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redescoberta do Egito faraônico inicia-se com
duas datas precisas: 1789 e 1824. Antes disso não se sabia absolutamente nada a
respeito desse período. A primeira das duas datas (1798) corresponde à
extraordinária expedição do general Napoleão Bonaparte no Egito. Com surpreendente
visão de longo alcance, além de um
corajoso exército, levou consigo um excelente grupo de técnico e de homens
entendidos no assunto, munidos de livros, duzentas caixas de instrumentos
científicos e duas tipografias completas, visto que em todo o Egito não existia
nada disso. Ao todo cento e sessenta e sete “cientistas civis”, compreendendo
naturalistas, botânicos, cartógrafos, engenheiros, astrônomos geólogos,
historiadores e, pelo que consta, desenhistas e arqueólogos. Esse douto
esquadrão recebeu o apelido de “Asnos”.
Champollion
e os hieróglifos
Entre
os objetos recolhidos durante a expedição napoleônica havia uma estela fendida,
com aparência totalmente insignificante, Deu-a casualmente a um oficial do
Gênio, um tal Bouchard, que a passou a um dos “Asnos”. Na estela três
inscrições, a primeira em hieróglifo; a segunda em demótico; a terceira em
grego – que indicava tratar-se de uma oferta sacerdotal feita por Ptolomeu V
Epifane – constituía a chave para decifrar as duas primeiras. Constatou-se logo
que o documento era de excepcional interesse e por ordem pessoal de Napoleão a
estela foi imediatamente reproduzida e litografada, sendo que depois de várias
cópias foram enviadas a vários especialistas de línguas mortas.
Gastaram-se
quinze anos para a interpretação de pelo menos a parte em demótico. O mérito
disso cabe ao sueco J. D. Akerblad (1814). Mas os hieróglifos resistiam,
inflexíveis. Como para a história, existiam apenas duas fontes de referência: a
primeira eram os Hieroglyfhica, obra de Orapolo Nilótico que parece ter vivido
no século IV d. C. Parecia antigo, dizia ser egípcio e portanto não havia
motivo de se contestar quanto à autoria de sua obra que, no entanto,
infelizmente se tornou inaceitável, embora tivesse algumas intuições certas. Surgiu,
posteriormente, a segunda fonte com a obra de P. Athanasius Kircher, este de
indiscutível e vasta cultura; mas a sua Lingua Aegyptiaca restituta, publicada
em Roma (1643), era de tal modo estranha que levou seus alunos a proclamar, e
sem hesitação, que num obelisco em Roma está inciso um hino à Santíssima
Trindade.
Infelizmente,
as dispensões destes dois ilustres estudiosos desencadearam todos aqueles que
as tinham como boas. Somente a dois não atribuíram nenhum valor, desde o
início. O primeiro foi o inglês Thomas Young, o qual seguiu pelo caminho certo,
mas que, não encontrando, afinal, uma confirmação para o seu trabalho apenas
por motivo de um erro banal de transcrição, deu-se por derrotado. O outro foi o
grande Jean-François Champollion (1790 – 1832). Champollion foi um verdadeiro
gênio da linguagem, iniciou o estudo das línguas orientais com onze anos, já
conhecendo paralelamente todas as européias, e aos dezenove anos se tornara
professor de história em Grenoble.
Está
claro que a estela encontrada, a qual se chamou “Estela de Rosetta”, se
tornasse a sua obsessão. E entregou-se a ela de corpo e alma, intensamente em
concorrências com os mais ilustres peritos e jamais abandou a terrível empresa
que aos poucos tinha desencorajado os outros. Procedeu por etapas: na sua Lettre à M. Dacier, lida
na Academia Real ao 27 de setembro de 1822, anunciava a primeira descoberta sobre o uso do alfabeto fonético
do qual os egípcios se serviam para escrever os nomes dos reis gregos e dos
imperadores romanos.
Dito
nestes termos, não parece muito : mas derrubava o conceito difundido por
Orapollo, de que a escrita hieroglífica seria apenas ideográfica. E finalmente,
em 1824 (esta foi a data mais importante para a redescoberta do Egito) vinha a
lume o seu Précis du système hièroglyphique des anciens Egyptiens. Embora ainda
rudimentar, a chave era finalmente encontrada. Todavia, continuava ainda sem
solução o problema mais importante;
seria necessário entender aquilo que agora se podia ler, isto é, renascer uma
língua morta a pelo menos dezoito séculos.
Também isso se dedicou Champollion até a morte, que lhe ocorreu por enfarte quando contava apenas quarenta e dois anos. A sua Gramática egípcia e o seu Dicionário, publicados postumamente (1834-1845 lançaram as bases para este cansativo renascimento que durará mais ou menos por um século.
Você quer saber mais?
A.Arborio Mella, Federico. O Egito dos Faraós (L’Egitto Dei Faraoni), Editora Hemus, São Paulo, 1981.