Maiza
Taques Margraf Althaus - UEPG
Resumo: O artigo analisa a avaliação dos processos de
ensino e aprendizagem por meio de portfólios na docência universitária. A pesquisa, de natureza qualitativa, é
resultado de uma intervenção realizada com seis alunos do programa de Doutorado
em Educação da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, durante o segundo
semestre de 2011, mediados por duas professoras coordenadoras do grupo de
pesquisa Paradigmas educacionais e formação de professores – PEFOP. A temática
volta-se para a formação pedagógica do professor universitário, tendo como
principal objetivo analisar, do ponto de vista didático-pedagógico, as
contribuições do trabalho por meio de portfólios aos processos de ensino e
aprendizagem na pedagogia universitária, a partir dos textos produzidos por
seis doutorandos em Educação, disponibilizados na Plataforma virtual Eureka. A
problemática levantada buscou identificar quais as possibilidades e os limites
da utilização de portfólios na prática pedagógica universitária, quando se
concebem os processos de ensino e aprendizagem integrados à avaliação.
Palavras-chave: Formação de professores. Avaliação.
Docência universitária.
Introdução
Os portfólios constituem peças
únicas, cuja singularidade traduz-se no caráter particular das vivências nele
descritas e refletidas, no quadro de referências pessoais que balizaram a
reflexão e as interpretações feitas. (DESPREBITERIS; TAVARES, 2009, p.150).
Estudos desenvolvidos sobre os paradigmas na
docência universitária têm revelado que o redimensionamento da prática
pedagógica implica uma mudança epistemológica, e não somente metodológica.
Frente às incertezas do mundo contemporâneo, as responsabilidades atribuídas às
Universidades têm exigido dos professores uma capacidade de aprendizado
permanente, que perpassa as tensões presentes no dia a dia , que envolvem desde
a avaliação externa dos cursos oferecidos (da graduação até a pós-graduação),
até a avaliação da aprendizagem dos estudantes universitários, foco de
interesse neste artigo (VASCONCELLOS, 2009, p.131).
Com esse pensar, a prática
pedagógica no ensino de graduação indica a necessidade de um processo formativo
que tenha sentido e relevância, tanto para os professores quanto para os
estudantes, profissionais que tão logo estarão à frente dos problemas por nós
enfrentados.
Mais do que capacitar seu quadro docente,
compreendemos que a formação pedagógica dos professores universitários precisa
ser trabalhada para além do aperfeiçoamento didático, sobretudo para o
fortalecimento e a constituição de uma identidade profissional, que envolva a
compreensão da docência universitária numa visão complexa, porque é tecida
conjuntamente, porque integra sujeitos que ensinam e que aprendem, articulando
e contextualizando singularidades e coletividades. Segundo Cunha (2009, p.217),
“o arcabouço histórico conceitual do entendimento
da docência e da mudança paradigmática, que vem afetando a concepção de
conhecimento e incluindo novas racionalidades, tem tido importante influência
no campo da formação de professores.”
A frágil compreensão de que, para ser professor,
basta conhecer o conteúdo do que se ensina caminha na contramão do que Zabalza
(2004, p. 111) afirma “[...] a capacidade intelectual do docente e a forma como
abordará os conteúdos são muito distintas de como o especialista faz”.
Precisamos romper com o pensamento disjuntivo, como destacou Morin:
[...] nosso pensamento é
disjuntivo e, além disso, redutor: buscamos a explicação de um todo através da
constituição de suas partes. Queremos eliminar o problema da complexidade. Este
é um obstáculo profundo, pois estabelece a fixação a uma forma de pensamento
que se impõe em nossa mente desde a infância, que se desenvolve na escola, na
universidade e se incrusta na especialização; é o mundo dos experts e dos especialistas maneja cada
vez mais nossas sociedades (1996, p.275).
No tocante à prática pedagógica universitária, o
pensamento redutor muitas vezes se volta aos processos de ensinar, aprender e
avaliar, considerando-se que, não raras vezes, são tomados como momentos
estanques e unilaterais. A retórica de que a avaliação é processo nem sempre é
vivenciada na prática. Se for processo, a avaliação não ocorre alheia aos
processos de ensino e de aprendizagem.
Reforçando essa ideia, Both (2005, p.55) sugere que
“a aprendizagem ocorre tanto mais significativamente quanto maior for a
interação de ações entre o ato de ensinar e o de avaliar.” Segundo o autor, “avaliar
a aprendizagem do aluno significa, concomitantemente, avaliar o ensino
oferecido. Não havendo a aprendizagem esperada, o ensino não cumpriu sua
finalidade de fazer aprender.”
Frente ao exposto, o objetivo principal da presente
pesquisa é analisar, do ponto de vista didático-pedagógico, as contribuições do
trabalho por meio de portfólios aos processos de ensino e aprendizagem na
pedagogia universitária, a partir dos textos produzidos por seis doutorandos em
Educação. Para isso, foram utilizados, na coleta de informações, os textos
disponibilizados na Plataforma Eureka, em que buscávamos informações sobre
conceitos teóricos e práticas de avaliação por meio de portfólios na docência
universitária. Trata-se de
uma abordagem metodológica qualitativa, por meio da pesquisa-ação,
desenvolvida no segundo semestre de 2011 com os interlocutores da pesquisa,
alunos da disciplina de Seminário de aprofundamento: teoria e prática
pedagógica na formação de professores.
O estudo em tela buscou respostas ao problema
expresso na questão: quais as possibilidades e os limites da utilização de
portfólios na prática pedagógica universitária, quando se concebem os processos
de ensino e aprendizagem integrados à avaliação?
A avaliação com portfólios na prática pedagógica universitária: diálogo
com autores
Avaliar é atividade didática de fundamental
importância no contexto da prática pedagógica universitária: é preciso estudar
a avaliação para compreender e aperfeiçoar esta tarefa didática tão presente em
nosso cotidiano.
O bom ensino, parafraseando Zabalza (2004, p.203),
não é linear, mas ocorre em círculos progressivos, como se avançasse e se
retrocedesse para continuar avançando. Na avaliação, a dinâmica do trabalho
pedagógico igualmente requer movimentos contínuos, visando sempre à
aprendizagem do estudante.
Para Tescarolo (2005), a
avaliação não pode ser analisada de forma autônoma, mas antes, constitui uma
das dimensões da problemática geral das aprendizagens, assumindo a parte mais
importante de sua função reguladora. Nesse sentido, precisa estar articulada ao
planejamento institucional, contribuindo para a gestão dos processos e
instrumentos pedagógicos, tendo por função primordial a orientação e
facilitação dos processos de aprendizagem.
A verdadeira avaliação é mais do que simples
mensuração, pois envolve também julgamento de valor, o que excede a pura coleta
de dados e aferição de medidas. A busca da excelência exige a avaliação
(JULIATTO, 2005, p.192). Compreendida desta forma, cabe perguntar: o que
pretendemos quando ensinamos e avaliamos nossos alunos nas universidades? Esse
questionamento permite-nos refletir que, nas universidades, professores vêm se
dedicando cada vez mais no preparo sobre o que será feito no cotidiano com os
alunos, na formação dos novos profissionais. Parece ser mais fácil, para alguns
professores, apresentar atividades interessantes aos estudantes do que refletir
a respeito das finalidades e dos objetivos que devem estar por trás dessas atividades.
Segundo
Masetto (2010, p.163),
[...]
para que a avaliação do desempenho do aluno colabore com sua aprendizagem, há
que se planejar seu processo e suas técnicas [...] quando formos realizar o
planejamento do semestre, no mesmo tempo em que definimos
objetivos de aprendizagem, conteúdos e técnicas pedagógicas, precisaremos
planejar o processo de avaliação, suas técnicas, seus critérios e seu
cronograma.
O bom uso da avaliação (SORDI, 2000, p.246) deve
ser levado a sério pelos educadores, “[...] sob pena de perpetuarmos um modelo
de ensino que desconsidera os desafios de uma sociedade que se transforma e se
desenvolve de modo acelerado”.
Compartilhamos com a autora a tese de que a alteração substantiva das
práticas de avaliação pode contribuir para que a aprendizagem ganhe significado
e, por se tornar significativa para os sujeitos envolvidos, consiga
efetivamente gerar efeitos educativos para os egressos das universidades, os
novos profissionais por quem somos responsáveis.
Como nos explica Roldão (2010, p. 30), é necessário
ao exercício da função de ensinar saber
analisar e avaliar como se ensinou, ou seja, ter um conhecimento reflexivo
que permita ao professor reanalisar
reflexivamente a sua ação, reorientando sua prática em função da análise feita.
Segundo
Méndez (2005, p.98),
[...] mais que o instrumento, importa o tipo de
conhecimento que põe à prova o tipo de perguntas que se formula, o tipo de
qualidade (mental ou prática) que se exige e as respostas que se espera obter
conforme o conteúdo das perguntas ou problemas que são formulados.
Na perspectiva formativa de avaliação, segundo
Perrenoud (1999), a avaliação é tão integrada aos processos de
ensino-aprendizagem que não se separa deles. Para o autor, a observação
formativa possibilita guiar e otimizar aprendizagens em andamento, que estão em
processo.
Reafirmando a perspectiva da avaliação no sentido
contínuo, formativo, Villas Boas (2004) nos oferece uma reflexão sobre a
relação entre o portfólio, a avaliação e o trabalho pedagógico. Toma por
referência o entendimento de que o portfólio compreende uma coleção intencional
de trabalhos do aluno, com o objetivo de contar a história dos esforços,
progressos e desempenho em uma determinada área. Segundo a autora, é necessário
o entendimento de três ideias básicas: “a avaliação como um processo de
desenvolvimento; o papel ativo dos alunos no processo por aprenderem a
identificar e revelar o que sabem e o que não sabem; e a reflexão do aluno
sobre o processo de sua aprendizagem” (VILLAS BOAS, 2004, p. 37-38).
Quanto à
origem da palavra portfólio, Depresbiteris e Tavares (2009, p.149) afirmam:
A palavra porta-fólio vem do latim portáre, que quer dizer portar, trazer,
transportar, e folíum, que significa
folha [...] O conceito de portfólio nasceu com as artes, denominando o conjunto
de trabalhos de um artista [...] ou de fotos de ator ou
modelo usado para divulgação das produções entre os
clientes [...] Em educação, o portfólio é o conjunto de vários trabalhos
realizados pelo aluno, com orientação do professor, que corresponde a um
período curto, médio ou longo, de sua vida escolar: ano, semestre, curso ou
unidade de um curso.
Ao discutir sobre a utilização de portfólios na educação superior, Alves
(2006, p.106) afirmou que esta prática permite aos professores considerarem o
trabalho de forma processual,
“[...]
superando a visão pontual das provas e testes, integrando-o no contexto do
ensino como uma atividade complexa baseada em elementos de aprendizagem
significativa e relacional”.
Nesse
particular, Condemarín e Medina (2005, p.23) partem do princípio de que:
O estabelecimento de acordos
sobre os propósitos atribuídos ao portfólio permite dar confiabilidade e
consistência à sua utilização como meio de avaliação. Assim, a partir dessa
definição surgirão múltiplas possibilidades de formato [...] Deste modo,
poderão ter um portfólio para trabalhos completos, para rascunhos ou trabalhos
parciais, para instrumentos ou ferramentas de síntese, etc.
Com respeito à definição dos
propósitos do portfólio, como pudemos observar acima, diferentes formatos ou
modalidades podem ser definidos com os estudantes, conforme as necessidades
avaliativas. A rigor, o maior propósito da organização dos portfólios é o de
que
“[...] o aluno se auto-avalie, visualize
e tome consciência do progresso de suas aprendizagens”
(Condemarín; Medina, 2005, p.88), o que permite que
cada portfólio seja uma peça única de criação, não devendo ser comparado com os
portfólios dos demais alunos.