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terça-feira, 16 de agosto de 2016

Esqueletos acorrentados - Os membros da Rebelião de Cílon podem ter sido encontrados



O nos resta após a morte, além de poeira e ossos? O que nós nos tornamos depois que advém o inevitável fim? Uma triste verdade a respeito da condição humana é que nossa existência é meramente transitória. Do mais poderoso monarca, ao mais insignificante escravo, o destino de todos é um só.


Mas isso não significa que, nossa vivência não possa ser de alguma forma resgatada e compreendida pelas gerações futuras. Para muitos, essa é a única forma de imortalidade: a memória, o respeito e o interesse daqueles que nos sucedem.


Recentemente, arqueólogos trabalhando em um antigo cemitério no Delta do Rio Falyron, próximo de Atenas, capital da Grécia, fizeram uma descoberta ao mesmo tempo enigmática e aterrorizante. 


Oitenta esqueletos humanos foram enterrados lado a lado em uma cova comum no que deveria ser uma grande terreno baldio de solo pantanoso nos arredores da Cidade Estado. A princípio não parece ser uma notícia muito importante, já que covas coletivas eram algo corriqueiro no Mundo Antigo, frequentemente assolado por pragas, pestes e massacres. Contudo, é o fato desses esqueletos terem sido colocados na terra ainda usando grilhões de ferro que chama a atenção.


Os especialistas conjecturam que eles podem ter sido vítimas de uma execução em massa, entre os séculos VIII e V antes de Cristo. Contudo, não há como saber ao certo quem eles eram e porque passaram por tão estranha modalidade de execução. A descoberta é única, e constitui uma forma incomum de punição nas cidades estado da Grécia Antiga.


Arqueólogos supõem que o crime praticado tenha sido de enorme gravidade para que eles enfrentassem um fim tão incomum. 


As vítimas aparentemente foram escoltadas, puxando e arrastando suas correntes para uma área cerca de um quilômetro e meio fora da cidade antiga. Lá eles foram perfilados lado a lado e atingidos por um objeto contundente, supostamente uma clava ou bastão na cabeça. Os crânios apresentam ferimentos condizentes com esse tipo de golpe, mas há indícios que alguns tenham sido simplesmente atirados no buraco e enterrados vivos, já que os ferimentos não teriam força suficiente para matar. Alguns esqueletos estavam perfeitamente depositados na terra, com pernas e braços dobrados, mas outros, indicavam terem de alguma forma resistido. Além disso, eles parecem ter morrido ao mesmo tempo, o que reforça a teoria de uma execução coletiva.


Um elemento no qual os pesquisadores estão se concentrando é se certificar que os restos das correntes realmente não se assemelham ao que era usado em escravos no período. A primeira suspeita dos historiadores era que os homens poderiam ser escravos rebeldes, condenados à morte por matarem seus senhores. Contudo, os primeiros exames apontaram para o fato de todos os esqueletos, pertencerem a homens jovens e com boa saúde no momento de sua execução. Uma condição que não se enquadra em uma descrição típica de escravos ou servos - mesmo os gregos que eram significativamente mais bem tratados. 


As correntes restringiam os prisioneiros, sendo fixadas no pulso direito e no tornozelo esquerdo de cada um deles. Nenhuma ossada pertencia a pessoas "acostumadas a vestir" ferros de restrição e muito provavelmente não se tratavam de trabalhadores rurais ou indivíduos envolvidos com atividade marcial. Além disso, todos eram bastante jovens, tendo entre 16 e 27 anos aproximadamente.

O contexto histórico, concede as melhores pistas do motivo pelo qual a execução possa ter ocorrido naquela região em especial. Stella Chryssoulaki, responsável pela escavação contou a Reuters o seguinte:


"Este foi um período de grande instabilidade para a sociedade ateniense, um período em que aristocratas e nobres estavam batalhando uns contra os outros por poder e prestígio político. Ter uma opinião forte ou defendê-la poderia ser algo extremamente perigoso nessa época."


Mais notável, o período em que o cemitério foi usado, coincide com a Rebelião de Cílon em meados de 632 a.C. O incidente, que é um dos primeiros acontecimentos datados de forma confiável na História da Grécia, se refere a uma tentativa mal sucedida de golpe tentado pelo aristocrata e campeão olímpico Cílon, para derrubar de forma violenta a elite ateniense. Cílon aliado ao seu sogro Teágenes, foi motivado pelas palavras do Oráculo de Delfos que o aconselhou a tomar o Poder durante o Festival em Honra a Zeus (as Olimpíadas), quando ele seria favorecido pelos Deuses do Olimpo.


A rebelião, entretanto, foi frustrada pelos guardas da cidade e os envolvidos tiveram de buscar refúgio no Templo de Atena dentro da Acrópole. Clamando por Santuário - a proteção da Deusa Atena concedida pelos sacerdotes - as portas foram abertas a eles e fechadas diante de seus perseguidores. Embora Cílon tenha escapado, um número desconhecido de seus seguidores ficaram confinados no templo. Se estes aceitassem se tornar religiosos, ficariam intocáveis. 


Mégara, o tirano da cidade prometeu que se eles se entregassem poderiam enfrentar um julgamento justo ao invés de serem imediatamente condenados à morte. Os rebeldes aceitaram deixar o templo, mas apenas depois que uma corda fosse atada a estátua de Atena e a um deles, representando uma lembrança de que eles estavam sob efeito do Santuário. Ocorre que segundo os registros da época, a corda se rompeu (ou foi cortada) e aqueles que os acusavam apontaram para o fato como um indicador de que Atena não desejava mais protegê-los.


O destino dos rebeldes é historicamente incerto, mas Heródoto Trucidides, historiadores que viveram na época afirmavam que eles teriam sido executados por Mégara, ainda que não exista qualquer menção de como e onde se deu a execução.


Um aspecto fascinante da lenda diz que Mégara e seus descendentes foram amaldiçoados por terem violado a Lei do Santuário, executando aqueles que suplicavam o auxílio de Atena. Além de ter sido banido de sua cidade, o tirano recebeu como punição um miasma ("mácula"), que seria herdada por todos seus filhos e netos. O miasma era uma corrupção de corpo e alma, uma mancha física e espiritual passada a todos que tivessem contato com Mégara e os seus descendentes. Plutarco teria escrito que o miasma do tirano e de seus filhos o compelia a andar nas sombras, longe da luz do sol, incomodado pelo fogo, sempre doente e com frio. Ainda segundo as lendas, ele não podia ser recebido em casa alguma, pelo temor de contaminação, oque sugere que ele possa ter contraído alguma doença desfigurante.


Muito embora, Mégara tenha retomado o poder de Atenas anos mais tarde, a maldição não foi anulada e ele governou por pouco tempo, sendo detestado por todos, inclusive seus antigos aliados. Quando Mégara morreu, seus filhos foram presos e executados, seus netos atirados ao mar para que a linhagem perecesse com ele. Alguns, no entanto sobreviveram, e segundo as lendas teriam se aliado aos Invasores Persas quando estes levaram seus exércitos até a Grécia com propósito de conquista.

Seria possível que os esqueletos acorrentados possam ser os restos dos homens que tentaram se rebelar? Chryssoulaki espera descobrir:


"É possível que com testes de DNA possamos dizer de que região da Grécia antiga vieram esses homens o que ajudaria a confirmar a hipótese de que esses indivíduos poderiam ser parte da Rebelião de Cílon, uma tentativa de tomada de poder que falhou".

Então, quem foram esses homens e o que aconteceu com eles? O que fizeram para enfrentar um destino tão terrível? 


Talvez eles tenham ousado um dia se erguer contra um Tirano e tenham sofrido por isso. Seus ossos são o único testemunho de que eles um dia ergueram suas vozes e seus punhos, talvez, se hoje forem lembrados, eles possam garantir sua imortalidade.


Eu sei o que vocês estão pensando: 


 (...) "o miasma do tirano e de seus filhos o compelia a andar nas sombras, longe da luz do sol, incomodado pelo fogo, sempre doente e com frio".

Nem preciso dizer o que isso parece, não é?

E mais, além da miasma, temos tantos elementos interessantes nessa estória, salientando que a parte da descoberta dos ossos e dos registros históricos são verdadeiros, o que nos faz imaginar como uma boa estória poderia ser montada ao redor disso tudo.
Outro detalhe: Cílon, sim, em inglês é "Cylon", e sim, é o mesmíssimo nome usado pela raça de implacáveis máquinas inteligentes, vistas na série Battlestar Galactica. O nome foi usado para designar essas máquinas e sua rebelião e tem tudo a ver com a Rebelião histórica de Cílon.

Para quem achava que "Cilônio" fosse um termo genérico criado por algum roteirista de série de TV, engana-se, alguém ali conhecia bem História Clássica.

segunda-feira, 25 de julho de 2016

Arqueólogos descobrem cemitério filisteu em Israel



Pesquisadores em Israel afirmam ter descoberto um cemitério filisteu - seria, segundo eles, o primeiro a ser encontrado na história. O achado, ocorrido em 2013 e tornado público no domingo (10), pode trazer respostas sobre o antigo mistério em torno da origem do povo. A descoberta marcou o fim da escavação realizada pela Expedição Leon Levy na região do Parque Nacional de Ashkelon, no sul de Israel. Os trabalhos duraram 30 anos. Os líderes da pesquisa dizem ter encontrado 145 conjuntos de restos mortais em várias câmaras fúnebres, algumas cercadas por perfume, comida, joias e armas. As ossadas são originárias do período compreendido entre os séculos 11 a.C. e 8 a.C. Os filisteus são mencionados na Bíblia como arqui-inimigos dos antigos israelitas. Acredita-se que eles tenham migrado para as terras de Israel por volta do século 12 a.C., vindos de áreas do oeste.

O filisteu mais famoso é Golias, guerreiro gigante que, segundo o Livro sagrado, foi vencido pelo jovem Davi antes de ele se tornar rei.

“Após décadas estudando o que os filisteus deixaram para trás, nós finalmente ficamos cara a cara com essas pessoas”, afirmou Daniel M. Master, um dos líderes da escavação. “Com essa descoberta, estamos próximos de desvendar o segredo em torno de suas origens.”

O achado foi mantido em segredo por três anos, até que os trabalhos fossem finalizados. O objetivo era evitar atrair a atenção de ativistas judeus ultraortodoxos, que já haviam feito atos contra escavações. Os manifestantes acusavam os arqueólogos de perturbar locais de sepultamento. “Tivemos que segurar nossas línguas por um longo tempo”, disse Master.

Especialistas que estudaram o período divergem sobre a origem geográfica dos filisteus - Grécia, sua ilha Creta, Chipre e Anatólia, na Turquia, são apontados.

A equipe da expedição está agora fazendo exames de DNA, de datação por radiocarbono e outros testes nos restos mortais em uma tentativa de apontar com precisão sua ascendência.

A maioria dos corpos não foi enterrada com itens pessoais, afirmam os pesquisadores, mas perto de alguns havia utensílios onde eram guardados perfumes, jarras e pequenas tigelas.

Poucos indivíduos foram sepultados com pulseiras e brincos. Outros, com armas. “É assim que filisteus tratavam seus mortos, e esse é o ‘livro de códigos’ para decifrar tudo”, disse o arqueólogo Adam Aja, um dos participantes da escavação.

Nota: E mais um aspecto da história bíblica é confirmado pela pá dos arqueólogos, o que faz da Bíblia Sagrada o livro antigo mais respaldado por descobertas arqueológicas. [MB]


quarta-feira, 20 de julho de 2016

Os Kami criam a Via Láctea



Após terem criado a Estrela Polar, as Maravilhas e os Tesouros Celestes, as Três Veneráveis divindades criadoras deram as costas a Takaamahara, o céu japonês, que ficou pleno de vida, mas deserto de deuses. Pouco, no entanto, foi o tempo em que as coisas assim permaneceram.

Certa noite surgiu na floresta de bambuzais um diferente broto de bambu (takenoko), que foi se tronando mais brilhante que a própria face iluminada da Lua. Partiu-se, num repente, como se tivesse levado, internamente, um golpe de uma afiadíssima katana (espada samurai), e dois pares de olhos, de órbitas finas e horizontais, piscaram vivamente entre as trincadas taquaras. Eram dois deuses. Deram vigorosas arremetidas, ao modo dos pintos quando saem da casca, e, após se livrarem das lascas fibrosas, colocaram os pés no Mundo das Nuvens, olhando curiosamente em volta de si, à procura de subsídios, inspiração e ideias para fazer o que vieram fazer: criar. Mas as suas mentes estavam vazias de imaginação e fantasia.

Puseram-se, então, a meditar profundamente, em silencioso agradecimento, e foi neste cenário plácido e sagrado que atingiram o alfa. De olhos fechado, músculos relaxados e com as mãos em formato de concha, postas afetivamente em frente aos respectivos sagrados abdomens, concentraram a energia vital e divina de seus ki. Esta poderosa força criada em seus íntimos físicos – que os fazia entender o mundo e a si mesmos emanou para suas sagradas palmas, que, encaixadas harmoniosamente, moldavam minúsculas esferas de luz que explodiam no ar. De tal intensidade era o seu brilho e cor que tudo o mais se tornou contrastante; aquilo que a luz atingia se traduzia em branco absoluto e a sua ausência desenhava ilimitadas tonalidades negríssimas, num forte contraste luz-e-escuridão ao modo Rembrandt.

Ao fim e ao cabo, bilhões e bilhões de multicoloridas estrelas: amarelas, azuis, verdes e brancas, de flamejante luz, emanaram, com facilidade, das mãos dos divinos irmãos com uma perfeição e naturalidade de fazer suspirar de inveja os mais dedicados magos das bolas de fogo. Toda escuridão da noite se dissipou com a fantástica explosão de tons e brilhos faiscando em toda aquela negra imensidão desvirginada: asteroides, cometas, enxames estrelares, galáxias, nuvens, nuvens de pó cósmico, nebulosas e milhões de outras espécies de corpos celestes. No afã do movimento, deixavam atrás de si rastros de pó brilhante no denso negrume que mexiam com a imaginação criadora de qualquer um que os visse. Recebeu o nome de Via Láctea.

- Acho que exageramos. – exclamou um deles, de olhos postos no excesso  de luzes e cores que resultara da brincadeira.

- Ficou tão luminoso que acabou por clarear até a sombria Terra lá embaixo – respondeu o outro deus pousando os olhos amendoados na baixa Terra.

Foram saindo de fininho e desapareceram dos céus, deixando atrás de si o céu semeado de estrelas e mais luminoso do que um incomensurável cesto virado de fundo para o Sol.

domingo, 10 de julho de 2016

O início de tudo, segundo a criação dos Kami anciãos.



Eis as lendas do Japão, segundo o registro dos kami anciãos primordiais, esta mitologia foi transmitida para os antigos sábios e de onde se basearam os eternos livros Kojiki e Nihon Shoki:

No início dos tempos, havia apenas uma disforme esfera oval, duplamente maior que a Terra, flutuando, plácida e silenciosa, no negro infinito. Vida alguma abrigava em seu abaulado ventre e astro algum iluminava o céu para além desta longínqua esfera, solitária como uma pedra perdida num mar escuro e vazio – nem Sol, nem Lua, nem estrelas havia.

Mas esse não era ainda o mundo no qual os kami e mortais viriam a habitar. Não passava este corpo ástreo, na verdade, de uma massa única, sem distinção entre o céu e a Terra.

Durante muito tempo assim foi, até que esta indefinida esfera foi lenta e vagarosamente repartindo-se em duas, como quando o corpo dorme e a alma se põe a sonhar. Mas não é porque dormia que este corpo não se debateu como em pesadelos e não é porque não havia viva alma para ouvi-lo que ele silenciou. Divorciou-se de sua outra metade, fazendo saltar pedras, lascas e pedregulhos para todos os lados, na ânsia de libertar-se, e desprendeu-se, enfim, esta incorpórea criatura, como se desprende a alma do corpo morto.

Eis que se põe a subir calma, leve e vaporosa, alcançando com suave perícia o pai de todos os cumes, o monte Takachiho, e instalou-se  acima do seu topo, que já era tão alto que perfurava uma densa camada de nuvem. Takaamahara é como passou a se chamar esta parte azulada espiritual que virou o que poderíamos intitular de céu japonês. Acomodou-se lá no altíssimo firmamento e ali permaneceu à espera dos kami, que em poucas eras estavam por vir.

A outra metade da esfera, no entanto, pesada, parda e densa, foi tombando como o peso da gema de um ovo na leve clara, precipitando-se pelo abismo infinito. As pedras que haviam saltado da separação foram sendo atraídas gradativamente a ela mais uma vez, unindo-se de modo a carreá-la mais e mais até atingir uma consistência firme e puramente física mudando sua cor para um tom negro-encarvoado. Assumiu, enfim, uma forma geoide, e a água espalhou-se em volta dela. Os dedos gelados de uma névoa densa e escura envolveram esta parte descartada dos céus que permaneceu esquecida pelos imortais durante sete gerações de deuses.

Takaamaharaq, a Planície dos Céus Elevados, ao contrário da Terra, logo atraiu os kami, deuses habitantes. Três deles, mais gigantescos de todos – colossais demais para serem apreendidos numa única olhada – surgiram nos céus, vindos de um lugar incógnito só conhecido por eles. Chegaram já prontos para criar e desenvolver o caótico e misterioso mundo celeste que a mente humana não prima por entender.

A criação da Estrela Polar



Acenderei uma luz na escuridão – disse altamente venerável e desenvolvido Amano Minakanushi no Mikoto, falando na linguagem dos deuses.

Focalizou o firmamento com o Terceiro Olho, a visão além do alcance dos olhos, e fez brotar de suas longas e finas mãos uma bola de fogo dourada que arremessou às alturas, onde ela se fixou para todo o sempre. Deu-lhe o nome de Estrela Polar.

Criação da Lua e do Sol



Honoráveis irmãos – disse o segundo deus, Takami Musubi no Mikoto. – Eu criarei as Maravilhas Celestes.

Pôs-se a mover as mãos envoltas em chispas chamejantes e fez brotar uma imensa bola branca de fogo que arrojou para o alto, ao modo de como fez o deus primeiro. Nomeou novo ser de Lua. Concentrou novamente todo seu KI – fogo que queima nas entranhas e é a energia vital de todos os seres vivos – e fez surgir outra bola de fogo, porém de uma cor vermelho-alaranjada e quatrocentas vezes maior do que a anterior. Arremessou-a igualmente ao alto dos céus, ofuscando instantaneamente as criações anteriores. Chamou-a  de Sol.

Colocou, então, dois dedos no centro da testa e tornou a se concentrar: flocos de neve caíram dos céus, levando os três irmãos a se encolherem de frio e cobrirem com o capuz as cabeças ainda quentes do Sol. Expulsaram os flocos da neve resplandecente que cobria seus mantos coloridos e se puseram a observar o campo celeste que ia ficando mais alvo e fofo do que as brancas nuvens.



A nevasca se transformou em uma chuva muito fina e fortes ventos varreram os quatro cantos da galáxia, de ponta a ponta, controlados docilmente pelas mãos do honrável kami. Raios e relâmpagos cortaram, neste dia, o firmamento com seus clarões dourados e estrondos retumbantes e o vento uivou ferozmente como mil lobos, virando uma terrível tempestade. A pouca chuva se transformou num aguaceiro que lavou e fertilizou o solo celestial pela primeira vez na vida.

Surge a vida vegetal e animal pelo terceiro kami



- Eu, por minha vez, criarei os Tesouros Celestes – disse a seus irmãos a terceira divindade, Kami Musubi no Mikoto, tão logo a tempestade amenizou.
Espalmou as longas e finas mãos sobre o solo irrigado e fez surgir os mais exóticos bosques, pomares e jardins, que se ergueram do chão de um minuto para o outro, crescendo a olhos vistos, como se um segundo representasse um século. Deleitou-se o deus criando montanhas e penhascos, mares e rios, pássaros e peixes, flores e corais.

Cachoeiras desciam agora livremente ao pé da montanha, abaixo do voo de esplêndidos faisões de penas rubras como o fogo douradas como o metal amarelo (modo com o qual os deuses primordiais referiam-se ao ouro). A límpida água corria nos largos e lentos córregos celestiais com toda sorte de murmúrios, fluindo através do coração de Takaamahara, brilhando entre musgos, pedras e peixes. Brotaram o arroz e demais cereais, que, sem cultivo ou trabalho algum, cobriram os campos alagados com seus tapetes amarelos, independente do clima, do tempo e das estações de maduração.

Logo o céu borbulhava de cores e arte, graças ao capricho destes fecundos criadores de inesgotável imaginação. Tão logo concluíram suas obras-primas, retiraram-se anonimamente dos céus e seguiram para um refúgio incógnito que somente os deuses conheciam, sem deixar atrás de si nem o brilho das caudas de seus faiscantes mantos multicoloridos e nem o mínimo resquício de vaidade.



terça-feira, 31 de maio de 2016

Por dentro dos zigurates.


Plano do zigurate de Ur construído por Ur-Nammu. Construído com tijolo de adobe seco ao sol, tinha uma grossa camada externa de tijolo cozido. Conservaram-se partes dos níveis inferiores. O aspecto geral foi reconstruído a partir das figuras encontradas em relevos e em selos.

Os zigurates eram um dos elementos mais característicos da antiga Mesopotâmia. Em muitas cidades o templo do deus tutelar compreendia um zigurate que constava de uma série de plataformas sobrepostas, em cima dos quais havia um templo. Os templos erigidos sobre plataformas já se encontram no período Ubaid em Eridu, por volta do quinto milênio a.C. os primeiros zigurates verdadeiros foram construídos por Ur-Nammum (2112-2095 a.C.),  primeiro rei da Terceira Dinastia de Ur, em Ur, Eridu, Uruk e Nippur. A planta era semelhante em todos eles, com uma base retangular, três escalinatas que se cruzavam em ângulo reto e que conduziam ao templo alto. Esta é a lanta do zigurate mais famoso de todos, o do deus Marduk, na Babilônia, que deu origem à história da Torre de Babel. Tinha o nome de Etemenanki, que significa “o templo da fundação do céu e da terra”, e foi começando no século XVII a.C.

Não se conhece a natureza exata das cerimônias que se desenvolviam no alto santuário. O historiador grego Heródoto, que descreveu em pormenor o zigurate da Babilônia, dizia que ali se celebravam as núpcias sagradas de uma sacerdotisa com o deus (que talvez estivesse representado na pessoa do rei ) nu ritual destinado a assegurar a prosperidade futura do país.



Os restos de zigurates foram encontrados em 16 jazigos; outros são conhecidos pelos textos (como o de Agadé, que não se sabe exatamente onde estava) ou pela forma das ruínas. Havia dois tipos principais de zigurate: um tipo do S., mais antigo, que tinha uma plataforma retangular e três escalinatas, e um tipo de nortenho, posterior, sem escalinatas, em que o templos costumava ser parte de um grande complexo. A construção do zigurate no jazigo elamita de Al-Untas-Napirisa (meados do séc. XIII a.C.) é excepcional. Encheu-se um pátio quadrado (com salas à volta) para construir um zigurate alto. As escadas dos quatros lados estavam dentro da estrutura.



A forma dos zigurates era parecida com as pirâmides do Egito, como a pirâmide escalonada de Saqqara (acima, figura), mas a sua função era diferente. As pirâmides eram túmulos, onde a câmara mortuária estava oculta no centro do monumento, sem estrutura por cima. Os zigurates eram sólidas construções de tijolo coroadas por um templo; parecem-se mais aos templos da América Central, como o de Chichén Itzá (figura inferior). É possível, contudo, que a ideia de uma grande estrutura piramidal tivesse vindo do Egito.


Plano reconstruído do templo e zigurate de Tell al-Rimah, provavelmente a antiga Qatara. É provável que fosse construído em tempos de Samsi-Adad I(por volta de 1800 a.C.). ao contrário do tipo anterior do S., que tinha três escalinatas, o zigurate formava parte do edifício do templo e do santuário mais alto chegara até ao teto do templo do pátio.



Em cima: O zigurate da capital assíria de Dur-Sarrukin foi um dos que forma descobertos anteriormente. Julgava-se que um caminho em espiral conduzia até à cúspide e que os três níveis inferiores estavam pintados de branco, negro e vermelho. Os níveis superiores não foram conservados, mas, segundo a combinação normal de cores, teriam sido azul, laranja, prateada e dourada.