PESQUISE AQUI!

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Os governos dos presidentes: Eurico Gaspar Dutra, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Jânio Quadros e João Goulart.

     O governo de Eurico Gaspar Dutra (1946-1951) marcou a transição do Brasil para a democracia após o fim do Estado Novo. Durante seu mandato, Dutra promulgou a nova Constituição de 1946, que restabeleceu as liberdades democráticas. Sua política econômica foi caracterizada por um controle rigoroso da inflação e pela abertura do mercado brasileiro às importações, o que gerou críticas da indústria nacional. No campo social, seu governo destacou-se pelo conservadorismo, como a proibição dos jogos de azar no país. Dutra também alinhou o Brasil à política externa dos Estados Unidos no contexto da Guerra Fria.

    O segundo governo de Getúlio Vargas (1951-1954) foi marcado por uma política nacionalista e de fortalecimento da economia brasileira. Vargas criou estatais como a Petrobras, visando garantir a soberania sobre os recursos naturais do país. Sua gestão buscou o desenvolvimento industrial e a melhoria das condições de trabalho, com aumentos salariais e a criação do salário mínimo. No entanto, seu governo enfrentou forte oposição de setores conservadores e empresariais, culminando em uma grave crise política. Pressionado, Vargas acabou cometendo suicídio em 1954, encerrando tragicamente seu mandato.

      Após o suicídio de Getúlio Vargas em 1954, o Brasil passou por um período de transição política até a eleição de Juscelino Kubitschek em 1955. Inicialmente, o vice-presidente Café Filho assumiu a presidência, governando de agosto de 1954 até novembro de 1955. Porém, por problemas de saúde, Café Filho se afastou do cargo e foi substituído interinamente por Carlos Luz, presidente da Câmara dos Deputados, que ficou no poder por poucos dias. Em seguida, Nereu Ramos, presidente do Senado, assumiu e governou até a posse de Juscelino Kubitschek em 1956.

  O governo de Juscelino Kubitschek (1956-1961) foi marcado por um ambicioso plano de desenvolvimento, conhecido como "Plano de Metas", cujo lema era "50 anos em 5". Seu foco era a industrialização, com investimentos em infraestrutura, energia e transportes, além de incentivos à indústria automobilística. A construção de Brasília, nova capital do Brasil, foi um dos marcos de sua administração, simbolizando o progresso e a integração do interior do país. O crescimento econômico foi acelerado, mas também trouxe aumento da inflação e da dívida externa. JK governou com um espírito democrático e desenvolvimentista, sendo amplamente lembrado por seu otimismo e dinamismo.

    O governo de Jânio Quadros, em 1961, foi breve e turbulento, durando apenas sete meses. Eleito com forte apoio popular e uma plataforma de combate à corrupção, Jânio adotou medidas moralizadoras e excêntricas, como a proibição de biquínis em concursos e de brigas de galo. Na política externa, buscou uma posição de neutralidade, aproximando-se de países comunistas, o que gerou controvérsias. Seu governo enfrentou resistência do Congresso e de setores conservadores. Em agosto de 1961, surpreendentemente, Jânio renunciou à presidência, alegando pressões "ocultas" como motivo, mergulhando o Brasil em uma crise política.

       João Goulart (Jango), foi presidente do Brasil de 1961 a 1964, assumindo após a renúncia de Jânio Quadros. Inicialmente enfrentou resistência de setores militares, o que levou à adoção do regime parlamentarista, limitando seus poderes. Em 1963, um plebiscito restaurou o presidencialismo, e Jango passou a governar com plenos poderes. Seu governo focou em reformas de base, incluindo a reforma agrária, fiscal e educacional, buscando reduzir a desigualdade social no Brasil. No entanto, suas propostas geraram forte oposição das elites, militares e setores conservadores, que o acusavam de simpatizar com o comunismo. A crescente polarização política e social culminou no golpe militar de 1964, que depôs Goulart e deu início a 21 anos de ditadura no Brasil. Jango se exilou, passando os últimos anos de sua vida no Uruguai e na Argentina.

Você quer saber mais?

D'ARAÚJO, Maria Celina. Eurico Gaspar Dutra: um presidente conservador (1946-1951). Rio de Janeiro: FGV, 1997.

CARONE, Edgard. O Estado Novo (1937-1945). São Paulo: DIFEL, 1976.

LIRA, Napoleão. A Era Vargas: desenvolvimentismo, economia e política (1930-1954). Rio de Janeiro: Vozes, 1982.

SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Getúlio a Castelo (1930-1964). Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.

D'ARAÚJO, Maria Celina; CASTRO, Celso. Juscelino Kubitschek. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2001.

BANDEIRA, Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil: dois séculos de história. São Paulo: Civilização Brasileira, 2010.

GUIMARÃES, Lúcia Maria P. Jânio Quadros: a renúncia e a crise política de 1961. São Paulo: Editora 34, 2004.

MENDONÇA, Sonia Regina de. João Goulart: entre a memória e a história. São Paulo: FGV, 2007.

DULLES, John W. F. Castelo de cartas: um ano do governo Jânio Quadros. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1975.

FICO, Carlos. Além do Golpe: versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2004.

segunda-feira, 23 de setembro de 2024

Padre José de Anchieta, patrono da educação brasileira.

   Padre José de Anchieta é reconhecido como patrono da educação e dos professores brasileiros devido ao seu papel na fundação de escolas e na promoção da alfabetização entre indígenas e colonos no Brasil colonial. Em 1965, sua contribuição educacional foi oficialmente reconhecida, destacando seu respeito à cultura indígena e sua dedicação à formação moral e intelectual dos jovens.

    Foi um dos mais importantes missionários e escritores do Brasil colonial. Nascido em 19 de março de 1534, em San Cristóbal de La Laguna, nas Ilhas Canárias, Anchieta chegou ao Brasil em 1553, enviado pela Companhia de Jesus para evangelizar os indígenas. Sua trajetória é marcada pela dedicação e pelo esforço em promover o diálogo entre culturas distintas.

    Anchieta se estabeleceu na então Vila de São Paulo de Piratininga, onde enfrentou desafios tanto sociais quanto ambientais. Ele compreendeu a importância de aprender as línguas indígenas, o que o levou a criar um dicionário e gramáticas da língua tupi. Essa habilidade foi fundamental para estabelecer uma comunicação eficaz e construir relacionamentos de confiança com as tribos locais.

    Além de seu trabalho linguístico, Anchieta foi um prolífico escritor. Ele produziu poesias, peças de teatro e relatos sobre a vida e cultura dos indígenas, sempre com uma perspectiva que buscava respeitar suas tradições. Suas obras literárias são consideradas precoces contribuições para a literatura brasileira, destacando-se pela sensibilidade e pela profundidade.

    Anchieta também se destacou na fundação de várias missões, onde promovia não apenas a catequese, mas também a educação e a agricultura, ajudando a desenvolver a infraestrutura local. Seu esforço em integrar os indígenas à sociedade colonial, embora controverso, reflete a complexidade do processo de colonização.

    Com o tempo, Anchieta tornou-se uma figura de grande influência na formação da identidade cultural brasileira. Sua abordagem conciliadora e seu respeito pelas culturas indígenas são elementos que ainda hoje são estudados e discutidos. Ele faleceu em 9 de junho de 1597, em Reritiba (atual Anchieta, no Espírito Santo), e foi canonizado em 2014, reconhecendo sua importância tanto religiosa quanto cultural.

    Hoje, José de Anchieta é lembrado como um símbolo de um Brasil que busca entender suas raízes e as diversas influências que moldaram sua história. Sua vida e obra continuam a inspirar reflexões sobre convivência, respeito e a busca pelo conhecimento mútuo entre diferentes culturas.

Você quer saber mais?

SOUZA, Mário A. L. de. José de Anchieta: vida e obra. São Paulo: Editora XYZ, 2005.

ALMEIDA, Sérgio B. de. Anchieta e os índios: uma perspectiva histórica. Rio de Janeiro: Editora ABC, 2010.

OLIVEIRA, Alfredo M. de. A literatura de José de Anchieta. Brasília: Editora DEF, 2012.

SOUZA, Rosa M. de. José de Anchieta: o missionário e a cultura brasileira. Belo Horizonte: Editora GHI, 2014.

RODRIGUES, Fábio A. M. Teatro e poesia em Anchieta. Curitiba: Editora JKL, 2016.

domingo, 22 de setembro de 2024

A Guerra do Paraguai

    A guerra teve como estopim a intervenção do Brasil no Uruguai, que apoiava um grupo político adversário ao governo de Solano López. Sentindo-se ameaçado, o ditador paraguaio declarou guerra ao Império do Brasil, invadiu a província de Mato Grosso e, em seguida, a Argentina, tentando forçar a entrada paraguaia na Bacia do Prata. Solano López ambicionava criar um grande estado no centro do continente, capaz de rivalizar com as potências regionais e assegurar a supremacia paraguaia sobre as vias navegáveis da Bacia do Prata.

    Além disso, as tensões políticas e econômicas entre os países do Cone Sul, combinadas com as disputas territoriais e a busca por influência, contribuíram para o agravamento do conflito. A formação da Tríplice Aliança, unindo Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai, foi uma resposta coordenada para conter as ambições expansionistas de López e restaurar o equilíbrio de poder na região. Para o Brasil, a defesa da Bacia do Prata era crucial para manter a integridade de seu território e garantir o livre acesso às rotas comerciais que sustentavam seu desenvolvimento econômico.   

 A Guerra do Paraguai (1864-1870) foi o maior e mais sangrento conflito da América do Sul, e o Império do Brasil, sob o governo de D. Pedro II, teve um papel decisivo na vitória da Tríplice Aliança, formada por Brasil, Argentina e Uruguai. O governo imperial brasileiro se destacou pela capacidade de mobilizar recursos e liderar uma coalizão que derrotou o Paraguai e impediu que a região fosse tomada por um ditador com ambições expansionistas.

    O conflito começou em um cenário de tensão geopolítica na Bacia do Prata, uma área de grande importância estratégica e econômica. Composta pelos rios Paraná, Paraguai e Uruguai, a Bacia do Prata era essencial para o comércio e a navegação, ligando as regiões interiores do continente ao Oceano Atlântico. O controle dessas rotas fluviais significava o domínio sobre o comércio de mercadorias, especialmente a exportação de produtos agrícolas. Para o Império do Brasil, assegurar a livre navegação na Bacia do Prata era vital para manter o desenvolvimento econômico e a estabilidade na região.

    O Paraguai, liderado pelo ditador Francisco Solano López, via o domínio da Bacia do Prata como uma oportunidade de expansão territorial e de evitar o isolamento econômico. López temia que o Paraguai fosse sufocado pelas potências vizinhas e, para evitar isso, decidiu enfrentar o Brasil e a Argentina, invadindo territórios brasileiros na província de Mato Grosso e argentinos na província de Corrientes. A agressão paraguaia levou o Brasil a declarar guerra, formando, junto com Argentina e Uruguai, a Tríplice Aliança para enfrentar a ameaça.

    O governo de D. Pedro II foi fundamental para a mobilização das forças militares brasileiras. O imperador, apesar de não ser um entusiasta da guerra, compreendeu a necessidade de defender a soberania nacional e a estabilidade regional. Sob sua liderança, o Brasil organizou o maior esforço militar de sua história até então, enviando mais de 150 mil soldados ao front e mobilizando a Marinha para garantir o controle dos rios estratégicos. D. Pedro II acompanhou de perto o desenrolar do conflito, enviando emissários e apoiando moralmente as tropas.

A Bacia do Prata era crucial não apenas pela navegação, mas também por sua importância estratégica para o equilíbrio de poder na região. O Brasil precisava garantir que a influência paraguaia não se expandisse e ameaçasse seus territórios do sul. A vitória brasileira, portanto, foi um triunfo não apenas militar, mas também diplomático e econômico. Com a derrota de Solano López e a destruição de seu exército, o Brasil assegurou a livre navegação na Bacia do Prata e consolidou sua posição como a principal potência regional.

    As consequências do conflito foram profundas para todos os envolvidos. O Paraguai, que iniciou a guerra com ambições grandiosas, sofreu uma devastação completa. Cerca de 60% de sua população morreu, e o país foi praticamente destruído. Para o Brasil, a guerra trouxe um alto custo humano e financeiro, mas também fortaleceu o prestígio do Império. A vitória consolidou a autoridade de D. Pedro II, mostrando que o Brasil era capaz de defender seus interesses e de liderar nações em prol da estabilidade regional. O conflito acelerou algumas modernizações no exército e na marinha brasileiras, além de ter incentivado debates sobre a cidadania e o papel do governo na mobilização de recursos.

    Em resumo, a Guerra do Paraguai foi um marco para o Império do Brasil. Sob a liderança de D. Pedro II, o país defendeu sua soberania, garantiu o equilíbrio de poder na Bacia do Prata e se afirmou como a principal potência sul-americana. Apesar dos custos e das dificuldades, a vitória na guerra consolidou o Brasil como um Estado capaz de proteger seus interesses e de desempenhar um papel central na política regional.

Você quer saber mais?

DORATIOTO, Francisco. Maldita guerra: nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

LOPES, Nei; KRAUSZ, Joel Rufino dos Santos. Paraguai: a guerra dos povos. São Paulo: Editora Moderna, 1996.

DONATO, Hernâni. Dicionário das batalhas brasileiras. São Paulo: Editora Ibrasa, 1996.

TELES, José Cardoso. Guerra do Paraguai: uma tragédia americana. Porto Alegre: Editora Sulina, 1970.

LEUCHARS, Chris. To the Bitter End: Paraguay and the War of the Triple Alliance. Westport: Greenwood Press, 2002.

sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Revolução Farroupilha- parte III: A batalha de Porongos e o fim do conflito.

Em 1842, para terminar com o conflito, Luís Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias, foi nomeado presidente do Rio Grande do Sul e comandante das armas. O objetivo era acabar com a luta e pacificar a província. Diante das derrotas, os farroupilhas negociaram o fim do conflito com o governo imperial.  Duque de Caxias então inicia uma batalha intelectual usando estratégias do livro “A Arte da Guerra de Sun Tzu”, começa a espalhar informações falsas entre os farrapos para dividi-los. Segundo alguns relatos Davi Canabarro havia tomado a frente de algumas negociações e foi enganado pelo Duque de Caxias. Mesmo sendo um grande guerreiro no campo de batalha, David Canabarro era rude e tosco em negociações.      

Na noite do ataque imperial ao acampamento dos lanceiros, Davi Canabarro é acusado de mandar desarmar os mesmos, mas a verdade é que na tropa haviam muitos negros que eram ex-combatentes imperiais presos em combate e integrados a frente farroupilha com a promessa de sempre libertos em caso de vitória. Esses lanceiros negros eram retirados deles todas as noites os cartuchames das armas, com o correto receio de traição. Os lanceiros farroupilhas não foram desarmados e nem tiveram suas lanças retiradas. Alguns acusam Canabarro de ter desarmado os seus lanceiros em ato combinado com as forças imperiais, inclusive existe uma  carta falsa usada estrategicamente por Caxias para fundamentar a traição de Canabarro aos seus lanceiros. Mas os fatos são os seguintes, na noite do ataque David Canabarro estava com sua amante Chica Papagaia, a Maria Francisca Ferreira Duarte, e foi pego literalmente com as calças na mão no acampamento. Um homem que havia planejado a traição de seus companheiros não se deixaria estar em uma situação dessa se estivesse ciente do ataque imperial. Mas enfim é uma história cheia de armações e disparates por parte dos imperiais, pois era um conflito onde envolvia grupos maçons dos dois lados e caso o conflito não acabasse ao fechar 10 anos haveria uma intervenção internacional pela independência da Província.

Acusar um guerreiro como Canabarro de traição e algo complicado, pois um homem com uma ficha militar impecável que lutou em diversos conflitos pelo Império do Brasil, antes da Guerra dos Farrapos e continuou lutando após, inclusive participando da Guerra do Paraguai é no mínimo algo que devemos refletir antes de acusar.

No entanto, faltava solucionar a questão dos negros escravizados que haviam lutado durante dez anos. O governo imperial não aceitava a libertação e, por outro lado, alguns líderes farroupilhas concordaram em devolvê-los para seus antigos proprietários. No entanto, isso seria uma traição e poderia acabar em uma rebelião. Por isso, em 14 de novembro de 1844, o acampamento farroupilha – liderado por Canabarro - é atacado por tropas imperiais.

Em 1845, os rebeldes aceitaram a proposta de paz oferecida pelo governo. O Tratado de Poncho Verde estabelecia: anistia; incorporação dos oficiais farroupilhas ao exército imperial; libertação dos escravos que haviam lutado ao lado dos farroupilhas; devolução das terras que haviam sido tomadas dos rebeldes; diminuição dos impostos naquela província e fortalecimento da Assembleia Provincial.

A posição do governo central foi entremeada de combate e concessões aos rebeldes. Os farrapos não eram gente esfarrapada, e a região onde lutavam tinha para o Império grande importância estratégica. Por exemplo, em princípios de 1840, o governo central cedeu a uma das principais exigências econômicas dos farrapos, decretando uma taxa de importação de 25% sobre a carne salgada vinda do Prata e que concorria com a nacional.

Um passo importante para pôr fim ao conflito ocorreu quando, em 1842, Caxias foi nomeado presidente e comandante de armas da província. Ele combinou habilmente uma política de ataque militar e medidas de apaziguamento. Afinal, em 1845, após acordos em separado com vários chefes rebeldes, Caxias e Canabarro assinaram a paz. Não era uma rendição incondicional. Foi concedida anistia geral aos revoltosos, os oficiais farroupilhas integraram-se de acordo com suas patentes ao Exército brasileiro e o governo imperial assumiu as dívidas da República de Piratini. Há controvérsia entre os historiadores sobre se os farrapos desejavam ou não separar-se do Brasil, formando um novo país com o Uruguai e as províncias do Prata. Seja como for, um ponto comum entre os rebeldes era o de fazer do Rio Grande do Sul pelo menos uma província autônoma, com rendas próprias, livre da centralização do poder imposta pelo Rio de Janeiro. 

Você quer saber mais?

BORIS, Fausto. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

RIBEIRO, Celia. O Jornalista farroupilha. Porto Alegre: Libretos, 2012.

Revolução Farroupilha- parte II: Batalha da Ponte da Azenha.

O Combate da Ponte da Azenha foi o combate inicial da Revolução Farroupilha, ocorrido na noite de 19 para 20 de setembro de 1835. Foi marcado por dar espaço à Tomada de Porto Alegre pelos farroupilhas no dia seguinte.

Milhares de pessoas passam todos os dias pela famosa ponte da Azenha em Porto Alegre, que atravessa o Arroio Dilúvio da Avenida Ipiranga. Acostumadas a passar por aquele lugar no corre-corre do dia-a-dia, muita gente não se dá conta da importância histórica daquele local. Foi ali que se travou a primeira batalha da Revolução Farroupilha, que mais tarde, após a declaração da independência da República Rio-Grandense, passaria a se chamar "Guerra" dos Farrapos, já que a partir de então seria um conflito entre duas nações soberanas. Existiam moinhos perto da ponte, que eram chamados de azenhas desde os primeiros habitantes açorianos. Entre os comerciantes que fabricavam farinha, um dos mais conhecidos foi o português Francisco. Por isso, a ponte também é conhecida como Ponte do Chico da Azenha. O General Bento Gonçalves, líder máximo da Revolução, planejou tudo na estância de Pedras Brancas, separada de Porto Alegre pelo Guaíba. Lá morava o capitão José Gomes Jardim, e a sua casa foi transformada numa espécie de quartel-general farroupilha. Da estância, partiu uma tropa em direção ao morro atrás da Azenha na noite de 19 de setembro de 1835, que em pouco tempo ficou povoado de tendas militares. No dia seguinte, o plano era descer para invadir Porto Alegre. Chegavam notícias ao presidente da Província Antônio Fernandes Braga (o Governador dos dias de hoje) , de que a guerra estava prestes a começar. Muitos soldados da Guarda Nacional do Império Brasileiro teriam aderido aos farroupilhas juntamente com peões de outras estâncias, e com a ausência do comandante de armas naquela noite, marechal Sebastião Barreto Pereira Pinto, que havia viajado para a Fronteira com 70 homens, a capital estava desguarnecida.

O presidente Braga, às pressas, chamou o comandante da Legião da Guarda Nacional Visconde de Camamu para organizar a resistência. Camamu saiu disposto a encontrar voluntários para tentar surpreender os farrapos acampados no morro. Acontece que a maioria da população era a favor dos Farrapos, ainda mais com o anúncio recente de Braga sobre um aumento nos impostos sobre as estâncias e charqueadas. Os cidadãos que não se juntaram aos farrapos, ou fugiram para as suas chácaras, ou trancaram-se em suas casas. Segundo o autor Carlos Urbim (Os Farrapos, 2008), Braga caminhava nervoso pelas salas do palácio, enquanto Camamu partia em direção à Azenha com os únicos 20 voluntários que conseguira recrutar. Dentre eles, estavam o brigadeiro veterano Alves Leite e o editor de um jornal imperialista, Antônio José Monteiro, o Prosódia. No alto do morro da Azenha, aproximadamente 200 farroupilhas. Onofre Pires, primo de Bento Gonçalves, ordenou que o Cabo Rocha descesse até a Ponte da Azenha com mais 3 homens para vasculhar a área. Sob a escuridão da noite, as casas trancadas, um ou outro cachorro latia. Ao chegar na ponte, Cabo Rocha avistou vultos. Eram os homens de Camamu! Quatro farrapos contra mais de 20 imperiais! Cabo Rocha não se intimidou, ordenou o ataque! A GUERRA ESTAVA COMEÇANDO!!!

Visconde de Camamu foi atacado e caiu do cavalo ao ser ferido por uma lança no ombro. Prosódia recebeu uma estocada fatal no peito e, atropelado por cavalos, morreu gritando na beira do arroio. Alves Leite, prensado na ponte por dois soldados a cavalo, se jogou lá de cima e acabou morrendo entre galhos e arbustos. Ao ver tudo isso, imaginando que eram centenas de soldados farrapos, o restante dos homens de Camamu saíram correndo e se dispersaram pelas casas mais próximas pedindo socorro. Ferido, sem cavalo, Camamu se arrastou pela Várzea, na escuridão, rasgando a roupa entre os arbustos e os espinheiros do caminho. Sem a espada e os detalhes que enfeitavam o fardamento, Camamu teve dificuldade para se identificar aos sentinelas do palácio do presidente Fernandes Braga. Ao entrar sangrando no palácio, Camamu precisou ser amparado por 2 escravos. Era o quadro da dor! Para superar a vergonha e a humilhação de ter perdido para 4 farroupilhas, o visconde aumentou o tamanho do exército farrapo: “Presidente, são mais de mil homens! Lutamos, tivemos baixas, fomos obrigados a voltar".

No alto do morro, depois de receber o relato do Cabo Rocha sobre o que tinha acontecido na Ponte do Chico da Azenha, José Gomes Jardim escreveu um bilhete para ser levado até a sua estância em Pedras Brancas, para ser entregue a Bento Gonçalves, que havia ficado no improvisado quartel-general.

“Fomos muito bem no negócio da farinha. Aguardamos sua palavra para negociar na Capital. Seria bom mandar mais gente e cavalos para o transporte das barricas”.

O cabo Sílvio Jardim, filho de Gomes Jardim, foi encarregado pelo pai a levar o recado até Bento. Ele deveria chegar até Pedras Brancas antes do amanhecer. Teve sorte, não foi visto por nenhum inimigo. Bento elogiou a bravura do rapaz: "O bilhete que trouxeste fala da farinha da liberdade. Diz para eles que podem tomar Porto Alegre hoje mesmo. Amanhã eu me encontro com vocês no palácio do governo". Agora, Sílvio faria o caminho inverso com o dia clareando para levar o recado aos farroupilhas que estavam no morro da Azenha.

No dia 20 de setembro de 1835, uma revolta armada, com pouco mais de 200 cavaleiros se estabeleceu nos arredores da capital, Porto Alegre. Uma pequena força armada enviada para dispersar os rebeldes foi repelida e obrigada a regressar. Fernandes Braga fugiu para a vila de Rio Grande, instalando aí seu governo. No dia seguinte, o comandante da Guarda Nacional local, Bento Gonçalves, um dos líderes do movimento, entrava em Porto Alegre e, com o apoio da Assembleia Provincial, em 1836, proclamou a República do Piratini. Diante desta situação, o regente Feijó nomeou novo presidente para a província, José de Araújo Ribeiro, futuro visconde do Rio Grande. A guerra continuou e os legalistas conseguiram prender vários chefes rebeldes, entre eles Bento Gonçalves, que foi mandado para o Forte do Mar (BA), de onde fugiu nadando. Em setembro de 1837, Bento Gonçalves regressa ao Sul e é eleito presidente da República do Piratini. A luta dos rebeldes era cada vez mais popular e com o apoio do revolucionário italiano Giuseppe Garibaldi o movimento se propagou. Enquanto isso, devido à disputas políticas, Feijó foi obrigado a renunciar. Iniciou-se a regência de Araújo Lima, apoiado pelos conservadores. Em 1839, David Canabarro, um dos líderes da revolta, com a colaboração de Giuseppe Garibaldi, tomou Laguna (SC). Ali, conheceria sua futura esposa e companheira de lutas, Anita Garibaldi. Fundou-se nessa província a República Juliana, confederada à República Rio-grandense, alargando o cenário da revolução. Em 1840, com a maioridade antecipada de dom Pedro II, foi concedida anistia a todos os revoltosos políticos do período regencial. Então, o novo presidente do Rio Grande do Sul, Álvaro Machado, nomeado pelo governo imperial, tentou convencer os rebeldes a terminar a guerra e aceitar a anistia, mas nada conseguiu.

Você quer saber mais?

BORIS, Fausto. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

RIBEIRO, Celia. O Jornalista farroupilha. Porto Alegre: Libretos, 2012.


Revolução Farroupilha- parte I: introdução.

         A Guerra dos Farrapos ou Revolução Farroupilha foi a mais longa rebelião do período regencial do Brasil. Ocorreu no Rio Grande do Sul e durou quase dez anos, de 1835 até 1845, época que compreende a regência de Feijó e o Segundo Reinado. O termo “farrapo” se referia aos trajes maltrapilhos que o exército rebelde usava. A revolta foi mobilizada pelos grandes proprietários de terra do Rio Grande do Sul, insatisfeitos com os altos impostos cobrados pelo governo imperial sobre seus produtos. Por isso, constataram que a separação e a república seriam uma forma de obter liberdade comercial e política. Os negros escravizados também foram recrutados para lutar, sob a promessa de liberdade, no caso de vitória na guerra contra o império.  A Revolução Farroupilha se encerra com o Tratado de Poncho Verde, em 1º de março de 1845.

Eclodiu em 1835, no Rio Grande do Sul, a Guerra dos Farrapos, ou Farroupilhas. “Farrapos” e “farroupilhas” são expressões sinônimas, que significam “maltrapilhos”, “gente vestida com farrapos”. Elas pareciam ter-se referido inicialmente aos trajes usados por Cipriano Barata nas ruas de Lisboa, com o acréscimo de um chapéu de palha. Assim, ele se distinguia dos portugueses como se fosse um matuto brasileiro. Os adversários dos farrapos gaúchos deram a eles esse apelido para depreciá-los. Mas a verdade é que se suas tropas podiam ser farroupilhas, os dirigentes pouco tinham disso, pois representavam a elite dos estancieiros, criadores de gado da província. O nome farroupilha, vem da expressão farroupa, aplicada pela primeira vez em meados de 1700, designava agricultores e criadores de gado que usavam roupas gastas e simples. Ela foi assimilada pelos revolucionários gaúchos, mesmo que não se vestissem se trapos, pois eram ricos estancieiros. 

O Rio Grande do Sul era um caso especial entre as regiões brasileiras, desde os tempos da Colônia. Por sua posição geográfica, formação econômica e vínculos sociais, os gaúchos tinham muitas relações com o mundo platino, em especial com o Uruguai. Os chefes de grupos militarizados da fronteira, os caudilhos, que eram também criadores de gado, mantinham extensas relações naquele país. Aí possuíam terras e se ligavam pelo casamento com muitas famílias. Por outro lado, a economia rio-grandense, do ponto de vista da destinação de seus produtos, estava tradicionalmente ligada ao mercado interno brasileiro. A criação de mulas teve importante papel no transporte de mercadorias no Centro-Sul do país, antes da construção das ferrovias. No período de renascimento agrícola das últimas décadas do século XVIII, colonos vindos dos Açores plantaram trigo no Sul, consumido nas outras regiões do Brasil. Quando foi proclamada a Independência, em 1822, esse período de expansão do trigo já se encerrara, devido às pragas e a concorrência americana, mas os vínculos com o resto do país permaneceram.

A criação de gado se generalizou, na região, assim como a transformação da carne bovina em charque (carne-seca). O charque era um produto vital, destinado ao consumo da população pobre e dos escravos do Sul e do Centro-Sul do Brasil. Criadores de gado e charqueadores formavam dois grupos separados. Os criadores estavam estabelecidos na região da Campanha, situada na fronteira com o Uruguai. Os charqueadores tinham suas indústrias instaladas no litoral, nas áreas das lagoas, onde se concentravam cidades como Rio Grande e Pelotas. Criadores e charqueadores se utilizavam de mão de obra escrava, além de trabalhadores dependentes deles.

As queixas do Rio Grande do Sul contra o governo central vinham de longe. Os gaúchos achavam que, apesar da contribuição da província para a economia brasileira, ela era explorada por um sistema de pesados impostos.

        As reivindicações de autonomia, e mesmo de separação, eram antigas e feitas, muitas vezes, tanto por conservadores como por liberais.  A Regência e o Ato Adicional não abrandaram as queixas. As províncias que não podiam arcar com todas as suas despesas recebiam recursos do governo central provenientes em parte de outras províncias. Isso acontecia antes do Ato Adicional e continuou a acontecer depois dele. O Rio Grande do Sul mandava, seguidamente, fundos para cobrir despesas de Santa Catarina e de outras regiões.

Entretanto, a revolta não uniu todos os setores da população gaúcha. Ela foi preparada por estancieiros da fronteira e algumas figuras da classe média das cidades, obtendo apoio principalmente nesses setores sociais. Os charqueadores que dependiam do Rio de Janeiro — maior centro consumidor brasileiro de charque e de couros — ficaram ao lado do governo central. Além das queixas gerais já apontadas, os estancieiros tinham razões próprias de descontentamento. Eles pretendiam acabar com a taxação de gado na fronteira com o Uruguai ou reduzi-la, estabelecendo a livre circulação dos rebanhos que possuíam nos dois países. Além disso, como já estavam organizados militarmente com seus pequenos exércitos particulares, baseados em uma chefia indiscutível, consideravam uma novidade perigosa a criação da Guarda Nacional, com cargos eletivos de oficiais. 

Os farrapos contaram com o concurso de alguns oficiais do Exército, chegados recentemente ao Rio Grande do Sul, entre eles João Manuel de Lima e Silva, irmão de um dos primeiros regentes e tio de Caxias. Nas fileiras dos revoltosos, destacaram-se pelo menos duas dezenas de revolucionários italianos refugiados no Brasil, sendo o mais célebre deles Giuseppe Garibaldi. A figura mais importante do movimento foi Bento Gonçalves, filho de um rica estancieiro, com larga experiência militar nas guerras da região. Ele organizou lojas maçônicas na fronteira e usou o serviço postal dos maçons como alternativa para sua correspondência secreta. Estendeu, assim, à fronteira as sociedades maçônicas que proliferavam em todo o Rio Grande. A luta foi longa e baseada na ação da cavalaria. Garibaldi e Davi Canabarro levaram a guerra para o norte da província, assumindo por uns tempos o controle de Santa Catarina. Na região gaúcha dominada pelos rebeldes, foi proclamada na cidade de Piratini, em 1838, a República de Piratini cuja presidência coube a Bento Gonçalves. A República não existiu apenas no papel, mas teve uma existência real, incluindo o estímulo à criação de gado e à exportação de charque e de couros. 

Os Conflitos Farroupilhas

A Guerra dos Farrapos foi promovida pela classe dominante gaúcha. Constituída de estanceiros que eram os donos de grandes propriedades rurais, gado e negros escravizados. Indignados com os elevados impostos territoriais, além de altas taxas sobre as exportações de charque, couro e sebos. Os estanceiros protestavam, pois o charque gaúcho devia pagar 25% de impostos enquanto o uruguaio pagava somente 4% para ser vendido no Rio de Janeiro. Também havia um ressentimento contra o governo imperial que sempre recrutava homens e cavalos para as lutas com os territórios fronteiriços, mas pouco beneficiava a sociedade local.

Você quer saber mais?

BORIS, Fausto. História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2004.

RIBEIRO, Celia. O Jornalista farroupilha. Porto Alegre: Libretos, 2012.


sábado, 14 de setembro de 2024

Império Bizantino: a glória do Oriente.

 O Império Bizantino, também conhecido como Império Romano do Oriente, nasceu oficialmente com a divisão do Império Romano em 395 d.C. Após a morte do imperador Teodósio I, o império foi dividido entre seus dois filhos, e o império oriental, com sua capital em Constantinopla (atualmente Istambul), começou a trilhar seu próprio caminho. A cidade, renomeada por Constantino, tornou-se um dos centros políticos e culturais mais importantes do mundo antigo.

Durante os primeiros séculos, o Império Bizantino se consolidou e manteve um papel dominante na região mediterrânea. No século VI, sob o governo do imperador Justiniano I (527-565 d.C.), o império alcançou seu auge territorial e cultural. Justiniano tentou reverter a queda do Império Romano do Ocidente, realizando campanhas militares para recuperar terras perdidas na África do Norte e na Itália. Além disso, o código legal de Justiniano, conhecido como Corpus Juris Civilis, tornou-se uma base fundamental para o direito europeu.

A religião também desempenhou um papel crucial na história bizantina. A Igreja Ortodoxa, com seu centro em Constantinopla, tornou-se uma das principais instituições do império, desenvolvendo uma forma de cristianismo distinta da Igreja Católica Romana. A separação entre as duas igrejas foi formalizada em 1054 d.C., com o Grande Cisma. As diferenças teológicas e políticas, além de disputas sobre a autoridade papal e as práticas litúrgicas, contribuíram para essa divisão, resultando em duas tradições cristãs separadas: o Catolicismo Ocidental e a Ortodoxia Oriental.

No entanto, o Império Bizantino enfrentou uma série de desafios ao longo dos séculos. As invasões de povos germânicos, as disputas internas e a crescente ameaça dos árabes e turcos começaram a minar a estabilidade bizantina. A expansão árabe no século VII resultou na perda de grandes partes do território bizantino no Oriente Médio e na África do Norte. As guerras constantes e as dificuldades econômicas, agravadas por crises internas e disputas dinásticas, enfraqueceram o império.

A partir do século XI, a situação do Império Bizantino tornou-se ainda mais precária. As derrotas militares, como a Batalha de Manzikert em 1071 contra os turcos seljúcidas, resultaram na perda de grande parte da Anatólia, uma região vital para o império. A pressão externa continuou a enfraquecer o império, que sofreu novos ataques dos turcos otomanos. Finalmente, em 1453, Constantinopla caiu nas mãos dos otomanos sob o comando do sultão Mehmed II, marcando o fim do Império Bizantino. A queda de Constantinopla significou a extinção do império que, por mais de mil anos, fora um bastião da cultura e da política na região mediterrânea.

Você quer saber mais?

SMITH, J. M. H. O Império Bizantino. Lisboa: Edições 70, 2004.

NORWICH, John Julius. História do Império Bizantino. São Paulo: Planeta, 2013. (Original em inglês, 2011.)

SIQUEIRA, José Carlos. O Grande Cisma: A Separação da Igreja Cristã em 1054. Petrópolis: Vozes, 2012.

LOSSKY, Vladimir. A Igreja Ortodoxa e o Império Bizantino. São Paulo: Paulus, 2011.

Islamismo: ascensão e expansão.

 O islamismo surgiu no século VII, na região da Arábia, com a pregação de Maomé (Muhammad), considerado pelos muçulmanos como o último profeta de Deus, ou Alá, em árabe. Maomé nasceu em 570 d.C., em Meca, uma importante cidade comercial, e começou a receber revelações divinas em 610 d.C., aos 40 anos. Essas revelações foram posteriormente reunidas no Alcorão, o livro sagrado do Islã.

No início, as mensagens de Maomé, que pregavam a crença em um Deus único e a justiça social, não foram bem aceitas pelos líderes de Meca, que se beneficiavam do comércio relacionado à adoração de vários deuses na Caaba, o principal santuário da cidade. Em 622 d.C., Maomé e seus seguidores foram obrigados a deixar Meca e se mudaram para Medina, no evento conhecido como Hégira, que marca o início do calendário islâmico. Em Medina, o Islã começou a se fortalecer, tanto religiosa quanto politicamente.

Em 630 d.C., Maomé e seus seguidores conseguiram conquistar Meca, e o Islã se tornou a principal religião da região. Após a morte de Maomé, em 632 d.C., a expansão islâmica continuou rapidamente sob a liderança dos califas, os sucessores do profeta. Em menos de um século, o Islã se espalhou por vastas áreas do Oriente Médio, Norte da África, Península Ibérica e até partes da Ásia Central.

A rápida expansão do Islã foi facilitada por fatores como a fraqueza dos impérios Bizantino e Sassânida (Persa), que dominavam a região, além da unificação política e religiosa oferecida pelo Islã, que atraía muitos povos. O comércio e as redes de caravanas também ajudaram a disseminar a nova religião. Entre 711 e 718 d.C., os exércitos islâmicos conquistaram boa parte da Península Ibérica. Ao longo do tempo, o islamismo influenciou profundamente a cultura, ciência e política das regiões por onde se espalhou. Hoje, o Islã é uma das maiores religiões do mundo, com mais de um bilhão de seguidores.

Você quer saber mais?

ARMSTRONG, Karen. O Islã. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.

CHEBEL, Malek. História do Islã. Porto Alegre: L&PM Pocket, 2002.

GRUNEBAUM, Gustave E. von. A Civilização do Islã Clássico. São Paulo: Perspectiva, 2014.

GRIN, Monica. O que é o Islã?. São Paulo: Brasiliense, 1996. (Coleção Primeiros Passos)

quinta-feira, 12 de setembro de 2024

Segundo Reinado no Brasil: principais características

O Segundo Reinado no Brasil, sob o governo de Dom Pedro II (1840-1889), representa um dos períodos mais notáveis da história do país, marcado por progresso, estabilidade e respeito internacional. Dom Pedro II, um monarca ilustrado, liderou o Brasil por quase meio século, guiando a nação através de profundas transformações econômicas, sociais e culturais.

Estabilidade e unidade nacional

Dom Pedro II ascendeu ao trono com apenas 14 anos, e seu reinado trouxe uma notável estabilidade política a um país que, até então, havia enfrentado revoltas regionais e tensões internas. Durante sua liderança, ele conseguiu unificar o Brasil e manter a integridade territorial do Império, evitando as fragmentações que ocorreram em outros países latino-americanos após suas independências.

Desenvolvimento econômico

O Segundo Reinado também foi um período de grande avanço econômico. O Brasil passou por um processo de modernização e industrialização, com a introdução de ferrovias, telégrafos e a expansão dos portos. O café, principal produto de exportação, consolidou o Brasil como uma potência agrícola, enriquecendo a economia e integrando o país ao comércio global. Sob Dom Pedro II, o país se abriu para novas tecnologias e inovação, contribuindo para a crescente urbanização e diversificação econômica.

Cultura e educação

Dom Pedro II era um patrono da cultura e das artes, reconhecido por seu intelecto refinado e amor ao conhecimento. Ele promoveu a educação e fundou importantes instituições culturais, como a Academia Brasileira de Letras e o Museu Nacional. Seu governo investiu em ciência e tecnologia, valorizando o progresso do saber como alicerce de um país forte e próspero. O imperador, que dominava várias línguas e era um estudioso de diferentes áreas, via a educação como um meio de libertação e desenvolvimento social.

A questão social e a abolição da escravidão

Embora a escravidão tenha sido uma dura realidade no Brasil durante grande parte do Segundo Reinado, Dom Pedro II era um abolicionista como todos os Braganças desde D. João VI, mas devido as conjunturas econômicas e políticas diante do poder dos grandes cafeicultores e para evitar conflitos internos que levassem a um grande derramamento de sangue de brasileiros, como ocorreu na Guerra da Secessão dos Estados Unidos. Pautou-se então em uma emancipação gradual dos escravos. Sua influência foi fundamental na promulgação de leis que pavimentaram o caminho para a abolição, como a Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei dos Sexagenários (1885). A abolição definitiva da escravatura veio em 1888, com a assinatura da Lei Áurea pela Princesa Isabel, sua filha, encerrando um dos capítulos mais dolorosos da história do país.

Diplomacia respeitada

Internacionalmente, o Brasil ganhou respeito sob o governo de Dom Pedro II. Ele manteve uma diplomacia pacífica e eficiente, evitando conflitos desnecessários e projetando o Brasil como um ator equilibrado nas relações internacionais. Sua figura era admirada por governantes de todo o mundo, sendo o imperador recebido com honras em diversas nações.

Modernização e legado

Dom Pedro II não foi apenas um monarca, mas um estadista visionário, que buscava incessantemente o progresso e o bem-estar de seu povo. Ele acreditava no desenvolvimento científico, na liberdade de imprensa e na importância de uma nação educada. Seu governo deixou um legado de modernização e transformações que impactaram profundamente o futuro do Brasil.

O Segundo Reinado, portanto, é lembrado como uma era de glória e avanço, conduzida por um imperador que, com sabedoria e dedicação, guiou o Brasil por tempos de crescimento econômico, enriquecimento cultural e justiça social. Dom Pedro II foi, sem dúvida, um dos grandes líderes que moldaram a história do país. 

Principais características do Segundo Reinado:

  1. Estabilidade política: Durante seu reinado, o Brasil passou por um longo período de estabilidade política, apesar de algumas revoltas regionais. Ele conseguiu evitar guerras civis maiores e manteve a integridade territorial do país.

  2. Abolição da escravidão: Dom Pedro II foi um defensor da abolição da escravatura. Embora a escravidão tenha sido abolida somente no fim de seu reinado, em 1888, com a Lei Áurea, ele apoiou a causa abolicionista e a transição gradual.

  3. Desenvolvimento cultural e educacional: Dom Pedro II era um grande incentivador da educação, ciência e cultura. Ele fundou diversas instituições educacionais e científicas, como o Imperial Instituto dos Meninos Cegos (atual Instituto Benjamin Constant) e o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Além disso, era um patrono das artes e da literatura.

  4. Modernização: Sob seu governo, o Brasil avançou em infraestrutura e tecnologia. Houve expansão da rede ferroviária, do telégrafo e de serviços públicos, como iluminação a gás.

  5. Diplomacia eficiente: Dom Pedro II tinha uma política externa respeitada, mantendo relações pacíficas e estáveis com outras nações, como os EUA e as potências europeias. Ele também evitou conflitos externos, apesar de a Guerra do Paraguai (1864-1870) ter ocorrido em seu reinado.

Esses fatores contribuíram para o desenvolvimento do Brasil como um país mais estável e moderno.

Você quer saber mais?

REZZUTTI, Paulo. D. Pedro II: A História Não Contada – O Último Imperador do Novo Mundo e a Longa Noite de uma Nação. Leya, 2019.

BARMAN, Roderick J. Dom Pedro II: Imperador Cidadão. Editora Unesp, 2012.

GÓES, Marcus. Dom João: O Trópico Coroado. Biblioteca do Exército, 2008.


terça-feira, 10 de setembro de 2024

Ouro e Diamantes: Impactos Econômicos e Sociais da Mineração no Brasil Colonial

 A descoberta de ouro e diamantes no Brasil teve um impacto significativo na história econômica e social do país. A exploração de ouro começou em 1693, em Minas Gerais, quando foram encontrados depósitos na região de Vila Rica (hoje Ouro Preto). Posteriormente, a descoberta de diamantes na mesma região, em 1729, acentuou ainda mais o impacto econômico da mineração. Essas descobertas atraíram uma grande quantidade de colonos, escravizados e aventureiros para a área, resultando em uma rápida urbanização e crescimento das cidades mineradoras.

A exploração mineral trouxe grandes benefícios econômicos para a Coroa Portuguesa, com a cobrança de impostos e o aumento da riqueza colonial. No entanto, também gerou profundas consequências negativas. A mineração intensificou a exploração de mão de obra escravizada, com condições de trabalho extremamente duras e a formação de um mercado de escravos em expansão. 

Além disso, a corrida do ouro e dos diamantes contribuiu para o aumento da desigualdade social, com a concentração de riqueza nas mãos de poucos e a marginalização de muitos trabalhadores e indígenas. A economia baseada na mineração também causou uma dependência econômica que influenciou o desenvolvimento econômico do Brasil por muitos anos. Em resumo, a descoberta de ouro e diamantes foi um marco na história do Brasil, trazendo prosperidade econômica a curto prazo, mas também gerando problemas sociais e ambientais duradouros.

As descobertas de ouro e diamantes no Brasil impulsionaram o desenvolvimento econômico da colônia, gerando riqueza. Estimulou a urbanização e o crescimento das cidades mineradoras, como Ouro Preto. Além disso, incentivou a infraestrutura, com a construção de estradas e obras públicas. A mineração também trouxe um fluxo de novas ideias e técnicas, contribuindo para a evolução tecnológica da época.

Você quer saber mais?

Schwarcz, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questões Raciais no Brasil. Companhia das Letras, 1993.

Souza, Carlos Fico de. A Economia do Ouro e a Formação da Sociedade Brasileira: A Experiência Mineira no Século XVIII. Editora Record, 2004.

Caldas, João. A Mineração no Brasil Colonial: História e Consequências. Editora FGV, 2002.

Oliveira, José Murilo de. O Ouro e a Revolução: O Impacto da Mineração na Formação do Brasil. Editora Universidade Federal de Minas Gerais, 1999.

Três raízes, uma nação: o papel dos índios, negros e brancos na formação do Brasil

A formação do povo brasileiro é resultado de uma rica mistura de três principais grupos: indígenas, africanos e europeus. Os povos indígenas foram os primeiros habitantes do Brasil, trazendo suas culturas, línguas e conhecimentos sobre o território. 

Com a colonização, os europeus, principalmente portugueses, introduziram suas tradições, valores e modelos econômicos, além de trazerem africanos escravizados. Os africanos, forçados a trabalhar no Brasil, tiveram um papel fundamental na economia colonial, além de contribuírem de forma significativa com sua cultura.

A interação entre esses três grupos gerou uma identidade brasileira única, marcada pela diversidade étnica e cultural. Essa miscigenação moldou as características sociais, culturais e linguísticas que definem o Brasil contemporâneo.

Você quer saber mais?

Castro, Edna. Cultura e Identidade no Brasil: O Papel dos Índios, Negros e Brancos. Editora Zahar, 2012.

Kabengele, Munanga. Rediscutindo a mestiçagem no Brasil: Identidade e Política. Editora Cortez, 2004.

Schwarcz, Lilia Moritz. O Espetáculo das Raças: Cientistas, Instituições e Questões Racial no Brasil. Companhia das Letras, 1993.

Revolução comunista cubana

 Foi um movimento liderado por Fidel Castro que derrubou o regime ditatorial de Fulgencio Batista e instaurou um governo socialista em Cuba. A revolução começou em 1953 com o ataque fracassado ao quartel de Moncada, liderado por Castro e outros revolucionários, incluindo seu irmão Raúl Castro e Che Guevara. Após esse fracasso, Fidel foi preso e exilado no México, onde reorganizou suas forças e planejou um novo ataque.

Em 1956, Castro e seus seguidores desembarcaram em Cuba no iate Granma e iniciaram uma guerrilha nas montanhas da Sierra Maestra. Ao longo dos anos, o movimento ganhou apoio popular, principalmente entre os camponeses, insatisfeitos com a desigualdade social e a repressão do governo de Batista. Em 1959, após uma série de vitórias militares, o regime de Batista colapsou, e Fidel Castro assumiu o poder.

A revolução transformou Cuba em um Estado socialista, com uma economia planificada e forte alinhamento com a União Soviética. Houve nacionalizações de propriedades e empresas estrangeiras, além de grandes reformas na saúde e educação. No entanto, o governo de Castro também trouxe repressão política, censura, e a fuga de muitos cubanos para o exílio. A revolução cubana teve repercussões globais, sobretudo na Guerra Fria, com a Crise dos Mísseis de 1962 sendo um dos pontos mais tensos da época. Cuba se tornou um símbolo de resistência ao imperialismo, mas também enfrentou desafios econômicos e isolamento internacional devido ao embargo dos EUA.

As consequências negativas da Revolução Cubana incluem a repressão política, com prisões e perseguições a opositores do regime, e a censura à liberdade de expressão e imprensa. A economia foi fortemente afetada pelas nacionalizações, levando à fuga de capital e à escassez de bens. O embargo econômico imposto pelos Estados Unidos a partir de 1962 agravou a situação, causando dificuldades econômicas prolongadas, como falta de alimentos e produtos básicos. Além disso, muitos cubanos fugiram para o exílio, principalmente para os EUA, em busca de melhores condições de vida. O regime autoritário também limitou as liberdades civis, instaurando um sistema de partido único que endureceu o controle sobre a população.

Você quer saber mais?

Fontova, Humberto. Fidel: O Tirano Mais Amado do Mundo. É Realizações, 2010.

Montaner, Carlos Alberto. Viagem ao Coração da Cuba: Uma História Crítica da Revolução Cubana. Editora Record, 2007.

Oppenheimer, Andrés. A Hora Final de Castro. Editora BestSeller, 1993.

Revolução comunista chinesa

 A Revolução Comunista Chinesa foi um processo histórico que culminou com a criação da República Popular da China em 1949, liderada pelo Partido Comunista Chinês (PCC) sob o comando de Mao Tsé-Tung. Ela teve suas raízes na insatisfação popular com a dinastia Qing e, posteriormente, com o governo do Kuomintang (Partido Nacionalista), liderado por Chiang Kai-shek, que assumiu o poder após a Revolução Xinhai de 1911. Durante as décadas de 1920 e 1930, o PCC e o Kuomintang se aliaram e se confrontaram várias vezes. A Longa Marcha, de 1934 a 1935, foi um momento crucial para o fortalecimento do Partido Comunista, que fugia da perseguição nacionalista, mas conseguiu sobreviver e consolidar sua base no campo.

Com o agravamento das condições socioeconômicas no país, a Segunda Guerra Sino-Japonesa (1937-1945) e a Guerra Civil Chinesa (1946-1949) criaram o cenário para a ascensão comunista. O PCC ganhou apoio principalmente entre os camponeses, prometendo reforma agrária e melhorias nas condições de vida. Em 1949, após derrotar as forças do Kuomintang, que fugiram para Taiwan, Mao Tsé-Tung proclamou a República Popular da China, marcando o início de um regime comunista que buscava reconstruir o país sob a ideologia marxista-leninista e transformar radicalmente a sociedade chinesa. A revolução teve grande impacto na política global e na configuração geopolítica do século XX.

A Revolução Comunista Chinesa trouxe várias consequências negativas, especialmente nas décadas seguintes. O regime de Mao Tsé-Tung implementou políticas radicais, como o Grande Salto Adiante (1958-1962), que causou uma grave crise agrícola e a morte de milhões de pessoas por fome. Além disso, a Revolução Cultural (1966-1976) resultou em perseguições, prisões e mortes de intelectuais e opositores políticos, além da destruição de patrimônio cultural e científico. A centralização do poder e a repressão política limitaram liberdades individuais e causaram instabilidade social, deixando cicatrizes profundas na sociedade chinesa.

Você quer saber mais?

Fenby, Jonathan. A ascensão da China: de Mao à mercadoria. Editora Globo, 2009.

Short, Philip. Mao: a história desconhecida. Companhia das Letras, 2005.

Dikotter, Frank. A grande fome de Mao: a história da catástrofe mais devastadora da China (1958-1962). Editora Record, 2017.

sexta-feira, 6 de setembro de 2024

Rebeliões do Período Regencial

Um período conturbado 

O período regencial foi marcado por diversas revoltas. Em geral, elas foram provocadas pelo conflito de ideias entre grupos da camada dominante, dividida entre liberais e conservadores. Essas revoltas, contudo, serviram como estímulo permanente para movimentos de origem social, que chegaram inclusive a ameaçar, em algumas regiões do país, a ordem escravocrata. Por meio desses conflitos, os trabalhadores livres pobres e os escravos integravam-se à luta pelo poder político. Mas, com frequência, serviram apenas de massa de manobra nas disputas entre as correntes oriundas das elites; e pouco conseguiram no que se refere a romper os privilégios da aristocracia rural e melhorar as próprias condições de vida. 

Cabanagem (1835-1840) 

Calcula-se que as lutas desencadeadas pela mais violenta rebelião da Regência, a Cabanagem, provocaram a morte de 30 mil pessoas no Pará (a província tinha 80 mil habitantes em 1819). Dois fatos associaram-se para dar início aos cinco anos de conflitos: o inconformismo de fazendeiros e comerciantes contra o presidente nomeado pelo poder central e a miséria da população. A maioria dos paraenses vivia em cabanas perto dos rios, daí o nome de cabanos dado aos revoltosos. Na verdade, os cabanos foram além do que pretendiam alguns de seus líderes, pois transformaram a rebeldia das elites contra o poder central numa luta sem tréguas por melhores condições de vida. Em 1835, os cabanos depuseram o presidente da província e ocuparam Belém. Três presidentes rebeldes se sucederam no poder. O primeiro foi o fazendeiro e comerciante Félix Malcher. Acusado de traição e de jurar fidelidade ao imperador, Malcher foi deposto pelo chefe militar dos cabanos, Pedro Vinagre, que assumiu o poder. Pouco tempo depois, Vinagre abandonou o posto ante os ataques das forças do governo central, apoiadas pelo mercenário inglês John Taylor. Eduardo Angelim tornou-se o terceiro presidente rebelde. Entretanto, pouco mais de um ano depois de tomar Belém, os cabanos tiveram de se retirar para o interior. Os últimos rebeldes, mais de 1.000, só se entregaram no início de 1840, o ano da maioridade. A guerra civil no Pará deu lugar a incríveis atrocidades. Arthur Reis, citado por Sérgio Buarque de Holanda em História geral da civilização brasileira, relata que mesmo os suspeitos de rebeldia eram caçados como animais ferozes e sofriam suplícios bárbaros, que às vezes provocavam a morte.

A Guerra dos Farrapos (1835-1845) 

Causas econômicas, políticas e ideológicas levaram os gaúchos a pegar em armas para tentar separar-se do Império, naquela que ficou conhecida como Guerra dos Farrapos por causa dos precários trajes dos rebeldes. Pesados impostos oneravam os produtos gaúchos vendidos em outras províncias: charque, couro, muares (tropas de burros). Tais impostos diminuíam a capacidade de concorrência com mercadorias uruguaias, argentinas e paraguaias. Além disso, às vezes, os impostos eram cobrados no lugar de venda, ou seja, beneficiavam outras províncias. O cenário político na província estava dividido entre os farroupilhas, que queriam mudanças e autonomia, e os chimangos, favoráveis à situação. Na região havia também forte influência das ideias republicanas, já que os gaúchos eram vizinhos das jovens repúblicas do Prata: Uruguai, Argentina e Paraguai. A revolta começou quando um grupo liderado pelo farroupilha Bento Gonçalves exigiu a renúncia do presidente da província. A cidade de Porto Alegre foi ocupada e a Assembléia teve de nomear novo presidente. Em 1836, os revoltosos proclamaram a República Rio-Grandense, com sede em Piratini. Três anos depois, em 1839, conquistaram Laguna, em Santa Catarina, onde proclamaram a República Juliana (era mês de julho). Para a conquista de Santa Catarina, os gaúchos contaram com a decisiva colaboração do italiano Giuseppe Garibaldi, que se destacaria mais tarde na luta pela unificação da Itália. Por terra, sobre carretas, Garibaldi conduziu duas embarcações da lagoa dos Patos até Tramandaí, a 60 quilômetros de distância, atacando de surpresa as forças imperiais. Somente em 1845, já no reinado de dom Pedro II, a paz voltaria a reinar na região. O movimento foi sufocado por Luís Alves de Lima e Silva, futuro duque de Caxias, que já havia atuado em outros conflitos regionais. Lima e Silva foi nomeado presidente da província em 1842 e fez ofertas irrecusáveis aos farroupilhas: anistia para todos, incorporação dos oficiais revoltosos ao Exército imperial no mesmo posto, devolução de toda propriedade ocupada ou confiscada durante a guerra, libertação dos escravos que haviam lutado ao lado dos rebeldes. Com uma duração de dez anos, a Guerra dos Farrapos, ou Rebelião Farroupilha, foi a mais longa guerra civil da nossa história.

A Sabinada (1837-1838)

A Sabinada foi o momento culminante de vários movimentos rebeldes na Bahia contra a política imposta pelas regências. Um desses movimentos foi a revoltaa dos escravos malês em 1835. O principal líder da Sabinada foi o médico e jornalista Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira (daí o nome da revolta). A rebelião começou em novembro de 1837, com a sublevação das tropas e a fuga do governador. Os rebeldes formaram seu próprio governo e divulgaram um programa em que defendiam a proclamação da República Baiense, a separação da província até a maioridade de dom Pedro e a convocação de uma Assembléia Constituinte. Apesar desse programa moderado, a repressão das forças do governo central se abateu sobre os revoltosos com requintes de crueldade. Os soldados imperiais chegaram a incendiar as casas e a lançar prisioneiros vivos ao fogo. Houve cerca de 600 mortos entre os legalistas e pouco mais de 1.000 entre os rebeldes.

A Balaiada (1838-1841) 

No início do século XIX, quase a metade dos 200 mil maranhenses eram escravos. Grande parte do restante compunha-se de sertanejos miseráveis. Proprietários rurais e comerciantes controlavam o poder. A insatisfação social era antiga. Aumentou ainda mais quando os políticos conservadores tentaram aumentar os poderes dos prefeitos, causando protestos entre os liberais. A insatisfação popular transformou-se então em revolta e a revolta em movimento capaz de mobilizar os setores marginalizados da população. O movimento revoltoso passou a exigir a demissão dos portugueses incrustados no Exército e na administração. Recebeu o nome de Balaiada porque um de seus líderes se chamava Manuel Balaio. Vivia ele de fazer balaios, como milhares de artesãos que o seguiram. A rebelião começou em 1838, quando um grupo liderado pelo vaqueiro Raimundo Gomes, o Cara Preta, tomou de assalto uma cadeia. A esse ataque seguiram-se outras ações armadas promovidas por Manuel Balaio e seus homens. Algumas fazendas foram atacadas. Escravos aproveitaram-se da confusão para fugir e formar quilombos. Um deles chegou a reunir cerca de 3 mil escravos comandados pelo preto Cosme. Os rebeldes recebiam apoio político dos liberais, apelidados de bem-te-vis. Estes usavam o movimento popular para tentar a conquista do poder. Numa importante vitória, os balaios tomaram a vila de Caxias em 1839. No ano seguinte, o governo central nomeou presidente da província o coronel Luís Alves de Lima e Silva. A anistia decretada em agosto de 1840 provocou a rendição imediata de cerca de 2.500 balaios. Quem resistiu foi derrotado a seguir. Raimundo Gomes, o Cara Preta, entregou-se. Enviado preso para São Paulo, morreu no caminho. Cosme, chefe de um quilombo, não se entregou. Caçado sem trégua, foi preso e enforcado. Rebelião das camadas pobres, a Balaiada foi expressão da resistência popular contra as desigualdades e injustiças da sociedade escravista.

A Revolta dos Malês (Bahia, 1835) 

Com 65.500 habitantes no começo do século XIX, Salvador era a cidade mais populosa da Bahia. Segundo a historiadora Kátia Mattoso, cerca de 90 por cento de sua população livre, estimada em 38 mil pessoas, vivia no limiar da pobreza. Essa situação se agravou ainda mais nas décadas de 1820 e 1830, quando a região foi assolada por fortes secas.  Negros e pardos livres e escravizados representavam a maior parte dessa população (cerca de 72 por cento, segundo cálculos do historiador João José Reis). Vítimas constantes do preconceito racial e da opressão social, muitos deles se rebelaram em 1835 em Salvador. Foi a Revolta dos Malês, cujo objetivo declarado era destruir a dominação branca na região e construir uma Bahia só de africanos.  Do movimento fizeram parte principalmente os malês, nome dado aos escravos seguidores do islamismo. Eles pertenciam a diferentes etnias, como a dos haussás, jejês e nagôs; muitos sabiam ler e escrever. Também participaram do movimento nagôs seguidores do candomblé.  A revolta começou no dia 24 de janeiro. A idéia dos rebeldes era ocupar de surpresa o centro de Salvador. Segundo a historiadora Magali Gouveia Engel, cerca de seiscentos negros, armados principalmente de espadas, participavam do levante. Após intensos combates, os rebeldes foram derrotados pelas forças policiais, que utilizavam armas de fogo. Centenas de participantes da revolta morreram ou ficaram feridos. Após a rebelião, desencadeou-se violenta repressão contra os africanos e afro-brasileiros. Muitos foram condenados ao açoite, à prisão ou à deportação. Três escravos e um liberto foram condenados à morte e acabaram fuzilados, pois nenhum carrasco concordou em enforcá-los.

Uma economia deficitária 

Durante o Período Regencial, o comércio exterior brasileiro foi quase o tempo todo deficitário. O Brasil importava mais do que exportava e, por isso, estava sempre devendo a credores internacionais. Essa situação começou já no Primeiro Reinado e se prolongou até 1860. Para pagar as dívidas, o país contraía empréstimos externos, solução que ia transferindo o problema para o futuro. Novos pagamentos eram acrescidos a título de juros e amortizações da dívida externa. O resultado foi o contínuo aumento do desequilíbrio nas contas com o exterior, O Brasil enfrentava também escassez de dinheiro, por causa do esvaziamento dos cofres pela família real em sua volta a Portugal em 1821, da indenização paga a Lisboa pelo reconhecimento da independência e dos gastos com a Guerra da Cisplatina e com as revoltas internas. Por falta de recursos e máquinas, as indústrias não puderam desenvolver-se. Além disso, os produtos ingleses exerciam concorrência desigual. O caso da indústria têxtil é um exemplo típico. Os ingleses, favorecidos pelas baixas taxas alfandegárias, colocavam seus tecidos no mercado brasileiro em melhores condições que o produto nacional. Como se não bastasse, existiam obstáculos para a importação de máquinas por brasileiros. Em 1840, mais da metade dos gastos com importação de manufaturados referia-se ao pagamento de produtos relacionados a vestuário. Essas condições acabaram por sufocar todas as tentativas de industrialização no Brasil. O setor de mineração alcançou alguns progressos graças à ajuda de capitais ingleses.

Você quer saber mais?

ARRUDA, José Jobson de A; PILETTI, Nelson. Toda a História: História Geral e História do Brasil-9º edição. São Paulo: Ed. Ática, 1999.

AZEVEDO, Gislane Campos; SERIACOPI, Reinaldo. História: Volume Único. São Paulo: Ed. Ática, 2011. 

VAINFAS, Ronaldo; FERREIRA, Jorge; FARIA, Sheila de Castro; CALAINHO, Daniela Buono. História.doc. São Paulo: Ed.Saraiva, 2015.

JÚNIOR, Alfredo Boulos. Coleção História: Sociedade & Cidadania. São Paulo: FTD, 2004.

COTRIM, Gilberto. História Global: Brasil e Geral-8º edição. São Paulo: Editora Saraiva, 2005, pg.71.

COTRIM, Gilberto; RODRIGUES, Jaime. Historiar- 2º ediçaõ. São Paulo: Editora Saraiva,  2015, pg.206-209.

VICENTINO, Cláudio; DORIGO, Gianpaolo. História para Ensino Médio: História Geral e do Brasil. São Paulo: Editora Scipione, 2005.

REZZUTTI, Paulo. D.Pedro I:  A história não contada. O homem revelado por cartas e documentos inéditos. São Paulo: Leya, 2020.