terça-feira, 19 de julho de 2011

O ESCRAVO NO RIO GRANDE DO SUL

Autor: Leandro CHH
Para a historiografia sulina durante décadas o escravo africano inexistiu, sendo esse um consenso entre os historiadores a pouca importância que teria tido o escravo na formação do Rio Grande do Sul. Avaliavam ser o homem livre o fator preponderante na formação de nosso Estado.
Acreditavam que os escravos eram pouco utilizados, e quando se falava neles era para ressaltar que aqui, se houve escravismo, ele foi paternal, benigno. Pelo conceito vigente acreditavam que havia sido pequena a contribuição de sangue africano na etnia rio-grandense. Diante desses fatos cria-se então o difuso mito da Província libertária, obra do braço livre, inocente, ou quase, da pecha da escravidão. Mas os primeiros escritos sérios sobre o assunto irão provar o contrário. Participando do amplo movimento da década de 30, que reiniciará o estudo mais sistemático da “africanologia” brasileira, aparecerão os primeiros trabalhos do advogado Dante de Laytano que procurará, nos documentos, relatos e mapas estatísticos do século XVIII e XIX, o traço da passagem da escravidão pelo Rio Grande do Sul. Tece duras palavras sobre a benignidade do tratamento aos escravos, pois enquanto os negros estavam no pastoril do Rio Grande tiveram um tratamento mais humano, mas ao habitar a senzala dos granjeiros ou as charqueadas esse tratamento foi modificado pelas chicoteadas do feitor e pela barbárie escravagista.

Na verdade, a história do escravo no sul está, ainda, por escrever-se. Isso deve-se a resistência dos historiadores gaúchos a escrever a história como ela é, pois tornará pouco simpático os heróis aparecerem como senhores-de-escravos. Junta-se a esse problema a raridade das fontes históricas, pois muitas foram propositalmente destruídas. A saga do escravo no Rio Grande do Sul não deve ser esquecida, pois ali nas fétidas e úmidas senzalas das charqueadas, nos suicídios do escravo desesperado, no negro aquilombado, nas tentativas de fuga e insurreições está o passado do nosso povo.

No fim do século XVII, Portugal funda a Colônia de Sacramento e uma das mercadorias procuradas que mais chegavam à mesma colônia era o negro. Era um gigantesco mercado de mão-de-obra servil devido a sua posição geográfica que facilitava tanto o recebimento como a distribuição pela região. O comercio com o homem escravizado será uma realidade cotidiana na Colônia. Outra atividade importante para a Colônia de Sacramento além do contrabando era o couro, sebos carnes salgadas e os escravos africanos como citados anteriormente. A caça ao gado da Banda Oriental, pelo seu couro, será permanentemente, um dos pilares econômicos da Colônia. Conseguindo o couro, era ele secado e exportado para o Brasil, ou para o exterior.

Com a abertura do ciclo mineiro, com o descobrimento dos campos auríferos em Minas Gerais. As “vacarias” do sul serão agora valorizadas não somente pelo couro que se podia extrair. O gado vale como animal de carga, como fonte de suprimento.
Nos primeiros anos do novo século, começarão a descer, em direção ao sul, tropeiros vicentinos em busca do valorizado e abundante gado. Isso possibilita a fixação do homem: as primeiras “estâncias”, os primeiros povoados. A ocupação do sul, que vinha dando-se em função da Colônia de Sacramento, torna-se independente desta, toma uma razão em si. Mas isso não significa que a ocupação do Rio Grande do Sul tenha-se dado baseada essencialmente sobre o braço livre. Mesmo sendo obvio que a caça ao gado selvagem não se combinava com o trabalho compulsório. Os peões que trabalhavam na courama eram senhores de seus destinos, pois se encontravam com boas montarias e armados. Coisas que não se encaixavam com o homem escravizado. Alguns escravos que participavam dessas atividades transformavam-se em acompanhantes de seus senhores como guarda-costas e pajens. A escravidão era meramente jurídica.

A abundância de mão de obra para estas atividades estava relacionada com a dificuldade de obter terras e o orgulho impedia os colonos de competir com os escravos índios e negros pela agricultura, pois isso os faria manchar a honra espanhola. O negocio do gado era diferente. Era “Sport”, não trabalho. O mesmo era válido para o lusitano. Desse modelo social nasce o gaudério, changador ou gaúcho. Em regra homens de má índole, vagabundos e fugitivos. O gaúcho foi parte fundamental de nossa história que esqueceu do eterno presente : o escravo. Embora, até quase o início do século XIX não tivéssemos um regime social de produção escravista a presença do homem escravizado era constante e significativa. O nosso território começa a ser ocupado durante um período aonde a sociedade brasileira esta toda alicerçada sobre a exploração do trabalho servil. A posse de um escravo significava status social.

A presença do escravo em nossas primeiras estâncias e algo pouco estudado, mas seu papel importante esta presente na analise de mapas estatísticos da Capitania. A agricultura ocupará, também, nesses primeiros anos o braço escravo. Não o fará porém com exclusividade. O regime social de escravidão se estrutura com a expulsão dos espanhóis e a fundação da primeira charqueada, ao nível industrial, que teremos uma atividade produtiva de primeira ordem, baseada na exploração do trabalho escravo. Iniciando a introdução sistemática de escravos para a exploração na atividade produtiva.

O ato de charquear era uma pratica artesanal e o próprio peão podia preparar o couro e carneá-lo, estender as carnes. O começo da produção industrial de charque no Rio Grande do Sul deve-se as secas do final do século XVIII, no nordeste que até então era o produtor da carne seca. Desse modo o mercado do produtor; o Rio Grande do Sul o substituirá. O ciclo da charqueada inaugura a definitiva estruturação do escravismo como modo social de produção dominante de uma ampla região de nosso território. As conseqüências e determinação que isso trará para a nossa história não foram, ainda, nem mesmo delineadas.

Por mais de cem anos, a classe economicamente mais dinâmica viverá da exploração direta do trabalho escravo. Teremos então nossas senzalas, feitores, tronco, nossas “casas grandes” e nelas frente a frente, o senhor e o escravo. Pode-se dizer que o limite da jornada de trabalho na charqueada era a resistência física do escravo. A violência na charqueada era extrema, o escravo mau trabalhador era na maioria das vezes castigado e torturado. Era um nodo de coerção muito eficiente para os senhores das charqueadas.


Com a supressão “Legal” da entrada de novos escravos em 1850, pressionado pela marinha inglesa, o império começa efetivamente a reprimir o tráfico negreiro. Teremos porém ainda os desembarques clandestinos. O contrabando de escravos que desembarcaram em Montevidéu no