Insígnia do Spetsnaz. Imagem: Spetsnaz GRU.
Sabotagens, atentados e ações-relâmpago são algumas das
especialidades da Spetsnaz, as ultra-secretas forças especiais.
Fazia muito frio,
com temperatura mínima de seis graus abaixo de zero, e havia ameaça de fortes
nevascas em Cabul, a capital do Afeganistão, naquelas últimas semanas de
dezembro de 1979. Com a situação política no país deteriorando-se rapidamente,
o presidente Hafizullah Amin solicitara, no dia 17 daquele mês, assistência
militar soviética para combater os rebeldes que já controlavam algumas regiões
nas províncias do norte. Aproveitando o pedido, os soviéticos concentraram
grande número de forças paraquedistas e soldados de infantaria nas imediações
da cidade. Enquanto isso, as informações enviadas por seus agentes convenceram
Moscou de que um golpe de estado era iminente. O melhor a fazer era
antecipar-se. Apesar das condições climáticas adversas, às 19 horas de 27 de
dezembro, vestidos com uniformes do Exército afegão, cerca de 700 militares
soviéticos, incluindo integrantes das ultra-secretas forças especiais
conhecidas como Spetsnaz, ocuparam
os edifícios públicos mais importantes da cidade, o aeroporto e o palácio
presidencial, onde assassinaram o presidente Amin.
Com precisão
cirúrgica, eles explodiram o principal centro de comunicações de Cabul,
isolando a cidade do mundo exterior e do resto do país. Começava a invasão
soviética ao Afeganistão. A tomada da capital teve êxito absoluto no dia
seguinte, quando foram eliminados os últimos focos de resistência com a participação decisiva e brutal dos homens
da Spetsnaz.
Com efetivo em tempos de paz entre 27 mil e 30 mil integrantes, a
Spetsnaz é a maior tropa de elite do mundo. É também uma das mais secretas,
apesar do enorme desafio que é manter em sigilo as atividades de tanta gente.
Até seu nome foi pensado de maneira a confundir. Ela é chamada genericamente em
russo de Spetsnaz (ou Specnaz, dependendo da forma de traduzir o alfabeto
cirílico), abreviatura de Voyska spetsialnogo naznacheniya, literalmente “unidades com funções
especiais”. A denominação tenta não dar pistas sobre sua verdadeira
natureza, e a palavra é, em geral, usada no dia-a-dia na Rússia para indicar
coletivamente as forças especiais de todos os países.
Pouco se sabe sobre sua história,
além do fato de que a ideia de formar
uma força desse tipo surgiu durante a Segunda Guerra Mundial, quando ainda
existia a União Soviética. As experiências da luta contra o nazismo
demonstraram a necessidade de contar com uma unidade capacitada a realizar
atividades não convencionais (sabotagens, atentados, sequestros,
ações-relâmpago, etc.), com a maior discrição
possível, pegando o adversário totalmente de surpresa. É bastante provável que o primeiro grupo chamado de Spetsnaz tenha sido
organizado no início da década de 1950, mas o segredo em torno dos preparativos
era tão grande que a opinião pública mundial só veio a tomar conhecimento dele
cerca de 30 anos mais tarde. Serviços secretos ocidentais conseguiram
apurar que essa unidade de operações especiais fazia parte da GRU, a inteligência militar soviética,
sendo subdividida em esquadrões que receberam o nome de “brigadas de
dissuasão”, designadas em código numa lista não-sequencial que vai de Grupo
Alfa até Grupo Zênite, servindo tanto ao Exército quanto à Marinha da URSS
– características provavelmente mantidas depois que o país se transformou na Federação Russa (nome oficial da Rússia
desde junho de 1990).
Nas décadas mais recentes essas
brigadas passaram a ser treinadas para atacar e tomar
bases nucleares, usinas ou linhas de abastecimento de energia e centros de comando hostis, além de atuar no combate ao terrorismo e no controle de situações militares que possam representar riscos aos interesses do governo ou à segurança da população civil. Mas nem sempre suas operações são tão bem-sucedidas como foi a tomada de Cabul em 1979.
bases nucleares, usinas ou linhas de abastecimento de energia e centros de comando hostis, além de atuar no combate ao terrorismo e no controle de situações militares que possam representar riscos aos interesses do governo ou à segurança da população civil. Mas nem sempre suas operações são tão bem-sucedidas como foi a tomada de Cabul em 1979.
Homens pertencentes à Spetsnaz
foram acusados de negligência criminosa, despreparo e abuso da força em 2004,
depois de serem mobilizados para enfrentar militantes nacionalistas chechenos
(tratados como terroristas) que haviam ocupado uma escola primária na cidade de
Beslan e sequestrado seus alunos e professores. O episódio acabou num banho de
sangue, com a morte de mais de 300 reféns, muitos deles crianças, aparentemente
pela ação desastrada do Grupo Alfa, uma das “brigadas de dissuasão”. Segundo
investigações posteriores, naquele incidente a unidade teria causado um número
de baixas civis mais elevado do que o inevitável ao usar de forma inadequada os
lança-chamas que faziam parte de seu arsenal.
Uma das
especialidades da Spetsnaz é infiltrar seus agentes em países estrangeiros para
missões de reconhecimento e coleta de informações. Eles são
lançados de paraquedas em território adversário, atravessam fronteiras
clandestinamente em disfarces civis e contam com engenhocas que parecem ter
saído de um filme de espionagem. Entre elas está um minissubmarino que se
desloca sobre esteiras e é lançado a partir de um submarino convencional da
classe India, sua nave-mãe.
Discrição absoluta
As missões e características desse
minissubmarino são consideradas altamente confidenciais, e a maior parte das
poucas informações disponíveis foi obtida em meados da década de 1980, quando
mergulhadores detectaram rastros deixados por uma dessas máquinas no solo
oceânico de águas territoriais da Suécia.
O segredo absoluto, aliás, é uma
obsessão que costumava se refletir até mesmo nos uniformes vestidos pelos
soldados da Spetsnaz. Para evitar a identificação de seus integrantes, eles até
há pouco tempo evitavam usar qualquer distintivo ou emblema que pudesse
diferenciá-los do restante da tropa. Recentemente, porém, o governo da Federação
Russa decidiu afinal reconhecer a existência dessa força especial, e seus
integrantes passaram a ter direito de usar insígnias especiais indicando sua
unidade.
Em termos de organização, uma
brigada da Spetsnaz ligada à GRU (ela sobreviveu ao fim da URSS) tem em torno
de mil homens, divididos em até cinco batalhões, uma companhia de especialistas
em comunicações, unidades de apoio (grupos de engenheiros, etc.) e uma unidade
especial, conhecida como “companhia do quartel-general”. Apelidada de
“companhia VIP”, ela é encarregada de assassinar ou sequestrar pessoas cuja
eliminação seja considerada importante para os interesses das autoridades
russas, ou de fornecer guarda-costas para proteger essas mesmas autoridades. Já
o braço naval da Spetsnaz dá ênfase ao trabalho de infiltração de agentes por
via marítima, e uma brigada sua consiste de até três batalhões de
mergulhadores, um batalhão de paraquedistas, uma companhia de especialistas em
comunicações e unidades de apoio, além da notória unidade “companhia do
quartel-general”.
Mesmo após a dissolução da União
Soviética e a consequente redução dos orçamentos do setor de defesa da agora
Rússia, a Spetsnaz manteve sua reputação como uma das melhores unidades de
forças especiais em todo o mundo. O rigor nos processos de seleção e
treinamento de seu pessoal é uma tradição cuidadosamente mantida, que garantiu
a presença do grupo com destaque nas principais operações militares ordenadas
por Moscou nos últimos 40 anos.
A Spetsnaz unidade soviética a entrar na então
foi a primeira Tchecoslováquia, em 1968, para reprimir a chamada Primavera de
Praga (levante popular que tentava construir um socialismo menos
desumano), esteve na linha de frente da luta contra os rebeldes islâmicos no
Afeganistão e continua com suas atividades
secretas tanto na Chechênia como no resto do mundo. Mas, como suas missões
nunca são confirmadas oficialmente, as supostas ações do grupo limitam-se a
permanecer no terreno das suspeitas. Como o recente incidente envolvendo o
assassinato de Alexander Litvinenko, dissidente russo morto em Londres em
novembro passado sob circunstâncias misteriosas, aparentemente vítima de um
veneno desconhecido.
Os armamentos utilizados
O equipamento-padrão de um
integrante das Spetsnaz é composto por um fuzil automático AKS-74 calibre 5,45
mm, mais 400 cartuchos de munição, uma faca de combate e seis granadas de mão
ou um lançador de granadas descartável (abandonado após um único disparo), além
de uma pistola P6 (modelo que vem sendo substituído nos últimos anos pela pistola
automática PRI, de 5,45 mm). Cada soldado transporta seu próprio kit de
primeiros socorros e rações altamente energéticas para manter-se bem alimentado
por vários dias. Comunicações seguras são garantidas por rádios especiais
distribuídos a cada grupo, dotados de sistema de encriptação para a transmissão
não ser interceptada.
Além do armamento pessoal de cada
soldado, as brigadas de dissuasão podem utilizar “equipamentos coletivos”, que
variam de acordo com a missão a ser cumprida. Eles costumam incluir lançadores
de granadas RPG-16 D, mísseis antiaéreos portáteis Strela-Blok (capazes de
abater helicópteros ou aviões que tentem atacar a unidade), minas com
finalidades diversas, granadas de iluminação e fumaça, explosivos plásticos e
outras armas para ocasiões específicas. Seus integrantes são treinados em artes
marciais, luta corpo-a-corpo armada ou desarmada e também no emprego de uma
ampla variedade de armas não convencionais – a mais inusitada delas é uma corda
de violão, usada para estrangular o inimigo por trás. Também fazem parte do
arsenal venenos mortíferos, mas dificilmente identificáveis em autópsias,
agentes químicos, bactérias infecciosas e cargas nucleares portáteis para uso
tático com potência de até 2 quilotons, o equivalente a 2 toneladas de TNT.
Roberto Navarro
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