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sábado, 9 de fevereiro de 2013

Djinns, Ghul, Ifrit, Jann, Marid e os Shaitan. Seres mitológicos da arabia Pré-islâmica.


Foto artística que retrata um Djinn. Imagem: Channel CWtv.

Há uns tempos atrás aluguei um filme em VHS, de nome “Djinn - O Senhor dos Desejos” (“Wishmaster”). O  filme não era uma super-produção mas a sua história despertou-me o interesse e como tal resolvi pesquisar sobre a criatura. Espanto o meu quando descubro que Djinn é muito mais do que um simples fato de látex avermelhado, propriedade de um estúdio de cinema qualquer de Hollywood. De facto, Djinn é uma criatura ancestral da Mitologia Árabe Pré-islâmica, uma personagem supra-humana e mais do que isso, neste caso é um “semi-demónio”, não porque é feio mas porque fluentemente é persuasivo, e maléfico até, nos seus actos e propósitos, pode causar dor e desespero onde se encontra mas... já lá vamos!

Djinn do Árabe “Jin”, possuí em português o equivalente a grosso modo de “Génio”! O Djinn provém de uma raça de seres sobrenaturais, os Djinni, remetente a Djanna (do Árabe), que significa coisa dissimulada ou invisível. Têm origem na Mitologia Árabe e mais tarde são “assimilados” pelo Islamismo. A sua presença é notada por diversas vezes no Alcorão, inclusive, para além de constantes referências suas nos textos sagrados, existe uma Sura (capítulo do Alcorão) inteiramente dedicada aos Djinni, a “Al-Jinn” (Sura nº 72).


Fotografia artística retratando um Ifrit. Imagem: Channel CWtv.

A história desta “espécie”, segundo rezam diversas escrituras, é já milenar, os Djinni são criaturas antiquíssimas postas a vaguear no paraíso há cerca de quatro mil anos atrás, dois mil anos antes da criação de Adão. Alá fê-los de ar e fogo razão pela qual se diz que estes podem assumir todo o tipo de formas animadas e inanimadas, inclusive a humana, podendo assim permanecer e caminhar “camuflados” entre nós sem que possam ser detectados, ou então simplesmente permanecerem ocultos no ar que nos rodeia a observarem a seu belo prazer a nossa sociedade. A princípio, ainda antes da chegada do Islamismo ao mundo Árabe os Djinni eram criaturas com virtudes e defeitos, nas “hierarquias sobrenaturais” são considerados inferiores tanto em relação aos Anjos (pois estes possuíam apenas a face da obediência) como aos Demônios (pois não eram tão maus nem poderosos quanto os mesmos). No entanto e relativamente aos segundos, eram igualmente detentores de uma enorme força e astúcia que usariam sem hesitar, independentemente do meio, para atingirem os seus objetivos. Após domínio Islâmico e por influência do mesmo, a alguns dos Djinni foram-lhes progressivamente retiradas as suas “qualidades”  ficando assim criaturas negras e enraivecidas, aos restantes foram-lhes conservada a capacidade de ajuda e interacção com os homens, embora na maior parte das vezes estes o façam para proveito e gozo próprio e não pela afinidade com a inferior espécie!



Ilustração artística de um Ghul. Imagem: Channel CWtv.

Aquando da criação de Adão, Alá ordenou que os Djinni se curvassem perante o recém-criado ser, no entanto estes refutaram a ordem, dada a sua “antiguidade” no Paraíso e sob o comando e liderança de Iblis (o actual equivalente cristão de Satan), um dos mais “negros” Djinni caracterizado como sendo orgulhoso e ciumento do poder de Alá,iniciaram uma revolta contra o seu criador. Como consequência de tal irreverência os Djinni, juntamente com Iblis, foram atirados para a terra e  ficaram sujeitos à mortalidade e a todas as restantes necessidades fisiológicas dos homens, com a excepção da forma física. Assim como os humanos também estas criaturas ficaram, segundo o Islamismo, sujeitos à salvação ou à condenação divina. Já na Terra, segundo as escrituras, os Djinni alojaram-se nas Montanhas de Káf, que se acreditava, na mitologia da antiga Pérsia, circundarem o mundo. São seis os grandes clãs ou tribos de Djinns que constituem os Djinni. Os Jinn, os Jann, os Marid, os Shaitan, os Ghul e os Ifrit. Iblis pertence a os Ifrit. Podemos ainda “catalogar rudemente” estas seis tribos em duas categorias; os que conseguem interagir com os humanos de forma harmoniosa e os que aterrorizam e existem para castigar e troçar dos mortais. Na primeira categoria incluem-se os Jinn juntamente com os Jann, os primeiros são os mais comuns na referida espécie sobrenatural e os que mais frequentemente interagem com os humanos, os segundos, os Jann, são conhecidos por se encontrarem e viverem em Oásis nos desertos. Já os Marid, a tribo mais antiga, encontram-se em menor número nesta superior sociedade, não obstante são os mais sábios e poderosos dos Djinni e como tal acharam por direito que os membros da mesma tribo pudessem ter o livre arbítrio sobre “de que lado  ficariam”. Os Marid alojam-se normalmente perto da costa e são conhecidos por controlarem o estado do tempo, estes podem aparecer aos humanos sob a forma de cavalo ou de um velho homem. Na segunda categoria inserem-se os “génios negros”, os Ifrit que são os mais comuns de entre os maus e são conhecidos pela tenacidade com que se opõem aos mortais; os seus aliados Shaitan, que vivem nas montanhas e no subsolo, são a segunda tribo mais antiga dos Djinni, são conhecidos por serem persuasivos e por se divertirem a manipular tanto humanos como outros Djinni para atingirem os seus propósitos. Os Shaitan podem adquirir a forma de chacal, nuvens de fumo, camelos negros ou a forma de uma bela mulher com uma parte de animal no seu corpo. Por fim os Ghul são os mais depravados deste subgrupo, deles diz-se que estão possessos de uma enorme gula, podem ser encontrados nos becos das grandes cidades a alimentarem-se de restos, muitos são avistados em cemitérios a devorarem os cadáveres dos recém-falecidos. 


quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Mary Leakey, contribuições ao conhecimento humano!


Mary Leakey (Londres, 6 de fevereiro de 1913 – 9 de dezembro de 1996) foi uma arqueóloga e antropóloga do Reino Unido.
Descobriu os primeiros fósseis do Proconsul, um gênero de primatas fósseis que viveram no Mioceno africano, de 14 a 18 milhões de anos atrás. O proconsul é considerado um antropoide muito primitivo que já apresentava traços dos símios, como a ausência de cauda, mas ainda conservava alguns dos macacos.

Leakey nasceu em 6 de fevereiro de 1913, em Londres e morreu em 9 de dezembro de 1996 no Quênia. As primeiras pesquisas e descobertas da arqueóloga foram publicadas pelo seu marido, Louis S. B. Leakey.
Era filha de um pintor que viajava o mundo retratando paisagens, Mary Leakey desenvolveu gosto pela aventura logo cedo. Em 1925, aos 12 anos, começou a escavar uma caverna na França, onde sua família estava morando. Seu interesse pela pré-história foi desperto, e ela passou a colecionar as ferramentas que encontrava, criando seu primeiro sistema de classificação. Por parte de mãe, Leakey era prima de um arqueólogo.

Mary Leakey também fazia ilustrações dos objetos que encontrava. Em 1932, seu trabalho chamou a atenção da famosa arqueóloga Gertrude Caton–Thompson, que a convidou para acompanhá-la em suas jornadas. Como artista e arqueóloga amadora, a britânica participou de expedições; em uma delas, conheceu Louis Leakey, que precisava de uma ilustradora. Enquanto trabalhavam juntos, eles se apaixonaram e mantiveram um romance, apesar de Louis estar casado à época.

Louis e Mary Leakey tiveram três filhos ao longo da década de 1940. Os garotos passaram a maior parte da infância em sítios arqueológicos. Os Leakeys faziam escavações e explorações como uma família. Em 1960, ela se tornou diretora de escavações na garganta de Olduvai, na África. Com a morte do marido, em 1972, Mary e os três filhos mantiveram vivo o interesse pela arqueologia, criando uma tradição na área como a família Leakey.

Mary morreu em 9 de Dezembro de 1996, 83 anos de idade, paleoantropóloga de renome, que não só realizou uma pesquisa significativa de sua própria, mas tinha sido de valor inestimável para as carreiras de investigação de seu marido Louis Leakey e seus filhos Richard, Philip and Jonathan.

Em 1948, Maria encontrou o primeiro fóssil verdadeiramente importante de sua carreira como arqueóloga, o Proconsul africanus. O fóssil consistia de metade do crânio, as maxilas superior e inferior, e todos os dentes.

Mary e Louis examinando fóssil de Zinjanthropus boisei. Imagem: Notícias Terra.


A primeira grande descoberta de Mary revelou um símio extinto, que se acredita ser um ancestral muito antigo dos seres humanos. O gênero Proconsul de primatas hoje tem quatro espécies conhecidas.

Em 1959, Mary descobriu um crânio de hominídeo, que ela reconstruiu a partir de centenas de fragmentos, e seu marido chamou de Zinjanthropus Bosei (mais tarde reclassificado para Australopithecus boisei).

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte V. Considerações finais.


O Pecado Original: desobediência a Lei de Deus...."do fruto da árvore do conhecimento do bem e do mal dessa não comereis por que no dia em de-la comeres certamente morrereis". Os Pelagianos não acreditavam que o pecado de Adão e Eva foram passados para seus descendentes pelo contrario cria que os homens eram livres para escolher entre o bem e o mal não sofrendo influência nenhuma da natureza desobediente de nossos primeiros pais. Essa crença se opunha contra todas as premissas da Salvação por meio de Cristo segundo a Graça Divina.
Imagem: Arquivo Pessoal CHH.

Chegamos ao final de nosso estudo sobre o Pelagianismo em suas implicações na vida da Igreja Cristã e dos cristãos do século IV e inicio do século V d.C. Agora analisaremos de forma ampla as questões que firmavam o pelagianismo como uma força religiosa que teve respeitável número de adeptos, mas como tal teve um grande adversário pela sempre por meio da Igreja Católica que firmava as premissas de sua fé na tradição Apostólica.

A convicção básica de Pelágio e seus seguidores consistiam em que a natureza do homem era correta e fundamentalmente imutável. Originalmente criados por Deus, reconhecia-se que os poderes da natureza humana tinham sido cerceados pelo peso dos hábitos passados e pela corrupção da sociedade. Mas essa constrição era puramente superficial. A “remissão dos pecados” no batismo podia significar para o cristão a recuperação imediata da plena liberdade de ação, que fora meramente suspensa pela ignorância e pelas convenções.

O homem pelagiano era, essencialmente, um indivíduo separado: o homem católico estava sempre prestes a ser tragado por vastas e misteriosas solidariedades. Para Pelágio, os homens haviam simplesmente resolvido imitar Adão, o primeiro pecador; para os católicos, eles recebiam sua fraqueza essencial da maneira mais íntima e irreversível que havia: nasciam pela mera realidade da descendência física desse pai comum da raça humana.

Para Pelágio o pecado humano era essencialmente superficial: era uma questão de escolha. As escolhas erradas podiam acrescentar uma certa “ferrugem” ao metal puro da natureza humana, mas uma escolha, por definição, era reversível. Para estes o autocontrole era suficiente: bastava defender a cidadela da decisão livre, escolhendo o bem e rejeitando o mal.

Por mais conscientemente cristão que fosse o movimento pelagiano, ele se apoiava solidamente no leito dos antigos ideais éticos do paganismo, sobretudo do estoicismo. Eles achavam que os bebês eram criados por Deus e, portanto, eram bons; que não poderiam ser amaldiçoados por não serem batizados; e “que o homem pode chegar à felicidade por seu livre-arbítrio respaldado pela bondade da natureza humana.” Pretendiam persuadir os homens como tinham feito os filósofos pagãos, de que eles poderiam atingir neste mundo uma “vida completa”, uma beata vita.

Os tratados de Pelágio soam vez por outra, como obras de teoria política racional. Seu Deus é um déspota esclarecido e os cristãos são bem providos de Sua legislação abundante. Pelágio indignava-se com o fato de os homens continuarem a descumprir as ordens de um soberano tão sensato e bem-intencionado:

“Depois de tantos avisos a vos chamar a atenção para a virtude, depois da entrega da Lei, depois dos profetas, do Evangelho e dos apóstolos, simplesmente não sei como Deus poderá vos demonstrar indulgência, se quiserdes cometer um crime.”

Pelágio presumia constantemente que a existência de um bom meio podia influenciar diretamente os homens para melhor. Segundo ele, a vontade dos homens podia ser “impactada” a agir pelo bom exemplo de Cristo e pela terrível sanção do fogo do inferno.

Havia um traço de frieza na mentalidade de todo o movimento pelagiano. Adão fora punido com a pena de morte por desrespeitar uma única proibição; e até ele era menos culpado do que nós, pois, não tivera o grande benefício da execução anterior de um ser humano para detê-lo.  A liberdade podia ser admitida como um fato: simplesmente fazia parte de uma descrição do ser humano feita pelo senso comum. Presumia-se que o homem fosse responsável (caso contrário, como poderiam seus pecados ser chamados pecaminosos?) e ele tinha consciência de exercer escolhas; portanto, insistia Pelágio, era livre para determinar seus atos.

“No começo, Deus instalou o homem e o deixou entregue a seu próprio arbítrio. (...) Colocou diante de ti a água e o fogo, para que estendas a mão para o que quiseres.”

Pelágio e seu discípulo Celéstio, julgavam poder argumentar diretamente a partir das realidades aceitas da escolha e da responsabilidade para completar a autodeterminação humana: “É coisa mais fácil do mundo” escreveu Celéstio, “mudar nossa vontade por um ato de vontade.” Para eles, a diferença entre os homens bons e maus era muito simples: uns escolhiam o bem, e outros o mal.

Para os católicos a liberdade não pode ser reduzida a um sentimento de escolha: trata-se de uma liberdade de agir plenamente. Tal liberdade deve envolver a transcendência do sentimento de opção. É que o sentimento de opção é sintoma da desintegração da vontade: a união final do conhecimento e do sentimento envolveria de tal maneira o homem no objeto de sua escolha, que qualquer outra alternativa seria inconcebível.

segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte IV: Papa Zózimo e o Imperador Honório dão a sentença final sobre o pelagianismo.


O personagem bíblico Jó era considerado pelos pelagianos um herói. Imagem: Arquivo pessoal CHH.

Chegamos à quarta parte de nosso estudo sobre o pelagianismo e sua influência na formação dos principais dogmas Católicos contra heréticos, pois sendo os mesmo uma ameaça que muito trabalho deu aos bispos católicos no século IV e V. No trabalho que se segue veremos a veemência pelagiana de alcançar a perfeição plena e harmônica entre alma e corpo de tal forma que segundo suas crenças poderiam manter-se livres de qualquer desobediência às leis sagradas por seu próprio esforço e dessa maneira deixando o clero católico consternado, pois desse modo os pelagianos excluíam Cristo de sua sociedade. Uma blasfêmia que não seria tolerada pela Igreja Cristã.

Pelágio escolhera bem os seus destinatários e, todos eles, tinham uma notável força de vontade ao romperem por completo com “o mundo”, frente ao opressivo sentimento de família que imperava na sociedade aristocrática do baixo Império Romano. A extraordinária obstinação desses jovens nobres afigurava-se um presságio seguro do futuro progresso na perfeição. Havendo usado sua força de vontade com um efeito tão poderoso, eles poderiam facilmente tornar-se seguidores fervorosos de Pelágio. E teriam dado a esse movimento de reforma a bênção da classe mais influente de leigos cristãos do mundo romano. Isso porque o pelagianismo podia afigurar-se um movimento com um projeto definido.

A Igreja Católica viu-se diante de pessoas que se acreditavam capazes de exortações urgentes, de exercer uma influência imediata no comportamento da sociedade.

Para os pelagianos, o homem não tinha desculpas para seus pecados nem para os males que o cercavam. Se a natureza humana era essencialmente livre e bem criada, e não perseguida por uma misteriosa fraqueza íntima, a razão da miséria geral dos homens devia ser externa, de algum modo, a seu verdadeiro eu; devia estar, em parte, na força restritiva dos hábitos sociais de um passado pagão, Tais hábitos podiam ser reformados. Assim, poucos autores do baixo-império foram tão francos em suas críticas à sociedade romana. Os trechos mais suaves das frias exortações dos pelagianos são os que descrevem o horror das execuções públicas, instando o cristão a:

“sentir a dor alheia como se fosse sua e a se comover até as lágrimas com as tristezas de outros homens.”

Jó era o herói dos pelagianos: ali estava um homem subitamente despojado dos artifícios da sociedade, e capaz de mostrar ao mundo o esqueleto nu de uma individualidade heroica. Não foi por consciência que essas ideias circularam entre homens que desejavam despojar-se de sua vasta riqueza.

Como muitos reformadores os pelagianos depositaram no indivíduo o peso assustador da liberdade completa: ele era responsável por todos os seus atos; portanto, todo pecado só podia ser um ato deliberado de desprezo a Deus.

Depois de 410, entretanto, a África tornou-se uma das únicas províncias em que se podia contar com o status quo. Talvez tenha sido mais do que coincidência o fato de as ideias pelagianas parecerem ter tido o máximo de repercussão justamente nas províncias em que os antigos estilos de vida foram afetados pelas invasões dos bárbaros: na Grã-Bretanha, no Sul da Itália.

As diferenças fundamentais entre Pelagianos e Católicos pode ramificar-se das questões mais abstratas da liberdade e da responsabilidade para o papel efetivo do indivíduo na sociedade do baixo império.  Mas, podemos distinguir fundamentalmente em duas concepções radicalmente diferentes da relação entre o homem e Deus. A Igreja Católica via nos bebês a extensão do desamparo encontrado neles e esta os impressionava. Já os pelagianos, desdenhavam os bebês. “Não há admoestação mais premente do que está: devemos ser chamados filhos de Deus”.

Ser “filho” era tornar-se uma pessoa inteiramente distinta, não mais dependente do pai, porém capaz de seguir por conta própria as boas ações ordenadas por ele. O pelagiano era emancipatus a deo – uma imagem brilhante, extraída da linguagem do direito romano de família: libertos dos direitos abrangentes e claustrofóbicos do pai de uma grande família sobre seus filhos, esse filhos teriam “atingido”. Como no direito romano, da dependência em relação ao pater familias, e podiam enfim lançar-se ao mundo como indivíduos maduros e livres, capazes de defender com feitos heroicos o bom nome de seus ilustres ancestrais: “Sede perfeitos, como perfeito é vosso Pai celestial.”

Pelágio angustiava-se com a hipótese de que sua mensagem austera fosse proscrita, se declarada herege. Os pelagianos achavam que a Igreja precisava de seus serviços: cabia mais a eles tolerar a negligência moral da Igreja católica, cujo populacho sempre rotularia de “heresia” qualquer opinião desagradável.

Para o homem médio, era difícil decidir se a linguagem usada por Pelágio era “herege”. “Heresia” significava erros quanto à natureza da Trindade, como os que haviam provocado à controvérsia ariana e, nesse aspecto, os pelagianos eram irrepreensíveis .

Os pelagianos sempre ameaçaram apelar para as igrejas orientais, com tradições mais liberais e muito diferentes. Vista de fora, a fundatissima fides parecia expressar meramente o rigor tacanho de uma igreja isolada.

Pelágio chegou a Terra Santa em meados de 415 e um sínodo de quatorze bispos se reuniu em Diópolis ficou claro para eles que as acusações deveriam ser descartadas.
Se a aceitação de Pelágio pareceu perfeitamente normal no Oriente, causou grande rebuliço no Ocidente. A misteriosa rede de adeptos de Pelágio certificou-se então de que seu relato do sínodo de Dióspolis chegasse ao mundo latino com espantosa velocidade. A conspiração destinada a prejudicá-lo fora reduzida a confusão; ele ficara com sua “ficha limpa”, e sua opinião de que os homens podiam existir sem pecado fora aprovada por bispos dos Lugares Santos.

Chegou então a vez da Igreja da África mostrar sua contra-demonstração. E está foi impressionante. Dois concílios foram realizados; um em Cartago e outro em Milevs e havia trezentos bispos católicos prontos para concordarem unanimemente com decretos redigidos por especialistas incontestáveis contra os ensinamentos pelagianos.

Assim no final de 416, Inocêncio bispo de Roma recebeu da África uma pilha realmente inusitada de documentos:

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte III: o Estado Romano, a Igreja Católica e os Pelagianos!



Pelagianismo. Imagem: Ministério Bereia.

Dando continuidade ao nosso estudo sobre as “Questões acerca do Pelagianismo”, avaliaremos nesta postagem sua compreensão da desobediência no pecado original e a hereditariedade da culpa trazida a todos os humanos, que como tais são descendentes de nossos primeiros pais Adão e Eva. E como consequência a compreensão dos pelagianos dos escritos canônicos ante os Católicos.

Quando analisamos a vida dos cristãos abastados do baixo Império Romano vemos que como tais continuavam a fazer parte de uma classe dominante comprometida com a manutenção das leis do império, mediante a imposição de castigos brutais. Estavam dispostos a lutar com unhas e dentes para proteger suas vastas propriedades e, à mesa de jantar, eram capazes de discutir tanto a mais recente opinião teológica, pela qual se orgulhavam como especialistas, quanto o tipo de punição judicial que houvesse acabado de infligir a algum assassino/estuprador.

Nessa confusão, a mensagem dura e firme de Pelágio surgia como uma libertação. Ele oferecia ao indivíduo a certeza absoluta, pela obediência absoluta. Podemos perceber isso na carta de um homem que se viu subitamente sob a influência de uma dama da nobreza, figura dominante de um grupo de entusiastas pelagianos na Sicília.

“Quando morava em minha terra, eu pensava ser um adorador de Deus. (...) Agora, pela primeira vez, comecei a saber como posso ser um verdadeiro cristão.(...) É fácil dizer que conheço Deus, creio em Deus, temo a Deus e sirvo a Deus. Mas não se conhece Deus quando não se acredita n’Ele; e não se acredita n’Ele a menos que se o ame; e não se ode dizer que se O ama, quando não se O teme quando não se O serve; e não se pode dizer que se serve a Deus quando se desobedece a Ele em qualquer aspecto. (...) Quem crê em Deus obedece a Suas ordens. Isto é amar a Deus: fazer o que Ele ordena.”

Era uma época séria. Os imperadores, ao insistirem no cumprimento de suas leis, usavam a mesma linguagem desesperada que Pelágio empregava ao falar das leis de Deus. Os homens que liam os textos pelagianos haviam acabado de assistir a uma série de acontecimentos que tinham abalado a confiança de toda uma classe: expurgos brutais, a ruína de famílias inteiras, assombrosos assassinatos políticos e, mais tarde, os horrores de uma invasão bárbara. Mas, enquanto alguns eram impelidos para o retraimento por essas catástrofes, os pelagianos pareciam determinados a se voltar para fora, a reformar toda a Igreja Cristã. Este foi o aspecto mais notável de seu movimento: o estreito fluxo de perfeccionismo que empurrara os nobres seguidores de Jerônimo para Belém, levara Paulino de Nola e Agostinho, de Milão, para uma vida de pobreza na África de repente voltou-se para fora nos escritos pelagianos, de modo a abarcar toda a Igreja Cristã:

“Decerto não é verdade que a Lei da conduta cristã não foi formulada para todos aqueles que se chamam cristãos. (...) Porventura credes que as fogueiras do Inferno arderão com menos calor para os homens que têm permissão (como governadores) de dar vazão a seu sadismo, e que só ficarão mais quentes para aqueles cujo dever profissional é serem devotos? (...) Não pode haver dois padrões num único e mesmo povo.“

Em toda a literatura do baixo Império Romano, esse é o protesto mais pungente contra a pressão sutil, experimentada pelos bispos católicos, para que se deixassem a vida cristã para os santos reconhecidos e se continuasse a levar a vida de homens comuns, como pagãos. Pelágio  queria que todos os cristãos fossem monges..

É que os pelagianos ainda pensavam na Igreja cristã como um pequeno grupo num mundo pagão. Estavam preocupados em dar um bom exemplo: o “sacrifício do louvo”, matéria tão íntima para os bispos católicos, significava, para os pelagianos, o louvor da opinião pública pagã, que seria conquistada pela Igreja como instituição composta por homens perfeitos. Foi nisso, é claro, que o movimento pelagiano afetou a Igreja Católica intimamente. Para a Igreja cristã, era como se as novas afirmações dos pelagianos de que poderiam chegar a uma Igreja “sem mácula nem imperfeição” meramente dessem continuidade à asserção dos donatistas de que só eles pertenciam justamente a essa Igreja.

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Questões acerca do Pelagianismo. Parte I: Pelágio e a perfeita natureza humana.



Pelágio da Bretanha. Imagem: 
Gram Enciclopédia Rialp. Pelágio y Pelagianismo. Tomo XVIII. 


No decurso de dois mil anos o cristianismo passou por diversos acontecimentos que suporão poder abalar a unidade da fé cristã. Desde as grandes perseguições realizadas pelos imperadores pagãos de Roma aos grandes debates teológicos com supostas novas e singulares ideias sobre a interpretação das Escrituras Sagradas. Neste estudo em particular abordarei com vocês o surgimento e desenvolvimento do Pelagianismo e suas implicações no cristianismo do recentemente convertido mundo romano. Convido a todos que embarquemos nesse estudo histórico sobre os diversos ramos cristãos que desejaram assumir a frente da Igreja como um todo durante sua aurora.

Após o ano de 410 d.C, o Império Romano teve suas fundações abadas pela invasão dos Visigodos Arianos comandados pelo Rei Alarico, que destruíram e saquearam Roma. Neste ínterim as famílias nobres de Roma viram-se momentaneamente empurradas para as portas ao Sul do Império. E, como podemos ver, a chegada de milionários excêntricos causou grande agitação ao Norte da África Romana.

Pelágio, um homem que se mudara com seus vizinhos e parentes cristãos, levaria sua controvérsia que viria a lhe garantir uma reputação realmente internacional. Sabemos pouco sobre Pelágio, ele nascerá na província da Grã-Bretanha e havia indo para Roma, aonde pós os pés na Itália pela primeira vez em 383 d.C. Pelágio permaneceu em Roma aonde levava uma vida de um sério leigo batizado por mais de trinta anos.

Vivendo em uma cidade constantemente visitada por monges do leste do Mediterrâneo, Pelágio observava de perto as perturbações que as questões teológicas de todas as partes do mundo influíam na Roma Cristã. Acima de tudo, esse leigo e seus partidários teriam ouvido padres manterem a mente aberta a respeito de questões que um bispo africano teria passado a tratar como encerradas desde muito antes.  Pelágio em Roma, chegou ao apogeu num mundo em que os leigos cristãos cultos exerciam mais influência do que em qualquer época anterior.

Homens e mulheres leigos haviam se tornado apóstolos destacados do novo movimento ascético: eram os destinatários ilustres de cartas de Paulino de Nola, Agostinho e Jerônimo; suas concepções teológicas eram respeitadas, sua proteção era buscada e suas mansões eram postas à disposição de santos e peregrinos vindos do mundo inteiro. Pelágio havia se juntado a esses homens em discussões sobre São Paulo. Tais discussões tinham constituído a base de suas Exposições das Cartas de São Paulo, a fonte mais segura de suas ideias teológicas, e, dirigido-se a tais homens, ele havia aperfeiçoado uma arte idealmente apropriada para transmitir suas ideias – a difícil arte de escrever cartas formais de exortação. Essas cartas eram admiradas nos mesmo círculos que deviam ler Jerônimo e Paulino de Nola. As cartas de Pelágio se destacavam por ser “bem redigidas e diretas”, por sua “facúndia” e sua “acrimônia”.

Com efeito, passamos a conhecer Pelágio muito melhor pela qualidade literária de suas cartas, sobretudo pela acrimônia que deu o tom de todo o movimento pelagiano, do que o conhecêramos antes, pelas proposições teológicas em função das quais ele ganhou fama de herege.

Em suas cartas podemos ver uma declaração deliberada e fartamente divulgada de suas mensagens. Suas mensagens eram simples e apavorantes como o exemplo que se segue: “já que a perfeição é possível para o ser humano, ela é obrigatória.” Pelágio nunca duvidou, nem por um momento, de que a perfeição fosse obrigatória; seu Deus era, acima de tudo, um Deus que ordenava obediência sem questionamento.


Pelágio da Bretanha. Imagem: Gram Enciclopédia Rialp. Pelágio y Pelagianismo. Tomo XVIII. 

Um Deus que fazia os homens executarem suas ordens e condenaria ao fogo do inferno qualquer um que não cumprisse uma só dentre elas. Mas o que Pelágio estava interessado em defender, com fervor especial, era que a natureza humana fora criada para que se atingisse tal perfeição: “Toda vez que tenho de falar em ditar normas para o comportamento e a conduta de uma vida santa, sempre assinalo, antes de mais nada, o poder e o funcionamento da natureza humana, e mostro o que ela é capaz de fazer (...), para não dar impressão de estar desperdiçando meu tempo, chamando as pessoas e enveredarem por um caminho que elas considerem impossível percorrer.”

domingo, 13 de janeiro de 2013

Maniqueísmo. Origem e fundamentos!



Mani (216-276 d.C), fundador do Maniqueísmo. Imagem: Recuerdos de Pandora.

Trata-se de uma filosofia dualística que divide o mundo entre bem, ou Deus, e mal, ou o Diabo. Com a popularização do termo, maniqueísta passou a ser um adjetivo para toda doutrina fundada nos dois princípios opostos do bem e do mal.O Maniqueísmo como filosofia religiosa sincrética e dualística fundada e propagada por Mani que divide o mundo entre Bom, ou Deus, e Mau, ou o Diabo. A matéria é intrinsecamente má, e o espírito, intrinsecamente bom. Com a popularização do termo, maniqueísta passou a ser um adjetivo para toda doutrina fundada nos dois princípios opostos do Bem e do Mal.

A origem do maniqueísmo

Quando o gnosticismo primitivo já perdia a sua influência no mundo greco-romano, surgiu na Babilônia e na Pérsia, no século III, uma nova vertente, o maniqueísmo.

O seu fundador foi o profeta persa Mani (ou Manés), após ter sido "visitado" duas vezes por um anjo que o convocou para esta tarefa, fato este comum entre aqueles que fundam religiões e seitas até hoje. Suas ideias sincretizam elementos do Zoroastrismo, do Hinduísmo, do Budismo, do Judaísmo e do Cristianismo. Desse modo, Mani considerava Zoroastro, Buda e Jesus como "pais da Justiça", e pretendia, através de uma revelação divina, purificar e superar as mensagens individuais de cada um deles, anunciando uma verdade completa.

“Conforme as suas ideias, a fusão dos dois elementos primordiais, o reino da luz e o reino das trevas, teria originado o mundo material, essencialmente mau.”

Para redimir os homens de sua existência imperfeita, os "pais da Justiça" haviam vindo à Terra, mas como a mensagem deles havia sido corrompida, Mani viera a fim de completar a missão deles, como o Paráclito prometido por Cristo, e trouxera segredos para a purificação da luz, apenas destinados aos eleitos que praticassem uma rigorosa vida ascética. Os impuros, no máximo podiam vir a ser catecúmenos e ouvintes, obrigados apenas à observância dos dez mandamentos.

As ideias maniqueístas espalharam-se desde as fronteiras com a China até ao Norte d'África. Mani acabou crucificado no final do século III, e os seus adeptos sofreram perseguições na Babilônia e no Império Romano.

Os maniqueus eram uma seita de reputação sinistra. Eram ilegais e, mais tarde, seriam selvagenmente perseguidos. Tinham aura de uma sociedade secreta: nas cidades estrangeiras, só se hospedavam na casa de membros de sua própria seita; seus líderes viajavam por uma rede de "células" espalhadas por todo o mundo romano. Os pagãos viam-nos com horror, os cristãos ortodoxos, com temor e ódio. Eles eram os "bolcheviques" do século IV; uma "quinta-coluna" de origem estrangeira, determinada a se infiltrar na Igreja Cristã e portadora de uma solução singularmente radical para os problemas religiosos da época.

Os maniqueístas procuravam respostas para perguntas que as religiões dominantes não possuíam resposta como por exemplo podemos citar:

De onde provem o mal?

A resposta maniqueísta para o problema da origem do mal foi o cerne do maniqueísmo para seus adeptos. Era uma resposta simples e drástica, é-nos plenamente conhecida a partir dos textos agostinianos (Agostinho de Hipona, ele mesmo foi maniqueu durante nove anos de sua vida) e, neste século, pudemos novamente penetrar nos sentimentos religiosos íntimos dos maniqueus graças á descoberta, em regiões tão distantes quanto o Egito e Xinjiang, das literaturas apaixonadas das comunidades maniqueístas.


Representação artística de maniqueus, seguidores de Mani. Imagem:  Recuerdos de Pandora. 

Os conventículos dos maniqueístas eram onde se reunião para ouvir as leituras da grande "Carta de Fundação" de Mani. Nessa ocasião solene, os ouvintes eram "enchidos de luz". Essa "iluminação" era a experiência religiosa inicial e básica de um maniqueu: era um homem que se haveria tornado agudamente cônscio de sua condição. Era como se tivesse sido despertado de um sono profundo por um grito distante:

"(...) Um homem ergueu a voz para o mundo, dizendo: Abençoado aquele que conhecer sua alma."

Assim despertado, o maniqueu percebia vividamente que era livre. Podia identificar-se apenas com uma parte de si mesmo, sua "alma boa". Claramente, grande parte dele não pertencia a esse oásis de pureza: as tensões de suas paixões, sua cólera, sua sexualidade, seu corpo poluído e o vasto mundo da "natureza de rubros dentes e garras" que existia fora dele. Tudo isso o oprimia. Era patente que o que havia de bom nele ansiava por ser "libertado", por "retornar", fundir-se outra vez com um sereno estado original de perfeição - um "Reino de Luz" - do qual se sentia isolado.

No entanto, era igualmente claro que os homens não haviam conseguido realizar isto, que constituía o único desejo possível do que de melhor havia em sua natureza.

Portanto, essa "Alma Boa" obviamente agia sob pressão: por alguma razão misteriosa, via-se "aprisionada", "Retida", confinada e "Violada", empurrada de um lado para outro por uma força que, temporariamente, era mais forte do que ela.

"Pois é fato que realmente pecamos contra nossa vontade (...) por essa razão, buscamos o conhecimento da razão das coisas."

Era esse "Conhecimento" da razão das coisas" que os maniqueus deixavam claro. Em suma, conquanto todos estivessem consciência da mescla íntima de bem e mal dentro de cada um e no mundo ao redor, era ao mesmo tempo, profundamente repugnante para o homem religioso, assim como absurdo para o pensador racional, que esse mal pudesse provir de Deus. Deus é bom, totalmente inocente. Devia ser protegido da mais tênue suspeita de responsabilidade direta ou indireta pelo mal. Essa desesperada "piedade para com o Ser Divino" explica a natureza drástica do sistema religioso dos maniqueus.

Os MANIQUEUS eram DUALISTAS tão convencidos de que o mal não podia provir de um Deus bom que acreditavam ser ele proveniente de uma invasão do bem - o "Reino da Luz" - por uma força ou demônio hostil, de poder igual, eterno e totalmente distinto: o "Reino das Trevas". "A primeira coisa que um homem deve fazer", dizia o catecismo maniqueísta chinês, "é distinguir os Dois Princípios (o Bem e o Mal). Aquele que deseja ingressar em nossa religião deve saber que os Dois Princípios têm naturezas absolutamente distintas: como pode quem não traz viva em si essa distinção pôr em prática a doutrina?"

Representação artística do dualismo presente no maniqueísmo. Imagem: Recuerdos de Pandora.

No tocante a esta questão , os maniqueus eram racionalistas inflexíveis. Acreditavam que podiam sustentar o dogma fundamental de sua religião unicamente por intermédio da razão:

*De onde vieram esses pecados? Perguntariam;

*De onde proveio o mal?

*Proveio o mal de um Homem, de onde veio esse homem?

*Proveio o mal de um Anjo, de onde veio esse Anjo?

*E, se disserdes 'De Deus..., então, será como se todo  pecado e todo o mal estivessem ligados, numa cadeia ininterrupta, ao próprio Deus.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

Os egípcios vistos por si mesmos!


Faraó Mentuhotep I. Imagem: História Geral da África de G. Mokhtar (Org.), pg. 54.

Não é perda de tempo conhecer o ponto de vista dos principais envolvidos. Como os antigos egípcios viam a si mesmos? Em que categoria étnica se colocavam? Como denominavam a si mesmos?  A língua e a literatura que os egípcios da época faraônica nos deixaram fornecem respostas explícitas a essas questões, que os acadêmicos insistem em subestimar, distorcer e “interpretar”. 

KMT = “os negros”(literalmente).  Imagem: História Geral da África de G. Mokhtar (Org.), pg. 56.

Os egípcios tinham apenas um termo para designar a si mesmos: KMT = “os negros” (literalmente). Esse é o termo mais forte existente na língua faraônica para indicar a cor preta; assim, é escrito com um hieróglifo representando um pedaço de madeira coma ponta carbonizada e não com escamas de crocodilo. Essa palavra é a origem etimológica da conhecida raiz KAMIT, que proliferou na moderna literatura antropológica. Dela deriva, provavelmente, a raiz bíblica KAM. Portanto foi necessário distorcer os fatos para fazer com que essa raiz atualmente signifique “branco” em egiptologia, enquanto, na língua-mãe faraônica de que nasceu, significava “preto-carvão”.

Na língua egípcia, o coletivo se forma a partir de um adjetivo ou de um substantivo, colocado no feminino singular. Assim, KMT, do adjetivo SI = KM = preto, significa rigorosamente “negros”, ou, pelo menos, “homens pretos”. O termo é um coletivo que descrevia, portanto, o conjunto do povo do Egito faraônico como um povo negro.

KMTJW = os negros, os homens pretos (literalmente). Imagem:  História Geral da África de G. Mokhtar (Org.), pg. 59.

Em outras palavras, no plano puramente gramatical, quando, na língua faraônica, se deseja indicar “negros”, não se pode usar nenhuma outra palavra senão a que os egípcios usavam para designar a si mesmos. Além disso, a língua nos oferece um outro termo KMTJW = os negros, os homens pretos (literalmente) = os egípcios, opondo-se a “estrangeiros”, que vem da mesma raiz, KM, e que os egípcios também utilizavam para descrever a si mesmos como um povo distinto de todos os povos estrangeiros. Esses são os únicos adjetivos de nacionalidade usados pelos egípcios para designarem a si mesmos, e ambos significam “negro” ou “preto” na língua faraônica. 

RMT KMT = os homens do país dos homens negros ou os homens do país negro. Imagem:  História Geral da África de G. Mokhtar (Org.), pg. 59.

Os acadêmicos raramente os mencionam ou, quando o fazem, traduzem-nos por eufemismo, tais como “os egípcios”, nada dizendo sobre seu sentido etimológico. Eles preferem a expressão RMT KMT = os homens do país dos homens negros ou os homens do país negro.

No alto da imagem à esquerda Ramsés II e um Batutsi moderno. (Fonte: C. A. Diop. 1967. PR. XXXV). Abaixo à Esfinge, tal como foi encontrada pela primeira missão científica francesa no século XIX. Presume-se que esse perfil, tipicamente negróide, represente o faraó Khafre ou Quefrén (cerca de -2600, IV Dinastia), construtor da segunda pirâmide de Gisé. O perfil não é nem helênico nem semita: em bantu. (Fonte: C. A. Diop. 1967. pr. XIX.) Imagem: História Geral da África de G. Mokhtar (Org.), pg. 57.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Mitologia egípcia e o conhecimento através dos números. Parte I.



Rá-Atum enfrentando a Serpente Apófis. Imagem: Enciclopédia Larousse.

De acordo com Schwaller de Lubicz, os antigos egípcios usavam deliberadamente a proporção harmônica em sua arte e arquitetura, com base no sistema numérico de pensamento. Era uma visão de mundo abrangente, que incluía a filosofia, a matemática, o misticismo e a teologia.

John Anthony West, um simbolista contemporâneo nos mesmos moldes de Schwaller de Lubicz, acredita que o que atualmente é conhecido como misticismo numérico pitagórico é, na verdade, de origem egípcia, e antecede até mesmo o Egito Antigo.

 Rá-Atum ou Atum. Imagem: Enciclopédia Larousse.

Quando o misticismo numérico é aplicado aos mitos egípcios, torna-se claro que as histórias e a mitologia egípcias são baseadas na compreensão dos números e não no animismo. É uma filosofia, mas não no nosso sentido do termo. Não existem textos explicativos. Mesmo assim, é sistemático, autoconsciente e organizado em princípios que podem ser expressos de maneira filosófica.

Por exemplo, na mitologia egípcia Atum (ou Tum) representa a causa transcendente, o absoluto ou o tudo, o Um, o primeiro e verdadeiro deus e criador que fez o mundo e tudo que nele há. Dentro dele estava o potencial para toda a vida. O nome Atum vem de uma