Os sofistas eram
considerados mestres da retórica e da oratória, acreditavam que a verdade é
múltipla, relativa e mutável. Protágoras foi um dos mais importantes sofistas.
Na Grécia Antiga, haviam
professores itinerantes que percorriam as cidades ensinando, mediante
pagamento, a arte da retórica às pessoas interessadas. A principal finalidade
de seus ensinamentos era introduzir o cidadão na vida política. Tudo o que
temos desses professores são fragmentos e citações e, por isso, não podemos
saber profundamente sobre o que eles pensavam. Aquilo que temos de mais
importante a respeito deles foi aquilo que disseram seus principais adversários
teóricos, Platão e Aristóteles.
Eles eram chamados de sofistas,
termo que originalmente significaria “sábios”, mas que adquiriu o sentido de
desonestidade intelectual, principalmente por conta das definições de
Aristóteles e Platão. Aristóteles, por exemplo, definiu a sofística como
"a sabedoria (sapientia) aparente mas não real”. Para ele, os sofistas
ensinavam a argumentação a respeito de qualquer tema, mesmo que os argumentos
não fossem válidos, ou seja, não estavam interessados pela procura da verdade e
sim pelo refinamento da arte de vencer discussões, pois para eles a verdade é
relativa de acordo com o lugar e o tempo em que o homem está inserido.
O contexto histórico e
sociopolítico é importante para que se compreenda o papel e o pensamento dos
sofistas para a sociedade grega. Embora Anaxágoras tenha sido o filósofo
oficial de Atenas na época do regime de Péricles, não havia um sistema público
de ensino superior, então jovens que podiam pagar por instrução recorriam aos
sofistas a fim de se prepararem para as dificuldades que enfrentariam na vida
adulta. Uma delas, imposta pelo exercício da democracia, era a dificuldade de
resolver divergências pelo diálogo tendo em vista um interesse comum. O termo
“sofista” não corresponde, portanto, a uma escola filosófica e sim a uma
prática. Mesmo assim, podemos elencar algumas caracterizações comuns aos
sofistas:
a) Oposição entre natureza
(phýsis) e cultura (nómos): Pelo que sabemos, podemos dizer que a maior parte
dos sofistas tinha seu interesse filosófico concentrado nos problemas do homem
e da natureza. Isso significa que aquilo que é dado por natureza não pode ser
mudado, como a necessidade que os homens têm de se alimentar. O que é dado por
cultura pode ser mudado, como, por exemplo, aquilo que os homens escolhem como
alimento. Ou seja, todos nós precisamos da alimentação para continuarmos vivos,
mas na China, a carne dos cães pode fazer parte do cardápio e, na Índia, o
homem não pode se alimentar da carne bovina, pois a vaca é considerada um
animal sagrado.
b) Relativismo. Para os
sofistas, tudo o que se refere à vida prática, como a religião e a política,
era considerado fatores culturais, logo podiam ser modificados. Dessa forma,
colocavam as normas e hábitos em dúvida quanto à sua pertinência e
legitimidade. Como eles eram relativistas, suas questões podiam ser levadas
para o seguinte sentido: as leis estabelecidas são pertinentes para essa cidade
ou precisam ser mudadas?
c) A existência dos deuses.
Para os sofistas, é mais provável que os deuses não existam, mas eles não
rejeitam completamente a existência, como Platão, por exemplo. Portanto, eles
são mais próximos do agnosticismo do que do ateísmo. A diferença entre os
sofistas e aqueles que acreditavam nos deuses – e a educação grega esteve, no
início, ligada à existência e interferência dos deuses nos destinos da humanidade
– é que eles preferiam não se pronunciar a respeito. Mas, se os deuses
existissem, eles não teriam formas e pensamentos humanos.
d) A natureza da alma. A
definição de alma para os sofistas é de uma natureza passiva e podia ser
modelada pelo conhecimento que vem do exterior. Isso é muito importante para a
prática que eles exerciam, pois, se as pessoas possuem almas passivas, elas
podem ser convencidas de qualquer discurso proferido de forma encantadora. Por
isso, era preciso lapidar a técnica a fim de levar as pessoas a pensarem de um
modo que favoreça o orador, ou seja, aquele que está falando para o público. A
resistência que alguma pessoa oferece a algo que é dito não seria proveniente
da capacidade de refletir ou questionar e sim era decorrência da inabilidade
discursiva do orador.
e) Rejeitam questões
metafísicas. Os sofistas estavam bastante empenhados em resolver questões da
vida prática da pólis. Aquilo que contribuiria para uma vida melhor com os
outros ou para atender às necessidades imediatas era o centro de suas
preocupações. Por concentrarem seus esforços para pensar naquilo que
consideravam útil, questões como a origem do seres, a vida após a morte e a
existência dos deuses, ou seja, questões de ordem metafísica, eram rejeitadas.
f) A habilidade de
argumentar, mesmo se as teses fossem contraditórias, também era um de seus
fundamentos. Apesar da dura crítica feita a eles, o trabalho dos sofistas
respondia a uma necessidade da época: com o desenvolvimento e a consolidação da
democracia na Atenas do século V a.C., era imprescindível desenvolver a
habilidade de argumentar em público, defender suas próprias ideias e convencer
a maior parte da assembleia a concordar com aquilo que os beneficiaria
individualmente.
g) Antilógica. Uma
estratégia de ensino comum aos sofistas era ensinar os jovens a defenderem uma
posição para, em seguida, defenderem seu oposto. Essa técnica argumentativa foi
chamada de antilógica e foi criticada por Platão e Aristóteles por corromper os
jovens com a prática da mentira. Historiadores contemporâneos, no entanto,
consideram essa técnica como uma atividade característica do espírito
democrático por respeitar a existência de opiniões diferentes (cf. CHAUÍ,
Marilena).
Os mais conhecidos sofistas
foram Protágoras de Abdera (c. 490-421 a.C.), Górgias de Leontinos (c. 487-380
a.C.), Hípias de Élis, Isócrates de Atenas, Licofron, Pródicos e Trasímaco.
Vamos agora conhecer um dos mais importantes, Protágoras.
Protágoras: “O homem é a
medida de todas as coisas”
Um dos responsáveis para que
Protágoras se tornasse um dos mais conhecidos sofistas foi Platão, que dedicou
a ele uma obra, o que mostra que o filósofo, mesmo sem concordar com o sofismo,
respeitou o pensamento de Protágoras ao ponto de se dedicar a elaborar
objeções. Além de ensinar a arte do debate aos jovens em suas muitas visitas a
Atenas (lembre-se de que os sofistas eram professores itinerantes, isto é, não
residiam em um lugar específico), foi nomeado por Péricles para redigir a
constituição de uma colônia ateniense (cf. KENNY, Anthony).
No diálogo Teeteto, Platão
traz um importante pensamento de Protágoras: “O homem é a medida de todas as
coisas, das que são como são e das que não são como não são”. Isso significa,
em outras palavras, que se uma pessoa pensa que uma coisa é verdade, tal coisa
é a verdade para ela. Ou seja, a verdade é subjetiva e relativa, não objetiva e
absoluta. Por exemplo, se uma pessoa está com febre, ela pensa que a
temperatura do ambiente está baixa, mesmo que ela esteja em Fortaleza e os termômetros
apontem 38 graus.
Como não há uma verdade
objetiva a ser considerada, a verdade sempre seria relacionada aos indivíduos.
Em relação à crença nos deuses (como sabemos, a sociedade grega era
politeísta), o relativismo tem a consequência de que não há uma crença mais
correta do que a outra, todas devem ser respeitadas, pois o homem não pode
saber nada a respeito dos deuses, se existem ou como são. Quando diz isso,
Protágoras se aproxima do agnosticismo. Em suas palavras, que chegaram a nós
por Diogenes Laertios:
“No que diz respeito aos
deuses, não posso ter a certeza de que existem ou não, ou de como eles são;
pois entre nós e o conhecimento deles há muitos obstáculos, quer a dificuldade
do assunto, quer a pouca duração da vida humana”.
Diogenes Laertios, ao
criticar Protágoras, nota que sua obra foi queimada em praça pública por
atenienses que acreditavam que ele corrompia a juventude e ironiza, dizendo que
ele foi o primeiro homem a dizer que em relação a qualquer assunto há duas
afirmações contraditórias. Depois, Platão objetou que se todas as crenças são
verdadeiras, a crença de que nem todas as crenças são verdadeiras também é
verdadeira.