segunda-feira, 2 de junho de 2014

Os enganos na História humana.


Você já percebeu que nem sempre as coisas são o que aparentam ser? Durante séculos, os cientistas acreditaram que a Terra era o centro fixo do Universo e que tudo, inclusive o Sol e as estrelas, orbitava ao redor dela. Foi um livre-pensador polonês, Copérnico, quem determinou que a Terra estivesse em movimento e girava em torno do Sol.

Ele comparou esse fenômeno à maneira como os marinheiros, quando estão dentro de um navio com o mar calmo, experimentam a ilusão de estarem perfeitamente parados enquanto tudo ao redor se move.

 “Da mesma maneira” escreveu Copérnico, “o movimento da Terra pode produzir a impressão inquestionável de que o Universo inteiro esta em rotação”.

Simplesmente porque o Sol e as estrelas aparentavam estar girando em torno da Terra não significa que isso que isso é verdade. Apenas porque outros acreditam também não. Os insetos, como se sabe, possuem seis patas. Durante séculos ninguém questionou o grande Aristóteles. As pessoas presumiam que as aranhas eram insetos e, portanto, tinham seis patas. Foi Jean-Baptiste Lamarck quem apresentou a classificação da aranha como um aracnídeo, possuidor de oito patas. Somente porque as pessoas acreditam em algo por séculos, não significa que seja verdade.

Seria possível que uma tradição como esta tenha se infiltrado em diversas áreas de estudo da vida humana? Seria possível que milhões tenham aceitado a falsidade no lugar da verdade, e poucos questionam isso? Seriam possíveis as tradições com seus fatos históricos distorcidos passar a ser aceitas como verdades?

Einstein foi considerado um dos maiores cérebros humanos. Mas teve alguns códigos da Inteligência represados? Sim. Foram tão represados que ele cometeu algumas falhas inadmissíveis na relação com um dos filhos, mas raramente se comenta esse assunto na imprensa mundial.

Einstein era um homem simples, sociável, gentil, amante da música, mas o código da Resiliência, a ser estudado, e o código da capacidade de se encantar atenta e prolongadamente com os pequenos estímulos da rotina diária estavam contraídos.



Se ele tivesse lutado contra as construções de seus vilões interiores como traços de pessimismo e pensamentos mórbidos não teria deixado de visitar seu filho de visitar por anos a fio seu filho portador de uma psicose no manicômio em que o internou. O ambiente tétrico do hospital e seu sentimento de impotência em lidar com fatos ilógicos também o angustiaram. Por não decifrar determinados fenômenos da mente humana, o gênio da física agiu em algumas áreas sem nenhuma genialidade. Einstein estudou os completou os buracos negros que são capazes de sugar e destruir estrelas e planetas inteiros como a Terra.

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Relação conturbada entre Estados Unidos e países da América Latina.


O historiador Voltaire Schilling nasceu em Porto Alegre, em 1944. Leciona História há mais de 30 anos em diversas instituições de ensino. Em seu livro Estados Unidos e América Latina: Da Doutrina Monroe á ALCA (Editora Leitura XXI, 2002, 144p) ele procura levar seus leitores há uma visão interpretativa das diferenças culturais entre os norte-americanos e seus vizinhos do sul. Fixando as idéias bases que nortearam as relações dos Estados Unidos com a América Latina. Relações estas que ataram o destino dos latinos americanos a um processo de subserviência neocolonial.

Voltaire Schilling aborda as relações entre Estados Unidos e América Latina de forma muito resumida nas idéias bases como: as doutrinas, os ideários, os corolários e os enunciados, não levando em consideração a complexidade envolvida em cada uma destas idéias que envolvem contextos temporais e regionais. Do mesmo modo que enfatiza a admiração dos latinos pelo sucesso dos Estados Unidos o autor nos mostrar o ressentimento com as constantes intromissões dos mesmos nos assuntos da América Latina, demonstrando uma plena lucidez sobre os fatos que envolvem os interesses dos Estados Unidos e suas intervenções.

O autor aponta a questão religiosa como grande barreira de desenvolvimento para a América Latina, de maioria Católica. Em contra posição a Anglo-saxã, de maioria protestante. Colocando deste modo um ponto de vista religioso, pois os Católicos tem por primazia o espiritual e no protestantismo o espiritual pode andar lado a lado com o material. Crendo o mesmo ser este um dos motivos do melhor desenvolvimento dos Estados Unidos em relação ao restante da América Latina Católica.

Apontando de forma variada no decorrer dos séculos os interesses dos Estados Unidos em substituir o domínio colonial europeu pelo seu domínio imperialista por meio da criação de Doutrinas, Regras, Estatutos e Leis (Destino Manifesto, Doutrina Draco, Doutrina Monroe dentre outras) para controlar as nações latino-americanas recém-emancipadas, mas esquecendo-se que estas nações foram deixadas em situação de pleno abandono pelas metrópoles deixandas a mercê dos interesses comercias e expansionistas norte-americanos.

Deste modo as guerras travadas pelas oligarquias locais incentivaram ainda mais a presença ianque, pois como esquece de relatar o autor, deixava claro para os interessados a total desordem deixada pelos colonizadores europeus diante de suas colônias e levava os Estados Unidos como cita Schilling a “acreditar” ter uma “missão civilizadora” a cumprir nesse vácuo político-social.

Vemos nas palavras do autor um pequeno mas importante ponto que fica de fora sobre a questão cubana. Cuba sempre foi vista pelos ianques como uma continuação do litoral norte-americano e deste modo sempre sofreu intervenções dos mesmos para mantê-la como tal. Primeiro expulsando os espanhóis e depois lutando contra os nativos para manter o estado cubano como um mero satélite de Washington. Foi diante dessa situação que a Revolução cubana se desencadeou, não tendo opção, pois de um lado estava à Espanha colonial e do outro os Estados Unidos imperialistas, Fidel e seus revolucionários procuraram refúgio nas idéias comunistas da URSS, onde encontraram apoio para manter sua dignidade com independência política, mas com apoio internacional vindo de Moscou.


No decorrer do livro o autor demonstrar que caberia aos Estados Unidos manter a ordem na América Latina, como esta nas entrelinhas da Doutrina Monroe, e desse modo manteria afastada as intervenções européias. Podemos ver até nos dias de hoje que isto ficou somente no papel, começando pela Guerra das Malvinas, podemos citar várias intervenções de interesses europeus diretamente ou indiretamente pelos Estados Unidos serem impostos na América Latina.


domingo, 25 de maio de 2014

Discurso de Charles Chaplin no filme "The Great Ditactor".


Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício. Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de ajudar – se possível – judeus, o gentio... negros... brancos.

Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim. Desejamos viver para a felicidade do próximo – não para o seu infortúnio. Por que havemos de odiar e desprezar uns aos outros? Neste mundo há espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover a todas as nossas necessidades.

O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade, mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência, empedernidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que de máquinas, precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.

A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A própria natureza dessas coisas é um apelo eloquente à bondade do homem... um apelo à fraternidade universal... à união de todos nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhares de pessoas pelo mundo afora... milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas... vítimas de um sistema que tortura seres humanos e encarcera inocentes. Aos que me podem ouvir eu digo: “Não desespereis! A desgraça que tem caído sobre nós não é mais do que o produto da cobiça em agonia... da amargura de homens que temem o avanço do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a liberdade nunca perecerá.

Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam... que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas ideias e os vossos sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação regrada, que vos tratam como gado humano e que vos utilizam como bucha de canhão! Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... os que não se fazem amar e os inumanos!


Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade! No décimo sétimo capítulo de São Lucas está escrito que o Reino de Deus está dentro do homem – não de um só homem ou grupo de homens, mas dos homens todos! Está em vós! Vós, o povo, tendes o poder – o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo, tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto – em nome da democracia – usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um mundo novo... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à mocidade e segurança à velhice.

É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam! Não cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância, ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos! ( segue o estrondoso aplauso da multidão ).

domingo, 18 de maio de 2014

Biografia de Monteiro Lobato


Monteiro Lobato (1882-1948) foi um escritor brasileiro. "O Sítio do Pica-pau Amarelo" é uma de suas obras de maior destaque na literatura infantil. Foi um dos primeiros autores de literatura infantil em nosso país e em toda América Latina. Tornou-se editor, criando a "Editora Monteiro Lobato" e mais tarde a "Companhia Editora Nacional". Metade de suas obras é formada de literatura infantil.

Monteiro Lobato (1882-1948) nasceu em Taubaté, São Paulo, no dia 18 de abril de 1882. Era filho de José Bento Marcondes Lobato e Olímpia Monteiro Lobato. Alfabetizado pela mãe, logo despertou o gosto pela leitura, lendo todos os livros infantis da biblioteca de seu avô o Visconde de Tremembé. Desde menino já mostrava seu temperamento irrequieto, escandalizou a sociedade quando se recusou fazer a primeira comunhão. Fez o curso secundário em Taubaté. Com 13 anos foi estudar em São Paulo, no Instituto de Ciências e Letras, se preparando para a faculdade de Direito.

Registrado com o nome de José Renato Monteiro Lobato, resolve mudar de nome, pois queria usar uma bengala, que era de seu pai, que havia falecido no dia 13 de junho de 1898. A bengala tinha as iniciais J.B.M.L gravadas no topo do castão, então mudou de nome, passou a se chamar José Bento, assim as suas iniciais ficavam iguais às do pai.

Ingressou na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco na capital, formando-se em 1904. Na festa de formatura fez um discurso tão agressivo que vários professores, padres e bispos se retiraram da sala. Nesse mesmo ano voltou para Taubaté. Prestou concurso para a Promotoria Pública, assumindo o cargo na cidade de Areias, no Vale do Parnaíba, no ano de 1907.

Monteiro Lobato casou-se com Maria Pureza da Natividade, em 28 de março de 1908. Com ela teve quatro filhos, Marta (1909), Edgar (1910), Guilherme (1912) e Rute (1916). Paralelamente ao cargo de Promotor, escrevia para vários jornais e revistas, fazia desenhos e caricaturas. Ficou em Areias até 1911, quando muda-se para Taubaté, para a fazenda Buquira, deixada como herança pelo seu avô.

No dia 12 de novembro de 1912, o jornal O Estado de São Paulo publicou uma carta sua enviada à redação, intitulada "Velha Praga", onde destaca a ignorância do caboclo, criticando as queimadas e que a miséria tornava incapaz o desenvolvimento da agricultura na região. Sua carta foi publicada e causou grande polêmica. Mais tarde, publica novo artigo "Urupês", onde aparece pela primeira vez o personagem "Jeca Tatu".

Em 1917 vende a fazenda e vai morar em Caçapava, onde funda a revista "Paraíba". Nos 12 números publicados, teve como colaboradores Coelho Neto, Olavo Bilac, Cassiano Ricardo entre outras importantes figuras da literatura. Muda-se para São Paulo, onde colabora para a "Revista do Brasil". Entusiasmado compra a revista e, transformando-se em editor. Publica em 1918, seu primeiro livro "Urupês", que esgota sucessivas tiragens. Transforma a Revista em centro de cultura e a editora numa rede de distribuição com mais de mil representantes.

No dia 20 de dezembro de 1917, publica no jornal O Estado de São Paulo, um artigo intitulado "Paranoia ou Mistificação?", onde critica a exposição de Anita Malfatti, pintora paulista recém chegada da Europa. Estava criada uma polêmica, que acabou se transformando em estopim do movimento modernista.

Monteiro Lobato, em sociedade com Octalles Marcondes Ferreira, funda a "Companhia Gráfico-Editora Monteiro Lobato". Com o racionamento de energia, a editora vai à falência. Vendem tudo e fundam a "Companhia Editora Nacional". Lobato muda-se para o Rio de Janeiro e começa a publicar livros para crianças. Em 1921 publica "Narizinho Arrebitado", livro de leitura para as escolas. A obra fez grande sucesso, o que levou o autor a prolongar as aventuras de seu personagem em outros livros girando todos ao redor do "Sítio do Pica-pau Amarelo". Em 1927 é nomeado, por Washington Luís, adido comercial nos Estados Unidos, onde permanece até 1931.

Como escritor literário, Lobato destacou-se no gênero "conto". O universo retratado, em geral são os vilarejos decadentes e as populações do Vale do Parnaíba, quando da crise do plantio do café. Em seu livro "Urupês", que foi sua estreia na literatura, Lobato criou a figura do "Jeca Tatu", símbolo do caipira brasileiro. As histórias do "Sítio do Picapau Amarelo", e seus habitantes, Emília, Dona Benta, Pedrinho, Tia Anastácia, Narizinho, Rabicó e tantos outros, misturam a realidade e a fantasia usando uma linguagem coloquial e acessível.

O livro "Caçadas de Pedrinho", publicado em 1933, que faz parte do Programa Nacional Biblioteca na Escola, do Ministério da Educação, está sendo questionado pelo movimento negro, por conter "elementos racistas". O livro relata a caçada a uma onça que está rondando o sítio. "É guerra e das boas, não vai escapar ninguém, nem tia Anastácia, que tem cara preta".

José Renato Monteiro Lobato morreu no dia 5 de julho de 1948, de problemas cardíacos.

Obras de Monteiro Lobato

Idéias de Jeca Tatu, conto, 1918
Urupês, conto, 1918
Cidades Mortas, conto, 1920
Negrinha, conto, 1920
O Saci, literatura infantil, 1921
Fábulas de Narizinho, literatura infantil, 1921
Narizinho Arrebitado, literatura infantil, 1921
O Marquês de Rabicó, literatura infantil, 1922
O Macaco que se fez Homem, romance, 1923
Mundo da Lua, romance, 1923
Caçadas de Hans Staden, literatura infantil, 1927
Peter Pan, literatura infantil, 1930
Reinações de Narizinho, literatura infantil, 1931
Viagem ao Céu, literatura infantil, 1931
Caçadas de Pedrinho, 1933
Emília no País da Gramática, literatura infantil, 1934
História das Invenções, literatura infantil, 1935
Memórias da Emília, literatura infantil, 1936
Histórias de Tia Nastacia, literatura infantil, 1937
Serões de Dona Benta, literatura infantil, 1937
O Pica-pau Amarelo, literatura infantil, 1939

Fábulas de Monteiro Lobato

O Cavalo e o Burro
A Coruja e a Águia
O Lobo e o Cordeiro
O Corvo e o Pavão
A Formiga Má
A Garça Velha
As Duas Cachorras
O Jaboti e a Peúva
O Macaco e o Coelho
O Rabo do Macaco
Os Dois Burrinhos
Os Dois Ladrões
A caçada da Onça

Jeca Tatu

quinta-feira, 15 de maio de 2014

O escravo no Rio Grande do Sul


O escravo e o trabalho com a cana de açúcar. Fonte: Arquivo Pessoal CHH.

Autor: Leandro Claudir

Para a historiografia sulina durante décadas o escravo africano inexistiu, sendo esse um consenso entre os historiadores a pouca importância que teria tido o escravo na formação do Rio Grande do Sul. Avaliavam ser o homem livre o fator preponderante na formação de nosso Estado. Acreditavam que os escravos eram pouco utilizados, e quando se falava neles era para ressaltar que aqui, se houve escravismo, ele foi paternal, benigno. Pelo conceito vigente acreditavam que havia sido pequena a contribuição de sangue africano na etnia rio-grandense.

Diante desses fatos cria-se então o difuso mito da Província libertária, obra do braço livre, inocente, ou quase, da pecha da escravidão. Mas os primeiros escritos sérios sobre o assunto irão provar o contrário. Participando do amplo movimento da década de 30, que reiniciará o estudo mais sistemático da “africanologia” brasileira, aparecerão os primeiros trabalhos do advogado Dante de Laytano que procurará, nos documentos, relatos e mapas estatísticos do século XVIII e XIX, o traço da passagem da escravidão pelo Rio Grande do Sul. Tece duras palavras sobre a benignidade do tratamento aos escravos, pois enquanto os negros estavam no pastoril do Rio Grande tiveram um tratamento mais humano, mas ao habitar a senzala dos granjeiros ou as charqueadas esse tratamento foi modificado pelas chicoteadas do feitor e pela barbárie escravagista.

Na verdade, a história do escravo no sul está, ainda, por escrever-se. Isso deve-se a resistência dos historiadores gaúchos a escrever a história como ela é, pois tornará pouco simpático os heróis aparecerem como senhores-de-escravos. Junta-se a esse problema a raridade das fontes históricas, pois muitas foram propositalmente destruídas. A saga do escravo no Rio Grande do Sul não deve ser esquecida, pois ali nas fétidas e úmidas senzalas das charqueadas, nos suicídios do escravo desesperado, no negro aquilombado, nas tentativas de fuga e insurreições está o passado do nosso povo. No fim do século XVII, Portugal funda a Colônia de Sacramento e uma das mercadorias procuradas que mais chegavam à mesma colônia era o negro. Era um gigantesco mercado de mão-de-obra servil devido a sua posição geográfica que facilitava tanto o recebimento como a distribuição pela região. O comercio com o homem escravizado será uma realidade cotidiana na Colônia. Outra atividade importante para a Colônia de Sacramento além do contrabando era o couro, sebos carnes salgadas e os escravos africanos como citados anteriormente. A caça ao gado da Banda Oriental, pelo seu couro, será permanentemente, um dos pilares econômicos da Colônia. Conseguindo o couro, era ele secado e exportado para o Brasil, ou para o exterior. Com a abertura do ciclo mineiro, com o descobrimento dos campos auríferos em Minas Gerais. As “vacarias” do sul serão agora valorizadas não somente pelo couro que se podia extrair. O gado vale como animal de carga, como fonte de suprimento.

Nos primeiros anos do novo século, começarão a descer, em direção ao sul, tropeiros vicentinos em busca do valorizado e abundante gado. Isso possibilita a fixação do homem: as primeiras “estâncias”, os primeiros povoados. A ocupação do sul, que vinha dando-se em função da Colônia de Sacramento, torna-se independente desta, toma uma razão em si. Mas isso não significa que a ocupação do Rio Grande do Sul tenha-se dado baseada essencialmente sobre o braço livre. Mesmo sendo obvio que a caça ao gado selvagem não se combinava com o trabalho compulsório. Os peões que trabalhavam na courama eram senhores de seus destinos, pois se encontravam com boas montarias e armados. Coisas que não se encaixavam com o homem escravizado. Alguns escravos que participavam dessas atividades transformavam-se em acompanhantes de seus senhores como guarda-costas e pajens. A escravidão era meramente jurídica. A abundância de mão de obra para estas atividades estava relacionada com a dificuldade de obter terras e o orgulho impedia os colonos de competir com os escravos índios e negros pela agricultura, pois isso os faria manchar a honra espanhola. O negocio do gado era diferente. Era “Sport”, não trabalho. O mesmo era válido para o lusitano.


Cicatrizes dos açoites dos feitores. Fonte: Arquivo Pessoal CHH. 

Desse modelo social nasce o gaudério, changador ou gaúcho. Em regra homens de má índole, vagabundos e fugitivos. O gaúcho foi parte fundamental de nossa história que esqueceu do eterno presente : o escravo. Embora, até quase o início do século XIX não tivéssemos um regime social de produção escravista a presença do homem escravizado era constante e significativa. O nosso território começa a ser ocupado durante um período aonde a sociedade brasileira esta toda alicerçada sobre a exploração do trabalho servil. A posse de um escravo significava status social. A presença do escravo em nossas primeiras estâncias e algo pouco estudado, mas seu papel importante esta presente na analise de mapas estatísticos da Capitania. A agricultura ocupará, também, nesses primeiros anos o braço escravo. Não o fará porém com exclusividade. O regime social de escravidão se estrutura com a expulsão dos espanhóis e a fundação da primeira charqueada, ao nível industrial, que teremos uma atividade produtiva de primeira ordem, baseada na exploração do trabalho escravo. Iniciando a introdução sistemática de escravos para a exploração na atividade produtiva. O ato de charquear era uma pratica artesanal e o próprio peão podia preparar o couro e carneá-lo, estender as carnes. O começo da produção industrial de charque no Rio Grande do Sul deve-se as secas do final do século XVIII, no nordeste que até então era o produtor da carne seca.

Desse modo o mercado do produtor; o Rio Grande do Sul o substituirá. O ciclo da charqueada inaugura a definitiva estruturação do escravismo como modo social de produção dominante de uma ampla região de nosso território. As conseqüências e determinação que isso trará para a nossa história não foram, ainda, nem mesmo delineadas. Por mais de cem anos, a classe economicamente mais dinâmica viverá da exploração direta do trabalho escravo. Teremos então nossas senzalas, feitores, tronco, nossas “casas grandes” e nelas frente a frente, o senhor e o escravo. Pode-se dizer que o limite da jornada de trabalho na charqueada era a resistência física do escravo. A violência na charqueada era extrema, o escravo mau trabalhador era na maioria das vezes castigado e torturado. Era um nodo de coerção muito eficiente para os senhores das charqueadas. Com a supressão “Legal” da entrada de novos escravos em 1850, pressionado pela marinha inglesa, o império começa efetivamente a reprimir o tráfico negreiro. Teremos porém ainda os desembarques clandestinos.

O contrabando de escravos que desembarcaram em Montevidéu no Uruguai era comum até a abolição da escravatura no mesmo. Outro problema a ser abordado pela historiografia era a origem dos escravos que chegavam ao Rio Grande do Sul, pois no máximo o que aparecia nos registros era o porto em que eram embarcados no continente africano. Para esboçar a origem e tradição histórico-cultural do afro-gaúcho seria necessário dois grandes processos. Identificar as correntes escravistas do continente africano e definir suas conexões com o nosso tráfico. O escravo era ensinado a obedecer e acreditar na superioridade de seu senhor. Porém incessantemente, o escravo resistiu. Quando resiste e retoma das mãos do senhor sua vida, reassume sua essência, é homem.

O ápice da resistência ao escravismo foi a insurreição mesmo rara e os quilombos, sociedades livres para homens livres. Eram insurgências sociais, coletivas. De modo individual o escravo, fazia corpo mole, fugia, ajustiçava eu senhor e sua família, feitor e o suicídio como o limite máximo da busca por liberdade. O suicídio será uma constante na história do escravismo. As concepções religiosas africanas, a brutalização e desumanização a que era lançado, as duras condições de sua vida, tudo apontava ao suicídio como possível alternativa. Podia assumir esse ato proporções verdadeiramente endêmicas. O suicídio não era só um perda material, mas uma sansão moral. A fuga de escravos para alcançar liberdade era comum, pois fugiam para aquilombar-se em um retirado ermo, para construir uma cabana afastada no campo, para procurar um novo senhor. No Rio Grande do Sul fugia em direção a fronteira castelhana, raia da liberdade.


Engenho colonial de cana de açúcar. Fonte: Arquivo Pessoal CHH. 

A fuga do escravo atravessará toda a história do escravismo gaúcho. A mais comum era a fuga para a constituição de “quilombos”. O escravo não só procurava conquistar sua liberdade através da fuga. São constantes, na documentação do Império, referências a insurreições ou tentativas de insurreições servis. As conspirações libertarias dos escravos gaúchos, no entanto,foram sempre reprimidas antes de eclodirem. E isso não era de estranhar devido a várias barreiras como: comunicação, línguas distintas, repressão e delação entre outras. O envelhecimento da escravaria, a escassez crescente de braços servis, assim como outros fatores, obrigou aos senhores-de-escravos a procurarem outro tipo de trabalhador para suas fazendas, plantações, etc. A escravidão no Brasil, prolongou-se até o apodrecimento. O apego constante dos historiadores gaúchos, em manter sob sua tutela a presença imaculada dos heróis de nosso estado tem impedido que a luz de fatos que construíram nossa sociedade atual venham a tona. Protegendo os heróis de receberem também o titulo de senhores-de-escravos, estão obstruindo o avanço do nosso encontro com nossas origens. No decorrer do texto o autor demonstra uma clara preocupação em situar o leitor dentro do contexto internacional e nacional que levaram a escravatura no Rio Grande do Sul e de forma objetiva demonstra o uso do instrumento servil desde o inicio da colonização no Estado.

A única mudança foi devido à maior necessidade de produção e capital com a vinda das charqueadas. Com as charqueadas os escravos começaram a trabalhar como máquinas em uma linha de produção, sendo cobrados para trabalharem mais por muito pouco (custo-benefício). Para que desse modo seus senhores viesse a lucrar muito. Podemos observar que o escravo era um objeto de uso para seus senhores, pois se ficasse desgastado (muito doentes e velhos) depois de muito trabalho eram substituído como um maquinário obsoleto por um mais atual, no caso um negro mais jovem. Mas pior que a escravidão é alguns historiadores terem o interesse de excluir esse evento dos anais da história de nosso Estado. Isso é como se mantivéssemos escravizados até hoje todos os escravos que aqui em nosso Estado chegaram e com sangue ajudaram a construir nossa economia e desenvolvimento. Diante de todos os fatos presentes no texto fica clara a luta permanente do humano de pele negra procurando constantemente a liberdade, pois é um grito presente dentro da própria alma do individuo. Essa luta estava presente nas fugas mesmo que sem rumo, nos quilombos como uma luta organizada de estabelecer uma sociedade construída por eles e para eles, aonde fossem aceitos. Uma luta que levava a natureza de liberdade presente na alma humana ao extremo, de sentir-se em saída e como última saída à vingança contra seus algozes ou o suicídio baseado em suas crenças na esperança de retornar a sua terra.