Seria possível anteciparmos
a ameaça de um psicopata? Isto é, poderíamos saber que se trata de um desses predadores
sociais antes que eles mostrem suas garras?
Os filmes e a literatura
sobre o assunto nos mostram que os indivíduos portadores de traços de
personalidade antissocial costumam ser muito sedutores à primeira vista.
Rapidamente eles atraem a atenção e engambelam os outros em seus planos que só
visam beneficiar a si mesmos.
O sofrimento resultante
disso, claro, é muito grande, tanto pelo fato de suas vítimas descobrirem a
enganação quanto pelos próprios danos diretamente causados, que podem ser relacionados
a falsificações, roubos ou até mesmo morte.
Por isso, técnicas que
possibilitassem a todos terem noções básicas e eficientes de como identificar
um psicopata antes que ele causasse danos irreparáveis teriam enorme valor.
Desse modo, resolvi buscar em pelo menos uma base de dados (diretórios onde
podemos pesquisar por artigos científicos) sobre a existência de estudos
relacionados a esse tema.
Achei apenas um, do ano
passado (2011), feito por Nicholas S. Holtzman, da Washington University. O
pesquisador trabalhou não só com psicopatia, mas com dois outros tipos de
personalidade: narcisista e maquiavélica.
Tentativas
de prevenção
A pergunta feita no início
do texto não é muito original, pois vários estudos parecem ter empreendido
esforços nessa direção (Back et al. 2010; Fowler, Lilienfeld & Patrick,
2009). Todavia, o ponto fraco desses estudos é que todos se focaram na
vestimenta dos indivíduos testados.
As roupas, por serem um traço estilístico
muito manipulável e mutável, acabam não sendo um indicador tão eficiente dos
traços de personalidade. Assim, o ideal seria ter algum que fosse mais difícil
de ser burlado. E, como você já deve estar desconfiando, um dos melhores que
podemos pensar são as expressões faciais.
Um melhor indicador
O artigo se refere, mais
especificamente, à estrutura craniofacial, que pode trazer preciosas
informações sobre esses três tipos de personalidade. E essa tríade possui
algumas características fundamentais em comum, que podem ser medidas, como o
hábito de manipular os outros e usá-los com fins exploradores.
Distinções-chave também ocorrem: maquiavélicos
são mais introvertidos e causadores de intrigas, narcisistas costumam ser mais
egoístas e psicopatas são mais imprudentes e exibem tendências a cometer
crimes. Apesar desses elementos, as semelhanças torna coerente a abordagem
dessa tríade de forma unida no estudo.
Metodologia
Resumidamente, a metodologia
usou dois tipos de abordagem. A primeira foi o uso de diversos questionários
para avaliar os traços desses três tipos de personalidade. O segundo – o que
também foi apontado como uma inovação desse estudo – foi o relatório por pares
(peer-report), em que os voluntários da primeira amostra, eram incumbidos de
recrutarem por e-mail outras pessoas para o experimento. Os indivíduos
recrutados também respondiam a uma série de perguntas que tinham o mesmo fim
das da primeira fase (para mais detalhes, consulte o artigo como na referência
no fim do texto).
Várias fotos eram tiradas desses voluntários,
que apresentavam face neutra. A partir daí, elas eram separadas de acordo com o
estereótipo de face atribuído a cada personalidade em estudo anterior
(Penton-Voak, Pound, Little & Perrettm 2006). Não ficou claro no artigo se
as fotos eram manipuladas de alguma forma para que a estrutura craniofacial
ficasse mais perto do que era desejado em cada caso.
Um
resgate do século XIX?
Pode ser que o leitor possa
ter feito alguma relação com antigas disciplinas do século XIX e início do XX,
como a Frenologia e com os estudos do italiano Cesare Lombroso.
Resumidamente, na abordagem
da frenologia acreditava-se que cada área cerebral seria responsável por uma
característica da personalidade. E isso levou à crença de que era possível
avaliar mesmo realizar um teste e montar um perfil do indivíduo, baseando-se
nas ondulações do crânio. Essa relação era possível para alguns estudiosos da época
porque acreditava-se que quanto mais de determinada característica uma pessoa
tivesse, mais aquela área cerebral crescia. E esse crescimento do tecido
cerebral empurraria o crânio, produzindo os “calombos”. Tal abordagem foi muito
criticada na época mesmo, pois muitos neurologistas não viam como um tecido tão
frágil como o cerebral poderia empurrar um osso tão resistente quanto o crânio.
Mas mesmo assim, por razões mais socio-culturais do que científicas mesmo, a
idéia ficou bem famosa.
Outro elemento poderoso foi
a abordagem de Lombroso. O italiano acreditava que através da anatomia
poderíamos conhecer a personalidade das pessoas. Assim, popularizou-se a
anatomia do assassino, por exemplo, em que supercilhos grandes, face angulosa e
queixo pronunciado, por exemplo, era sinal de agressividade.
Tais conhecimentos hoje se
provaram incorretos, então, caso o leitor faça alguma relação entre esses
estudos antigos e o usado como base deste texto, saiba que não é o caso. O
presente estudo é pioneiro e no próprio artigo é dito que para que ele seja
levado mais à sério pela comunidade científica, é preciso que ele seja
replicado por outros pesquisadores e etc.
E
a Fisiognomia?
Em relação à essa técnica,
não existe muitos comentários a serem acrescentados. Um dos principais aspectos
que distinguem-na do estudo de Nicholas S. Holtzman é que essa disciplina não é
uma ciência. A ausência da aplicação desse método faz com que ela seja
relacionada Muitas vezes à astrologia e outras atividades sem o crivo
científico. E, de fato, ela guarda algumas semelhanças, como sua origem milenar
e tentativa de observação holística do ser humano. O holismo ttenta analisar o
ser humano em seu aspecto global, sem que haja o reducionismo tipicamente
científico. Porém, esse reducionismo é necessário ao se querer analisar um
fenômeno e elaborar meios para testar as conclusões de tal estudo. Sem isso,
temos resultados indesejáveis numa pesquisa, como o seguimento de determinada
interpretação com base em argumentos de autoridade como o de “é uma técnica
milenar” ou “ah isso foi dito por tal pessoa importante”.
Muitas vezes – e isso vale
para fisiognomia, astrologia, grafologia, tarô e até mesmo, dizem alguns, para
algumas técnicas projetivas e expressivas da psicologia – um mesmo elemento é
interpretado de modos diferentes por dois especialistas. Links sobre a
fisiognomia: Entrevista no Programa do Jô
e um site sobre o assunto.
Recomendo a leitura do
artigo O estudo da linguagem corporal é uma ciência? para quem se interessar
mais por essa história de se alguma coisa é ciência ou não.
O
resultado e além
Um dos aspectos
interessantes do resultado foi o efeito de gênero. Parece que, comparando com a
de homens, as faces femininas denunciavam mais facilmente qual o tipo de personalidade
vinculada à estrutura da face.
No entanto, uma série de falhas metodológicas
podem ter produzido esse efeito, como o fato de as voluntárias femininas terem
mais extremas características do que os homens que participaram da composição
das fotos.
Ou talvez exista mesmo um viés de gênero que
facilite de alguma forma a detecção dessas características em faces femininas.
De qualquer forma, Holtzman alerta para a necessidade de mais estudos para
ampliarem e replicarem seus resultados.
O estudo nos deixa um legado
muito precioso e inovador. Segundo seus resultados pioneiros, observadores
podem avaliar com sucesso se a personalidade de seu interlocutor é psicopática,
maquiavélica ou narcisista, a partir de faces neutras. Como as três estão
relacionadas a indivíduos extremamente danosos para aqueles com os quais
convivem – especialmente os psicopatas – a ampliação dessa habilidade pode
aumentar em muito nossas chances de prevenirmos tal mal.
Mas, Holtzman nos faz
refletir para além desses resultados práticos. Ele nos faz reforçar as
evidências que mostram que somos seres psicossociais, mas essa esfera está
diretamente ligada à nossa biologia, isto é, à aspectos físicos também. E no
fim das contas, tudo isso interage e forma aquilo que somos.
Texto:
Felipe C. Novaes
Referências
Holtzman N. (2011). Facing a psychopath: Detecting the
dark triad from emotionally-neutral faces, using prototypes from the
Personality Faceaurus, Journal of Research in Personality 45 (2011) 648–654.
Back, M. D.,
Schmukle, S. C., & Egloff, B. (2010). Why are narcissists so charming at
first sight? Decoding the narcissism-popularity link at zero acquaintance.
Journal of Personality and Social Psychology, 98, 132–145.
Fowler, K. A.,
Lilienfeld, S. O., & Patrick, C. J. (2009). Detecting psychopathy from thin
slices of behavior. Psychological Assessment, 21, 68–78.
Penton-Voak, I.
S., Pound, N., Little, A. C., & Perrett, D. I. (2006). Personality
judgments from natural and composite facial images: More evidence for a
‘‘kernel of truth’’ in social perception. Social Cognition, 24,
607–640.
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