 62 de Tobit 04:12 (PG, IV, 689, 728, 729, 767).
• Santo Ambrósio (370 d.C) escreveu um livro intitulado “De Tobia” contra a usura (PL, XIV, 759), e apresenta-o, referindo-se ao trabalho da bíblia com esse nome como “um livro profético”, “Escritura”.
• Em toda a Igreja ocidental, no entanto, a canonicidade de Tobias é mais clara por sua presença na versão latina antiga, o texto autêntico da Escritura para a Igreja Latina a partir de 150 d.C até ser substituida pela vulgata de São Jerônimo.
• O uso de Tobias canônica em que parte da Igreja bizantina cuja língua era siríaco é visto nos escritos de Santo Efrém (cerca AD 362) e de São Arquelau (cerca AD 278).
• Todas as primeiras listas canônicas contêm o Livro de Tobias; são as do Concílio de Hipona (393 dC), as do concíliode Cartago (397 dC e 419), Santo Inocêncio I (405 d.C), Santo Agostinho (397 d.C).
• Além disso, os grandes manuscritos da Septuaginta do quarto e quinto século são a prova de que não só os judeus, mas os cristãos utilizaram Tobias como canônico.
Contra a canonicidade de Tobias são alegadas várias acusações, porém todas já foram refutadas aqui.

ORIGEM

É provável que o ancião Tobit escreveu pelo menos a parte da obra original em que ele usa a primeira pessoa do singular, (cf. 1, 1-3: 6), em todos os textos, exceto na Vulgata e no aramaico. Como toda a narrativa é histórica, esta parte é provavelmente autobiográfica. Depois de revelar a sua natureza angelical, Rafael manda tanto o pai quanto o filho contar todas as maravilhas que Deus lhes havia feito (Vulgata, 12,20) e escrever em um livro todos os incidentes de sua estadia com eles (cf. o mesmo versículo em AB , Aleph, Vetus Latina, HF, e HM). Se aceitarmos a história como fato-narrativa, naturalmente concluímos que ela foi escrita originalmente durante o Exílio babilônico, na parte inicial do século VII a.C; e que tudo, exceto o último capítulo foi trabalho de pai e filho. Quase todos os protestantes estudiosos consideram o livro pós-exílico. Ewald atribui a 350 a.C; Hgen, atríbue a 280 a.C; Gratz, a 130 d.C; Kohut a 226 a.C.

NOTAS

 1 - As introduções de CORNELY, KAULEN, Danko, Gigot, Seisenberger.  
2 - Embora os Padres usem Tobias, só o Venerãvel Beda (PL, XCI, 923-38) e Walafrid Estrabão (PL, CXIII, 725) deixaram-nos comentários sobre o mesmo.
3 - Durante a Idade Média, HUGH DE ST. VICTOR, Allegoriarum em Vetus Testamentum, IX (PL, CLXXV, 725), e Nicolau de Lyra, DENIS DA Cartuxos, HUGH DE S. CARO, em seus comentários sobre toda a Escritura, interpretaram o Livro de Tobias. Comentaristas posteriores são SERRARI (Monza, 1599); Sanctius (Lyons, 1628); MAUSCHBERGER (Olmutz, 1758); Justiniani (Roma, 1620); DE CELADA (Lyons, 1644); DREXEL (Antuérpia, 1652); NEUVILLE (Paris, 1723); Gutberlet (Munster, 1854); REUSCH (Freiburg, 1857); GILLET DE MOOR, Tobie et Akhiahar (Louvain, 1902); VETTER, Das Buch Tobias und die Achikar-Sábio em Theol. Quartalschrift (Tübingen, 1904).
5 - As principais autoridades protestantes foram citados no corpo do artigo.

PARA CITAR

Drum, Walter. Apologistas Católicos. ‘Tobias.” The Catholic Encyclopedia. Vol. 14. New York: Robert Appleton Company, 1912. 17 Aug. 2014. Disponível em . Tradução: Rafael Rodrigues.


[1] Æons é o termo dado por heresiarcas gnósticos para designar o conjunto de poderes espirituais evoluídos por emanação progressiva do Ser eterno, e que constituem a Pleroma ou o mundo espiritual invisível, como distinta da Kenoma, ou mundo material visível.

1º Livro dos Macabeus

Com o título de Macabeus são designados dois livros que fazem parte da Sagrada Escritura, embora sejam conhecidos mais dois com este nome na antiga literatura judaica. Nos primeiros séculos da Igreja, houve algumas dúvidas em considerá-los parte do Cânone. De facto, não constam no Cânone da Bíblia Hebraica dos judeus pales­ti­nenses; mas fazem parte da Bíblia do judaísmo de Alexandria. Este facto veio a criar, por parte das igrejas protestantes, uma atitude de reserva para com eles; quanto aos outros dois, cedo lhes foi recusada a classificação de livros bíblicos, tanto pelos judeus como pelos cristãos.
NOME
Chamam-se Macabeus, não porque tal fosse o nome do seu autor, mas porque Judas – o protagonista dos principais acontecimentos narrados nos dois livros – foi denominado “Macabeu”. Porém, foi São Clemente de Ale­xan­­dria (séc. III d.C.) quem, pela primeira vez, lhes atribuiu esse título, que se tornou corrente na tradição cristã.
Muito provavelmente, com esse nome ter-se-á querido salientar a missão que Deus, Senhor da História, quisera confiar a Judas Macabeu. De facto, o termo “macabeu” apa­rece em Is 62,2 com o significado de «designado do Senhor», que corres­ponde perfeita­mente à qualidade de chefe com que Judas é descrito em 2 Mac 8,1-7. Tam­bém é muito semelhante ao que se diz dos chefes carismáticos do período dos Juízes e ao papel dos que têm a missão de libertar o povo de um poder político ou de uma cultura que não respeita a fé de Israel.
AUTOR E MENSAGEM
O 1.° livro dos Macabeus é obra de autor des­co­nhecido, mas bom conhecedor da Palestina e imbuído da fé que caracteriza o povo eleito. É precisamente esta fé que o leva a narrar a História recente do seu povo, para impedir os seus irmãos de raça de serem infiéis à aliança.
No horizonte, está o confronto entre a fé de Israel e os novos modos de viver da cultura helenística, em que o judaísmo da diáspora se encontra. Para responder a essa situação con­creta e precaver da traição à fé, o autor vai buscar este período histórico e os modelos de fé nele encontrados.
Tocado pela dura experiência do tempo do domínio selêucida, com An­tíoco IV Epifânio à cabeça, volta-se para a raiz da fé, que é a aliança do Sinai, e diz ao povo: «Deus está sempre atento e vai fazer surgir homens cora­josos e determinados, para resistirmos à imposição dos valores culturais que ameaçam as atitudes de vida exigidas pela aliança». Por isso, mais que descrever objectivamente o que fizeram esses homens, o autor preocupa-se em mostrar como, por atitudes idênticas às deles, o povo fiel pode continuar a viver a sua fé no Deus único e a manter a sua identidade nacional.
GÉNERO LITERÁRIO
Os dois livros dos Macabeus são históricos, segundo os critérios historiográficos da época, e com uma acentuada preocupação religiosa e edificante.
Mais que uma narração objectiva dos acontecimentos do mesmo período, nem sempre concordantes, porque entre si distintos e independentes, asse­mel­ham-se a dois Evangelhos Sinópticos: o 1.° livro abrange o período que vai de 175 a.C. a 134 a.C. (subida ao trono de João Hircano); o 2.° livro cobre o período de 175 a.C. a 160 a.C. (morte de Nicanor).
DIVISÃO E CONTEÚDO
A narração dos acontecimentos está distribuída em quatro blocos: no primeiro traça-se o am­biente político e cultural criado por Alexandre Magno, que origina a revolta dos Macabeus (1,1-2,70); no segundo narram-se os feitos glo­rio­sos de Judas Macabeu (3,1-9,22); no terceirodescrevem-se os feitos de Jó­na­tas (9,23-12,54) e, no quarto, os fei­tos do Sumo Sa­cerdote Simão, fun­­dador da dinas­tia dos Hasmo­neus (13,1-16,24).